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- Em primeiro lugar, desculpe a reação.

O Edu colocou as mãos na frente, em um gesto de defesa e perdão, e deu de ombros, e nós rimos.

- Não, acho que eu que tenho que me desculpar. Falei rápido demais! Foi..

- Um tiro. Hehehe...

- Isso!

- Mas... precisava falar, né, meu broder?

Ele mostrou a palma da mão e eu bati nela, ele segurou, apertando-a. Quando eu despejei a novidade em cima do Edu, ele ficou tão aéreo que quase foi atropelado por uma camionete que passava justo na hora, eu o puxei de volta para o passeio, enquanto o veículo desviava, buzinando e xingando impropérios. Depois ele ficava olhando pra mim e pro Jimmy, com a mão na boca, e ria, depois perguntava se era sério, e depois ria novamente. Fomos seguindo o caminho de volta ao apê um pouco mais afastado dos meninos, e eu fui contando mais algumas coisas que o Jimmy tinha falado comigo (não o que tinha feito), sem dar muito tempo pra ele absorver. Ele oscilava entre os gestos e palavras de apoio, e expressões consternadas, confuso e surpreso. Nos despedimos do Didi e do Orêa e subimos. Aproveitamos que o Jimmy tava no banho e continuamos a conversa.

- Sim, precisava, Edu. Eu tava e tô abafado.

- Por algum motivo especial?

- Por vários – suspirei e me recostei no colchão, abraçando uma almofada – por vários. O maior deles é que, bom... ele é um menino, né, véi...

- Hum... E você também é um menino...

- Lembra que eu te falei aquela vez, que o Murilo até tava com a gente... é uma coisa nova pra mim. E, eu sei que a especulação sempre houve lá na cidade, mas eu nun...

- Olha, da minha parte, te falei que isso é irrelevante, cara...

- Mas eu nunca tinha tido nada com nenhum cara, sabe? – o Incidente ainda não contava pra mim, e não tinha coragem de contar a ninguém.

- E isso é importante pra você até que ponto?

- Não sei te dizer. Nunca parei pra pensar sobre isso, sabe? Digo assim, pensar a fundo. Quando o pessoal começou a zoar, e falar aquelas coisas sobre mim, creditei na conta do preconceito, do meu jeito... excêntrico, como diz o Murilo, e não refleti sobre até que ponto aquilo...

- Você me disse que tava curtindo também. Acho que é nisso que você tem que se concentrar, cara. O que você tá sentindo, querendo.

- Sim...

- Deixar um pouco os rótulos de lado. Bom... é a primeira vez que isso acontece?

- Não te falei que eu nunca...

- Não digo da experiência, não – o Edu parou para articular – tô falando assim: tipo: pera: xô tentar...

- kkkkkk!

- Hahaha, é difícil falar essas parada, porra! Pera! Tá. Você tipo, nunca sentiu, mesmo sem ter tido nada concreto, nunca sentiu nada por alguém, do mesmo sexo...

- Um sentimento...

- Diferente de amizade. Sei lá, alguma... pô.

- Diferente... de amizade...

- Sei lá uma amizade mais forte, um afeto. Digo isso porque você sempre falou que nunca sentiu tesão por homem nenhum, mas... acho que não se trata só disso, né não?

- Hum...

- Trata-se também de afeto. Ninguém... tipo... antes dele..?

- Eu... acho que não...

- Tem certeza?

Um nome pairava naquela sala, entre o barulho da rua e do chuveiro aberto do Jimmy.

Eu não queria tocar naquele assunto, ainda não tinha assimilado direito nada daquela história que tinha ocorrido em Camaçari. Depois nós todos éramos muito próximos, não queria envolver o Edu naquela confusão... e também, foi tudo tão abstrato, só no plano das ideias. A história de amor mais forte que nunca aconteceu.

- Bom... quer dizer... acho que posso ter me confundido antes.

- Sei...

- Mas nada que chegasse assim, às vias de fato, como agora, entende?

- Bom, mas, então... como te falei: se concentra agora em curtir o que você tá vivendo, e deixa pra pensar depois. Claro, se isso não for fuder a sua cabeça.

- Tô tentando abstrair. É que também tá tudo meio rápido, talvez...

- Bom, cara, o que eu posso te dizer é, que... pô, sei lá. O cara é gente boa, o Jimmy... tem uma natureza boa, sabe? Se vocês derem certo, acho que, quer dizer, se você se permitir... acho que vai ser uma boa.

Eu nunca vi o Edu tão hesitante, escolhendo as palavras com tanto cuidado. Percebi que ele estava na verdade se esforçando em me dar apoio, me tranquilizar, cuidando para tratar o assunto da maneira mais normal possível, mas eu podia ver que ele também estava um pouco desnorteado com a novidade. De qualquer forma, desabafar me permitiu tirar um peso enorme das costas.

O Jimmy saiu do banho e se juntou a nós. Sentou ao meu lado no colchão, e nos olhamos. O Edu nos observava, e riu. O Jimmy franziu a testa, sem entender, e eu comecei a rir também.

- Eu contei a ele, Jimmy.

O Jimmy instintivamente olhou pro Edu, esperando reação. O Edu respondeu:

- Eu quero ser a madrinha.



No domingo, deixei os meninos na rodoviária de Salvador e fui pra Feira. Eu estava mais leve depois de ter conversado com o Edu, mas aquela sensação de algo fora do lugar me perseguia. Eu TINHA a necessidade de saber como seria dali pra a frente. Eu conseguiria levar adiante um relacionamento com outro cara? Minha família algum dia saberia? Como cada um dos meus amigos mais próximos reagiria? O Edu realmente aceitou ou só estava tentando manter uma naturalidade? Será que poderíamos nunca contar pra ninguém e manter no anonimato? Eu seria capaz de dar conta daquele sentimento que o Jimmy nutria por mim? Eu conseguiria superar o Murilo e não deixar que ele contaminasse minha relação com o Jimmy? Contaria pro Murilo?

Meu domingo, e a segunda, e a terça, foram de dúvidas, questionamentos e incertezas. Cumpria minha rotina naqueles dias de forma mecânica, mas sempre com a consciência trabalhando. Curiosamente, os únicos momentos em que esses pensamentos não me atingiam tanto era quando estava conectado com o Jimmy, ou por telefone, ou pelo msn. Incrível que quando estava em sua companhia, mesmo que virtual, eu não racionalizava muito, apenas tentava curti-lo ao máximo.

Mas é claro que ele, sensível como era, percebeu que em mim existia algo, um entrave que estava de alguma forma me bloqueando. Soube disso pelo Edu, na quinta-feira, quando fui à Camaçari e dormi em sua casa, e aí tivemos oportunidade de conversar mais um pouco.

