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29 de abril de 2008.
Um beijo na boca de outra mulher, ou um beijo na boca de outro homem, é um beijo na boca de outra pessoa.
Os dentes estão ali, onde deveriam estar. A língua, a temperatura interna, a saliva; a respiração suspensa, aguardando pacientemente a hora de voltar... Os, olhos, por vezes fechados, para facilitar a imersão do ser naquele universo sensorial, as vezes abertos, para ver de perto o que o ser vivencia.
Tanto faz, porra, se a outra pessoa é do sexo oposto ou do mesmo sexo. É uma outra pessoa, ponto.
Foi com uma certa dose de surpresa que eu cheguei a essa conclusão enquanto dirigia de volta à empresa e fingia prestar atenção ao que o Edu falava. Sempre achei, no meu íntimo, do alto da minha ignorância e falta de experiência, que no momento em que tocasse os lábios de outro cara, aconteceria algo como atravessar um portal secreto, de onde não poderia voltar pra o lugar em que antes me encontrava; passar de fase no game da minha vida, ou, me tornar uma pessoa diferente, de modo que todos que cruzassem comigo de alguma forma sentiriam isso. Eu seria um homem que beija outro homem, que é muuuito diferente de um homem que de vez em quando pensa em beijar outro homem.
Tudo bobagem, óbvio, delírios de uma mente presa na infância emocional.
Pois bem, numa tarde qualquer, depois de um almoço como tantos outros, experimentei meu primeiro beijo gay. Foi muito bom, meu corpo todo respondeu imediatamente, mas a verdade é que dali em diante a minha vida continuava a mesma, eu era o mesmo, enfim... estava descobrindo o óbvio: não tem nada a ver ficar diferenciando se o amor, atração ou sei lá o que é por alguém do mesmo sexo ou não.
Chegamos no escritório da firma e a Valquíria ainda não tinha chegado, apesar de já ser quase três.
- Nossa, será que a Val vai demorar ainda?
- Ela avisou que ia ter reunião na diretoria uma e meia, né? Deve ter esticado. Senta aí, pô, espera mais – o Edu indicou uma cadeira, ele e a Valquíria dividiam uma sala – tá com pressa assim porque, cê quer voltar ainda hoje pra Feira?
- Sim, eu marquei de fechar essas coisas com ela hoje e já iniciar os trabalhos amanhã, pra ver se dá pra entregar na semana que vem. Se demorar muito aqui vai me atrapalhar todo, não posso perder o foco do trab...
O telefone tocou, interrompendo o nosso diálogo.
O Edu atendeu, e olhou pra mim, passando o aparelho.
- É pra você.
- Pra mim? – peguei o aparelho, pensando ser a Val – oi!
- E aí? Tá tudo bem?
Era o Jimmy.
- Ué? Ligou pra a sala da doutora pra falar comigo? Hahaha!
- É, rss, é o número da sala do Edu, eu sempre ligo pra ele daí. Tentei aventurar pra ver se falava contigo, ouvir a voz, e tal...
Minha bochecha ferveu na hora, olhei pro Edu que olhava pra mim, e dei graças a Deus que a minha orelha estava bem grudada no fone.
- Ah... sei.
- Hehe, o Edu tá aí do lado, né?
- Sim, sim.
- Deixa eu falar então porque eu liguei. Cê lembra quando a gente tava conversando lá na Micareta sobre aquela série que você gostou?
- Os Maias? Sim!
- Pois é, então... Eu liguei pra um colega da faculdade, ele tem os DVD's, a série completa...
- Olha! Que ótimo...
- Aí eu pensei de ir lá pegar, fazer uma cópia pra você... e... de repente a gente até marcar de assistir, quer dizer, começar a assistir...
- Hum...
- Tipo, hoje à noite... que cê acha?
De repente a minha barriga revirou, senti como se tivesse havendo uma corrida de avestruzes dentro do meu estômago.
- Ah, era uma boa...
- Quer dizer, cê vai ficar aqui hoje?
- É, na verdade eu ainda tô resolvendo com Valquíria isso – o Edu me olhou, tipo "que porra o Jimmy tem a ver com o que você vai resolver com a Valquíria..?". Tapei o fone e expliquei – o Jimmy quer saber se fico hoje, ele arranjou os DVD's de Os Maias, pra fazer sessão de cinema com a gente...
- Ah, tá... fica aí, pô, aí a gente assiste lá em casa, qualquer coisa. Ah, mas é que cê tem que fazer o trabalho, né?
- Preciso saber mesmo porque aí eu vou lá na casa dele pegar o bagulho – o Jimmy emendou.
- Tá, então... vai lá – respondi – a Valquíria parece que vai atrasar mesmo...
Nesse instante Valquíria irrompeu pela sala, esbaforida, cheia de explicações, ao mesmo tempo falando, largando as coisas e sentando em sua cadeira.
- Jimmy, eu vou ter que desligar. A gente se fala mais tarde.
-...sabe como é a sua diretora geral, né? A Gilda queria repassar tudo!
- Respira, Val! – desliguei o fone – no problem. Edu vai pegar uma água pra você, cavalheiro que é.
- Lógico que sou! – Edu respondeu – e aí? Resolveu o que com o Jimmy? Acho que pra hoje não vai dar, né?
- É... eu vou ver aqui com ela... não sei...
Me virei pra a Valquíria e fiquei tentando raciocinar: se fosse pra ser uma pessoa responsável mesmo, o certo seria fazer logo a reunião com ela, fechar os detalhes, partir rumo ao escritório, e só sair de lá uns sete dias depois, com o trabalho pronto. Só que tinha duas coisas: 1- eu não era uma pessoa responsável e 2- eu queria ver se ficava uma pouquinho mais com aquele rapaz, quem sabe até rolava outro beijo daquele, quem sabe, né? Quem sabe.
Então a reunião inteira eu fiquei protelando, tirando dúvidas mil vezes e problematizando pra ver se ficava tarde e eu usava o pretexto do horário pra só ir no outro dia. Até que surgiu uma desculpa perfeita, que eu falei em alto e bom som na sala pro Edu também escutar:
- Ah, nesse caso, eu vou ter que fazer uma vistoria nesse local aqui, que eu não conheço as características, olha! – olhei o relógio – cinco e pouca, já. Pouxa, que droga... Agora só amanhã.
O Jimmy chegou perto de oito da noite na casa do Edu, com os quatro DVD's na mão – e tomadinho banho, que nem no dia anterior.
- Pô, foi mal a demora, é que ele tava numa má vontade do caraio pra me emprestar esse negócio... tive que jurar pra ele que levava amanhã de volta...
- Nossa, a gente vai assistir tudo hoje? Dou conta não, fio... – respondi.
- Ô jumento! A gente tira cópia, né? Eu vou fazendo as cópias enquanto a gente começa a assistir.
- Ah, tá...
O quarto do Edu era o retrato das grandes catástrofes mundiais, tsunamis, furacões, enchentes. Era roupa, caderno, papeis, ocupando todos – todos – os espaços vazios. Quando sobrava, podia se enxergar uma cama de solteiro, algumas prateleiras atrás da porta, entupidas de livros, e num canto um rack com um computador.
Porém, ele conseguia "organizar" tudo rapidinho; juntava tudo o que coubesse e saía abraçado a esse monte de coisa, levando para algum lugar desconhecido da casa, assim, liberando o espaço necessário para nos instalarmos.
E é claro que eu ia zoar.
- Olha, gente, o piso do quarto dele é marrom... Nunca tinha tido a oportunidade de ver...
- ...era piso mesclado de calça e cueca... – o Jimmy completou minha observação.
