33. REUNIÃO FAMILIAR
"Tem certeza de que eles não vão nos pegar de surpresa antes da hora, doutora?".
É sexta-feira e estou acompanhando Miranda para mais uma consulta de pré-natal após ter saído do estágio. Com a chegada dos sete meses, achamos por bem aumentar a frequência do acompanhamento de duas para uma semana por precaução. Mas, sendo sincero, se dependesse da minha ansiedade com o último estágio da gravidez, Miranda e eu moraríamos aqui no hospital até o nascimento.
Acho que Sabrina Laurent tem um pouco de noção disso ao olhar para mim.
"Certeza mesmo eu não tenho, mas as chances de a gravidez seguir o tempo correto são boas, então não se preocupe muito com as chances contrárias, senhor Maximoff. Nesse momento, é essencial para a senhorita Miller que ela não se atordoe. Do contrário, essas últimas semanas podem não sair como prevemos", a médica nos lança um olhar sério, a fim de deixar clara a importância da recomendação.
"Estou conseguindo evitar situações de estresse e mantendo a rotina alimentar e de exercícios, embora as minhas costas não sejam mais a mesma coisa de antes", Miranda fala. "Principalmente agora que eles resolveram começar a se mexer...".
"É nesse estágio que eles começam a fazer bagunça mesmo. Estão buscando um jeitinho de se encaixar e logo encontrarão a posição de ponta cabeça indicada para o nascimento".
Sabrina nos dá mais algumas recomendações e, apesar de garantir a saúde de Mimi e dos bebês, pede que tenhamos atenção a qualquer sinal fora do comum que possa indicar que houve alguma mudança abrupta.
"Principalmente acerca da sua pressão arterial, senhorita Miller", a médica fala. "Como queixou-se de algumas quedas durante os meses iniciais, temos que estar bastante atentos a possíveis alterações".
"Sim, senhora".
"Até semana que vem, então".
"Até semana que vem, doutora".
Aperto a mão da médica e depois acompanho Miranda para fora do consultório, onde somos cercados por um pequeno séquito de guardas. Apesar do hospital King ser considerado seguro, com a exposição de Miranda após o anúncio público de casamento entre nós, passei a me preocupar ainda mais com o possível assédio que ela possa sofrer e a estressar nas últimas semanas da gravidez.
"Espero mesmo que eles se comportem até o final", Mimi fala quando entramos todos no elevador, acariciando a barriga expressiva em seu vestido delicado de seda verde. "Embora esteja ansiosa para conhecê-los e me livrar da dor nas costas, a ideia de um parto de urgência me assusta".
"Não vai acontecer", garanto, mas só por saber que é o que ela precisa ouvir no momento. Em se tratando de fatos, eu não tenho a menor ideia do que esperar.
"Espero que não", Miranda responde, depois ergue o olhar de sua barriga para mim quando o elevador chega ao estacionamento. "De qualquer forma, temos algo mais imediato com o que se preocupar agora".
Ela está se referindo ao fato de que, após a consulta, vamos direto para a casa de chá da minha avó Nana, onde marcamos o jantar de noivado. Miranda ainda está pensando no último jantar em que tivemos lá, o de aniversário da minha mãe, em que anunciamos a gravidez e ela se negou a casar comigo. Além de estar nervosa sobre reunir sua família com a minha e o reencontro com os meus temíveis avós, é claro.
"A gente vai se sair bem".
"Eu não tenho tanta certeza...".
Por falta de argumento contrário, porque também não faço ideia do que esperar desse jantar além da formalização do nosso noivado perante os nossos familiares, a conduzo até meu carro e abro a porta para ela entrar. Depois, dou a volta e ocupo o lugar do motorista.
"Contanto que seu pai não tente magoá-la e apareça e que meus avós não abram a boca, vai dar tudo certo", digo.
"Acho que você está sendo otimista demais", Miranda responde. "Vai ser uma surpresa se meu pai for e se seus avós não falarem nada para me menosprezar".
XxX
Fico tenso conforme nos aproximamos da casa de chá, mas tento não demonstrar muito por saber que Miranda, com certeza, está mais tensa do que eu. Isso se torna perceptível quando eu seguro a sua mão após sairmos do carro, que noto estar gelada.
"Bem, o carro deles está aqui", ela indica um veículo branco, modelo de alguns anos atrás, no estacionamento.
"Já devem estar todos nos esperando".
