CAPÍTULO 31-ESPÍRITO OBSESSOR




Naquele dia, Marcos Atalla se sentia um perfeito idiota diante de uma escolha  tão simples que precisava fazer  e não conseguia!

Precisavam divulgar uma nova linha de cosméticos masculinos e, como sempre, ele foi consultado para que desse a palavra final sobre o garoto propaganda que deveriam usar.

Aquilo sempre era tão simples...era mera formalidade, porque a equipe era excelente e sempre fazia o melhor. 

Estavam usando a mesma agência de modelos de sempre, os rapazes eram lindos,  mas daquela vez foi diferente para o dono da Cosméticos Atalla. 

O empresário não mais olhava aqueles homens com os mesmos olhos que os havia olhado há algum tempo...um tempo anterior àquele em que tinha visto Lúcio pela primeira vez.

Impressionante como o taxista havia mudado a sua vida em todos os sentidos, inclusive interferindo no seu trabalho, o empresário admitia. De repente, o seu olhar não mais era atraído por nádegas e bustos femininos...perfumes e olhares de todas as mulheres que sempre o haviam abordado com segundas intenções agora passavam despercebidos. Era como se algo diferente  que estivesse adormecido dentro dele, agora estivesse desperto e exigisse  atenção e um outro olhar sobre a vida. 

E lá estavam os cinco finalistas e ele não conseguia deixar de comparar cada par de pernas...cada bíceps...cada braço musculoso...cada sorriso... boca... nariz...as sobrancelhas...tudo ali lembrava Lúcio!

Numa tentativa insana de autodefesa, mais uma vez tentando fugir de si mesmo e de seus próprios sentimentos, Marcos começou a procurar defeitos nos homens que estavam a sua frente!

O empresário cismou que dois candidatos eram afeminados demais...o terceiro era muito másculo e passava uma imagem quase selvagem...o quarto era muito pálido e parecia doente e o quinto definitivamente o fez estremecer por se parecer demais com o taxista!

Marcos sentiu atração pelos homens que o faziam se lembrar de Lúcio e repulsa exatamente por nenhum deles ser Lúcio!

Ele dispensou os rapazes que ficaram visivelmente decepcionados...inclusive por terem sido elogiados pelo empresário em outros trabalhos! A funcionária não entendia aquela rejeição do patrão!

_É só o que você tem? _ ele perguntou mal humorado.

A garota ficou boquiaberta, pois não entendia aquela postura do patrão, porque  nunca houvera dúvidas ou discordâncias quanto as escolhas que ela e a sua equipe faziam.

Ela pensou em lembrar que os modelos tinham fama internacional, mas desistiu temendo ser repreendida por alguma má interpretação.

_Bem, senhor Atalla...talvez se o senhor me dissesse o que exatamente está procurando, eu poderia fazer uma seleção mais ao seu agrado. _ a moça falou com um tom de voz completamente inseguro.

Ela tinha os seus motivos pra estar tão apreensiva, afinal, ele já havia discutido com dois funcionários no dia anterior, demitira um terceiro e havia cancelado duas reuniões importantes naquele dia!

Marcos queria saber o que responder para a garota que esperava submissa a sua frente...mas não sabia o que dizer. Estava disperso...não conseguia focar no que precisava fazer realmente. Os rapazes eram todos lindos...todos perfeitos para a campanha...mas ao mesmo tempo nenhum lhe servia e isso o deixava confuso.

Naquele dia, o empresário estava com baixo padrão vibratório...ou com a energia baixa, como muitos médiuns descreviam e foi por isso que mais uma vez, Valéria encontrou a oportunidade para  atacar!

Por um momento, o empresário simplesmente se sentiu perdido...sabia que a moça o encarava esperando uma resposta, mas essa não vinha e nem ele tomava a iniciativa de dispensá-la. Ficou ali diante dela com o olhar perdido, sem ação!

_Senhor Atalla, o senhor está bem? _ ela perguntou desconfiada.

Ele deveria responder o quê? Que precisava que ela trouxesse um homem que não lembrasse em nada Lúcio?

_Tem um cigarro? _ perguntou  sem perceber que aquele desejo não era exatamente o dele.

A mulher levou um susto, pois sabia que o patrão não fumava. 

_Sim...eu tenho sim. _ disse pegando um dos seus.

