@nós
**Este conto não está devidamente revisado
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O bom de relacionamentos é que eles acabam. Ponto.
... Mesmo quando você não quer que acabe.
Então, eles simplesmente terminam e você fica a pensar se... Será que tudo foi verdadeiro? Por que simplesmente acabou? Como em um momento temos a infinidade de dias, fazendo planos juntos para sermos felizes, e no outro já não somos mais que nada? Não era amor?
A verdade é que por mais que seja difícil admitir...
Era numa quinta-feira, cinco de fevereiro, dois dias depois do dia dos namorados. Era exatamente sete horas e quarenta e nove minutos. Precisamente. Heitor falava alguma coisa sobre a agência, uma colega de trabalho cantava desesperadamente uma música de desilusão amorosa no karaokê, e eu estava tentado a ir embora. Decidido, correto.
Antes de mais nada, preciso decorrer sobre o destino. Ele é ou não crucial? Ele realmente existe e joga com nossas vidas? O destino escolhe a dedo a quem vai beneficiar ou quem (perdoe-me o palavrão) vai deliberadamente ferrar?!
Então preciso lhes afirmar que não acredito nessas coisas. Sou um homem desacreditado. Mas um homem tende a acreditar nas coisas quando elas simplesmente passam a se encaminharem, de um modo atraente e até mesmo sugestivo sobre... Sobre os desacreditados e meros seres comuns! E é por isso que os relatos a seguir precisam inteiramente de sua atenção. Como precisou da minha.
Estava prestes a me levantar e inventar alguma desculpa que me livrasse daquela sensação de estupidez humana... Agonizante. A tal colega tinha terminado com a tortura dos nossos ouvidos e agora virava dose atrás de dose de vodca — com certeza daria muito trabalho para sua amiga. E por meros segundos, me deixei levar pelo pensamento do que teria acontecido para deixá-la daquela forma (?). Pela música de desilusão, presumir sentimentos. As pessoas se acabam com ele/por ele, e se reinventam. Porém, menos assim ele é belo e almejado, e todo mundo vive em busca de um alguém. É um circuito interessante e doloroso, e confesso que naquela época sequer entendia todo esse circuito maluco.
Ainda perdido em pensamentos, uma música começou a tocar. Eles tinham dado uma pausa com o karaokê depois do desastre vocal da tal colega - o que foi um alívio, antes que não sobrasse vidraçaria. Ela cantava realmente muito mal, coitada! Alguém precisava avisá-la.
Eu conhecia aquela música tão bem que poderia simular uma performance na guitarra, com coreografia dançante, mesmo me achando patético imaginando a situação emblemática. Era We Can Work It Out*. Não a versão do Beatles, mesmo a achando incrível também, aliás é os Beatles! Os garotos de Liverpool! Mas a versão do Stevie Wonder... Simplesmente mágica! Todo mundo ali sentia essa energia, "life is very short, and there's no time". Eu amava aquela música e estava esperando terminar só a repetição do refrão para ir embora em paz.
Foi quando ela entrou no bar. Ponto.
Ao som de uma das minhas músicas preferidas! Foi a primeira vez que a vi, ali...
Vestida com um vestido azul até os joelhos, marcando tua cintura e com as mangas caindo aos ombros, ela parou diante da porta totalmente perdida, e mesmo assim como se tivesse... maravilhada!
Sua clavícula estava exposta. E ela usava um colar; não parecia muito caro, estava mais para uma bijuteria de menos de cinco dólares de algum ambulante. Mas era chamativo o suficiente para cobiça-lo nela.
O cabelo dela me lembrava a década de quarenta.
Ela usava meias. Três quartos. Era surreal.
Os sapatos era algo parecido com botas, — só que menos sofisticadas.
E o mais importante: Ela sorria, deliberadamente, simplesmente, extremamente.
Ela sorria! Vejam só! E então instintivamente eu passei a sorrir também. Deliberadamente, simplesmente, extremamente, sem nem ao menos saber o porquê.
