CAPÍTULO 29-INDECISÃO
Lúcio levou um susto, quando abriu os olhos e percebeu que Marcos tinha desaparecido!
O taxista enfiou-se rapidamente na calça e saiu trôpego do quarto, deparando-se em choque com as horas que pareciam zombar dele no relógio na parede da casa humilde.
_Mas já são quase oito horas? _ ele perguntou incrédulo vendo dona Rosa sentada no sofá lendo compenetrada "O Evangelho Segundo o Espiritismo". _Meu Deus, eu dormi demais!
A boa senhora sorriu para o filho da amiga:
_Bom dia pra você também, Lúcio.
Ele ficou envergonhado por perceber a grosseria que havia cometido com a dona da casa:
_Desculpe, dona Rosa...bom dia. A senhora viu o Marcos? Ele não está no quarto!
_Ele foi embora antes das cinco. _ela informou com a voz calma._ Eu estava dormindo quando escutei o som da porta da frente se abrindo e quando olhei pela janela, ainda o vi entrando no carro onde estava aquele tal motorista. Dá pra acreditar que o infeliz passou a noite toda de plantão aí em frente?
_Não duvido que o Emílio tenha feito exatamente isso, dona Rosa! Não deve ter fechado os olhos nem por um minuto, acredite, só vigiando a casa da senhora.
Lúcio estava desorientado ainda sem acreditar que não havia percebido a fuga de Marcos. Voltou ao quarto, terminou de se vestir, percebeu os sapatos do empresário esquecidos ali e os pegou.
_ Deve ter saído às pressas! Ele deixou até os sapatos pra trás!
_Realmente parecia estar com pressa pra ir embora.
Lúcio não conseguia se perdoar pelo vacilo:
_Meu Deus...como não percebi ele saindo?
_Você estava dormindo profundamente, foi isso, não se culpe. Devia estar cansado, Lúcio, apenas isso. Tem uma escova nova no armário do banheiro, toalha limpa numa prateleira que fica ao lado da porta. Quando terminar de tomar banho, venha tomar café comigo.
Lúcio queria recusar...queria simplesmente passar por aquela porta e sair correndo atrás de Marcos, mas viu a mesa posta para dois e percebeu que o mínimo que poderia fazer era acompanhar a gentil senhora em seu café da manhã.
Já debaixo do chuveiro, ele deixou que a água molhasse a cabeça enquanto estava com os olhos fechados repassando tudo o que havia acontecido na noite anterior.
Darlen o havia guiado até onde o empresário estava visivelmente atordoado, inclusive correndo o risco de ser atropelado se perdesse o equilíbrio.
O que teria acontecido com Marcos, caso ele não chegasse para resgatá-lo?
O que aconteceria se eles não tivessem encontrado dona Rosa para socorrê-los?
Será que Marcos se lembrava das palavras de Valéria e acreditava que Neitan era filho de Darlen?
Então seria assim, Lúcio pensou ainda aturdido...agora ele não veria apenas Darlen, como também a falecida Valéria. Talvez devesse agradecer por não ver mais nenhum outro desencarnado, ou talvez já tivesse visto outros, como aconteceu na infância, e ele nem estava se dando conta disso.
Lúcio olhou para as mãos, ainda sem acreditar que havia dado o seu primeiro passe espiritual. Será que ele havia perdurado até o momento em que Marcos acordou, ou será que ele havia fugido novamente sendo atormentado pelo espírito de Valéria?
_Mais do que fugir de você, ele estava fugindo dele mesmo, filho. _ disse dona Rosa assim que Lúcio sentou-se em frente a ela.
_Se ele ainda se lembra da ideia absurda que a falecida esposa meteu na cabeça dele, deve estar realmente desorientado. Não que ele e o filho tenham uma relação perfeita, claro, mas tenho certeza de que isso mexeu com ele. Especialmente porque aquela mulher acusou o irmão do Marcos de o ter traído.