Marcos pediu que ela o acendesse pra ele e deu uma longa tragada soltando a fumaça em espirais perfeitos. 

Por que ele nunca havia colocado um cigarro na boca? Valéria gostava de fumar e, por causa de uma alergia do filho, era obrigada a fumar fora de casa ou em algum momento em que Neitan não estivesse. Depois, a empregada tinha que dar um jeito de limpar o ambiente antes que o garoto chegasse.

_Senhor Atalla, desculpe interromper, mas  o seu pai está subindo. _ avisou a secretária aflita.

Quase não deu tempo da moça terminar de falar e Júlio Atalla entrou com o seu rompante de dono do pedaço. 

Marcos dispensou a funcionária ainda aturdida por ver o patrão fumando.

O pai estranhou:

_Não sabia que você fumava.

Marcos não respondeu...também ele não sabia...mas estava gostando da sensação.

O pai dirigiu-se a um barzinho que ficava  num dos cantos da sala e ficou surpreso quando o filho pediu:

_Prepare um pra mim também. 

Júlio Atalla franziu as sobrancelhas, porém, por dentro, estava gostando daquilo. O filho sempre o criticava por beber, mas finalmente parecia estar acordando para o que o pai chamava de hábito de macho.

Marcos virou o copo de uma única vez, o que deixou o pai mais surpreso ainda.

Júlio Atalla sorriu, percebendo  que o filho finalmente adotava hábitos que ele apreciava em um homem.

_Dia difícil? _ o pai  perguntou sentando-se num sofá confortável.

Marcos sentiu o álcool parecendo preencher todos os espaços do seu corpo num relaxamento que há muito ele não sentia! 

Por que não havia pensado naquilo antes? Tomar um pouco de álcool talvez fosse a melhor forma de relaxar das tensões do dia a dia...aquelas eram as palavras da ex-esposa falecida, ele se lembrou e concordou!

Júlio Atalla assustou-se quando viu o filho repetir a dose e o alertou:

_Calma aí, porque sei que você tem uma reunião importante hoje. 

_Eu tinha duas reuniões hoje, mas não estou com saco para tolerar gente chata. Mandei cancelar as duas. _ falou com desprezo.

Júlio assustou:

_Cancelou duas reuniões hoje?

Marcos jogou os braços para cima e falou alto, em  tom impaciente:

_Que lhe importa? Cancelei duas hoje e se quiser cancelo mais duas amanhã...De qualquer forma, a Cosméticos Atalla deverá alcançar o topo ainda este ano.

O pai não escondeu a contrariedade:

_Não seja tão negligente, porque o mercado é sensível  demais para tolerar erros.  Da mesma forma que chegaremos ao topo, num piscar de olhos eles nos lançam ao fundo!

Marcos passou a mão pelo rosto...um mal-estar surgiu de repente...uma dor na nuca...uma náusea...Recentemente, um dos funcionários havia contraído uma virose e havia contaminado mais sete em sua seção. Será que ele também havia contraído a doença?

_Mandou o material para fazer o exame de DNA do Neitan? _ o pai perguntou mudando completamente de assunto, talvez exatamente para tentar entender a postura relapsa do filho.

Marcos não respondeu imediatamente...Ele ainda  estava resistente quanto a fazer aquele exame, pois sabia o quanto aquilo iria impactar em sua vida...na vida do Neitan...na vida dos pais...na memória que todos tinham de Darlen.

_Ainda não. _ disse virando mais um pouco de álcool após jogar dois analgésicos na boca.

 O pai franziu a testa:

_Não vá me dizer que está com medo de confirmar que aquela vadia  te fez de corno uma vida inteira!

Marcos sentiu o corpo todo se arrepiar, como se estivesse febril. 

Pediu que a secretária encontrasse o doutor Macedo pra ele,  ignorando a presença do pai ali.

_Percebi  que você  tem ficado com este médico a tiracolo ultimamente, Marcos. Está ficando hipocondríaco, não percebeu?

Marcos queria mandar o pai à merda! Ele queria dizer que era pra Júlio  ir cuidar da própria vida! O pai realmente era um chato, isso sim, ele queria gritar!

O que ele disse a seguir saiu antes mesmo de Marcos analisar o que falaria:

_Acho também  que o Neitan não é o meu filho. 