- Ajudar a arrumar, ninguém se dispõe, né? – ele já estava voltando – Ó, a gente vira a tela pra cá e eu coloco dois colchões aqui do lado da cama, dá pra assistir de boas.
Foi o que fizemos. A tela virada pra o lado dos colchões, Edu pegou uns travesseiros, colocou o DVD e eu fui logo me sentando, com um travesseiro no colo. Edu perguntou se queríamos pipoca, mas ninguém topou.
- Edu, eu queria um copo d'água, só – o Jimmy pediu.
Enquanto Edu ia na cozinha, o Jimmy, que estava sentado na cama do Edu, desceu pro colchão, sentando ao meu lado. Eu fiquei enrolando a ponta do lençol com o dedo, olhando pra baixo, mas sentia que ele olhava pra mim.
- E aí..? Tá tudo bem? – perguntou.
- Sim, sim... e contigo? – a gente já se olhava, meio que rindo.
- Eu? Tô ótimo, tá... tudo... maravilhoso... rsss.
Rimos juntos, e eu voltei a olhar pro meu travesseiro. Ele encostou o dedo mindinho na minha mão e ficou alisando-a, tentando sentir a minha reação. Eu o olhei sério, e ele fitou a minha boca.
- Trouxe logo a jarra de água pra não ficarem depois pedindo – o Edu entrou, deu o copo ao Jimmy e despejou. Eu instintivamente me afastei um pouco pro lado – ó, a gente podia pedir alguma desgraça pra comer depois, que acham?
- É, é uma boa.
Começamos a assistir, depois que o Edu apagou a luz e todo mundo se acomodou.
De fato, tinha esquecido como eu gostava de Os Maias, até hoje acho uma das melhores coisas que a Globo produziu. Eu já tinha lido o livro de Eça de Queirós duas vezes, e a adaptação é muito fiel, tem diálogos inteiros iguaizinhos. A autora deu uma incrementada no final, mas nada que mudasse o espírito da obra.
De vez em quando o Jimmy dava um jeito de encostar a perna na minha, ou de passar a mão em meu joelho, sem que o Edu percebesse. Eu adorava, mas me mostrava impassível, morria de medo de dar bandeira.
Já eram quase onze quando a gente decidiu dar uma parada. Nem pedimos nada pra comer, ninguém tava afim.
- Eu mesmo só quero saber onde vou me escorar – falei – tô podre de sono.
- Novidade. Nem sei como tu aguentou ficar até agora... rsss – o Edu respondeu – deita na cama mesmo que eu me espalho aqui no colchão.
- Nunca vi a visita despejar o dono da cama, Edu...
- Se eu dormir na cama, eu acabo caindo no chão mesmo. Melhor já ficar por aqui.
- Ah, é. Esqueço que tu vaga pela noite. Bom, então, me dêem licença que eu vou partir – dei a mão pro Jimmy que estava em pé, perto da porta, pra me ajudar a levantar – valeu, Jimmy. Xô escovar meus dentes.
Ele estava calado até então, apenas observando.
- Bom, então, eu já vou indo... – ele me olhava, eu senti que ele queria que eu o levasse até a porta. Quem sabe, né. O Edu interrompeu:
- Bicho, já tá tarde. Tu não quer dormir aqui não, pô? Amanhã tu desce.
Percebi que ele tinha adorado a sugestão, embora ainda tivesse negado a princípio, uma negativa bem fraca. Edu insistiu uma vez só e ficou resolvido, ele dormiria lá, no outro colchão ao lado do Edu. Ainda pensei em insistir pra dormir no chão também, mas agora ia ficar muito na cara.
Deitei e ficamos conversando ainda por um tempo, o Edu e o Jimmy tinham assunto pra mais uns três anos sem parar. Não sei que horas eles foram dormir, porque eu não me lembro a hora em que caí no sono de vez. Deve ter sido uns três minutos depois.
Acordei no meio da noite e estava tudo escuro no quarto, ouvia-se apenas o barulho da respiração profunda do Edu. Meu rosto estava virado pra a parede, e só entendi o porquê de ter despertado quando me virei. O Jimmy estava com o queixo apoiado na beira da cama, quase sentado, me observando, e alisando a minha mão. Meu coração descompassou com o susto, mas fiquei quieto, porque o silêncio era muito grande. Fiquei virado pra ele um tempo, não conseguia ver seu rosto direito.
A sua mão lentamente largou da minha e procurou no escuro o meu rosto, alisando-o lentamente. Era muito bom aquele carinho. Fechei os olhos e beijei a sua mão, que deslizou até a minha nuca, me puxando pra perto.
Eu obedeci, embora com cuidado, pois a cama rangia. Coloquei meu rosto bem próximo do dele, que procurou a minha boca e me deu um selinho demorado. Roçamos os nossos narizes, eu alisei seu cabelo moicano, e demos mais um selinho. Ele abria a boca pra um beijo. Procurei a sua orelha e sussurrei o mais baixo que pude:
- Vai fazer barulho...
- Barulho de que? – ele falava na minha orelha e a mordia, me fazendo arrepiar inteiro.
- Barulho de beijo...
- Não...
Ele me beijou, um beijo longo, mas cuidadoso. A cama rangeu e o Edu se mexeu, fazendo a gente se apartar. O Jimmy deitou novamente e eu me arrumei na cama, me cobri. Deitei mais próximo da ponta da cama, fiquei tentando visualizá-lo no chão. Minha mão chegou até seu peito e eu o alisei, e ele apertou-a. Ficamos assim um tempo, de mãos dadas, cochilando, depois eu me desvencilhei, para tentar pegar no sono de novo.
De um pulo só, o Jimmy saiu de onde estava e pulou na cama, fazendo um barulho enorme. Colocou a mão na minha boca antes que eu pudesse gritar, e imprensou seu corpo em cima do meu, entrelaçando as nossa pernas. Entrei em pânico.
- Nãaao...
- Shhhh...
- Jimmy, não...
- Calma, pera...
Ele me beijou de uma forma mais urgente, gulosa, enquanto explorava meu corpo com as suas mãos. Colocou as duas mãos na minha bunda, apertando-a, roçando o corpo no meu, fazendo-me sentir a sua ereção. Levantou o corpo para se livrar do lençol que estava entre a gente e roçou mais ainda os nossos corpos, senti que ele estava só de cueca. Os nossos corpos quase nus em contato. A sua pele era muito lisa, gostosa, a temperatura do seu corpo estava alta. Senti seu tórax, explorei suas costas com as minhas mãos. Por uns segundos eu até esqueci a situação toda, mas a cama não parava de nos denunciar.
- Desce, pelo amor de Deus...
Ele desceu, rapidamente, se ajeitou, e eu coloquei a mão no peito pra saber se o coração ainda estava ali.
Acordei com o barulho dos dois rapazes procurando seus pertences, a claridade no quarto também já estava alta. Me espreguicei e o Edu se virou pra mim:
- Bom dia! Pretende trabalhar hoje?
- Ô... se eu pudesse ficava mesmo... odeio acordar cedo – bocejei – aliás, odeio acordar...
Jimmy riu. Estava de bermuda de pano, sem camisa, e a visão me fez rapidamente relembrar o que tinha ocorrido aquela noite. Como que pra espantar meus pensamentos, levantei rápido e fui ao banheiro escovar os dentes e fazer xixi. Quando saí o Edu já estava na porta, de toalha no ombro, aguardando.
Entrei no quarto pra procurar uma roupa enquanto o Edu tomava banho, e o Jimmy estava lá ainda, em pé.
- Bom dia...
- Bom dia – respondi – já tá indo?
- Sim... – ele veio se aproximando devagar, com a cara mais maldosa do mundo - ...na verdade, eu queria uma carona sua...
