18| Lindo quando chora

Não diga que você precisa de mim se
Você sair por último, você está partindo
Não consigo fazer isso, não consigo fazer isso
Mas você faz isso muito melhor - (Pretty When You Cry
- Lana Del Rey)

Lili estava coberta apenas com seu vestido preto, um moletom comprido negro e botas vermelhas. Não estava fazendo tanto frio, pelo menos para mim, mas a vi tremer algumas vezes. Um vento soturno soprou quando ela segurou minha mão em um aperto e seguiu em direção à cidade. Tive um pressentimento terrível sobre aquilo, algumas vezes vislumbrei sombras entre as árvores da floresta, outras vezes ouvi o vento sussurrar coisas ruins. Era noite de lua cheia e ouvimos alguns lobos uivarem ao longe. Lembrei-me de Hélio. Fiquei atento ao máximo, aquela não seria uma noite comum, não quando uma besta me gravou como se eu fosse um escravo.

Novamente o vento soturno. Apertei a mão de Lili e a fiz parar, ela me olhou com medo e assentiu em silêncio. Observei ao redor em busca de mais alguma presença além de nós. Não senti calor algum emanando da floresta. Tentei farejar algo, mas senti apenas o cheiro de alguns animais noturnos e o de Lili. Ela prosseguiu com a caminhada e não desgrudei os olhos da floresta, algo ruim vinha de lá, ou era apenas minha imaginação. A queimadura em meu pescoço começou a coçar, não quis tocá-lo, rocei o pescoço no ombro, mas apenas piorou. Passei o dedo com cuidado e pude sentir minha pele diferente, tinha algum tipo de relevo nela. Chegamos à ponte, onde as ervas-daninhas estavam congeladas e quebradas.

Quando passamos entre os dois grandes lobos ornamentados em pedra, vislumbrei um deles me observando. Foi um rápido vislumbre, mas tive certeza que foi real. A estátua de Hélio me olhava de soslaio, mas não eram olhos de lobo, eram os olhos humanos, grandes e negros como os meus já foram um dia. Parei assustado e me livrei do aperto de Lili, ela me olhou aflita e perguntou o que estava acontecendo. Não tive coragem de responder. Voltei até o lobo e passei os dedos em seus olhos, mas estavam petrificados outra vez.

- Vamos, está ficando muito frio – sussurrou Lili, segurando minha mão outra vez.

- Lili... estou ficando louco.

- Todos nós estamos – ela assentiu.

Continuamos a caminhada e ela apertava minha mão a cada lufada de ar frio. Nossos pés afundavam a cada passo e era possível escutá-los de encontro com a neve. Cheguei mais perto de Lili para mantê-la aquecida, foi quando escutei mais passos atrás de nós. Segurei-a pelo braço, forçando sua parada. Consegui escutar que os passos se aproximavam, vislumbrei pegadas formando-se na neve. Não era humano. Eram pegadas grandes que pareciam ser de um cavalo, ou um alce. Senti meu corpo tremer quando as pegadas pararam bem perto de mim. Olhei para cima, depois para os lados, mas não havia nenhum animal por ali. Uma vaporada quente atingiu meu rosto e agitou meus cabelos, como se alguém me olhasse de baixo.

- O que está acontecendo Nero? – sussurrou Lili. – Me diga, estou com você – ela agora agarrava meu braço com os seus.

- N-nada – gaguejei. Aquele aperto me fez sentir segurança, até andei para trás, mas as pegadas não me acompanharam. Elas haviam ido embora.

- Estou ficando assustada, mas também estou preocupada com você. Tem de me dizer o que está havendo. Se não como poderei te ajudar?

- Não estamos lidando com algo desse mundo – falei.

- Pode ter certeza que não – sussurrou. – Vamos sair daqui, já estamos quase chegando à cidade, só mais alguns minutos.

- Certo – ela puxou meu braço e seguimos adiante.