- E aí, como estão as coisas com vocês? – o Edu perguntou.

- Esses dias, desde que deixei vocês na rodoviária, a gente vem se comunicando por msn e por torpedo... estamos de alguma forma ligados, sabe? Ontem ele comprou um chip da TIM e me ligou, todo empolgado, rsrs, porque ele me cadastrou como favorito e a gente agora pode se falar à vontade... e hoje eu vim pra cá mas ele tá em Salvador, acompanhando o Ogro lá num curso, sei lá. Então a gente nem vai se ver.

-No sábado, lá no apartamento da Lenita, depois que você foi dormir, a gente conversou pa caralho lá...

- Ah... – franzi a testa – eu pensei que eu tinha sonhado... aquelas vozes...

- Kkkk, tu é doente, na moral. Não lembra não, porra?

- Só lembro da gente conversando no colchão...

- Nós três conversando, aí você entrou em coma, do nada. Só que aí a gente continuou conversando, ele foi se abrindo... cara, ele tá fodido.

- Fodido, como assim?

- Sei lá, ele tá gostando mesmo de tu. Até enquanto a gente conversava mesmo, ele te olhava dormir, ajeitava o lençol pra tu, essas parada de cuidado. Teve até uma hora que ele foi alisar teu cabelo e tu deu um tapa na mão dele, hahahaha.

- Vixe, que merda! Kkkk!

- Pois é. Ele me chamou pro quarto da Lenita que queria conversar e não te acordar. Como se isso fosse possível...

- E aí?

- E aí que ele se abriu mesmo, disse que tá apaixonado, que nunca sentiu nada tão forte, que desde que tu apareceu na vida dele mudou tudo, e tal.

- Ai... gente... – apertei as minhas mãos – ouvindo isso tá me dando...

- Receio?

- Um medo, uma vontade de cagar, sei lá...

- Kkkk! Desgraça!

- Kkk, não, sério! Minha barriga fica revirada, dá um aperto...

- Do que cê tem medo?

- Não sei dizer, é tanta coisa. Sei lá, do preconceito, de não estar à altura, de...

- Ele falou isso também.

- O quê?

- Que tá com medo porque acha que você não tá na mesma vibe... na verdade assim: tem horas que ele acha que você tá, mas tem horas que ele diz que você se retrai...

- Eu achava que ele não percebia isso.

- Percebe, sim.

- Quando a gente tá conversando eu fico até melhor, esqueço essas coisas...

- Bom, mas, de alguma forma, ele percebe, não sei.

Meu celular tocou. Levantei na hora.

- Ó – mostrei a tela pro Edu – ele não morre mais.



Saí pra a varanda pra conversar com o Jimmy. Ele estava em Salvador naquela semana, o melhor amigo dele foi fazer um curso e pediu pra ele ir pra acompanhá-lo. Ele também aproveitou pra fazer umas pesquisas da faculdade. Conversamos sobre tudo isso e mais coisas ainda, falei pra ele que eu teria mais um curso pra fazer na capital semana que vem.

- Pô... quando eu voltando, você tá vindo...

- Venho pra Camaçari, você está em Salvador... vou pra Salvador, você volta pra Camaçari... o universo tá brincando com a gente, né?

- Tá, rss. Mas ele pode brincar o quanto quiser, só aumenta a minha vontade de estar com você. Só de te ouvir pelo telefone, mano, já fico feliz...

- Também tô com muita vontade de te ver...

- E vai. A gente vai se ver, se beijar... vou te apertar muito...

- Humm, coisa boa...

- Seu curso são três dias novamente?

- Sim. De segunda a quarta próxima. Depois volto pra Feira e aí, bom, vou ver como se encaminham as coisas por aqui, se será necessário vir pra Camaçari novamente...

- Estou com um pressentimento que sim, que sua cliente vai precisar de você...

- Hahaha, engraçadinho...

- Mas, sério. Tomara que dê certo de você ir. Tô com saudade, vontade...

- Vamos ver como será, né? Talvez até d...

- Sabe qual é a pior opção entre o Sim e o Não?

- Como assim?

- É o Talvez...

- Ah! Entendi... rsrsrs.

- O Talvez te deixa num limbo, na angustiante dúvida se você vai cair no poço do Não, ou na alegria e glória do Sim!

- Meu Deus, temos um filósofo aqui, gente...

- A gente faz o que pode, né... kkkk!

- Kkkk! Tá! Mas ó: eu juro que vou fazer o possível, tá?

Houve um silêncio inquietante do outro lado da linha.

- Jimmy.. tá aí ainda?

- Tô sim.

- Ficou calado...

- É que... tirando as brincadeiras, e tal... é claro que eu entendo se você não puder ir, tá? Ou, se não tiver à vontade pra ir nesse dia...

- Não... olha, deixa eu te falar: essa ansiedade não é só sua! Eu também quero muito te encontrar... ter um momento verdadeiramente a sós, sabe?

- Sei. E como sei. Não que eu esteja reclamando, mas... sinto falta de estar com você e estarmos à vontade, sem ter que disfarçar nada, se esconder... te dar carinho sem medo de alguém aparecer...

Fechei os olhos e suspirei. Meu coração acelerava com a possibilidade, por medo e por desejo. É verdade que meu corpo ardia quando pensava em nós dois a sós, livre pra fazermos o que pudermos, mas ainda assim sentia que precisava de (mais um) tempo pra estar preparado, se é que isso existia... Seria ótimo que tivesse um curso pra isso, como aqueles que eu tava fazendo no CREA... Qual seria a carga horária necessária pra dar o cu sem ter a mente atormentada depois?

- Cê tá aí ainda?

- Tô!! Tava viajando aqui, rss.

- Tomara que pensando em nós...

- Sim. Sim...



No outro dia assim que abri o Orkut percebi que ele tinha mudado o texto do seu perfil. Era uma letra de uma música que eu adorava, da Roberta Sá, que entre outras coisas, falava:

"Não deixe idéia de Não ou Talvez

Que Talvez atrapalha

Não deixe idéia de Não ou Talvez

Que Talvez atrapalha."

Na mesma hora o Edu ligou:

- Sabe que essa indireta é pra você, né?

Sim, aquilo eu tinha certeza que era pra mim. Novamente o medo me encheu, e a expectativa também, no mesmo ritmo e intensidade.

Queria desanuviar. Era uma sexta à noite. Saí pra beber com a Rose.



Acordei no domingo às cinco e meia.

Nem acreditei quando abri os olhos e vi as horas, o mais interessante é que o sono tinha sumido. Tinha ficado até tarde no msn com o Jimmy, como de praxe, então o esperado seria eu entrar em coma profundo até pelo menos umas onze.