- Ah, é? – sentei na cama do Edu, disfarçadamente, pra evitar que ele tentasse algo. Morria de medo de ser pego pelo Edu ou por alguém da família dele – eu pensei que tu tivesse vindo de moto...
- Não – ele se aproximou da porta do quarto e fechou-a, e eu olhei pro outro lado – o meu amigo pediu emprestado pra sair com uma mina, e eu emprestei.
- Ah..
Nos olhamos. Ele, parado na porta, não disse nada, mas sabíamos o que queria. Ri, de nervoso, imaginei mil desastres acontecendo. O Edu entrando de vez, ou no mínimo perguntando porque a porta estava trancada. A sua mãe, pai ou irmão. Pareciam estar dormindo, os quartos ainda fechados, mas... Por outro lado, o vi ali, sem camisa, o tórax e abdômen sem um pelo, moreno meio castanho, cabelos ainda bagunçados e olhos de mel brilhando contra a luz que entrava pela pequena janela... eu não tinha condições de recuar àquilo, pois, no meu íntimo, eu pedia. Era impossível ver aquele corpo querendo me dar prazer e não ir até lá, a tão poucos passos, tão disponível e... enfim.
De um salto levantei e o apertei com meus braços, e nos beijamos da mesma forma que antes, como se um quisesse engolir o outro. A minha mão explorava todo o seu corpo, seus cabelos, sua cintura e seu quadril, e ele explorava a mim com uma agonia igual. Mordia a minha orelha, beijava meu pescoço, meus lábios. Me jogou de encontro à porta, me levantando. Eu abri as pernas e o encaixei, cravei as minhas unhas em suas costas e desci até a sua bermuda, e ele gemeu, revirando os olhos. Por cima do seu pescoço vi que a sua bermuda estava desabotoada, quase caindo, e pude notar as curvas do seu bumbum aparecendo. Não resisti. As minhas mãos exploraram seu derrière, expulsando aquela bermuda, deixando-o praticamente nu, e gemi de prazer.
- Como você é gostoso..
- Você que é...
- Eu quero você...
Ele pegou a minha mão e levou até o seu corpo, descendo lentamente, e pude perceber o quanto ele estava excitado. Ele colocou as duas mãos nas minhas costas e desceu, por baixo do meu short, apertando e trazendo para si.
Senti um solavanco muito forte atrás de mim, arregalei os olhos, saindo do transe. Era o Edu, que tentava entrar. Bateu na porta.
- Meu Deus!
- Calma!
- Oi! Abre aqui!
Jimmy se virou, ajeitando a bermuda, eu sentei na cama, ofegante e ele abriu a porta. Edu entrou, com uma expressão estranha.
- Porque vocês trancaram a porta??
- Não tava trancada, eu..
- Tava trancada sim, eu tentei abrir e não consegui!
- Não, eu que tava mexendo na minha mochila ATRÁS DA PORTA, aí você tentou entrar e bateu em mim...
Edu me olhou desconfiado. Apontou para o outro lado do quarto e disse:
- A sua mochila tá lá. Se você tava procurando.
Olhei e não tive coragem de virar o rosto de volta. Não tinha nada atrás da porta.
- Na verdade – o Jimmy quebrou o silêncio – eu tranquei a porta mesmo, Gustavo.
- Ah, foi?
- É que eu ia me trocar e fiquei com receio de alguém aparecer, a sua mãe, sei lá...
Edu apenas olhava. Depois disse:
- A minha mãe não entraria aqui.
- É, Jimmy – eu não sabia o que dizer – ela não entra aqui...
- Ah, sei lá, pensei.
Edu virou pra mim.
- Cê vai tomar banho agora? É melhor ir logo, o pessoal começa a acordar e fica meio concorrido.
- Tô indo já.
Passei por eles super sem graça, me tranquei no banheiro e comecei a respirar.
Quando voltei eles já estavam conversando sobre outros assuntos, mas, não sei se foi a minha consciência que estava gritando, o meu medo, mas senti um clima super pesado ali.
- O Jimmy quer uma carona até a casa dele.
- Tudo bem, a gente leva lá.
Deixamos o Jimmy em casa depois de um trajeto meio silencioso, e depois que ele desceu o Edu ficou observando-o se afastar. Bom, se ele fosse tocar no assunto e perguntar alguma coisa seria ali, naquele momento, e eu prendi a respiração de novo.
- Jimmy é uma figura, né? Rss.
Só falou isso, concordei, sorri e fomos pro trabalho.
A manhã passou voando, fiquei lá na empresa e o Edu acabou fazendo a vistoria comigo depois. Chamamos o Jimmy pra almoçar e ele aceitou. O climão tinha sumido completamente, se é que alguma vez existiu. Fiquei pensando que foi da minha cabeça mesmo, ele na verdade só queria saber porque tínhamos trancado a porta.
- E aí, hoje vai rolar o bagulho de novo? – Jimmy perguntou.
- Que bagulho? – franzi a testa.
- A segunda sessão do cinema em casa.. rss.
- Ah.. rss. Sei não, acho que dev..
- Porque você não fica aí, cara? – Edu me interrompeu – trabalha por aqui mesmo, na salinha, de noite a gente assiste, faz alguma coisa...
- Ah, não sei...
- Fica aí, pô – o Jimmy insistiu.
- Gente, eu vou dormir mais uma noite aqui? Nem roupa eu tenho pra trocar...
- Ó, se ficarem demorando demais eu vou terminar de assistir sozinho a minha porra, viu? Vocês são enrolados, eu não gosto de ficar assistindo assim, pingado não.
- Vixe, se estressou.. – a gente riu do Edu.
- Claro! Eu só assisto série em maratona. Não gosto de ficar assistindo de pouquinho em pouquinho.
- Hum – pensei um pouco. A lógica já havia me abandonado há tempos – tá bom, então eu fico, né? A gente assiste mais hoje.
A arrumação do quarto ficou a mesma, os dois colchões no chão, lado a lado, e a tela virada pra nós. Dessa vez pedimos pizza, o pai do Edu entrou na divisão, mas a gente só saiu do quarto na hora de comer, rapidinho, e voltamos pra assistir. Adiantamos muito. Cada DVD tinha quatro horas de minissérie, já estávamos na metade do segundo.
Às vezes eu sentia vergonha da família do Edu, sei lá. O fato de ficarmos trancados no quarto, tudo escuro, de vez em quando saía alguém só pra mijar e voltava, talvez alguém pudesse pensar besteira. Ou era a minha consciência mais uma vez me torturando, fruto das tantas vezes que pensavam bobagens da minha pessoa, só porque eu era um pouco diferente. Fiquei com a neura só pra mim.
Talvez por causa disso, nesta noite, nada rolou entre a gente. Depois que demos pausa na sessão, eu me recolhi, eles ficaram conversando até altas horas, depois caíram também. Na manhã seguinte, enquanto o Edu estava no banheiro, ele me pediu um abraço, e ficamos assim, entre curtindo e atento aos barulhos da casa, só abraçados. Eu me recostava no peito dele e era tão bom, porque ao mesmo tempo ele alisava minha nuca como que para me relaxar.
- Tô adorando estar com você esses dias... – ele sussurrou – obrigado por me oferecer isso...
- Eu também tô amando, amando...
Nos afastamos, meio a contragosto, depois nos abraçamos de novo e demos um selinho. Eu fui arrumar as minhas coisas e ele também.
O Edu voltou pro quarto e ele se despediu da gente, saindo logo depois. Estava de moto desta vez. Era feriado de primeiro de maio, mas mesmo assim eu tinha que voltar pra Feira de Santana, pra cuidar do meu trabalho. Uma hora teria que botar o pé na realidade. Me despedi do Edu perto de onze da manhã e peguei a estrada.
