CAPÍTULO 7-VALÉRIA, EX-ESPOSA DE MARCOS




Marcos Atalla havia resolvido tentar esquecer da experiência desagradável  que havia tido dentro do táxi de Lúcio.

O empresário achou que seria melhor acreditar nas palavras de seu médico...Ele havia  tido uma crise de pânico... em seu delírio havia fornecido  todas as informações para o taxista...Lúcio talvez nem tivesse falado o segredo do cofre...ou mesmo o nome de Emanuele...talvez ele nem mesmo tivesse citado Darlen! 

O médico estava certo, o empresário concluiu...foi  tudo fruto de sua imaginação cansada pelo excesso de trabalho...tudo um grande mal entendido que quase havia levado o pobre taxista  para a cadeia.

A morte de Darlen havia mexido muito com Marcos e, segundo havia dito o seu médico, uma recaída poderia acontecer a qualquer momento, especialmente pelo empresário viver em constante estresse. 

_Não podemos considerar que você teve apenas uma perda, Marcos. _doutor Macedo havia dito . _Você também perdeu os seus pais que saíram do país...você também perdeu o seu filho que se afastou de você para não sofrer pela ausência do tio que ele tanto amava... Estando separado da sua esposa, inclusive, você ficou solitário demais.

Marcos havia retrucado, mesmo sabendo o quanto estava sendo ridículo:

_Não me vejo como um homem solitário, doutor Macedo. Vivo cercado de funcionários, advogados, compradores, bajuladores e só durmo sozinho porque quero, porque companhia feminina não seria o problema. 

O médico o havia encarado sem achar graça alguma no comentário final, especialmente, e falou    sério:

_Tenho certeza de que você entendeu  o que eu quis dizer, Marcos.

Numa conversa que Marcos  havia tido com um conhecido, a explicação mais sensata foi a de que o taxista tinha agido de caso pensado...provavelmente era um antigo amigo de Darlen e como o irmão costumava beber e sair pela noite, numa dessas poderia ter dado aquelas informações ao oportunista até mesmo sem perceber.

_A menos, é claro, que você acredite que o seu irmão apareceu dentro daquele carro e simplesmente foi dando a sua ficha completa para este cara. _ironizou o advogado.

Óbvio que o empresário até chegou a pensar em algo tão absurdo assim, mas a explicação do amigo o deixou mais aliviado, descartando a hipótese  de que não estava enlouquecendo, daí não ter se questionado mais sobre o assunto.

Lúcio...o homem parecia ser boa gente, tinha uma família presente, amigos fiéis...ele não parecia realmente o tipo de pessoa capaz de tentar sequestrar alguém.

_Ele pode até ter pensado nisso, Marcos,  quando viu você ali no meio da rua visivelmente numa emergência...Sabe como é...a oportunidade faz o ladrão.

Marcos sabia que ele era uma personalidade conhecida e tudo o que o outro  foi explicando foi se encaixando e fazendo sentido.

_Claro que ele deve ser um amador, um marinheiro de primeira viagem, porque o imbecil nem pegou o seu celular!

Marcos não avaliaria Lúcio como um imbecil, mas preferiu não dizer nada.

_Tem que ficar esperto, meu amigo...Como dizia a minha avó, o diabo  mora nos detalhes e não dorme em serviço. Você deu mole e foi só isso.

Marcos não quis dizer nada mais sobre aquele assunto, pois não queria  parecer estar dando atenção demais a algo que o outro demonstrava achar tão banal. 

_E aí?  Você remarcou a sua consulta com o doutor Macedo pra quando?

_Não remarquei... Estou pensando em ficar por aqui mesmo e, quem sabe, pedir ao doutor pra vir até o Brasil me ver. Além do mais, a minha ex-esposa Valéria está cobrando que eu passo pouco tempo com o meu filho  Neitan e eu acho que ela tem razão. 

_Realmente deve ser difícil ficar perto do Neitan  sabendo o quanto ele e o Darlen eram ligados.

Marcos tinha contado que o garoto  não escondia que se pudesse escolher, iria preferir  ser filho do tio e, no início, até tinha surgido um certo ciúme por parte do empresário.