Também reconheço os carros de meus avós, da minha mãe e dos meus irmãos no estacionamento.
"Nesse caso, é melhor não nos atrasarmos mais".
Saímos do estacionamento, passamos pela ponte sobre o lago de peixes dourados e entramos na construção ao estilo tradicional da China imperialista.
Dentro, no salão já conhecido, encontramos todos juntos, mas em grupos dispersos. Meus avós Feng conversam com Cassie, os Maximoff estão com Cepheus e minha mãe tenta estabelecer um assunto com a mãe de Miranda e, surpreendentemente, com seu pai.
Contra tudo o que Mimi esperava, o senhor Miller veio.
Minha noiva parece surpresa o suficiente com isso para se emocionar. Muito embora não ache que Mark mereça qualquer sentimento minimamente bom vindo da filha que fez tanto sofrer, sei que Miranda não acha o mesmo. Apesar de tudo, ela o ama.
"Quem você quer cumprimentar primeiro?" Acabo perguntando, tirando-a de seu torpor.
Mas não é necessário tomar uma decisão. Mamãe nota nossa presença e abre um sorriso para nós.
"Ah, meus queridos, que bom que chegaram!" Ela se afasta dos pais de Mimi para nos cumprimentar com abraços e beijos, sorrindo ao notar o tamanho da barriga de Miranda. "Que linda, querida. Os meus netinhos estão tão grandes!".
"Não veem a hora de ganhar o mundo", sorrio, contente por vê-la feliz.
"E eu não vejo a hora de ajudá-los a conhecer esse mundo", mamãe fala, voltando-se para trás por um momento e olhando para a mãe de Mimi. "Não é, Juliana?".
"Sim, Katherine".
Miranda fica surpresa pelo modo como a mãe dela responde a minha de maneira informal, mas não diz nada a respeito. Juliana se aproxima e também lhe dá um beijo e um abraço, mas se retém ao chegar em mim, demonstrando ainda não estar totalmente à vontade comigo para cumprimentos mais afetivos.
"Olá, Caellum", ela fala, tímida.
"Olá, senhora Miller".
Juliana é um pouco mais velha do que a minha mãe, mas preserva certa juventude e é tão bonita quanto Miranda, com quem se parece muito.
"Como a senhora conseguiu convencer o papai a vir?" Mimi não consegue guardar a pergunta que lhe ronda a mente por mais tempo.
Juliana dá de ombros.
"Acho que já passou da hora de ele parar de fazer birra e seu pai sabe disso, apesar de envergonhá-lo admitir".
Miranda assente, mesmo que ainda esteja um pouco descrente com o poder de persuasão da mãe.
"A Julie não veio?" Ela acaba perguntando, provavelmente a fim de mudar de assunto.
"Sua irmã está com a Mia, querida. Ela parecia um pouco entediada no meio de tantos adultos, então Mia a levou para passear no jardim", mamãe responde, ao que Miranda assente.
"Então acho que temos que cumprimentar os outros, não é?".
Ela está novamente tensa e mamãe deve notar seu desconforto, pois sorri de modo afetado.
"Não se preocupe, Miranda. Ninguém aqui lhe tratará de modo desrespeitoso".
Minha noiva não parece muito convencida, mas assente.
"Vamos começar pelos Feng", digo a ela, ainda segurando a sua mão. Depois me volto para as nossas mães e forço um sorriso. "Com licença".
Conduzo Mimi até o grupo formado por Cassie, Nana e vovô Hue. Eles parecem estar conversando com Cassiopeia sobre os seus planos futuros (ou a falta deles), o que faz minha irmã demonstrar certo alívio quando nos vê.
"Cal!" Ela exclama. "Que bom que vocês chegaram. Foi tudo bem na consulta?".
"Boa noite", Miranda e eu falamos em uníssono. "Foi tudo bem sim", acrescento.
"Boa noite, querido", Nana beija o meu rosto do modo carinhoso de sempre antes de se voltar para Mimi, a quem dirige um sorriso calculado. "Olá, Miranda".
"Olá, senhora Feng", a mão da minha noiva volta a ficar gelada, mas ela soa firme ao cumprimentá-la.
"Parece que não falta muito para meus bisnetos nascerem, não é?" Vovó se esforça para puxar assunto em clima de paz.
"Cerca de dois meses, senhora".
Nana assente, de repente pensativa.