Durante todo o trajeto eu repassava os acontecimentos dos últimos dias, parecia que estava voltando de uma outra viagem, mais longa, sei lá. Estava sol, o vento batia na minha cara pela janela do carro, eu fumava um cigarro e pensava... A vontade de ficar era enorme, talvez dar uma saída, conversarmos mais, os três, eu ficava perto dele mais tempo... mas tinha que trabalhar naquele feriado, então fiquei tentando reprimir os pensamentos que vinham à tona, aquela tristeza que batia.
O universo deu uma mãozinha pra diminuir um pouco a minha bad, e assim que entrei na cidade, o Daniel ligou pra mim. Estava na rodoviária de Feira, tinha acabado de chegar, e estava querendo saber do meu paradeiro.
- Genteee, que coincidência... tô entrando em Feira agora, Dan!
- Tava aonde?
- Em Camaçari!
- Pô, que massa! Velho, passa aqui então, me pega! Vamo almoçar em algum lugar!
- Demorou, desça e venha pelo GBarbosa!
Não demorou cinco minutos e eu já tava estacionado próximo da saída do desembarque. Foi incrível como meu humor melhorou da água pro vinho, já estava animado de estar em Feira só pra poder ver o Dan. Quando ele apareceu eu desci pra abrir a mala, porque, como sempre, estava carregado de saco, sacola, mochila, todo desajeitado. Nos abraçamos, dei uns tapas nele e fomos almoçar.
Rimos demais. A gente repassou todos os episódios da micareta, o Murilo invadindo o banheiro químico, as palhaçadas dos meninos.
- Como é que tá o Murilo, hein?
- Murilo? – alteei as sobrancelhas – nem sei, nunca mais eu vi.
- Ué, tu não tava lá esses dias todos?
- Pois é... verdade. Cheguei lá na segunda... deixa eu ver... ah! Lembrei. Na segunda eu já cheguei no finalzinho de tarde, Murilo já tinha ido pra Salvador, pra a faculdade. Na terça ele não tava em Camaçari, tinha pedido folga na empresa porque tá em período de provas, então ele fica lá em Salvador até amanhã estudando. Aí, a gente nem se bateu.
- Nem se falaram, por telefone?
- Não.
- Que milagre de Deus, ó Senhor!
- O que, idiota?
- Vocês desgrudaram!
- Ai, começou.
- E o povo lá, como tá? Viu mais alguém? Cadê aquele colega de Edson? O da dancinha?
- Jimmy? Ah, tá bem.
- Você encontrou com ele lá?
- Sim. Na verdade ele passou na casa do Edu uma noite dessas.
- Aquele bicho é uma figura, esquisito todo.
- Esquisito?
- É, sei lá. Aquele moicano, todo caladão, fica só olhando...
- Acho que ele é tímido.
- Não sei. Tu não achou ele esquisito não?
- Ah... não sei. Esse povo que faz História é tudo doido, deve ser a maconha que deixa assim, come o juízo.
- Kkkkkk!
Deixei o Dan em casa umas duas da tarde.
- Gu, e aí, quer sair mais tarde? A gente pode ir comer a coxinha lá da Queimadinha.
- Hum, pode ser. Mas eu te confirmo. Porque eu tô atolado de trabalho, vou chegar em casa agora e me enterrar. Se eu conseguir adiantar, a gente vai.
- Tanto trabalho assim?
- É, Valquíria me passou um monte até a semana que vem, e eu acabei me atrasando porque só vim hoje...
- E porque não veio antes?
- Ah.. é... tinha trabalho da campo pra fazer.
- Ah. Bom, qualquer coisa ligue.
- Tá.
- E se não der pra a gente se ver hoje mais, ó: eu tó indo pra Salvador amanhã, que eu vou prum curso, aí na sexta eu já volto pra cá, e só vou pra Itaberaba no domingo. Bora fazer alguma coisa?
- Beleza, a gente faz, sim.
Como planejado, me enterrei no computador depois que cheguei em casa e fui até umas nove da noite.
Decidi dar uma parada, porque minhas vistas estavam reclamando. Nessa hora tinha me dado conta que eu tava tão concentrado que nem fiquei lembrando do Jimmy, como antes. A saudade voltou.
O que ele estaria fazendo àquela hora? Será que ele também estava daquele jeito, pensativo, ainda envolvido nas lembranças dos últimos dias que nem eu? Depois pensei que se eu quisesse falar com ele, só se fosse pelo msn ou Orkut... não tinha o seu celular. Mas também, se tivesse, nem sei se ligava.
Nesse momento o meu celular que estava na cozinha, do outro lado da casa, começou a tocar. Era um Nokia 2100 com aquele toque polifônico horroroso, mas que me fez correr, voar, porque eu já sabia quem era. Institivamente falei alto "Jimmy!", e alcancei o aparelho. O número que apareceu era de um telefone fixo desconhecido, mas pelo prefixo eu percebi que era de Camaçari.
- Alô...
- Oi... Gustavo?
- Sim, é ele.
- Como é que tá, hein? Aqui quem tá falando é o Jimmy...
- E aí!! Tudo bom? Eu tô bem, sim. Tô em casa, trabalhando...
- Chegou bem de viagem? Direitin?
- Sim, tudo de boa... e tu, fez o que hoje?
- Ah... nada de interessante... fiquei em casa, agora tô dando um rolê aqui com um colega meu, encontrei um orelhão, aí deu vontade de saber de você...
Realmente eu ouvi o barulho da rua e das unidades do cartão telefônico caindo, uma a uma.
- Ah, que massa... rss. Comprou um "caiirtão"?
- hahha, cê vai me zoar, né, mano? Kkk
Eu ouvi de longe o colega perguntando a ele quem era, e ele respondeu "um amigo", depois falou algo como "pode ir que eu tô indo lá".
- É um colega meu que tava aqui do lado, rss.
- Ah...
- Eu... bom. Eu vou desligar pra você poder... não vou te atrapalhar, não.
- Não atrapalha, bobo. Eu tava de boa. A gente pode conversar à vontade...
- Ah... é, e na verdade, o meu cairtão tá acabando, já já cai. É por isso também.
- Ah! Kkkk!
- Kkk!
- Então, tá! – eu queria dizer alguma coisa, mas não sabia o que – então... tchau, né?
- Deixa eu falar rápido, porque na verdade eu só liguei pra falar isso: eu queria dizer que eu tô com a mó saudade de você. E que eu queria ouvir sua voz hoje ainda, antes de ir dormir.
- Ai, pouxa, nem fale... eu..
- É isso. Beijo, beijo...
- Olha, eu também tô com...
A ligação tinha sido encerrada. Fiquei olhando pro aparelho, aquele teclado branco, ainda aéreo. Meu coração estava acelerado e a boca seca, ele estava com saudade. Mó saudade! Aquele sotaque paulistinha, aquela voz dengosa, nossa.
Entrei no quarto, caí na cama, fiquei olhando pro teto umas duas horas repassando aquela pequena conversa, até levantar pra procurar alguma coisa pra comer.
E é claro que entre uma planilha e outra, ao longo daqueles dias, eu fuçava o perfil dele no Orkut. Recados, depoimentos, mudanças de status... Era uma forma de mantê-lo perto, saber o que se passava na vida dele, enfim.
No sábado de tarde ele colocou a letra de "Love Is a Losing Game", da Amy. Colocou a letra original, e eu fui buscar a tradução, que eu já conhecia, mas desta vez eu li de um jeito diferente, como que procurando algo para mim, um recado, uma dica de como estava a sua cabeça com aquilo tudo:
O Amor É Um Jogo de Azar
Pra você eu fui uma chama
O amor é um jogo de azar
Cinco andares se incendiaram quando você me chegou
O amor é um jogo de azar
Porque eu desejo nunca ter jogado
Oh, que estrago nós fizemos
E agora o lance final
O amor é um jogo de azar.