Ele tinha me perguntado se eu iria realmente estar em Camaçari na quinta, e eu fui evasivo, respondendo que precisava ver ainda com a Valquíria. Na segunda cedinho estava partindo com a Leni para mais um módulo do curso, e voltaríamos quarta. A dúvida ainda me consumia.

Lavei meu rosto, fiz um café e me sentei à mesa que ficava no quintal coberto da casa. Nem curtia muito essa bebida, mas queria algo com o que me ocupar. A fumaça que invadia minhas narinas e embaçava as lentes do meu óculos quando eu soprava. O cheiro forte e a temperatura aquecendo meu peito naquele quase começo de dia. A minha mãe diz que "só vira gente" depois de uma xícara, não adianta lavar o rosto, nem tomar banho. Só o café mesmo despertava.

Aquele negócio estava indo rápido demais, ou então eu sou muito cagão. O menino me conheceu no dia 19, me beijou no dia 29, no dia 09 seguinte disse que me amava, no dia 12 comprou um chip da Tim pra a gente poder se falar melhor e no dia 16 quer saber da minha semana pra ele se programar da gente ter o nosso "momento". Pior que eu tava adorando tudo, mas e se eu desistisse no meio do caminho? Até que ponto eu podia chegar sem me comprometer tanto com a outra pessoa? Será que ele ia reparar se eu falasse "olha, foi legal e tudo, mas eu ainda não tô pronto"? Será que eu queria realmente parar?

Abri o notebook e comecei a estudar a matéria do curso, porque o segundo módulo seria mais puxado e porque o primeiro foi aquela bagunça: cerveja com os meninos, forró, matar aula... tudo menos o assunto em questão. Logo depois fui pro escritório e passei o dia inteiro lá, sozinho, enclausurado, terminando os estudos e algumas coisas que precisariam estar prontas na segunda de manhã.

Mas, logo depois do meio dia, resolvi entrar no msn. Mandei uma mensagem de alô, como se estivesse solto no espaço, procurando sinal de vida. Um minuto depois ele ficou online e me respondeu.

Mandou uma letra de música que eu já amava, e que costumava me perguntar se alguém também viajava como eu quando a ouvia:

https://youtu.be/G5ZCts-cye0

Órion

Daqui se vê em pé

Dizem até que Artêmis o matou por amor

Mas eu não levo fé


Longe

Eu posso ser ninguém

Pois longe ser ninguém é ok

Novo chão velha constelação


Dá saudade de ouvir falar

Saudade de sentir

Saudade de te encontrar


Vai amanhecer

Aí que horas são?

Aqui faz tanto frio

Aí é verão


Vai amanhecer

Ah...eu tinha um vidão


Lua crescente

Daqui se vê um D

D de down, não leva a mal, por favor

Aqui tá zero grau


Dá preguiça de explicar

Saudade de sentir

Saudade de voltar


Imediatamente me lembrei do meu réveillon, ainda despedaçado por conta do Murilo, jogado na grama e imaginando se existia alguém reservado pra mim. Que sintonia... Ouvir essa música agora sabendo que fora dedicada por alguém a mim, lhe dava uma outra dimensão.

Pronto.

Não tinha mais dúvida, nem medo. Ele estava ali o tempo todo, off-line, esperando eu retornar, e foi me dando uma euforia quando ele disse que tava já meio tristinho porque eu não tinha aparecido, e que não queria me importunar porque sabe que eu acordo tarde, e se eu tava bem, se o estudo tava rendendo... Me empolguei e taquei logo um:

- Meu amor! Lindo, que saudade! Quinta-feira eu tô ai, tá? Mesmo que não role reunião, eu vou sim, quero te ver...

Foi o suficiente pra ele se derramar todo do outro lado, e ficarmos praticamente a tarde toda entre piadas bobas, declarações descaradas e beijos pela cam, antes de eu voltar para as minhas planilhas e para o meu lar-enfermaria.



Os dias em Salvador, desta vez, foram tranquilos. O curso foi de segunda a quarta, o dia todo novamente, porém sem a chatice do anterior, pois tratava de casos práticos, em vez daquele mundo de conceitos. Decidimos comer menos dos coffee-breaks para poder aproveitar mais a gastronomia de Salvador, no almoço e à noite. Na quarta mesmo voltamos, logo depois que o curso acabou. Valquíria tinha finalmente marcado a reunião para a quinta, mas mesmo que não tivesse marcado, eu iria mesmo assim.

Os dias do curso serviram para consolidar em mim a ideia de que eu teria que ser um pouco menos Gustavo e me permitir, esquecendo o medo, se eu quisesse algum dia sair da mesmice da minha vida. O Jimmy estava ali, sentindo o mesmo que eu, querendo explorar isso, e eu insistindo em querer racionalizar tudo o que estava acontecendo e o que porventura iria acontecer. Não, não poderia deixar essa oportunidade passar.



Na quinta-feira cedo passei no Galpão e me concentrei na reunião com a Val. Almocei com o Edu.

- Cê viu o que ele anda postando no Orkut? – ele me perguntou.

- Sim, ando acompanhando, rsss. Mas, ó: eu tô mais decidido a me jogar, sim...

- Hum, finalmente, decidiu descer do muro... muito bem. E ai, como vai ser?

- Posso falar o que eu tô planejando? Vixe, tenho vergonha...

- Hahaha, agora eu vi! Fala logo, porra!

- É que... hahaha, eta!

- Finge que a gente tá falando de mulher, pronto!

- Tá. Hoje à tarde tenho uma vistoria pra fazer, às duas, devo estar livre no máximo três horas. Bom, tô pensando em ligar pra ele, e marcarmos algo... só nós dois, sabe?

- Huuum, entendi sim. Vão fuder.

- Kkkkk! Não! Quer dizer, não necessariamente, né? A ideia é termos finalmente um momento a sós, sem correria, sem gente em volta...

- E já pensou em local?

- Aí é que tá.

Parece exagero estar relatando assim, mas é que a cidade, apesar de já ser grandinha, não era nenhuma metrópole, e eu já era relativamente conhecido ali; às vezes, quando eu ia pra lá, assim que saía da BR e passava pelo centro o telefone começava a tocar "ah, não sei quem viu o teu Palio passando, cê tá por aqui, vamo tomar uma?" Isso, aliado ao meu medo do novo, me impedia de, por exemplo, enfiar o Jimmy no carro e tomarmos o caminho dos motéis. Tinha que ser algo mais neutro.



A vistoria era numa obra próxima ao centro, e o Bomba estava me acompanhando. Na verdade eu tinha uma ideia, sim, mas estava com receio de executá-la.