Várias casas cobertas de neve surgiram a nossa frente, casas velhas e tortas que haviam sobrevivido ao tempo. Algumas até me eram familiares. A neve não estava muito densa quando pisamos na cidade, pessoas andavam pelas ruas e sorriam, alguns sorrisos eram direcionados para mim. Lili afrouxou o aperto quando entramos no meio da multidão que desfrutava de uma noite de lua cheia. A praça ainda abrigava a enorme árvore secular inclinada. Mas muitas coisas foram mudadas, os bancos de madeira velha agora eram revestidos de rocha e ferro. A grande estátua de meu pai com seu lobo Sólon, agora dava lugar a uma pequena cabana onde uma velha exibia um sorriso desdentado a todos.

- Dois cafés por favor – disse Lili, e grandes nuvens de vapor saíram de sua boca. – E dois cachorros-quentes tamanho grande.

- Mais alguma coisa querida? – a velha perguntou, mais uma vez com seu sorriso desdentado.

- Não, obrigado Sra. Vane – falou Lili, remexendo no bolso de seu casaco e retirando algumas moedas.

- E o rapaz, deseja algo? – perguntou, olhando para mim.

- Ele está comigo – falou Lili, pondo suas moedas no balcão.

- Que rapaz bonito Lili, é seu namorado? – a velha me lançava um olhar penetrante com seus olhos murchos.

- Não, é só um amigo – disse Lili com impaciência.

- Qual seu nome rapaz? – perguntou a velha, se inclinando para ficar mais próxima de mim.

Não respondi, fiquei pensando se deveria ou não. Lili me olhou com preocupação e tamborilou os dedos sobre o balcão para desviar a atenção da velha, mas não obteve sucesso. De repente tudo ficou em silêncio e só era possível escutar a respiração da velha, que ainda me fitava como se eu fosse um animal exótico.

- Não precisa me dizer todos filho, afinal você tem vários. Diga-me só um deles, sim? – sussurrou, sorrindo para mim e exibindo sua gengiva enorme.

- O que você disse? – grunhi para ela.

- O meu pedido, por favor Sra. Vane! – guinchou Lili, me puxando para longe da velha. – O que foi isso Nero?

- O que? Você não ouviu o que ela me perguntou? – falei rápido demais, fazendo minha voz sair desesperada. Aquilo tudo estava me enlouquecendo. Virei e a velha ainda me fitava, exibindo um sorriso torto.

- Claro que ouvi. Ela apenas perguntou se você me achava bonita e você ficou... sei lá, meio catatônico e depois gritou com ela!

- Não, ela não me perguntou isso! – arfei.

- O que foi então? Por favor, não volte a gritar assim com a Sra. Vane, ela é querida por todos, então não vai querer fazer inimizades por enquanto!

- Ela me perguntou quantos nomes eu tenho, me pediu para dizer apenas um deles – falei.

- Não, ela não perguntou isso Nero. Eu estava lá! – guinchou.

- Falou sim – resmunguei, mas ela pareceu não ouvir.

Lili limpou a neve de uma mesa redonda e nos sentamos nela. Ela sentou-se ao meu lado, onde a marca era visível no pescoço. Baixei meu olhar para a mesa, onde minhas mãos repousavam. Senti o toque de Lili na marca e fiquei tenso. Retirei sua mão e a segurei entre a minha, me certificando de que quilo não a faria mal. Ela me olhou e sorriu, mas não consegui retribuir o sorriso e voltei a fitar minhas mãos. Ela desceu a gola do meu casaco até os ombros, desabotoando alguns botões e deixando livre um de meus braços do casaco, passando o dedo sobre cada linha da marca, que pareciam não parar apenas no nome. O dedo de Lili andou do meu pescoço até os ombros e uma parte das costas.

- Uau! – ouvimos alguém atrás de nós, Lili deu um pulo e tentou me cobrir novamente com o casaco. – Tatuagem maneira.

- An, oi Arabela... o que faz por aqui? – perguntou Lili, pondo meu braço de volta no casaco.

- Apenas treinando minhas novas habilidades de caça – pude sentir o olhar da menina concentrando-se em mim.

- Caçando? – Lili soltou uma risada. – Certo, está acompanhada?

- Agora estou. Não vai me apresentar seu namorado?

- Ah, não, não. Ele é apenas um primo... um primo distante que veio conhecer a cidade – gaguejou Lili.

- Ótimo, vamos às apresentações então? – perguntou a garota, sentando-se a minha frente.

