CAPÍTULO 10-NADA FAZ SENTIDO




Marcos Atalla havia se fechado no escritório e lá havia permanecido por longas horas.

Afinal de contas, o que estava acontecendo na vida dele?

Aquele homem desconhecido havia  entrado em sua vida da maneira mais inesperada  possível  e agora  já dominava todos os seus pensamentos, isso depois de lhe dar uma lição de moral na frente de todo mundo.

O empresário reconhecia que Lúcio parecia ter mais jeito com Neitan do que ele, que era o pai do garoto...Será que o taxista era casado e tinha filhos? Será realmente que ele gostava de crianças, ou tudo fazia parte de um plano pra ganhar a confiança de Neitan?

Nada fazia sentido...Primeiro a suspeita era de que Lúcio queria sequestrar o pai e depois veio a suspeita de que ele havia sequestrado o filho, mas, como da primeira vez, nenhuma das duas supostas  ameaças  havia sido concretizada...era  como se o taxista  simplesmente tivesse desistido de levar os seus planos adiante!

Lúcio havia tido a oportunidade de sequestrar o empresário, mesmo sem portar uma arma...e também poderia ter desaparecido com Neitan, mas não...ele o levou pra casa e usou a mesma farsa ao dizer que Darlen estava dentro do carro! 

Todo mundo havia ficado sabendo da morte horrível de Darlen, acreditou  Marcos...claro que também o taxista, especialmente se tivesse estudado o perfil de suas vítimas! Por que então insistir naquilo? Por que mentir dizendo pela segunda vez que o falecido estava dentro do carro? Por falta de criatividade? Não fazia sentido, pois Lúcio parecia ser um homem inteligente! Por que não mudar o seu modo de agir então?

Estaria o taxista tentando confundi-lo para dar um golpe maior? Será que ele achava que depois de dois alarmes falsos de sequestro, ele poderia ter mais chance de finalmente levar o seu plano até o fim sem chamar a atenção e levantar suspeitas sobre ele? 

Marcos acreditava que tinha um sexto sentido para fechar bons negócios, mas em relação às pessoas já não tinha tanta certeza de nada! Lúcio era realmente uma grande incógnita para o pai de Neitan!

Alguém bateu na porta interrompendo os pensamentos de Marcos. 

_Perdão, senhor Atalla, sei que não quer ser incomodado..._disse a empregada timidamente.

_E espero que tenha uma boa justificativa para tê-lo feito. _ ele falou mal humorado. 

_É a sua esposa ao telefone. Disse que está tentando falar com o senhor e que é urgente!

Marcos agradeceu e pegou o celular. Realmente Valéria já tinha tentado ligar pra ele diversas vezes, mas ele havia desligado o telefone.

O empresário não teve a oportunidade de dizer nada, pois assim que a esposa atendeu, já veio com tudo pra cima dele:

_Mas que merda você está fazendo com a cabeça do nosso filho, Marcos? O Neitan me ligou completamente alterado, à beira de um ataque de nervos!  Ele está totalmente descompensado dizendo que descobriu que o tio não está morto...que o tio foi buscá-lo na escola...tomaram sorvete juntos...que você tentou bater no amigo do tio dele...Que loucura toda é esta? Isso é um plano seu pra me obrigar a voltar para o Brasil, é isso?

Marcos sentiu que precisava  ouvir outra pessoa dizendo tudo aquilo para acreditar que  realmente tinha acontecido.

_Marcos, você está me ouvindo?_ Valéria berrou do outro lado. 

_Sim, Valéria...eu estou te ouvindo sim...

_Então fale logo o que você está pretendendo com esta história toda! Quer enlouquecer o Neitan ou quer me enlouquecer?

O que ele deveria falar com a ex-esposa? Que o filho estava louco? Que assim como havia tentado fazer com ele, um taxista que se chamava  Lúcio estava mexendo  com a cabeça de Neitan  tentando convencê-lo de que o tio estava vivo?

O que a esposa pensaria do ex-marido se soubesse que assim como da primeira vez, também da segunda Marcos não havia deixado Lúcio, um suposto golpista,  ser preso?

_Se quer se vingar de mim por alguma coisa, Marcos, não venha usar o meu filho pra isso!

Que tipo de monstro ela achava que ele era pra fazer algo assim? Santo Marcos reconhecia  que não era, porque que tipo de pai deixaria livre um homem que fez o que fez com um garoto de sete anos? 