Em jogo na mesa
O amor é uma aposta perdida
Acima do que eu poderia cobrir
O amor é uma aposta perdida
Auto-declarado "profundo"
Até as fichas se acabaram
Sei que você é um homem de apostas
O amor é uma aposta perdida
Apesar de estar bastante cega
O amor é um resignado destino
Lembranças arruínam minha cabeça
O amor é um resignado destino
Acima de fúteis probabilidades
Ridicularizado pelos deuses
E agora o lance final
O amor é um jogo de azar
A leitura só serviu pra me deixar mais confuso ainda.
Bom, pelo menos eu era "cinco andares pegando fogo" pra alguém, será?
Ou, simplesmente, ele gostou da letra, botou lá e pronto.
No sábado à noite, como anteriormente combinado, dei uma saída com o Daniel. Passei em sua casa e depois na casa da Liziane.
- Quem é essa? – ele perguntou, assim que eu comuniquei que ela sairia conosco também.
- É uma colega minha, da faculdade. Quer dizer, hoje ela é engenheira também, e, assim como você, não mora aqui em Feira, mora em Salvador... aí sempre que vem em Feira, assim como você, ela me cobra uma saída. Bom, vou juntar os amigos, assim não fico devendo a ninguém.
- Eu conheço?
- Acho que não... Nunca saímos juntos. Ah! Lembra daquela colega que eu te falei... ela estava no msn comigo conversando, quando eu trabalhava ainda lá na empresa de Camaçari, aí o Diego perguntou quem era, botei a webcam, eles se adicionaram...
- Ah... aí o Diego teve aqui e deu uns pega nela.
- Isso! É essa.
- Hum.. bom, não conheço, mas já sei os antecedentes..
- Já é alguma coisa, hehehhee...
Pegamos a Liz na casa dela, apresentei um ao outro e fomos no carro conversando, trocando ideia, enquanto resolvíamos o destino. Ela foi logo despachando:
- Meninos, eu sei que sou daqui, como todos nesse carro, mas, olha... tem tempo que moro em Salvador, então não conheço mais nada da noite feirense.
- "Noite feirense", é ótimo, né, binha? - respondi
- "Binha"? – o Daniel estranhou.
Rimos, os dois.
- Ah, meu filho! – ela deu um tapa na nuca dele, do banco de trás do carro, e ele se assustou – isso é uma longa história. Quer ouvir?
- Hum?
- Ou não quer ouvir?
- Ouvir?
- Faaaaalaaa, porra! Quer ou não quer ouvir?
Eu só ria, acompanhando o diálogo dos dois, o Dan me olhava tipo: "quem é essa maluca?"
- Então conta, logo, caralho!
- Se não quiser ouvir também, fale!
- Eu quero ouvir!
- A gente fazia faculdade, né? Aí a gente tava fazendo um trabalho de final de curso, era um projeto estrutural, né, binho? Que a gente tinha que entregar, e aí, tinha um elemento na equipe que eu não ia muito com a cara, o Igor, quer dizer, hoje eu até gosto dele. Hum. Mais ou menos. Hum... Não, gosto mesmo. Sim, mas nesse tempo eu não gostava.
- Hum... interessante.
- Aí, teve um dia que... interessante o que? Tá de sacanagem, é? Binho, eu mando ele tomar no cu?
- Não, binha, ele é gente boa... – respondi, rindo.
- O que eu foi que eu falei, meu Deus?
- Que a história era interessante. Você estava sendo sarcástico.
- Nãaaao, eu estava realmente achando a história interessante... rebocado mesmo.
- Rebocado, chapiscado, pintado?
- oi?
- Deixa eu contar! Aí, teve um dia que a gente começou a discutir e ele me chamou de binha. Pera, porra. Binha? Eu me estressei! Falei: ó, eu ODEIO esse tipo de adjetivo que mostra claramente que a pessoa está sendo falsa. Binha, amada, fofa, quirida...
- Minha flor...
- Minha flor! Eca!
- Hahahaha
- Bom, aí o palhaço do teu amigo – ela apontou com o dedo polegar pra mim – começou a me chamar de binha, só pra me provocar. Véi... o outro também pegou e foi assim até o fim do semestre..
- Gustavo então nunca prestou...
- Nunca. Só que aí eu entrei na brincadeira, né? Resultado, o semestre terminou, a gente ficou se tratando assim, e pronto! Bom, é isso. E aí, gente? A gente vai ficar rodando de carro mesmo pela cidade?
Decidimos parar num barzinho na João Durval, "O Botekim", um lugar novo, bem aconchegante. As mesas eram em madeira rústica, os bancos também, e tinha uma banda tocando na hora. O papo fluiu maravilhosamente, o Daniel primeiro se acostumou e depois adorou a louca da Liz, então tudo virou piada. A minha amiga era realmente maluquinha, além de tudo hiperativa, e muito gente boa. Ela falava mais rápido que podia, às vezes se embaralhava, o papo também era meio randômico, mas no final era massa tudo.
A gente decidiu ir pra outro lugar, porque lá não tava tão animado assim e porque a gente queria ficar rodando mesmo. Parávamos na porta dos bares, olhávamos e decidíamos. Na terceira parada, um bar que funcionava em cima de um comércio, colocamos a cabeça pra fora do carro pra observar. Não se via muita coisa, mas o som que saía do ambiente era bem agradável. Daniel perguntou:
- Vocês estão pensando em, tipo, entrar aí, é?
- Eu tô gostando da música.. – respondi
- Também... – Liz respondeu – mas não dá pra ver muita coisa, tá meio escuro...
- É aquela luz negra, né? Gente, sei não, esse lugar é meio baixo astral... – o Dan tava meio receoso.
- Baixo astral porquê?
- Essa área aqui, gente... aqui só tem puta.
Liziane arrumou a blusa e respondeu:
- Mas eu sou uma puta.
- Oi?? – Daniel arregalou o olho.
- Qual o problema? O que você tem contra as putas? Sou mulher, engenheira civil e puta.
- Nada contra, mas é que não parece...
- Não me ofenda. Pareço sim! Mas deve ser porque eu sou uma puta chique. Prazer, meu nome é Nati'n Euro.
- Nati'n Euro?
- É, Porque eu só recebo em euro. Nem venha com dólares que eu me empolo toda.
- Meu Deus, Gustavo, porque eu ainda saio contigo?? Kkkkk!
Descemos, pedimos uma mesa, e mais divertido não poderia estar em lugar nenhum. Estava tendo um encontro de estudantes e professores de dança de salão, a banda tocava aqueles clássicos, os cavalheiros e as damas vinham nos convidar pra dançar, o Daniel se acabava de rir com os passos que eu a Liz improvisávamos... muita maluquice.
Só tinha uma coisa que estava impedindo a minha diversão, a minha entrega total naquele momento: a minha cabeça estava em outro lugar. Eu não parava de pensar no que o Jimmy pudesse estar fazendo, ou se ele estava tentando me contatar, ou se não... Tínhamos nos encontrado no msn bem rapidinho, e ele tinha dito que iria entrar naquela noite, depois da meia noite, pra a gente conversar (nessa época, mais precisamente na era pré-cambriana, anterior ao período paleozoico, quem tinha conexão discada, ocupava a linha do telefone e tinha tarifas mais baratas pra usar a internet em horários ermos). Logo, depois de um certo horário, eu fiquei compulsivamente olhando o relógio e rezando pra que o pessoal desanimasse. Descobri que trocaria de boa aquela noite agradabilíssima pra estar naquele momento na frente do computador, com ele.