"Eu soube que vocês dois escolheram homenagear o meu Jun ao escolherem o nome de um deles", como quase sempre ocorre quando o assunto é meu pai, vovó se emociona. "Meu Jun... Ele com certeza amaria poder acompanhar o Caellum se tornar pai, mesmo que não tenha sido da forma como gostaríamos".
Resolvo ignorar a sua pequena crítica pelo bem da conversa.
"Tenho certeza de que ele está acompanhando tudo aonde quer que esteja, vovó"
"É o que dizem..." Esse discurso não a convence muito. Acho que, para uma mãe em luto, nada que se diga sobre a sua perda é confortante o bastante, mesmo com a passagem do tempo.
"Chega de falar sobre Jun", vovô Hue, sempre menos sensível a tudo, diz. "Então vocês dois resolveram que vão se casar".
"Era o que vocês queriam, não era?".
"É um modo de começar a consertar o problema que você causou", ele rebate,
"Vovô...", Cassie o censura.
E é impressionante o quanto ela é a única pessoa viva capaz de conter a fera chamada Hue Feng. Mesmo carrancudo, ele cede e, ao falar novamente, soa menos hostil:
"Só quero dizer que estão fazendo a coisa certa. Embora não tenham tido grandes consequências com o povo, os apoiadores dos Maximoff não ficaram muito contentes com a gravidez não planejada e o casamento deve ajudar a assegurar que continuem apoiando o governo de sua mãe".
"Sim, com certeza", apesar de este estar longe de ser o motivo que levou Miranda a me pedir em casamento, concordar é sempre a melhor opção em se tratando de Hue. Assim como dos Maximoff. E falando neles... "Agora, se nos dão licença, temos que falar com o vovô Patrick e a vovó Nancy. Com licença".
Afasto-me deles com Miranda, a qual suspira de alívio.
"A sua avó não foi tão ruim, mas o seu avô...".
Entendo o que ela quer dizer, mas não tenho tempo de respondê-la antes de chegarmos ao último - e mais difícil - grupo reunido para o jantar.
"Boa noite", Mimi e eu voltamos a falar em uníssono.
Meus avós e Cepheus interrompem o assunto sobre a faculdade do meu irmão e, ao passo em que meu caçula sorri, Patrick e Nancy estampam expressões azedas.
"Vocês vieram, afinal", percebe vovó. "Só tiveram a ideia indelicada de nos convidar para o jantar e serem os últimos a chegar".
"Tínhamos uma consulta pré-natal para ir, vovó", pego-me me explicando. "Meus horários estão um pouco apertados com o estágio e alguns compromissos acabam se sobrepondo".
"E eu achando que você finalmente criaria o juízo e a ambição de um duque...".
"Não sei o que uma coisa tem a ver com a outra, mas, de qualquer forma, não serei duque, vovó. A Cassie será. Ela é perfeita. Sem gravidez não planejada e com muito juízo e ambição".
Nancy bufa.
"Inacreditável que ainda faça piada sobre tudo".
"É apenas humor, vovó. Vou ser pai em breve, casarei com a mulher dos meus sonhos... Estou feliz e quero que todos ao meu redor também estejam".
"Podemos aceitar que esteja remediando as consequências dos seus atos, Caellum, mas querer que a gente fique feliz com isso? Francamente", Nancy rebate, voltando-se para Miranda com ar de superior. "Sonhei com algo muito melhor para você".
"Pergunto-me com o quê, já que não consigo pensar em nada melhor para mim do que já está acontecendo comigo", estampo um sorriso e envolvo Miranda pela cintura, a qual está tensa.
"Aceitamos a situação, Caellum, mas não faça piadas com a nossa paciência", vovô Patrick me repreende.
"Não estou fazendo piada, apenas demonstrando a felicidade que sinto, o que deveria ser suficiente para fazê-los agir como meus avós e não como ditadores da moral e dos bons costumes", respondo, agora sem sorrir. "Afinal, vou me casar com a mãe dos meus filhos. Não é como se estivesse indo me drogar ou ter uma filha fora do casamento com a atriz da geração para estarem me reprimindo tanto...".
Vovô Patrick trinca o maxilar diante da minha fala e vovó Nancy estampa uma cara mortificada que combina com a expressão surpresa de Cepheus e Miranda. Todos aqui sabem o que eu quis dizer com isso.
O assunto proibido dos Maximoff: o passado obscuro do vovô Patrick.
"Que tal começarmos a ocupar os lugares à mesa?" Mamãe surge de repente, como se tivesse captado o clima ruim de onde estava. Ela tenta sorrir diante da tensão de todos.