_Está me escutando bem, Marcos? Eu meto um processo em você se descobrir que você está tentando mexer com a cabeça do meu filho pra me atingir! Isso se eu não for na mídia e  fizer um escândalo tão grande que você vai perder todos os seus clientes e irá à falência, eu lhe garanto!

A mãe de Valéria  tomou o telefone da filha e foi dura com ele:

_Escute aqui, seu irresponsável, a minha filha não está aqui a passeio! Ela será operada nos próximos dias e você não pode tomar conta do Neitan neste período? Está enchendo a cabeça do menino de absurdos dizendo que o tio dele está vivo...

Marcos a interrompeu nervoso:

_Eu não disse a ele que o Darlen está vivo!

_E não venha gritar comigo que eu não sou um de seus empregados, Marcos! O Neitan pode ser tudo, menos mentiroso! Se ele disse que você falou que o tio dele não morreu, é porque você falou!_ protestou a ex-sogra.

_Pode ter certeza, mamãe...este desgraçado está aprontando alguma pra não precisar pagar pensão para o filho, porque Marcos só pensa em dinheiro! _ berrou Valéria ao fundo. 

Marcos sabia que não era o momento de falar do taxista, pois certamente elas o acusariam de negligenciar a segurança do filho deixando ele ter contato com aquele tipo de pessoa.

O empresário deixou que a ex-sogra gritasse mais um pouco, fizesse ameaças contra ele e quando ela finalmente desligou sem se despedir, ele manteve o aparelho no ar ainda por um momento como se esperasse que ela dissesse mais alguma coisa.

Marcos pediu que a empregada chamasse o filho dele.

_Desculpe, senhor, mas eu não sei se isso será possível, pois o Neitan se recusou a abrir a porta para mim quando eu tentei entrar.

Marcos decidiu ele mesmo tentar falar com Neitan e realmente a porta estava trancada.

_Neitan, abra esta porta agora que eu quero conversar com você!

Alguns minutos de silêncio, até que finalmente o garoto destrancou a porta para que o pai entrasse.

Na cama enorme, o garoto de sete anos parecia menor ainda e Marcos de repente se sentiu quase hostil ali naquela posição de autoridade.

_Por que você mentiu mais cedo dizendo que o seu tio estava dentro daquele táxi?

O garoto ergueu o rostinho e encarou o pai com franqueza:

_Eu não menti, papai! O tio Darlen foi me buscar na escola junto com o Lúcio sim!

Marcos tentou se controlar:

_Mentiu sim e está mentindo novamente. Fale a verdade e me conte por que você entrou no táxi daquele desconhecido depois de ter inventando lá na escola que ele era o seu tio!

Neitan foi ficando aflito, temendo não conseguir convencer o pai de que falava a verdade:

_Mas eu não inventei! O tio Darlen foi me buscar na escola, sim! Pergunte para o Lúcio e também pergunte para a Cácia que viu o meu tio dentro do táxi do Lúcio!

Marcos respirou fundo, avaliando se o  taxista teria algum poder de criar ilusões na cabeça de uma criança, pois realmente parecia que Neitan falava a verdade. Imaginar que Lúcio havia conseguido um sósia de Darlen apenas para enganar o garoto já era demais e ele descartou a ideia. Nem perderia tempo em tentar falar com a tal Cácia pra confirmar aquilo.

O pai da criança tentou se controlar, torcendo para que o menino desistisse daquilo logo e dissesse qual o real motivo dele ter aceitado a carona de Lúcio. Será que eles já se conheciam, por isso Neitan ter confiado em Lúcio? Será que o taxista havia oferecido algum presente para o garoto?

_Eu e a sua mãe já lhe dissemos que você não deve falar com estranhos, especialmente entrar no carro de um estranho! Por que você entrou naquele táxi? Responda logo, Neitan! 

_Mas o tio Darlen não é um estranho, papai! Nem o Lúcio é estranho, agora que eu sei que ele é amigo do meu tio! _ insistiu o pequeno. _Lúcio agora é o meu amigo!

A última afirmativa deixou Marcos apreensivo, pois indicava que agora sim Lúcio teria o controle do seu filho, já que o tinha conquistado daquele jeito!

_Pare com isso! _Marcos apelou. _Você já é grande o suficiente para entender que se o seu tio morreu, ele nunca mais vai voltar!

Neitan foi ficando mais aflito:

_Mas ele não morreu, papai! Ele estava lá no carro do Lúcio...eu juro que estava!