O pai olhou o filho com desdém:

_Isso é notícia de ontem. Me conte uma novidade.

Marcos sentiu necessidade de machucar o pai!

_Acredito  que o Neitan  seja  filho do Darlen.

Marcos sentiu o silêncio do pai como se fosse um murro em seu estômago.

Júlio Atalla deixou o filho no vácuo por alguns minutos, antes de se levantar e avançar sobre ele furioso:

_O que está dizendo? Está louco?

Marcos deu uma risadinha débil:

_Mas se não foi o senhor mesmo quem sugeriu que Valéria tinha me traído e que o Neitan não era  o meu filho...

Júlio Atalla colocou o dedo a centímetros do rosto do filho e falou ameaçador:

_Vai ter que usar um argumento muito bom pra justificar esta desconfiança, Marcos!

Marcos novamente sorriu sentindo a cabeça parecendo flutuar:

_O Darlen sempre quis o que era meu...sempre disputou comigo a atenção do senhor e da mamãe...ele queria o meu lugar na empresa...queria a minha mulher...agora parece que tem o meu filho...

_Está usando drogas? Foi isso o que você acabou de jogar na boca, Marcos?

Marcos riu novamente e pareceu não se intimidar quando o pai o agarrou pelo colarinho e sacudiu.

_ Aqueles dois se amavam como se fossem pai e filho e não vá me dizer que nunca percebeu isso! Só sei que o Darlen tinha um pau entre as pernas e a Valéria...

Talvez o pior tivesse acontecido, se a secretária não avisasse que o médico estava na linha.

Júlio Atalla olhou uma última vez para o filho e o soltou com verdadeiro asco.

_Voltaremos a conversar quando você estiver sóbrio.

Quando o médico chegou, Marcos já estava melhor, mas desabafou  que havia se descontrolado e jogara tudo aquilo na cara do pai.

O médico fez alguns exames...pressão, glicose, saturação...não havia nada de errado com o amigo, a não ser o cheiro de cigarro e álcool.

_Você estava fumando? _ o médico perguntou surpreso.

_Nem acabei o cigarro... _ Marcos respondeu ainda confuso. _Acho que dei umas duas ou três tragadas só.

_E também ingeriu álcool? 

_Só pra acompanhar o meu pai, nada de mais.

_Como assim nada de mais? Você não fuma...nunca bebeu em serviço  e ainda discutiu com o seu pai. 

Marcos deu de ombros:

_Senti vontade de fumar...depois de beber...meu pai estava me irritando com esta história de fazer o teste de  DNA do Neitan.

O médico tentou se agarrar naquela possibilidade, antes de pensar em algo mais grave:

_Ah...o teste de DNA do Neitan. Então é isso que está te tirando do sério? 

Marcos também tentou se agarrar naquilo:

_E você acha pouco, Macedo? E se for verdade? E se o Neitan não for o meu filho? E se ele for mesmo o filho do Darlen?

_Olha só...você está uma bagunça hoje e acho melhor ir pra casa, antes de fazer mais alguma besteira. _aconselhou o médico preocupado.

_Maior do que cancelar duas reuniões importantes?

_Maior do que jogar esta bomba em cima do seu pai e quase provocar um infarto no velho! Imagine se ele for contar isso pra sua mãe! 

Marcos sabia que o médico estava certo. Era algo grave demais para ter sido revelado assim sem comprovação alguma. O certo seria primeiro fazer o exame e só depois, se as suspeitas se confirmassem, ele decidir se iria ou não revelar aquilo para os pais.

_Confesso que só estou fazendo besteira desde que comecei a desconfiar de que o Darlen é o pai do Neitan. 

_Faça o exame amanhã. _ decretou o médico. _Acabe logo com isso!

Marcos assentiu submisso, já imaginando que a espera pelo resultado do exame lhe tiraria completamente o sono. 

_Arrume as suas coisas que eu mesmo vou te levar pra casa. 

_Mas ainda tenho alguns compromissos...

_Já ouviu falar em internet? _ ironizou o médico impaciente. _Agora vamos!

O empresário obedeceu a ordem médica, já sentindo um desejo enorme de fumar mais um cigarro e de  tomar alguma bebida bem forte. Não percebeu, obviamente,   que com um sorriso maldoso no rosto, Valéria ia junto com ele.


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