"Acho uma boa ideia", respondo.
XxX
O jantar transcorre de forma a me fazer pensar que posso ter uma indigestão de tão hostil que é o clima, mesmo com as tentativas da minha mãe de entrosar os Miller com os Feng e os Maximoff.
Absolutamente ninguém se sente confortável, nem mesmo a pequena Julie. Acho que nunca a vi tão quieta quanto agora, fingindo concentração na tarefa de se alimentar.
Como se não bastasse Patrick, Nancy e Hue com tentativas de desprezar os pais de Miranda ao fazerem perguntas invasivas sobre suas vidas e, principalmente, seus ganhos, ainda há a guerra fria entre minha mãe e Cassie. Sem falar, é claro, que o pai de Mimi achou por bem falar que não apoia a realeza numa mesa com um ex-duque e uma duquesa e, muito embora a minha mãe tenha o escutado sem julgamentos, não posso falar o mesmo de vovô Patrick.
É simplesmente o caos.
Por isso, assim que a sobremesa é servida, aproveito para ficar de pé e trazer à tona a verdadeira razão da reunião, apesar do clima de enterro.
"Bem, acredito que todos já saibam o que vou fazer agora, então os pouparei de um grande discurso, porque, sinceramente, esse casamento é muito mais por mim, por Miranda e pelos bebês do que por vocês, que mal conseguem se comportar durante um jantar que deveria significar um momento inesquecível e bom para nós", noto que ao menos nossas mães, Mia e meus irmãos tem a decência de parecerem culpados pela situação, mas não me detenho muito neles. Volto-me para Mimi, que ainda está sentada e me olha com uma carinha de preocupação. Tento sorrir. "Você me pediu em casamento e eu disse sim. Vai dizer sim para mim dessa vez também?".
Há apenas nós dois em nossa bolha particular agora. Sem Maximoff, Feng ou Miller. Apenas Miranda e Caellum, como na noite do meu aniversário.
"Não", ela diz, ousando sorrir quando arqueio minhas sobrancelhas em confusão.
"Não?".
Miranda fica de pé.
"Direi sim dessa vez e em mais uma outra no futuro", ela fala. "É claro que quero me casar com você, Caellum".
Apesar das antigas alianças de noivado dos meus pais terem servido ao seu propósito, providenciei as nossas próprias alianças, as quais retiro do bolso do blazer que uso para selar a união.
Estas são menos elaboradas do que a relíquia Feng, mas nossas, e Mimi deve pensar isso quando pego a sua mão e coloco o anel que, dessa vez, cabe perfeitamente.
Assim que ela coloca a minha aliança, beijo-lhe apenas o rosto por causa da plateia e, depois me volto para as pessoas ao redor da mesa.
"Partindo do princípio de que agora seremos uma família só, que tal começarem a pensar em um modo melhor de conviverem?" Questiono. "Miranda e eu já estamos fartos de entender que não estão satisfeitos conosco, mas é assim que as coisas são e quero que os nossos filhos jamais tenham que lidar com um jantar como esse. Se não colaborarem, teremos um problema".
"Caellum...", mamãe me repreende.
"É só um aviso", dou de ombros. "Agora que o noivado está oficialmente selado na ilustre presença de vocês, vamos aproveitar a sobremesa".
Não sei vocês, mas eu simplesmente morro que o Caellum, esse ser fofo e apaixonado, é a língua de chicote dos irmãos Maximoff. Falou na cara do avô que ele não tem moral alguma kkkkkkkkkkk amo.
Sobre isso: nos capítulos 38 e 39 (QUE SÃO OS CAPÍTULOS MAIS TENSOS DO LIVRO TODO E ESCREVO EM CAIXA ALTA PORQUE ISSO ME DEIXA ANSIOSA AAAAA), ele vai estar ainda mais língua de chicote (e seria engraçado se não fosse tenso).
Sobre o passado "obscuro" do Patrick: falei um pouco na parte dedicada aos Maximoff no Guia da Realeza Oriana (aos interessados que ainda não leram) e talvez, SÓ TALVEZ, eu esteja preparando um conto sobre ele e a Felicity. Porém, DE CERTEZA, só conhecerão a Felicity Jones (e a filha bastarda do antigo duque) em um outra série, com outros personagens e outros casos de família :)
No mais, até semana que vem, com a segunda parte dessa torta de climão <3
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