Ela tinha cabelos curtos e ruivos. Seus olhos eram mais verdes que os de Sora, e seu nariz empinado era rodeado de sardas. Ela me exibiu um sorriso bonito, que não retribui. Apenas a observei, era uma menina bonita. Seu casaco branco entrava em contraste com a paisagem fria, fazendo seus cabelos destacarem-se entre os rostos comuns. Eu pude escutar as palpitações agitadas de seu coração, e o cheiro do seu sangue vivo me fez salivar. Cravei os olhos em sua pele e desejei profundamente enfiar os dentes em seu pulso. Ela agora me olhava de um jeito esquisito, como se tivesse aguardando uma resposta.

- Nero? – despertei levemente do torpor quando Lili estalou os dedos. – Bela fez uma pergunta, o que deu em você?

Contrai os lábios para evitar que a saliva descesse e distanciei o olhar, para além da menina, onde uma árvore velha tentava resistir ao frio. Lili me olhava com desconforto no rosto e parecia saber o que se passava em minha cabeça.

- Vamos tentar outra vez, sou Arabela Manson, e você é? – perguntou Arabela, estendendo o braço.

- Nero – quando apertei sua mão senti ondas de calafrios e o cheiro de seu sangue ficou cada vez mais forte, me deixando um pouco tonto e entorpecido.

- Nome incomum – falou, me lançando outro sorriso, que dessa vez retribui. – Minha nossa!

- Fecha a boca Nero! – ouvi Lili sussurrar rapidamente em meu ouvido.

- Que maneiro! – exclamou Arabela. – Você tem uma tatuagem maneira, dentes maneiros e olhos maneiros! É isso aí, a gente tem que ser amigos, ou quem sabe algo mais.

Arabela deu um sorriso intenso e travesso, na qual percebi que ela era uma presa fácil, então lancei para ela um sorriso lupino e mal intencionado. Lili percebeu o que eu fiz e me deu um beliscão nas costelas abaixo do casaco. Reagi com uma careta, o que fez Arabela morder os lábios e me lançar outro sorriso ambíguo.

- Então, de onde você é Nero? – perguntou Arabela.

- Bli...

- Ele é da Província do Sul...

- Argh que coisa chata Lili! – exclamou Arabela. – Você e sua matraca, me deixe conversar com Nero, echo que ele não precisa de uma intérprete!

- Tá... – Lili se viu derrotada e ficou nos observando. – Só não pergunte muito.

- Sim senhora – disse Arabela, fazendo uma careta para Lili, depois voltando-se para mim. – Pode me chamar de Bela! E você não aparenta ser das Províncias do Sul. Tem feições duras do povo do Norte. Bem, eu também sou das Províncias do Sul!

- Certo, Bela – falei, com a voz arrastada.

- Uau, que voz mais sexy. Posso ver sua tatuagem? – perguntou, tentando olhar através do casaco.

- Não! – interrompeu Lili.

- Por que não? – Arabela formou um bico com seus lábios levemente rosados.

- Porque não! – guinchou Lili. – Está muito frio para ele retirar o casaco, não é Nero?

- Ah sim – falei, ainda fitando Arabela.

- Depois você me mostra então. Em qual casa você está Nero? Se você está sem lugar para ficar, pode ficar na minha casa, sabe. Podemos ser grandes amigos. – Ela deu um sorriso torto para mim e mordeu o lábio.

- Seria muito bom, mas já tenho um lugar para ficar – me inclinei para frente e apoiei minha mão no queixo para observar melhor a menina.

- É realmente uma pena... – ela suspendeu sua fala e olhou para minhas unhas, tentei escondê-las, tarde demais. – Parecem reais, que marca de esmalte é essa?

- Como? – desconheci aquela palavra.

- São postiças sabe, ele é gótico – falou Lili, soltando uma risada nervosa.

- Ah, eu gosto de homens góticos – ela inclinou as sobrancelhas repetidas vezes para cima.