O Bomba há alguns meses tinha recebido a casa que ele havia comprado através de um financiamento, mas ainda não tinha se mudado, continuava na casa da mãe. Estava aos poucos mobiliando, fazendo pequenas reformas, sem pressa, até porque o casamento dele só sairia em setembro. A casa já tinha geladeira, cama, fogão (sem botijão), um sofá... Quando eu fui conhecer o imóvel, ele me ofereceu as chaves para quando eu precisasse dormir lá, porque segundo ele talvez eu ficasse mais â vontade do que na casa do Edu, com pai, mãe, cachorro, etc. Mas eu nunca aceitei porque achava meio contramão, e porque sempre me senti bem lá com a galera.

Novamente, quando falei com o Bomba que iria pra Camaçari, ele renovou o convite e dessa vez, falei:

- Ah, Bomba, acho que vou querer... Sei lá, toda semana dormindo no Edu, deve ser meio abuso, né?

- Vá pra lá, pô! Com a gente não tem essa, não! Quando a gente for na vistoria, eu te entrego a chave.

Então seria assim: terminaria minha vistoria com o Bomba, pegava as chaves na mão dele, ligaria pro Jimmy e...

E você estaria enganando o colega, fazendo-o acreditar que ele estaria lhe dando guarida quando na verdade você estava fazendo a casa dele de motel? Como você acha que ele reagiria se soubesse que você transou com outro cara na cama que ele dormirá com a esposa? Isso é certo?

Apenas isso me impedia de prosseguir. Estava na verdade quase desistindo e deixando essa ideia louca pra lá, quando terminamos tudo e o Bomba colocou as chaves na minha mão.

- Já sabe como chegar lá, né?

- Já sim. Bomba, mas...

- Olha, só não repara na bagunça, tá? Tem coisa que ainda tá dentro de caixa, no meio da sala... A cama também deve tar toda desarrumada, se vira lá! É que na verdade... – ele olhou pra os lados e teve o cuidado de falar mais baixo perto de mim – eu só uso aquela casa mesmo pra levar as puta, sacou? Hahaha...

- Ahh.. tá. Então se trata de um abatedouro... – raciocinei e dei dois murros nele – cara de pau, na cama que tu vai dormir com tua mulher...

- Não, nosso quarto ainda não tá montado não... Só tem uma caminha de solteiro no outro! Ah! E é bom você até comer na rua antes de ir, que a cozinha é zerada!

- Tá. Tranquilo, só vou à noite mesmo, vou trabalhar até mais tarde.

- Então qualquer coisa eu te ligo quando sair do trampo!

- Valeu!!



Parei o carro no centro da cidade, respirei e liguei pro Jimmy. Senti que ele tava ansioso pela minha ligação, mas ao mesmo tempo, não esperava que, às três e meia, eu o convidasse pra passar o resto da tarde comigo num lugar que ele não sabia direito onde era. Me diverti porque era a primeira vez que eu tomava a dianteira e ele ficava confuso.

- Cê tá com algum compromisso pra agora à tarde, é isso?

- Não! Quer dizer, tenho aula à noite, mas nada que...? Cê tá aonde agora?

- No centro, com o carro ligado, no volante, sem saber se vou pra o escritório ou se passo a tarde com você, nesse cantinho que eu arranjei...

- Hahaha, aaaaai!

- Kkkkkkk!

- Tá.. e... é agora?

- Não. Em fevereiro...

- Kkkkkkk! Besta!

- A gente pode ficar conversando também pelo celular, sem problema!

- NÃO! Onde é mesmo que fica isso?

- É melhor você vir pra onde eu tô e a gente descer junto, você me seguindo, porque pode desencontrar. Eu tô aqui em frente ao Hiper...

- Tá bom.. Me dá só uns dez minutos...

- Te dar só por dez minutos? Poxa...

- Kkkkkkkk, meu Deeeeeus!

Ele tava nervoso. Na verdade esperei por bem mais que isso, e até pensei que ele tinha desistido, quando ele finalmente parou a moto do meu lado. Entendi o porquê da demora.

- Foi em casa tomar banho... Sacanagem, viu? Eu aqui do trabalho...

- Você não precisa, é perfeitinho do jeito que tá, sempre...

- Rsss, tá. Vou tirar o sapato e colocar no teu nariz, e aí a gente conversa...

- hahahah, calma!

- Rss – pisquei pra ele (com o olho de cima ainda) – me segue.

O carro saiu em direção à casa do Bomba e o Jimmy ia me seguindo de moto. Durante todo o trajeto o coração mantinha-se acelerado, eu me pegava inconscientemente olhando pelos retrovisores pra ver se não tinha nenhum conhecido me vigiando, apertava a chave da casa na minha mão direita me perguntando se tava tudo OK. Enfim encontrei a casa, naquele conjunto recém-terminado, em que todas as casas eram iguais, nenhuma com muro, estacionei no passeio e o observei descer da moto. Olhei para as casas vizinhas, me perguntei se alguém acharia estranho aquela movimentação no meio da tarde, numa casa vazia, se algum vizinho já era amigo do Bomba a ponto de entrar em contato com ele, se... Respirei. Chega de pensar. Olhei pro Jimmy, sorri, abri a porta da frente e o convidei a entrar.



Ele entrou, colocando o capacete numa das caixas que repousavam no chão da sala. As mãos se enfiaram no bolso de trás da calça, olhando em volta. Eu caminhei lentamente, explorando a casa, olhei a cozinha, os quartos e o banheiro, e ele me acompanhava com o olhar. Eu me encostei na parede oposta, e o observei. Rimos.

Ele lentamente veio até mim e parou.

- A casa é legalzinha, né?

- Sim, ela é pequena, mas bem aconchegante.

Ele tirou as mãos do bolso e as colocou na minha cintura. Ficamos parados por quase um segundo antes de literalmente colidirmos e ocorrer um beijo urgente como já era de hábito entre nós. Foram minutos ali, em pé, imprensado na parede, em que eu sentia todo o seu gosto, seu toque e seu cheiro, e me inebriava com o modo como ele me explorava.

Fechei os olhos e o senti me levantando, para se encaixar em mim. Me segurava pelos quadris e eu o enlacei com as pernas. Juntamos nariz com nariz e nos olhamos, finalmente. Estávamos ofegantes. Dei uma olhada pela janela da frente da casa, era de um vidro jateado, que não permitia a visualização pelo lado de fora. Barulho de algumas crianças brincando de bicicleta e uma mãe nervosa tentando disciplinar a bagunça. Ele deslizou a ponta do nariz suavemente até alcançar o meu pescoço, e eu o apertei mais uma vez sentindo o meu corpo todo arrepiar. Senti as suas mãos me segurarem, e ele andar até o quarto onde, no meio de uma desorganização de sacos e caixas, encontrava-se uma cama de solteiro.