Mas o tempo foi passando, e de cinco em cinco minutos percebi que já passava de uma da manhã, ele não estaria esperando ainda. Quando o pessoal decidiu ir, graças ao sono da Liz, que já chegou derrubando-a, eram quase duas.
Entrei em casa, e só por desencargo de consciência, entrei no msn pra ver. Ele não estava mais online, mas a janelinha pulou indicando que ele tinha tentado me encontrar. Havia várias mensagens para mim.
Primeiro era um arquivo mp3, uma música da Amy, que, de cara, conseguiu me emocionar.
https://youtu.be/ZWtZUujPRmQ
There is no greater love
Than what I feel for you
No sweeter song, no heart so true
There is no greater thrill
Than what you bring to me
No sweeter song
Than what you sing, sing to me
You're the sweetest thing
I have ever known
And to think that you are mine alone
There is no greater love
In all the world, it's true
No greater love
Than what I feel for you
Não há amor maior
Do que o que eu sinto por você
Nenhuma canção mais doce, nenhum coração tão verdadeiro
Não há emoção maior
Do que a que você traz pra mim
Nenhuma canção mais doce
Do que a que você canta, canta pra mim
Você é a coisa mais doce
Que eu conheço
E pensar que você é totalmente meu
Não há amor maior
Em todo o mundo, é verdade
Nenhum amor maior
Do que o que eu sinto por você
Jimmy SP: desculpa qq coisa
Jimmy SP: Pode tar ficando chato mas
Jimmy SP: Eh que as vezes o troço fica batendo tanto na kbç da gnt que transborda e sei la tem que flar
Jimmy SP: Cara, esses dias eu n to conseguindo fzr nda, eu so penso em vc, no que tivemos aqui
Jimmy SP: Sei que to flando isso e posso parecer maluco ou qq coisa do tipo afinal de contas a gnt não tem nd
Jimmy SP: Mas eu to super ligado em vc
Jimmy SP: Na vdd nem é essa a palavra... na vdd eu to
Jimmy SP: apaixonado mesmo
Jimmy SP: por ti
Jimmy SP: A impressão q eu tenho as vzs eh q meu coração vai explodir toda vez que me lembro do seu rosto, do seu cheiro, do seu sorriso, das coisas que vc fala
Jimmy SP: Entrei aqui numa esperança louca de te encontrar, fikei o dia todo esperando esse momento, mas entendo que vc tem sua vida e deve vive-la
Amy tocava no meu ouvido "nenhum amor maior do que eu sinto por você" enquanto eu lia uma verdadeira declaração, descobrindo que aquilo tudo que eu estava vivendo e tentando entender e talvez até represar, ele também compartilhava... foi... impactante, emocionante, para dizer o mínimo.
Pela primeira vez na minha vida, depois de tanto viver histórias ocultas, proibidas, mal resolvidas, eu experimentava a sensação de amar e ser amado de volta. Lembrei de algumas outras vezes em que me senti só, fantasiando coisas que só existiriam na minha cabeça, ou das vezes em que, depois de uma decepção, eu repetia pra mim mesmo que a vida era daquele jeito e que a culpa era minha de ter esperado por mais... E agora... há dias eu não paro de pensar em alguém, irracionalmente fico desejando estar sempre próximo, e, olha só, ele também quer o mesmo.
E depois do contentamento veio o medo.
A pergunta que rodou na minha mente foi: até quando? Até quando esse sentimento se manterá assim, considerando toda a realidade que me cerca, meus problemas, o preconceito do mundo, nossas famílias... o que há por vir? Até quando eu teria aquela pessoa me amando, desejando a mim, como naquele momento, até quando eu seria o bastante para ela? Aquele pavor do futuro veio com tudo, e, do nada, comecei a chorar, chorar, espremendo o rosto com as mãos, querendo não pensar que aquilo era uma ilusão e que um dia eu ia cair dessa nuvem com tudo, espatifando a minha cara em meus problemas.
Li e reli as suas palavras, e de repente o msn avisou: "Jimmy SP acabou de entrar"
Luiz Gustavo: oii
Jimmy SP: td bom?
Luiz Gustavo: agora mais que nunca
Jimmy SP: rsss
Jimmy SP: Eu tava off te vi entrar, não resisti
Jimmy SP: Posso pedir uma coisa?
Luiz Gustavo: tudo
Jimmy SP: rsss
Jimmy SP: Deixa eu te ver
Jimmy SP está te convidando para conversar via webcam
Você aceitou o convite
JimmySp: aaah...
JimmySp: Que saudades desse rosto lindo
JimmySp: Que sds de nos 2
JimmySp: :/
Luiz Gustavo: tb
Luiz Gustavo: Mta mta
Jimmy SP: c ta chorando?
Luiz Gustavo: no
Luiz Gustavo: Sono
Jimmy SP: jura?
Luiz Gustavo: to um pouco
Jimmy SP: ?
Luiz Gustavo: axo q um pouco de emoção
Luiz Gustavo: Eu tava lendo suas mensagens
Jimmy SP: po
Jimmy SP: desculpa
JimmySp: n queria forçar nd
JimmySp: so desabafar msm
Luiz Gustavo: não tem o q
Luiz Gustavo: E q peço desculpas
Luiz Gustavo: Eu que
Luiz Gustavo: Eh q foi tudo tao lindo
Luiz Gustavo: Posso te dizer que to sentindo o msm
Luiz Gustavo: Sem saber ainda como lidar c isso
Pela imagem da câmera dele eu o vi colocar as mãos na boca, lendo as minhas palavras recém enviadas, e pude ver a emoção brotando aos poucos no seu olhar. Ele ficou apenas olhando pra a tela, meio bobo. O seu quarto estava todo escuro e só pude vê-lo por conta da luz do monitor.
Luiz Gustavo: sim
Luiz Gustavo: Axo q to apaixonado
Luiz Gustavo: Oi
Luiz Gustavo: Q foi
Jimmy SP: nd
Jimmy SP: então foi bom eu desabafar
Luiz Gustavo: sim
Luiz Gustavo: Pq eu tava axando que era doideira minha
Luiz Gustavo: Mais uma ne :/
Jimmy SP: hehehe nesse caso não
Luiz Gustavo: Quer dizer
Luiz Gustavo: Pode ate ser doidera mas é nossa
Luiz Gustavo: Compartilhada
Luiz Gustavo: E quero viver essa loucura contigo
Luiz Gustavo: Se vc deixar
Quanto mais o papo evoluía, menos eu conseguia controlar o fluxo de pensamentos na minha mente. Estava tudo indo rápido demais (para mim). Que era aquilo? Já estávamos falando em sentimento, paixão... amor? Em que momento o flerte virou sentimento? Não saberia dizer. A razão não fornecia nenhuma resposta pra mim, muito menos alento para o meu peito cheio de medo. Só o que a minha mente me dizia era "você vai se foder", enquanto eu decidia se me jogava ou não naquele precipício.
Como que lendo meus pensamentos, ele partilhou comigo praticamente todos os seus receios, e até a similitude das nossas apreensões era pra mim algo a se considerar extraordinário: as suas experiências anteriores, também frustrantes; a descrença de que algo possa sobreviver ileso ao preconceito; mas, antes de qualquer coisa, o sentimento que estava lhe tomando posse.
Também ficamos tentando marcar alguma coisa, dar um jeito de se ver pessoalmente. Comentei que iria a Salvador nos próximos dias e ele até se animou com a ideia:
Jimmy SP: talvez lá seja mais fácil da gente dar um perdido no povo e ficar quietinho se curtindo na boa ;) ;)
Luiz Gustavo: hahaha verdade
Luiz Gustavo: Podíamos tirar uns momentos só pra nós
Luiz Gustavo: Fico lá de quarta a sexta
Jimmy SP: pouxa
Jimmy SP: Quem sabe eu não consigo um jeito? Te encontro lá...