Dona Rosa deu de ombros:
_Ele vai pedir o exame de DNA do garoto e logo saberá que o menino é filho dele mesmo.
Lúcio olhou pra dona da casa surpreso e cheio de esperanças:
_A senhora viu isso aí? Então o Darlen não está mentindo?
_Ele está? _ ela lhe devolveu a pergunta.
_Não...eu acredito que não. Confesso que confio mais na palavra dele do que na palavra daquela mulher.
_Então pronto. Você confia no seu amigo e sabiamente já reconheceu que a outra lá só está querendo fazer intriga. Mas claro, até que o resultado do exame saia, creio que o pobre homem vai ficar bem atormentado com a dúvida.
_Para felicidade de Valéria que quer mesmo é tirar a paz do Marcos!
_E ela vai ter sucesso, se ele continuar dando brecha pra ela. Seria bom que você o convencesse a ir lá no centro espírita para adquirir mais conhecimento. Inclusive sobre a mediunidade do filho dele.
_Marcos Atalla num centro espírita vai ser meio difícil, isso eu já percebi, dona Rosa.
_Quem não aprende pelo amor, aprende pela dor. Acho que ele irá optar pelo caminho mais difícil.
_Pobre Marcos...deve estar perdido, especialmente porque o pai, pelo que entendi, o atormenta demais.
_E a mãe? Ela não pode dar um apoio ao filho?
_Eu não sei...não a conheço, dona Rosa. Mas seria bom que alguém próximo do Marcos pudesse ajudar.
_Ele não parece o tipo de homem que vai aceitar ajuda de outra pessoa, daí você ter que insistir.
_Eu? O homem me odeia! Ele acha que eu sou uma ameaça na vida dele e na vida do filho dele. Se não se lembrar do que aconteceu ontem, provavelmente o motorista contará o que aconteceu...que eu o trouxe pra cá... Já cismado comigo, o Marcos vai pensar que eu o hipnotizei, na melhor das hipótese e o trouxe pra cá.
_Isso na melhor das hipóteses, porque sob a influência dessa tal Valéria, podemos esperar que o seu amigo vá enfrentar algumas batalhas bem difíceis, Lúcio.
_Ele não vai aceitar saber que o filho é médium...não vai acreditar que está sob a influência da ex-esposa...ou mesmo vai acreditar em mim quando eu insistir com ele que o irmão dele não o traiu.
_Espero que isso não o impeça de tentar, Lúcio. Mais do que isso, você terá que insistir numa solução.
_Acredite, dona Rosa...vai ser difícil ajudar o Marcos...
_Mas não será impossível. É um sacrifício que vale a pena fazer por alguém que se ama.
Lúcio ficou constrangido por perceber que ela já sabia de sua paixão por Marcos.
_Fale a verdade, dona Rosa... Foi a minha mãe quem contou pra senhora?
_Não...não foi a sua mãe. Sou uma mulher experiente, vivida...sei reconhecer quando vejo uma pessoa apaixonada. Meus guias só confirmaram o que eu já imaginava. Você gosta dele e ele é o seu primeiro amor.
_Eu já tive namoradas, dona Rosa... _ Lúcio soltou sem pensar.
_Eu estou falando de amor verdadeiro, Lúcio._ ela piscou cúmplice pra ele.
Lúcio se resignou em concordar:
_Um amor verdadeiro, porém impossível, dona Rosa.
Dona Rosa não disse mais nada por algum tempo, até que aconselhou:
_Não deixe de frequentar as reuniões lá no centro, Lúcio. Você precisará de muito auxílio espiritual para ajudar o Marcos e também o filho dele.
O filho de dona Maria Inês agradeceu à dona da casa, se despediu e saiu levando os sapatos de Marcos, já analisando como iria devolvê-los. Talvez os deixasse na portaria da Cosméticos Atalla, ou mesmo pagasse um motoboy para deixá-los na casa do empresário...ou usaria eles para ter uma desculpa para mais uma vez ir atrás de Marcos.