Assim que eu deitei, ele me ajudou a retirar a minha camisa, silenciosamente, e retirou também a sua. Deitou-se por cima de mim e novamente me beijou, só que dessa vez bem lentamente, fazendo-me prestar atenção no que ocorria abaixo das nossas cinturas. Estávamos ainda de calças, mas nada que nos impedisse de sentirmos um o corpo do outro. Ele desceu, beijando o meu pescoço, a minha barriga, e a ponta da sua língua roçou desde o meu umbigo até onde o cós da calça permitia. Me livrei dos sapatos, empurrando um pé no outro. Fechei os olhos, e pude apenas sentir as suas mãos desabotoando a peça de roupa e abrindo o zíper; a calça deslizava por entre as minhas pernas, fugindo de mim, e eu a deixei ir, imerso nas sensações.

Abri os olhos e percebi a sua silhueta, contra a luz da janela do quarto, ajoelhado na cama, abrindo a sua calça também. Um instante depois e ele estava apenas de cueca boxer, avançando lentamente como um felino espreitando a caça, deitando-se por cima de mim mais uma vez e me levando à loucura. Eu puxava o seu cabelo quando ele mordia meu pescoço, beijava a minha orelha e me apertava ao máximo com seus braços. Nos olhamos mais uma vez antes de ele levantar um pouco e se livrar da cueca. Seu pau estava latejando, era grosso e apontava pra cima; um pouco torto. Ele tirou a minha cueca e a deixou no chão. Abriu as minhas pernas e me fez sentir a cabeça do seu pau, deslizando aos poucos e deixando a minha pele com o mel que saía dele. Subiu e me encaixou, pressionando o máximo que pôde seu corpo contra o meu. Era uma sensação nova, louca, sem igual.

A cama começou a ranger com os nossos movimentos, e alguns gemidos soaram pelo quarto.

Instintivamente olhei para a porta do quarto, e o meu tio Mauro estava lá, em pé, enfurecido, com as mãos nos quadris:

- É assim que vocês estão olhando a fogueira, não é?

Puxei o Jimmy e beijei o seu pescoço, olhei para o teto e me perguntei se alguém no mundo desconfiaria o que eu estava fazendo agora. O Jimmy rolou sobre mim, e a cama gritou, quando ele me pôs sobre o seu corpo.

De olhos fechados, percorri o seu pescoço, beijei o seu mamilo, e de repente eu estava tomando banho com o Marquinhos trancado no banheiro.

- Deixa eu botar só a cabecinha, vai, Gu... Não tem ninguém aqui. Olha só.

O Jimmy gemeu e alisou o meu cabelo, e a tia Malu gritou: "A culpa é do seu filho, ele sempre foi esquisito..."

A minha mãe sussurrou "meu filho, se tiver algo que você queira me contar, eu sou a sua mãe..."

Eu beijei o seu abdômen lisinho, nos fitamos e rimos descaradamente, enquanto eu lembrava do Murilo. Não esse Murilo de agora, um outro Murilo, de anos atrás, o primo do meu primo Marquinhos, filho da minha "tia torta" Ivone, um adolescente lindo e corpulento que eu encontrava de vez em quando nas festas de família, e que uma vez, quando eu tinha 14 e ele 16, me chamou no corredor lateral e disse que havia me sacado, apertando o pau. "Eu sei do que você gosta, fala aí, Tavinho... vem aqui...

- Pára, Murilo!!

- Pega aqui... rapidinho.

- Murilo, seu imbecil!

- Pensa que eu não soube de você e Marquinhos não? Eu vou contar pra todo mundo, ouviu? Cê vai ver!

- NÃO!

O Jimmy levantou, assustado.

- Que foi?

Olhamos para a porta da frente. Alguém tinha batido. Ou era impressão minha? Eu tremia.

- Você ouviu? – ele me perguntou – alguém tá batendo na porta.

- Sim.

- Fica aqui.

O Jimmy levantou-se, ainda nu, de pau duro, e na ponta do pé, foi até a porta. Me perguntei o que eu ia dizer caso o Bomba tivesse resolvido ir lá, e visto uma moto e o meu carro na porta, e se deparasse com aquela recepção.



Um tempo depois ele voltou, deitando-se ao meu lado na cama.

- Parece que os meninos jogaram a bola e ela bateu aqui, na varanda. Eles vieram pegar e levaram.

A gente se abraçou.

- Se assustou, pequeno?

- Um pouco, rsss.

- Fica assim não. Vem aqui – me enlaçou e me beijou a testa, e eu me aninhei no seu cangote – o coração tá acelerado...

- Rsss, deixa pra lá.

- Vem cá... de quem é essa casa, hein?

- Do Bomba – expliquei rapidamente as circunstâncias que nos levaram até ali – naquela hora eu achei que era ele, hahahaha.

- Imagina, hein? Haha! Véio... e eu pelado, iria atender!

- kkkk!

Ele alisou meu rosto. Me observava, esquadrinhava cada detalhe, e eu me limitei a olhar pra baixo, envergonhado.

- Você tem um rosto muito, mas muito lindo... Nossa...

- Não precisa agora começar a mentir, né? Rsss, a gente já ta na cama... – rimos.

- Bobo! Olha isso... quando você ri, essas covinhas... – o seu dedo indicador apontava para cada uma delas que apareciam nas minhas bochechas – isso me deixou ligado, desde a primeira vez que eu te vi, sabia?

Apenas o encarei e lhe dei um selinho. As crianças ainda faziam barulho na rua. Fora isso, apenas o vento soprando as folhas de alguma árvore dava notícia do que acontecia lá fora. Fechamos os olhos e de novo nos deixamos levar por aquelas sensações. Ele procurou a minha orelha e sussurrou:

- Se eu soubesse que ia terminar a minha tarde assim, dessa forma maravilhosa, talvez eu tivesse tido um infarto de manhã... de ansiedade...

- Gostou da surpresa..?

- Nossa... como que eu posso te retribuir isso, hein? Tava achando já que tinha ficado louco, do tanto de vezes nesses dias que eu pensava nisso... pilotando, na sala de aula, antes de dormir – me abraçou forte, e sussurrou mais perto ainda – no banho...

- Olha só...

- Hehe, poxa... eu não quero também que as horas passem e a gente tenha que sair daqui...

- Fecha os olhos... – passei a mão carinhosamente descendo as suas pálpebras – sente meu corpo aqui colado no teu – coloquei a sua mão em volta da minha cintura – lembra disso, sempre... – encostei minha boca lentamente na sua e ele abriu, esperando mais. Provoquei o máximo que pude, mordiscando, encostando e soltando, enquanto sentia seu membro latejando contra a minha pele e suas mãos me explorando.

- O tempo parou...

- Conseguimos, tá vendo?

Ele jogou a minha perna em cima dele, fazendo-me sentir ao máximo a sua excitação, e me beijou longamente. Agora os únicos ruídos eram dos nossos beijos, da cama rangendo novamente e dos nossos gemidos.