Marcos tentou de outra forma, imaginando que talvez o seu filho ainda estivesse em choque e não estivesse conseguindo se lembrar do que realmente havia acontecido naquele táxi:

_Aquele homem...o Lúcio...ele te tocou ou tentou fazer alguma coisa com você?

O pequeno negou com a cabeça, mesmo sem entender por que o pai perguntava aquilo.

_Me conte como foi toda a conversa entre você e o Lúcio. _Marcos decidiu procurar mais pistas.

_Eu e o Lúcio quase não conversamos, porque eu estava com saudades do tio Darlen e conversei com ele o tempo todo. _os olhos do pequeno brilhavam de contentamento. _E aí a gente foi tomar sorvete...

Marcos fez a pergunta seguinte rapidamente, tentando fazer o seu filho entrar em contradição:

_Quem foi tomar sorvete? Você e o Lúcio?

_Não, papai...o Lúcio ficou no táxi dele e eu e o meu tio Darlen fomos comprar sorvete...

_Ah...então o taxista parou com você numa sorveteria e mandou você entrar sozinho pra comprar sorvete?

_Não, papai...eu já disse...entrei com o tio Darlen. Aí ele me perguntou se eu tinha dinheiro, porque ele tinha esquecido a carteira...e o meu tio Darlen deixou que eu pedisse o sorvete e também pagasse... _ o garotinho parecia orgulhoso de si mesmo.

_Ah...ele disse que  tinha esquecido a carteira e te pediu dinheiro... 

_Mas o meu tio não quis sorvete e eu comprei um pra mim e outro para o Lúcio.

Marcos ficou olhando para o filho, tentando desvendar aquele mistério, mas o rosto infantil e puro realmente parecia acreditar nas próprias palavras.

Outras probabilidades foram surgindo na mente do empresário, inclusive acreditar que Lúcio tinha sim hipnotizado Neitan.

No momento seguinte, Marcos quis eliminar outra hipótese:

_Foi a sua mãe quem mandou você inventar estas coisas?

_Mas eu não estou inventando, papai...eu juro! Pergunte ao Lúcio...ele também conversou com o tio Darlen! Pergunte ao moço da sorveteria...ele viu o meu tio Darlen junto comigo!

O empresário perdeu a paciência e  levantou-se num impulso, completamente fora de si:

_Você não vai sair deste quarto a não ser pra ir pra escola, ouviu bem? Vai ficar preso aqui até falar a verdade!

Neitan se desesperou:

_Mas eu estou falando a verdade, papai!

_Silêncio! _ele ordenou com autoridade suficiente para chocar o filho que num ato reflexo tampou a boquinha com ambas as mãos.

Marcos se sentiu mal por ser ele o autor de tamanha violência contra o filho, mas não podia admitir que Neitan continuasse mentindo daquele jeito! Era fundamental que o pequeno esclarecesse os fatos para que o pai resolvesse logo que medidas deveria tomar contra Lúcio!

A ideia de um sósia de Darlen voltou a atormentar o empresário. Ele conseguiu falar com Cácia e ela  afirmou que Lúcio estava sozinho dentro do táxi e que tinha sido ele a chamar Neitan se fazendo passar por tio do menino.

Novamente, lá estava a pergunta: por que Darlen havia participado daquela farsa? Tinha sido anteriormente ameaçado pelo taxista? 

Marcos procurou mais informações sobre Lúcio. Viu que ele tinha a ficha limpa...que ele era solteiro, não tinha filhos...viu o endereço do trabalho dele, assim como o endereço da casa onde ele morava.

O empresário podia, num único telefonema, conseguir que a polícia fosse atrás daquele homem, o levasse preso e o obrigasse a confessar os seus planos! Mas Marcos sentia que não conseguia ter iniciativa para tomar aquela atitude...e aquilo era mais estranho ainda...ele não conseguia pensar em prejudicar daquele jeito o taxista!

_Meu Deus, eu vou enlouquecer! _ gemeu segurando a cabeça entre as mãos. _Maldita a hora em que este homem entrou na minha vida!

O empresário ficou olhando para a foto de Lúcio tentando ler algo naquele rosto e talvez por não obter resposta, custou a dormir. 

Quando caiu num sono agitado, Marcos sonhou com Lúcio que olhava para ele sorrindo cinicamente, enquanto ia embora levando consigo o pequeno Neitan.


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