Darlen não demorou a aparecer no banco de trás do táxi de Lúcio:
_Obrigado por ter ajudado o meu irmão ontem, Lúcio.
_Teria sido bom se você tivesse me acordado um pouco mais cedo, não acha?
Darlen brincou:
_Acha mesmo que eu tenho cara de relógio?
_Já deve saber que o seu irmão fugiu no meio da madrugada.
_Isso não me surpreende nem um pouquinho, porque o meu irmão está muito confuso com tudo o que está acontecendo na vida dele. Você precisa ajudá-lo.
_Ouviu eu dizendo que ele fugiu de mim? Está na cara que ele não quer a minha ajuda e se eu tiver juízo, não vou insistir com ele, claro.
_Não acredito que vai deixá-lo enfrentar a Valéria sozinho e ainda por cima vai abandonar o Neitan à própria sorte. Os dois precisam de você! _ Darlen apelou aflito.
_Até outro dia eu nem tinha ideia de que era médium, Darlen. Agora você já quer que eu enfrente um espirito sem luz? Dá um tempo, cara!
_Você se saiu muito bem ontem dando aquele passe no meu irmão. Vi muito bem que você tem o dom, Lúcio!
_Sorte de principiante.
_Principiante só se for nesta encarnação, porque deu pra ver que você sabia exatamente o que estava fazendo. Você já é espírito velho, Lúcio.
_Isso é um elogio?
_Você sabe que é! Vai passar em casa, antes de começar a rodar?
_Sim. Preciso trocar de roupa.
O carro já se aproximava da casa do taxista e ele percebeu que um dos seus colegas estava parado em frente ao portão e que uma senhora acertava a corrida.
_Você tem visita, Lúcio. _Darlen falou sério.
Lúcio examinou a mulher que parecia indecisa em frente ao portão.
_Visita pra mim? Eu não sei quem é aquela senhora.
_Eu sei. É a minha mãe. _ Darlen falou emocionado.
_A sua mãe? _ Lúcio ficou em choque. _Mas o que ela está fazendo aqui na minha casa?
_Algo me diz que você vai poder contar com o apoio dela pra ajudar o Marcos e o Neitan, meu amigo. _Darlen sorriu satisfeito.
Cristina Atalla olhou para trás, quando percebeu a aproximação do táxi.
Lúcio fingiu que estava pegando algo dentro do carro, enquanto tentava controlar a ansiedade, afinal, aquela era a mãe de Darlen, mas também era a mãe de Marcos! Tinha certeza de que Marcos não sabia que a mãe dele estava ali!
A senhora bem vestida e que trazia os olhos tristes no rosto abatido olhou com ansiedade pra ele assim que o viu se aproximar.
_Bom dia. Você é o Lúcio? _ ela perguntou parecendo aflita, como se temesse que alguém pudesse vir atrás dela impedir aquele encontro.
_Bom dia. Sim, eu sou o Lúcio. Posso ajudá-la?
Ela estendeu a mão com ansiedade, enquanto parecia analisar cada linha do rosto do taxista:
_Eu sou Cristina Atalla. Eu vim aqui conversar com você sobre o meu filho Darlen.
Diante do silêncio do taxista, Cristina se adiantou:
_Pode ser como você quiser...na sua casa, ou mesmo dentro do seu táxi... Eu juro que não levará nem cinco minutos, Lúcio! Só preciso que você me responda algumas perguntas!
O taxista sabia que seria infantil demais entrar novamente no táxi e fugir da mãe de Marcos.
Lúcio ainda estava em choque, quando finalmente abriu o portão e a chamou para entrar, torcendo para não haver ninguém em casa.
Foi impossível não pensar na reação de Marcos quando soubesse que a mãe dele havia ido atrás do taxista que dizia ver e conversar com o filho falecido dela.
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