A dança dos corpos nus recomeçou, cada posição procurava o máximo de prazer e descoberta. Nunca, nunca estive tão imerso no corpo de alguém e recebi tanto prazer. Ele desceu pra poder me chupar e ofereceu seu sexo pra mim, e eu busquei com vontade, enquanto explorava seu bumbum com as minhas mãos. Colamos novamente nossos corpos como antes, estávamos já suados e isso era uma sensação a mais. Eu comecei a masturbá-lo e ele a mim, frente a frente, com os rostos colados, olhos fixos um no outro, e dez em quando nossas línguas se encontravam. Fechei as pernas e prendi seu membro entre elas, ele urrou enquanto encaixava ali. Me colocou de costas, abriu as minhas pernas e encaixou o máximo que podia sem penetrar, rebolando ora suave, ora selvagemente. De alguma forma silenciosa concordamos em não haver penetração, não ainda. Mordia meu pescoço por trás e me masturbava, e instantes depois eu gozei. A sua mão colheu o máximo que pôde, e apertou os meus quadris, espalhando pelo meu corpo. Logo depois ouvi-lo gemer alto, e senti nas minhas coxas os seus jatos quentes. Ali, mais uma sensação que eu nunca tinha experimentado.



Nossos corpos continuavam colados ainda. De olhos fechados, os dois, deitados um de frente pro outro, com as pernas entrelaçadas, conversávamos bobagens, nos beijávamos, ríamos; cochilamos levemente por minutos, ouvindo um a respiração do outro.

Abri os olhos e ele me olhava, com uma expressão de encantamento.

- Gustavo... minha vida tá boa, de repente... rss. Eu tô te amando... e você tá aqui comigo. Nem acredito...

- Eu também não acreditava que isso pudesse acontecer comigo um dia. Essa intensidade, essa reciprocidade...

- Ia sim, inevitavelmente. Você é uma pessoa amável ao extremo. Não tem quem não te conheça, quem não tenha um tempo ao seu lado e não fique no mínimo... atraído pela sua pessoa...

- Ai, meu Deus – eu encostei meu rosto no seu peito, me escondendo – eu fico muito...

- Ei, não precisa ficar envergonhado. Você pode achar que tô falando essas parada pra te conquistar, ou porque eu tô apaixonado, e tal, mas...

- Não é isso, é que...

- ... mas é só a observação do que eu vejo... As pessoas te adoram, seus amigos estão sempre em volta, e você atrai olhares, siiimm, tá?

- kkkk devo atrair mesmo! Tudo o que é esquisito demais acaba...

- Kkkk para! Não faz isso! Seu bobo! – me beijou. Você é lindo, por dentro e por fora, e por isso é muito fácil te amar.

Suspirei. Não era fácil pra mim lidar com aquilo.

- Jimmy, eu morro de medo de você se decepcionar depois. Eu estou certo de que não sou isso tudo, não – ele fez menção de falar e eu gentilmente pus o dedo no seu lábio – eu de fato gosto de gente em volta, procuro ser o máximo possível gentil, solidário, mas... eu...

Parei, tentando encontrar palavras. Foi a vez de ele me calar, com um selinho. Alisou meus cabelos e disse:

- Mas... você... tem defeitos, como qualquer um. Não é disso o que eu tô falando. É de como você é bom, lindo, generoso... pô, isso tá na cara.

- Mas sou confuso, inseguro, contraditório, problemático também...

Eu queria me mostrar um pouco mais a ele, não queria idealizações de algo que eu não conseguiria nunca manter. Lembrei de como aquele processo de entrega estava sendo demorado, de como eu ainda estava reticente... Me sentei na cama, ele continuou alisando as minhas costas, e eu emendei:

- Eu sou muito problemático. A minha cabeça não é boa. A minha vida é problemática, é.. difícil, sei lá, é...

- Vem cá – ele me puxou e eu novamente me aninhei entre seus braços e pernas – não fica assim. Só quero que você saiba o seu valor.

- Tá.

- Todos nós enfrentamos coisas ruins, situações chatas, e muitas vezes enfrentamos os nossos próprios deslizes. O que importa é, eu acho, o saldo, rss, sei lá, no final das contas, os sentimentos que nos envolvem.

Olhei pra ele. Seu rosto exalava sinceridade. Ele continuou:

- E você é isso. Amor, bondade, essa alegria contagiante. E eu tô aqui, agradecendo essa oportunidade que você me deu de aproveitar isso, você, seu mundo... O meu mundo hoje é outro, desde que você apareceu, me deu a mão, sorriu pra mim, e colocou felicidade nele.

Ele juntou os nossos rostos e parecia estar fazendo uma prece silenciosa, enquanto alisava meu rosto, meus cabelos. Eu me senti tocado no fundo da alma, algo como se estivesse flutuando num tapete mágico, numa nuvem, em outro planeta, sei lá.

- Eu que agradeço por tudo. Sou eu que tenho que agradecer. Você entrou na minha vida, Jimmy, num momento em que, meio que já tinha desacreditado de tudo... – suspirei, ele estava atento – eu te falei agora há pouco e é verdade. Eu não esperava que isso fosse plausível de acontecer comigo um dia, eu esperava no máximo conseguir resolver alguns desafios pessoais e viver uma vida tranquila. Mas essa intensidade, esse calor, essa vibração que eu tô experimentando ultimamente... eu posso arriscar a te dizer que eu nunca passei por isso. Sentimento recíproco... Vontade mútua. Amar e ser amado de volta...

- Eu te amo, te amo, mesmo. Muito. Não tenho medo de dizer, porque é o que eu sinto.

- Eu também te amo. Mas... acho que tenho medo de dizer. Rss. Tenho medo de arriscar a ter esperança de novo em algo bom. Tenho ficado com medo de tudo ultimamente – nos beijamos – vou tentar melhorar, tá?

- Conta comigo. Se eu te disser que um momento antes de eu te conhecer, eu estava nesse mesmo lugar que você, não sei se você vai acreditar – ele me puxou forte pra si – mas sim, eu tava meio down, e decidido a seguir minha vida sem esperar nada assim, relacionado à felicidade, à amor...

Foi a minha vez de prestar atenção nele. Estávamos ainda nus, abraçados, acarinhando um ao outro naquela tarde que caía.

- Eu terminei um relacionamento de quase dois anos porque estava sufocado, eu me sentia perdido no meio de muita demanda, saca? Eu me sentia eternamente devedor, porque eu não conseguia corresponder, nem em sentimento, nem à expectativa dela...

- Foi a moça que o Edu viu na sua moto naquele dia?