_Criança não gosta de regras e formalidades, Marcos...não gosta de cara séria...terno e gravata... _ Darlen havia se defendido na época. _Quando foi que você jogou bola com o Neitan? Ou mesmo foi ao parque soltar pipa com ele? Pelo menos nadou junto com o seu filho numa piscina? Você está pedindo pra perder o posto de pai desde que o seu filho nasceu, meu irmão!

Marcos tinha que admitir pra si mesmo que admirava a criatividade do irmão para afastar o sobrinho do vício dos jogos eletrônicos e do celular. Darlen sempre levava Neitan  para fazer atividades ao ar livre.

_Olha que merda de vida que os nossos pais deram  pra nós dois nos mantendo presos num apartamento e cercados por presentes caros, nos afastando do mundo aqui fora... _ Darlen havia completado. _Vai querer criar o seu filho da mesma forma, dentro de um ovo?

Marcos admitia pra si mesmo que quando se tratava de Neitan, ele  queria ser igual ao irmão...queria ter o poder de conquistar o próprio filho, fazer com que ele o amasse, o admirasse...mas nunca havia tido  muito sucesso...ou investido muito do seu precioso tempo para fazer aquilo.

Infelizmente, com tantas responsabilidades pesando sobre os seus ombros, cada vez mais o empresário  ia se acomodando pela praticidade dos entretenimentos eletrônicos  que mantinham  a criança sossegada sem incomodar os adultos.

_O Neitan? _ele exibia para os amigos. _O Neitan é um anjo! Não dá trabalho algum! Nem parece que tem criança em casa!

Quando Darlen chegava na casa do irmão, o sobrinho  pulava no pescoço do tio e fazia aquela festa! Ele dispensava as babás, ignorava todos aqueles brinquedos viciantes do sobrinho,   pegava o pequeno Neitan  e desaparecia com ele o dia todo.

O garoto voltava pra casa sujo, suado e com um sorriso iluminado no rosto corria atrás dos pais para tentar  contar as aventuras que havia tido com o tio. Marcos o expulsava de seu escritório, sempre atarefado demais para dispensar alguns minutos com a criança...Valéria o expulsava de perto dela dizendo que o filho estava fedorento e que iria sujar as roupas dela. Em minutos, os pais de Neitan conseguiam desmanchar o sorriso do rosto do pequeno que só queria dividir a sua felicidade com os dois. Geralmente, o pequeno chorava vendo os seus esforços de interagir com os pais frustrados. 

_Para o meu filho, o melhor seria eu ter morrido e o tio Darlen ter sobrevivido e assumido a educação dele. _ Marcos às vezes pensava deprimido. _Sou um péssimo pai e fui um péssimo irmão.

A secretária de Marcos informou que a esposa dele estava subindo e ele já sentiu o seu estado de espírito mudar. Valéria nunca era uma boa visita, pois sempre vinha com alguma exigência, com alguma reclamação, nunca aparecia para ser agradável e daquela vez não foi diferente.

A jovem de aparência exageradamente  artificial, devido às inúmeras cirurgias estéticas,  entrou feito um furacão na sala da presidência da empresa sem mesmo bater.

Era uma boneca Barbie destruída, Marcos observou. Valéria já tinha sido a mulher mais linda que ele havia conhecido na vida, mas agora era um monte de cirurgias plásticas e procedimentos estéticos que ele descreveria como desastrosas! 

_Pegarei  um voo daqui a duas horas para os Estados Unidos e devo ficar lá por pelo menos um mês. _ ela anunciou como se fosse a coisa mais simples do mundo.

O empresário sabia o que aquilo significava...ela certamente iria fazer mais algum procedimento estético e exigia que ele assumisse o papel de pai em tempo integral.

_O que vai ser desta vez? _ele questionou por simples educação e sem nenhum real interesse. 

Ela olhou pra ele como se aquilo fosse óbvio:

_Preciso de mais silicone  nos seios, caso não tenha percebido.

Ele não tinha percebido...talvez, se ela arrancasse os dois seios, ainda assim ele não iria perceber.