Luiz Gustavo: hummm
Estávamos saboreando a ideia, e só isso já era o suficiente pra a gente se animar.
Fui dormir quase quatro horas da manhã, passeando entre a felicidade, o contentamento, e a tristeza e medo do futuro.
O domingo não foi diferente, eu fiquei o dia todo na frente do computador, alternando entre a tela do AutoCAD, Excel, e msn. Ele se portou como um verdadeiro companheiro, tentando o máximo não me atrapalhar, fazendo-me rir quando estava ficando estressado, me dando injeção de ânimo pra terminar logo aquilo. Fiquei feliz por de alguma forma tê-lo em minha companhia o tempo todo naquele dia, apesar de estar exausto no fim. A semana já havia começado, e seria cheia. Na segunda teria que imprimir e finalizar os meus trabalhos, levar a Camaçari, logo depois do almoço. Ficaria lá até terça, pois na quarta eu e a Lenita iríamos pra Salvador, tomar um curso em uma nova área que queríamos adentrar na Engenharia. A princípio, só voltaria na sexta. A princípio. Os próximos dias trariam muitas surpresas.
A primeira pessoa que eu encontrei ao descer do carro, no corredor que dá acesso à sala da Valquíria, foi o Murilo. Só quando me bati com ele que me dei conta de há quanto tempo não o via, apesar de estar sempre por lá.
- Meu broother! Pensei que estivesse brigado comigo!
- Ué, Murilo, porque? Quem tá sumido é você, eu tô sempre ciscando por aqui...
Nos abraçamos.
- Aquela correria de faculdade, né, velho... Precisei ficar em Salvador mais dias na semana por causa de uns trabalhos, tô negociando aqui. E você, só escolhe vir nos dias em que não tô!
- Vamos combinar as nossas agendas, então, pra não haver mais desencontros – eu não tinha a menor intenção de fazer isso. Olhei em volta, mirando a sala em que ia entrar – você sabe se a Valquíria tá por aí? Marquei uma reunião pra as duas mas tô atrasado...
- Você, atrasado? Muito estranho, isso, quase nunca acontece...
Me virei pra a recepcionista, que nos observava, rindo.
- Milena, vire pra lá, porque eu vou mandar o Murilo ir pra lugar não muito agradável fazer uma coisa menos agradável ainda!
- Fique tranquilo, Gu, pode mandar! Hahaha... adoro!
- Você quer ver o circo pegar fogo, né, colega? Ele não vai não, porque ele é meu amigo...
- Rum. Deixa eu ir lá procurar a minha cliente. Milena, vê se ela pode atender?
- Xá comigo.
- E depois daqui? Vai fazer o que? – o Murilo perguntou.
O que eu queria mesmo era encontrar o Jimmy, mas na verdade ainda não tinha pensado em nada pra despistar a galera, e agora, o Murilo.
- Não sei, na verdade, nem sei que horas eu saio daqui – e me saí com a clássica – qualquer coisa eu te ligo.
A reunião com a Valquíria durou até as seis, e antes de terminar eu já tinha encontrado o Edu, que já tinha encontrado o Murilo, e já tinham marcado um happy hour. Na verdade estavam só me esperando, lá fora.
Assim que saí da sala da Val encontrei os dois no pátio, e vi no meu celular uma mensagem do Jimmy.
"Você me disse que viria pra cá hj.. tá por aqui? bj"
Fiquei agoniado porque havia muito tempo que ele tinha enviado, e eu não percebi. Não queria que ele entendesse que eu não tava dando atenção. Respondi: "tou sim... acho que durmo no Edu, queria te encontrar, só não sei o jeito ainda..." Pra aumentar a aflição, lá não pegava celular direito, e a mensagem não foi enviada.
- Pensei que essa porra de reunião não ia terminar mais.. – Murilo estava impaciente pra tomar a cerveja de segunda.
- Não tem aula hoje?
- Não, hoje fico por aqui. Só vou amanhã pra lá.
- Ah... então, vamo né?
- Vamo pra onde? Peixotinho? – o Edu perguntou, já no caminho, do banco de trás do carro. O Murilo que respondeu:
- Rapaz, dia de segunda só vamos encontrar lá mesmo aberto, eu acho... Mas eu queria passar no centro primeiro, pra ver outras opções...
Eu e o Murilo viramos porque o Edu falava ao celular:
- Ó, a gente não sabe ainda, vamo ver... quando pararmos em algum ligar te ligo. Valeu.
Murilo perguntou:
- Quem era?
- O Jimmy. Ele ia me pegar lá na empresa, aí eu liguei desmarcando.
- Ah, velho, chama ele pra sair com a gente!
- Chamei, né? Falta só saber pra onde!
Respirei aliviado, o danado do Jimmy já tinha dado um jeito da gente se ver.
Já estávamos os três instalados num barzinho ótimo no centro, quando ele chegou. Tinha tomado banho, estava de bermuda e camisa, e sandália de borracha. Tudo isso eu percebi em dois segundos de contemplação, afinal de contas, não podia dar mole com aqueles dois.
Ele também fingiu uma despretensão comigo no "e aí, brother?", e no "fazendo o que por aqui?", bem como eu também o fiz em "vim resolver umas paradas aí" e especialmente no "e ai, tudo certinho?" Sentou-se ao lado do Murilo e de frente pra o Edu, na minha diagonal, enfim, mais longe, só se ficasse em outra mesa.
As cervejas começaram a desfilar.
- Vou pedir uma carne do sol, quem vai? – Murilo sugeriu.
- Pede, sim. Tô com fome – eu aceitei – só vou ali na porta, fumar um rapidinho e volto. Era a deixa pra ver se conseguia um momento com o Jimmy, e ele percebeu.
- Cê tem um aí pra mim? – ele foi se levantando, satisfeito.
- Ah, pera, pô, eu também vou – Murilo já foi logo levantando também – eu tenho aqui, Jimmy, se você quiser.
- Aí vão sair as três putas e me deixar aqui na mesa por causa dessa desgraça de cigarro... – Edu protestou. Ficamos os três em pé, eu ri, sem graça, até que o Murilo disse:
- Fica aí, Jimmy, que na próxima nós vamos revezando – o tapinha que ele deu nas costas do Jimmy foi meio que um empurrão de volta à cadeira, e nosso artifício foi por água abaixo.
Já do lado de fora, o Murilo me perguntou:
- Você vai ficar aqui a semana toda? Vamos programar outro almoço daquele...
- Não, na verdade eu volto amanhã pra Feira.
- Fica aí, pô, eu vou amanhã pra aula mas volto no mesmo dia. A gente almoça na quarta.
- Ow, não vai dar. Na quarta cedo eu vou pra Salvador, fico lá até sexta, num curso com a Lenita.
- Vai pra Salvador? Porra, velho, que massa! Eu durmo lá na quinta e sexta, volto só no sábado! Você fica aonde lá?
- Eu fico n...
- Onde é o curso?
- O curso é n....
- Você vai no seu carro mesmo ou no da sócia?
- Eu f... Você quer que eu responda ou vai fazer todas as perguntas de uma vez?
Murilo riu alto, me abraçou e me deu uma gravata, e instantaneamente olhei pra dentro do bar e vi o Jimmy nos observando. Me recompus.
- O curso é no CREA, vou ficar no apê que a Lenita tem em Brotas, e provavelmente vamos no meu carro mesmo.
- Humm... A minha faculdade é na Federação, mas não tem problema porque você estando de carro, me pega lá pra a gente fazer alguma coisa. Fica lá até sábado, pow!