- Sim, ele conhece ela também. Faz faculdade com a gente lá. Bom, depois fiquei um tempo só, e acabei me envolvendo com um outro colega nosso, o Alisson, da facu também. Ele é uma pessoa espetacular, sabe? Cara legal, papo bom, começamos a sair juntos e eu tava meio que envolvido mesmo. Mas do nada, depois de umas noites em que ficamos juntos, ele me pediu pra eu me afastar, que não sentia nada por mim além de atração física, e que tava em outro momento...

- Nossa, Jimmy..

- É. Foi foda. Porque, sei lá, ele tava na onda também, senti que ele tava curtindo a parada... O Edu nunca soube desse rolo, tá?

- Eles se conhecem também?

- Eles são colegas de turma. Eu sou de um semestre mais adiantado. Bom, aí eu acabei sabendo que ele na verdade tinha um relacionamento já de vários anos, moravam junto e tudo, mas estavam meio frios, mas que ele tinha resolvido voltar pro cara, enfim...

- Poxa...

- Entrei no meio de uma história sem saber de nada. Daí, eu, cara, fiquei muito mal... Além de todo aquele processo de estar com outro cara, e tal, misturou tudo, e eu não consegui superar fácil. Criei meio que uma casca e resolvi tocar a vida.

- Foi cicatrizando aos poucos...

- E ai... você apareceu. E, por mais que meus alarmes estivessem tocando no máximo volume, eu não consegui resistir, eu não consegui me desviar, me blindar. Foi incrível... foi mais forte do que qualquer experiência que eu tenha passado. Eu não consegui ouvir o que minha cabeça tentava me aconselhar.

- Eu também tentei racionalizar isso tudo, mas... acabei aqui – estendi as mãos mostrando onde estávamos e rimos alto, nos abraçando.

- Ainda beem!!

- Rss, não me arrependo!

- Se arrepende não, por favor, tá?



- Mas... vem cá. Tô meio.. bolado com... porque que seus alarmes tocaram tão alto comigo? Rss...

- Ah...

- Foi por aquilo que você disse, que já não queria se envolver de novo?

- Sim. Sim. Há menos de um mês estava jurando que não ia me permitir me entregar daquele jeito novamente a ninguém, e aí... pá. Olha eu de novo ali, e...

Ele me olhou. Suspirou e balançou a cabeça rápido, como que pra afastar algum pensamento. Me beijou.

- E...

- Nada...

- Pode falar, tá? A gente tá se conhecendo...

- Tá. E... a semelhança da situação anterior.

Franzi o cenho, tentando captar alguma semelhança.

- Você também estava envolvido em outro relacionamento, que eu não consegui identificar o que era exatamente, ou em que estágio estava, só consegui ver que havia muita coisa ali...

- Euu??

- Sim. Você e o Murilo. Não?

Joguei a minha cabeça no travesseiro, meio atordoado.

- Não! De onde você ti... Eu e o Murilo, o Murilo é um amigo, quer dizer, nós fomos colegas de trabalho e hoje somos amigos. Eu adoro ele e tudo, mas nós n...

- Você e o Murilo não eram namorados?? – ele estava realmente surpreso.

- Não!!

- Ué!

- Ué o que? Kkk, meu Deus, quem te disse isso? Ah, foi aquela brincadeira do Edu lá em Feira? Nãaoo, kkkk! O Edu que...

- Que brincadeira?

- Ele falando com a minha mãe lá que...

- Acho que eu não tava nessa hora não.

- Mas... bom. O Murilo na verdade tem noiva, tem namorada também, tem ainda ou...

Ele apertou a minha mão, me confortando, com a expressão mais doce que foi possível:

- Olha... não foi ninguém que me disse nada, nem soube de nenhuma história. Na verdade, foi o que eu observei quando conheci vocês. Aliás, conheci os dois no mesmo dia... Sei lá, vocês se tratavam como, vocês eram um casal. O jeito que se olhavam, que se cuidavam, que se implicavam, as carícias... pô. Então, não sei, rss.

- Tô te dizendo... – eu estava tão envergonhado que de repente a minha nudez me constrangeu – nós somos amigos, apenas. Nunca rolou nada entre a gente.

Fitamos um ao outro.

- A única dúvida que eu fiquei, lá, na Micareta, era se vocês ainda estavam juntos, ou já tinham terminado, ou se era apenas um rolo mesmo, desses que a gente vê por aí. Por isso que me retraí a princípio. Depois, como te falei, não consegui me resguardar.. rss.

- Nossa... eu não conseguiria olhar nem flertar com ninguém se estivesse em um relacionamento com outra pessoa, principalmente na mesma casa, na mesma ocasião...

- Isso também me confundia. Depois daquilo que aconteceu no quarto entre a gente, das camisas, eu fiquei pensando "poxa, então, devo estar errado...", e tal, mas aí depois teve aquela DR na lanchonete, ele falando de um tal aniversário que...

- Ah...

- ...sei lá, parece que você deu o bolo nele, enfim. Aí fiquei boiando. Pensei: "eles podem estar terminados, sei lá"

Respirei fundo. É, o Jimmy viu muita coisa, observador que era. Mesmo que não fosse, eu e o Murilo meio que perdemos o pudor em algum ponto daquela história.

- Jimmy... como te falei. A gente tá se conhecendo, se curtindo, e... você foi tão legal em se abrir comigo...

- Olha... não tô te cobrado nada, eu só cheguei nesse assunto nem sei porque, rss. Vamo continuar curtindo isso que a gente tem aqui...

- Não, não é questão de cobrança é que... acho que o clima tá propício pra, antes de mais nada, nos conhecermos melhor, nos entendermos, e, partilharmos mais coisas ainda um com o outro. E não quero que fique também nada, sei lá, obtuso entre a gente...

Ele só me observava.

- Eu e o Murilo nunca tivemos nada. Éramos colegas de trabalho, viramos amigos, nos aproximamos muito, mas nunca passou de amizade. Nunca houve um beijo, um, enfim, uma conversa, nada. Mas... da minha parte... eu realmente me confundi.

Olhei pra ele, mas não esboçava nenhuma reação.

- Então, há algum tempo, eu... acho que me apaixonei mesmo, me confundi com algumas atitudes dele. Acho que hoje, olhando pra trás, sei lá, podia ter entendido que era só afeto mesmo da parte dele, e eu acabei achando que... bom, resumindo... em um certo momento, em que eu estava muito, muito fodido com isso na cabeça, e quase cheguei a chamá-lo pra conversar, aconteceram algumas coisas que me convenceram que eu precisava mesmo era colocar a cabeça no lugar e reconsiderar a hipótese de só ser amizade mesmo. Sofri, eu... me afastei um pouco dele, e também acabei passando por uma série de problemas familiares, mas mantemos nossa amizade, o convívio também, quando é possível, e o afeto.

- Mas você conseguiu...