Minha boca estava tão seca que eu poderia abocanhar o pescoço de Lili e depois rasgar os pulsos de Arabela. A preocupação nos olhos de Lili mostrava o quanto ela sabia que algo errado estava acontecendo, mas isso não seria o suficiente para me impedir. Lancei a Arabela um olhar astucioso, ela pareceu perceber e voltou a morder o lábio. Desejei profundamente seu sangue e seria fácil consegui-lo, então tratei de articular tudo. Lili observava indignada o meu comportamento, quando um rapaz chegou a nossa mesa e deixou o que ela havia pedido.

- Vamos comer – ela disse, me passando um embrulho quente.

- O que é isso? – perguntei.

- Pão, agora come! – ordenou.

Abri o embrulho e um vapor subiu em meu rosto. O pão não me parecia nada apetitoso, dei apenas uma mordida e o deixei de lado, pois aquele tipo de comida não mais me apetecia. Lili olhou mais uma vez com desconfiança, então apenas dei de ombros e não voltei a pegar o pão, que já parecia estar congelado. Arabela de repente inclinou-se mais para frente e passou o dedo levemente sobre minha boca, removendo algumas migalhas de pão. Segurei a ponta de seu dedo antes que ela retirasse e captei seu cheiro, como ela havia dito, era apenas estratégia de caça.

- Que nojo – ouvi Lili resmungar ao lado.

- Você é muito frio, precisa do calor de Bela – ela soltou uma gargalhada ao ver a expressão de lamento de Lili.

- Quem sabe, talvez eu esteja mesmo precisando – concordei.

- Arabela por favor... – começou Lili, ela parecia prever o pior.

- Gente, vocês souberam do assassinato na floresta? – perguntou Arabela, repentinamente apagando seu sorriso. – Foi horrível. Luscka era minha colega.

- Sim, lamento por ela – falou Lili, seus pensamentos pareciam estar distantes. Olhei para ela e ergui uma sobrancelha, indagando silenciosamente se estaria bem.

- Estou bem Nero – sussurrou, depois se virou para Arabela. – Já descobriram quem foi? Alguma pista?

- Nenhuma, saberíamos na mesma hora se o culpado fosse pego. Bem, Lili eu sei que você gosta muito de Sora, mas...

- Não Bela! – guinchou Lili. – Não e não! Sabe que Sora não tem nada com isso.

- Mas aconteceu na clareira mais próxima da casa dela, e ela é uma assassina!

- Ela não fez aquilo! – Lili agora estava vermelha, pude sentir raiva emanando dela.

- O que Sora fez? – perguntei.

- Você não sabe? – Arabela me olhou com raiva. – Ela matou os pais e a irmã – terminou a frase com um sussurro.

- Não diga isso Bela – grunhiu Lili.

- Pare de defender ela Lili! Como você me explica aquele dia? Ela odiava Kalinne! Maldito seja o dia em que a Sra. Bloom adotou Sora!

- Não vou discutir Bela, gosto demais de você para fazer isso. Mas Sora não matou ninguém, muito menos aquelas garotas.

- Kalinne era uma pessoa boa – choramingou Arabela. - Nossa. Já passa das nove! É melhor eu ir andando, é uma pena, não consegui nada hoje – ela me direcionou um olhar divertido e sorriu, mordendo o lábio.

- Nem eu. É uma pena... AI! – Lili me deu outro beliscão.

- Podemos resolver isso agora mesmo – disse Arabela, me olhando de cima para baixo.

- ÃN-HAM! – tossiu Lili. – Eu ainda estou aqui. E tem razão Bela, é melhor você ir andando.

- Ok. Foi um prazer te conhecer Nero, a gente se vê por aí. Boa noite pra vocês.

E dizendo aquilo ela se foi, me deixando com uma sede insuportável que eu não sabia se poderia controlar aquela noite. Contraí os lábios e suspirei. Lili ainda me olhava com uma careta estranha que demonstrava desconfiança e medo, mas sua expressão logo mudou quando suas mãos me deferiram muitos beliscões de uma vez nas costelas. Fiquei inclinado e segurei suas mãos, seu rosto estava vermelho de raiva. De repente uma vontade estranha de soltar uma gargalhada rompeu de minha garganta, e me surpreendi comigo mesmo ao rir daquela maneira.

- Idiota! – ela me lançou um soco no ombro. – Você é um sacana.