_Achei que você iria deixar o Neitan com a sua mãe.

Valéria não escondeu a irritação:

_ Achei que o Neitan tinha também um pai, ou você se esqueceu  que eu não o fiz sozinha?! Mamãe irá comigo, claro. Não acha que vou passar por isso sozinha, como da última vez!

Das últimas vezes, ela deveria dizer, ele quase corrigiu. Quantas vezes ela tinha  mexido nos seios, na barriga, no bumbum, no nariz, nas pálpebras... Ele não saberia dizer se ainda havia algo natural no corpo da ex-esposa! A mãe sempre a acompanhava, mas da última vez, Margarida, mãe de Valéria,  também estava num hospital fazendo a sua própria cirurgia plástica. 

_O seu filho não dá trabalho, você sabe...é só deixá-lo no celular. Pedi para que a escola libere o Neitan para você, quando for buscá-lo ao final das aulas. Pelo amor de Deus, não vá se esquecer de buscar o seu filho na escola, Marcos! Isso é o mínimo que você pode fazer por ele!

Marcos não se intimidou com o comentário dela:

_Pedirei ao Emílio para pegá-lo, não se preocupe.

Valéria apelou:

_Será que é tão difícil pra você buscar o seu filho na escola de vez em quando? Vai ser apenas por um mês!

Marcos não se alterou:

_Nem sempre estou livre quando ele sai... Preciso dirigir uma empresa, caso não tenha percebido. Meu motorista pode perfeitamente se encarregar de levar e buscar o Neitan na escola, não vejo mal nenhum nisso, Valéria.

Valéria se irritou mais ainda:

_Fico pensando, sabe...deveria ter escolhido o Darlen...deveria ter dado para o Darlen, assim, pelo menos, o Neitan teria  noção do que é ter um pai! Não foi  à toa que o seu filho gostava mais do Darlen  do que de você, Marcos!

Marcos  sentiu a dor da perda do irmão  mais uma vez...A ex-esposa já  não estava ali para ver, pois assim como Valéria  apareceu  de repente, na mesma velocidade ela  virou-se e saiu, fazendo questão de falar a última frase bem alto,   já  na sala da secretária:

_Não sei onde eu estava com a cabeça quando decidi fazer um filho com você! Você e nada são  a mesma coisa, Marcos!

Aquele era um dos motivos pelos quais  os dois haviam se separado...Ela não era um modelo de mãe, mas sempre exigia que ele fosse um bom pai.

Ela estava certa, Marcos admitiu...Darlen tinha nascido pra ser pai...ele não...Às vezes, Marcos pensava que se encaixaria melhor como tio...só precisaria  pedir à secretária que o lembrasse dos aniversários para que ela comprasse um presente e enviasse em seu nome para o sobrinho. 

Não precisava se preocupar com a agenda  do filho... Ele tinha certeza de que Valéria já havia se encarregado de deixar tudo com a secretária dele.

Por um lado, era bom que a ex-esposa já soubesse que sem o apoio de outras pessoas, ele não conseguiria cumprir as suas funções de pai. Por outro lado, porém, Valéria só confirmava que péssimo pai ele era. 

Para a segurança do filho, talvez um dia a ex-esposa afastasse definitivamente  Neitan do próprio pai. Talvez, ele admitiu, fosse o mais sensato a se fazer...ele não era Darlen...ele  não era um bom pai...assim como não tinha sido um bom irmão. Pra fechar o pacote, Marcos Atalla nem mesmo estava sendo um bom filho, já que indiretamente por causa dele, os pais tiveram que deixar o país.

Trinta dias com o filho de sete anos sob a responsabilidade dele...Um certo pânico invadiu o empresário se vendo na posição de tutor de Neitan...precisando tomar alguma decisão urgente como liberar uma extração de dente...participar de alguma reunião importante...decidir se ele poderia ou não dormir na casa de algum colega...lidar com o vazio que Darlen havia deixado na vida dos dois. 

 Marcos reconhecia que  tinha sorte  nos negócios...apenas nos negócios, pois em todo o resto, ele era um fracassado!


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