- Totalmente. Murilo hoje, pra mim, nada mais é do que um amigo. Um amigo querido, mas, nada além disso.

- Tem muito tempo que vocês t... se afastaram...? Ah, desculpa, eu ia falar "terminar", mas você ta dizendo que nunca teve nada, rsss, foi mal...

- Rss, nunca teve nada. Nada de concreto, nem nada da parte dele que denotasse alguma coisa diferente de amizade. O que eu p...

- Desculpa, mas... desculpa estar insistindo nisso. Mas é que: tem certeza que da parte dele nunca houve um sinal de que não seria só amizade mesmo? Sei lá, não foi bem isso o que eu percebi dele...

- Jimmy... eu só posso falar de mim. O que aconteceu aqui, ó, aqui dentro, comigo. O que vai na cabeça dos outros... O que eu digo é que, daqui, eu não consigo enxergar nele um sentimento além de amizade.

- Verdade.

- O que eu entendo de amor, de sentimento correspondido, é outra coisa, muito diferente. Não é nada que diminua a gente, ou que nos faça sofrer de forma profunda... É algo que nos promove, que nos eleva, que... é o que eu tô tendo agora. Com você.

Ele suspirou, fechando os olhos. Me apertou o máximo que pôde e cheirou o meu pescoço.

- Como te falei antes... Eu tô apaixonado por você, amando você, sei que às vezes pode parecer louco falar isso em tão pouco tempo que nos conhecemos... mas é isso. Eu quero ser na sua vida o que você está sendo na minha, a luz que você trouxe, eu quero que você, de repente, pô, sei lá, partilhe essa sua vida tão problemática que você disse comigo, pra que, se eu puder, te ajudar a carregar o peso que você tá carregando. Ser teu companheiro, teu amante, sei lá. Te amar.

- Eu t...

- Mas, ao mesmo tempo, se não for o caso de você não estar pensando nisso agora, ou de ainda não saber, é só falar. Eu já sou bem grandinho, sei lidar com isso, rsss. Mas, a última coisa que eu quero, de fato, é embarcar novamente numa história em que eu não caiba, ou que faça apenas o papel de coadjuvante.

Eu senti meu rosto corar.

- Eu tô só me abrindo novamente contigo, tá? Rss, não fica assim.

- Não, eu acho legal falar. Muito da minha hesitação, que você percebeu, vem justamente do fato de que eu ainda não sei classificar o que tá acontecendo comigo desde que você chegou na minha vida. Apesar de saber que é muito forte, avassalador E, talvez, sim, precise de um tempo até entender, e, no meio disso, me retrair. Poxa, não posso nesse momento aqui...

Ele me calou com um beijo ardente. Me abraçou.

- Não é hora de um papo tão pesado. Eu te encontrei, você me encontrou, estamos nos curtindo, e o futuro está no futuro!

- Isso! Chega de energia pesada aqui! Vem cá, vem cá, vem!

Abracei-o forte e tentei desanuviar. Não queria pensar, naquele momento, no quanto de sinceridade existia naquele meu relato. Na verdade, foi, sim, a primeira vez que eu mentiria pra ele sobre o Murilo; aquela página não estava virada assim como eu tinha enfatizado. Estava eu tentando juntar o desejo que eu tinha de que fosse verdade com a tentativa de deixá-lo mais seguro, mas a minha consciência dizia que algo poderia estar errado ali.



Já tínhamos levantado, andado pela casa, gozamos de novo no box do banheiro, e agora dávamos risada porque depois do banho simplesmente não havia na casa toalha pra a gente se secar. Eu tive que sair molhado mesmo, procurando algo que tivesse essa função, mas não achei nada além de:

- Um pano de chão, Gu?

- Jimmy, amor, nem lençol tinha naquela cama... Aliás tinha um forro, sim, mas... enfim, melhor não usar.

- Meu Deus.

- Pois é. E se você observar, ele foi comprado para ser um pano de chão, mas ainda não foi usado, então...

Rimos muito daquela situação. Um pano de chão pra secar nós dois, era demais pra aquele início de noite.

Dei uma arrumação rápida na casa do Bomba, o Jimmy foi pra a faculdade, e foi a conta certa de estar saindo da casa e o colega me ligar. Já era mais de sete da noite, ele tava saindo do trabalho e queria fazer algo na rua.

- Passa aqui, pô, tô no Peixotinho!

- Passo sim, Bomba, podexá! É bom que eu te entrego a chave da tua casa!

- Ué, não entendi!

- Passei lá mais cedo, véi, acho que vou ficar no Edu mesmo! Casa desarrumada do caralho! Não tem nem toalha pro hóspede, nem uma comidinha feita no fogão...

- Vai se fuder, vagabundo, tomar no teu cu!

- kkkkkk! Tô brincando, porra... Vou ficar lá sozinho não, porque eu tenho medo de espírito.

- Sei não, viu. Muita viadagem pra uma pessoa só. Tá bom, chegar aqui a gente conversa. Liga pro Edu, vê onde ele tá!

- Valeu!

O carro ia em direção ao centro, institivamente me cheirei com medo de perceberem algo. Coisa de gente louca mesmo. Ri sozinho. Liguei pro Edu e ele já atendeu fazendo piada: "tava fudendo, hein, descarada?" Marcamos de eu pegá-lo no centro pra encontrarmos o Bomba lá.

- Mas é que é verdade... – falei sozinho, desligando o celular – quer dizer, eu tava fudendo. Fudendo, PORRA!! Hahaha! Depois de décadas! Vou mandar rezar uma missa, Senhor! Obrigado, Jesus, por essa putaria concedida! KKKKKK!

Quemestivesse olhando de fora não entenderia nada, lógico. Acelerei o carro, estavacom pressa, com sede, com fome, e satisfeito, alma leve.


...



Gente, primeiramente... Fora Temer!

Em segundo lugar, desculpa pelo sumiço, vou tentar manter regularidade nas postagens, tá?

Em terceiro lugar, quero dar uma notícia maravilhosa pra vocês: eu fui convidado pra participar do WattEntrevistas! Muito feliz!

O WattEntrevistas é um livro de entrevistas com autores e leitores aqui do WattPad, super bombado, feito por uma equipe maravilhosa! Gente, só celebridade lá! O livro está na minha biblioteca, pra quem ainda não conhece...

Não consegui dizer: "ah, vou dar uma entrevista...", ia ficar muito metido, né não? kkkkkk. Bom, mas o fato é que a Cris tá organizando as perguntas, e eu queria avisar que se algum de vocês tiver interesse em me perguntar algo, seja relacionado ao meu livro, ou à minha vida, enfim, qualquer coisa, mandem pra ela no inbox, tá bom? crikabn

Espero que tenham gostado do capítulo e até a próxima! Bjo na bochecha de todo mundo!


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