- Gostei dela. Ela tem o cheiro bom.

- Imagino! – resmungou.

- Talvez eu a prove mais tarde.

Me perguntei se ela sabia ao que eu estava me referindo e a observei melhor para ver sua reação, mas ela riu apoiada em meu ombro. Grandes baforadas de ar saiam da sua boca à medida que ela tremia de tanto rir. Olhei para a comida a minha frente e tomei um pouco da bebida amarga em uma tentativa inútil de afastar a sede de sangue que se apoderava aos poucos de minha sanidade limitada. Lili limpava pequenas lágrimas que brotaram em seus olhos. Olhei além das mesas e vi que a velha ainda nos fitava com seu sorriso doentio no rosto. Me se senti desconfortável com aquilo e tentei me encolher o máximo possível.

- O que foi? – perguntou Lili, percebendo minha mudança de postura.

- Não gosto dela – falei, olhando para a velha.

- Pare com isso – ela sorriu. – Você tem que gostar das pessoas.

- Eu gosto de você.

O vento soturno voltou a soprar em meus ouvidos. As árvores começaram a agitarem-se ao nosso redor, com o gelo delas caindo sobre nós. Puxei Lili para mais perto de mim, protegendo-a do gelo. Ela me puxou e saímos daquela mesa para uma mais afastada da praça, nos distanciando das outras pessoas. Lili agora me olhava assustada, e uma parte de mim não queria que ela se machucasse.

- Não é seguro para você Lili – arfei.

- Não interessa, deixe-me ver essa tatuagem – ela olhou ao redor e cerificou-se de que não havia ninguém e desabotoou alguns botões de meu casaco e novamente puxou da gola até o ombro.

- Minha nossa, isso está ficando muito sinistro Nero – sussurrou.

- Eu sei. Lili – segurei sua mão – talvez seja melhor você ficar longe de toda essa escuridão podre, algo terrível se abriga dentro de mim.

- Olha Nero, eu sou esperta o suficiente para saber que você está tentando me afastar ultimamente, mas quero que saiba que eu não vou soltar a sua mão. Minha melhor amiga precisa de mim tanto quanto você, estou me tornando sua amiga agora e é isso o que os amigos fazem, eles protegem uns aos outros.

Ela olhou para mim e chegou mais perto, me envolvendo em um abraço apertado. Fiquei triste, mas ao mesmo tempo grato por ter alguém em que confiar. Também embalei Lili em meus braços e como se não pudesse evitar, lágrimas arderam em meus olhos, minha garganta apertou e solucei. Um cheiro metalizado invadiu o ar, então percebi que sangue escoria de meus olhos. Lili percebeu que eu estava chorando, pois me abraçou com mais força. Meus soluços se tornaram desenfreados, me senti estranho, pois nunca havia chorado daquela maneira. Ela afrouxou um pouco o abraço e voltou a examinar a marca, passando os dedos por ela, seguindo até as costas. Tudo que estava acontecendo comigo era injusto, o que eu havia feito para merecer aquilo?

- Ei, você está bem?

- Talvez fosse melhor se eu estivesse morto – consegui manter a voz firme. – Eu não pedi para me tornar essa coisa, talvez eu também não tenha o privilégio do suicídio.

- Ainda bem que você acordou, porque eu adorei te conhecer – falou Lili, sorrindo para mim.

Seus olhar estava mais tranquilo agora, como se uma repentina ameaça tivesse finalmente partido. Passei a manga do casaco no rosto para limpar as marcas de sangue.

- Você fica lindo quando chora Nero – ela arfou.

Senti tudo ficar mais frio, era como se aquele lugar não nos quisesse ali.

- Vamos sair daqui, está ficando muito frio.

Segurei a mão de Lili e a ajudei a levantar. Suas bochechas já estavam rosadas por conta do frio e os lábios um pouco arroxeados. Segurei seu braço no meu e ela permaneceu o resto do caminho estranhamente em silêncio, como se algo terrível fosse acontecer a qualquer instante ou ela tivesse dito algo muito errado. Também não tentei falar nada, apenas permaneci atento ao caminho sinuoso que nos aguardava até chegar em casa.

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