- Não dá, a Lenita tá comigo, e tipo, ela é mãe de família, vai querer voltar na sexta mesmo....
- Joga ela na rodoviária, e fica lá. Veja aí..
- É vamo ver.
Conversamos horrores, demos muita risada, ligamos pro Daniel, só pra fazer inveja, aquele ritual.
- E aí otáaario! Saia dessa roça, Dan, venha tomar uma com a gente! – estava na vez do Murilo pegar o celular, depois de termos conversado no viva voz, depois comigo, com o Edu e até duas palavrinhas com o Jimmy.
- Diga a ele que se ele sair de lá agora, dá tempo de tomar a saideira daqui a umas três horas... – o Edu sugeriu. Todos rimos.
- Cê ouviu aí? Hahahaha, sacana! Mas olha, é sério agora: eu e o Gustavo estamos indo pra Salvador essa semana, já marcamos aqui de ficarmos por lá, não tem jeito de você ir também?
O Jimmy nem olhou pra mim, mas o jeito que ele tentou rir, e depois enfiando o copo na boca... eu tentei dizer algo a ele na minha expressão, sem sucesso. O Murilo continuava:
- ...aí se você for, a gente fica até o fim de semana lá, né?
- Eu não posso ficar até o fim de... – minha voz era um rouco.
- Ah. O viado tá dizendo que não pode não.
- Qual viado? – o Edu perguntou – o daqui ou o de lá? O daqui já disse que não pode.
- O de lá também não. Ah, tá bom, então... Mas marca aí po, venha pelo menos ver a gente aqui em Camaçari...
Depois que o Murilo desligou, consegui uma escapadinha pra fora do bar com ele.
- Olha... eu não marquei nada com o Murilo em Salvador...
- Relaxa, pô. Eu não tô te co...
- Não, mas não quero que você fique pensando em nada que não tenha acontecido. Afinal de contas, nós dois estávamos tentando marcar algo lá, não é?
- Mas não tinha nada certo – Jimmy não queria seguir a linha da cobrança, mas a decepção estava escrita no seu rosto – e também acho que nem vai dar pra ir mesmo, como a gente tava pensando...
- Ele perguntou se eu ia ficar aqui a semana toda e eu acabei dizendo que ia pra um curso em Salvador. Não imaginei que ele fosse ficar lá também, e...
- Ele faz faculdade lá, né...
- Mas vai e volta todo dia. Bom, ele acabou se empolgando...
Jimmy suspirou. Tentou rir.
- Poxa, desculpa. Eu preciso me conter, às vezes. Às vezes, não. Rss. Eu preciso me conter. É que...
- Não se contenha. Por favor. É recíproco, saiba. Minha vontade é grande também, de termos nosso momento. Mas eu ainda não d...
- Tem aí uma tragada pra mim? – o Murilo apareceu de repente, jogou o braço em volta do ombro do Jimmy, e lhe tomou o cigarro, fazendo-o rir. Chegou o rosto perto do Jimmy – e aí, qual a boa?
- Diga você... – Jimmy sustentou o olhar. Ele se virou pra mim.
- Aqui já tá fechando, então acho bom a gente procurar outro canto.
- Ou, de repente, ir pra casa... – eu intervi – afinal, hoje é segunda...
- Olha quem fala, kkkk – ele ainda continuava abraçado ao Jimmy – esse rapaz, Jimmy, foi quem instituiu em Camaçari a "Cerveja de Segunda"...
- É, eu lembro dele comentando lá em Feira que segunda era o melhor dia pra beber...
- Falei? – fiquei sem graça, mas ri – Jimmy, não ajuda o Murilo não, não tá vendo que ele nem precisa mais beber?
- Quem disse isso? Eu tô beleza ainda, meu brother, a gente nem bebeu muito.
- Hum. Então, tá. Vamo. Mas amanhã eu acordo cedo, não vou ficar m...
- "Você chega com certeza a tempo de tomar banho e ir trabalhar..." Lembra? – virou-se pro Jimmy – ele também falava isso pra a gente aqui, quando a gente queria ir embora.
Jimmy completou:
- E de repente, nem precisa de banho, já vai direto pro trampo... Perder tempo com banho pra que, né, se pode beber mais um pouquinho?
- Bom – Murilo lançou um olhar maldoso pro Jimmy – dependendo de como seja a noite, talvez seja preciso um banho, sim...
- Tipo... beber até cair, se sujar, né? – completei.
- Ou sei lá, coisas que fazem suar...
- Hum... correr, pedalar..
- Gustavo, vamos chamar de... exercício físico, sem especificações.
Ele deu um sorriso muito malicioso. Parecia se divertir com aquele jogo de palavras.
- Nossa, tem gente pensando em fazer besteira hoje... – Jimmy falou e riu pra mim, eu ri, meio confuso, sem saber pra onde aquela conversa tava indo.
- Hahaha, mas calma, galera – ele abriu os braços – eu ainda não tô no nível alcoólico de fazer besteira, não.
- AINDA não...
- Rss... mas estamos trabalhando pra ficar – ergueu o copo.
- Bom – eu me afastei – vou pra a mesa ficar com o Edu e pedir a conta.
- Murilo já tá bebinho, cara, melhor a gente vazar – o Edu falou assim que eu sentei.
Olhei pra fora do bar, ele conversava com o Jimmy.
- É, tô ligado. Ele quer dar um rolê ainda.
- Eu já pedi a conta daqui.
- Beleza – tomei o que restava do meu copo e observei os dois lá fora, o que poderiam estar conversando? Murilo falou alguma coisa e os dois olharam pra mim, o Jimmy meio sem jeito – vou mijar.
- Na hora de pagar a conta, né. Sei.
Entrei no banheiro, fui no mictório e me olhei no espelho. Enquanto eu lavava meu rosto coberto da oleosidade do dia inteiro, ia percebendo que a noite tinha sido ótima, mas mais uma vez eu trocaria por um momento a sós com ele. O final de semana inteiro passei imaginando isso, no final das contas.
Quando levantei a cabeça, olhei o Jimmy atrás de mim, pelo espelho. Rimos, eu enxuguei o rosto e ia saindo, quando ele me puxou pelo braço, empurrou a porta com o outro, e quando eu ia protestar, ele me agarrou. Beijou meu pescoço. Sussurrei:
- Tem gente naquele box...
- Rapidinhoo...
E me beijou. Eu fiquei ofegante, mas não deu tempo de retomar o fôlego, pois nos beijamos de novo. A descarga do box foi acionada, e foi o suficiente pra eu sair em disparada de volta pra a mesa.
Jimmy foi embora na sua moto, o Murilo sentou no banco do carona, e foi um custo convencê-lo a encerrar a noite por ali. Quando eu já estava deitado, na cama do Edu, ele me perguntou se iríamos mesmo pra Salvador.
- Bom, eu vou, porque tenho um curso lá. O Murilo...
- Ele me disse que tá tudo certo, que vocês vão rodar Salvador inteira lá. Varios regs.
- Se ele tá falando, né? Eu não sei, porque vou estar com a Lenita.
- Me chamou pra ir também, disse que podia ficar naquela favela do primo dele.
- Ah, é?
- Tenho até que ir lá mesmo, resolver um negócio da minha conta.
- Aí, pô, quem sabe? A gente dá uma saída lá.
- Vou ver. Eu fiquei achando que o Jimmy queria ir também, pelo jeito dele, mas ele não falou nada.
- Ah... fala com ele. Vocês podem ir, eu pego na rodoviária, sei lá.
- Vamo ver.
Virei pra tentar dormir. Eu, Lenita, o Murilo, o Edu, o Jimmy... a coisa tava tomando um rumo meio doido. Queria só ver como ia ser aquilo.
...
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