Na verdade, eu sabia sim. A gente sempre sabe.
Ela olhou determinada para dentro do local, parecia, de repente, deslocada. Seus olhos contemplavam todos os detalhes. Demoraram cinco ou seis segundos num pôster do The Velvet Underground*. E mais quatro no The Beatles. Seus pés batiam no assoalho no compasso da música, parecia que a qualquer momento ela ia começar a dançar e interpretar Bob Dylan como ninguém faz. Ela já nem parecia mais tão deslocada. Seus olhos, pequenos, e cinza como aquela noite, então, pararam em mim. Em mim. Em milésimos de segundos. E porra, eles eram tão vívidos, tão instigantes, que me fazia querer conhecê-la e desvendar todos os mistérios que escondia sob aquela pele, e sob aqueles olhos. Eram sete horas e cinquenta e um minutos! E-xa-ta-men-te!
Eu não contei, e nem me lembro com precisão, claro. Era só mais uma questão de percepção.
Fodase. Eu contei sim. E continuei contando todos os milésimos segundos ao seu lado. Seu julgo é risadinhas, caro leitor, tenha compaixão... Compaixão de um cara apaixonado pela primeira vez.
Hoje, de qualquer forma, me pergunto: Se eu tivesse saído a um minuto atrás, teria dado tempo de esbarrar com ela na porta? Eu notaria nas suas meias, no corte anos quarenta, e nos seus olhos, ou apenas passaria direto com um murmurado "sinto muito" e seguiria adiante? Eu precisaria contar obcecadamente malditos milésimos segundos?
CO-IN-CI-DÊN-CI-A? DES-TI-NO?
Os segundos seguintes foram muitos rápidos. De repente começou tocar Tops (tattoo you)*, por pura ironia do destino. O mundo não tinha parado de girar, e eu ouvia muito bem toda a conversão ao meu redor. Mesmo assim ela caminhou até mim. Até onde estava sentado com alguns amigos bebendo a segunda ou terceira garrafa do dia. Não sei se era a bebida, mas Ela tinha um balançar engraçado sabe, como se tivesse desfilando ou saltando poças imaginárias. Eu adorei aquilo. E mesmo assim ninguém a notou.
Era extremamente surreal a situação, contando que ninguém, além de mim, a percebia bem ali... Exatamente ali na frente do clube com meias três quartos e um cabelo dos anos quarenta. Céus! Era surreal. Quem usava meias três quartos naquele tempo? E como ela conseguia ficar inteiramente perfeita?
Ela sorriu e se inclinou em minha direção para dizer alguma coisa. No som dizia que "Your such a natural you don't need no acting school"*, fazendo parecer uma situação do ensino médio. E eu tive que me concentrar o máximo para não perder o que ela diria no meio de todo aquele barulho e de toda aquela atitude.
— Oi. — A voz dela era doce e melódica, e a risadinha no fim só me fez acreditar que tínhamos voltado no tempo, ou que talvez estivéssemos em um tempo paralelo aquele. Eu era o cara pouco notado que tinha várias espinhas e que carregava uma pilha de livros nos corredores do colégio, que desejava uma garota "Tops". Ela prosseguiu: — Você pode me dizer onde é o cinema?
Hã? A olhei sem entender. Estávamos num clube de karaokê, um bar! Como... Cinema?
— Sou nova aqui — explicou. — Estava indo ver um filme francês que vi num cartaz um dia desses. E então vi esse letreiro "La musique". — Ela sinalizou, parecendo pensativa. — Foi bem chamativo. Parece nome de um filme francês. Mas sou péssima em francês. — Se afastou e sorriu, desdenhando de si mesma. — Então entrei...
E não era o cinema.
Ela riu e eu bem... eu rir junto.
No entanto, você deve estar se perguntando: por que diabos alguém iria ver um filme em francês se não entende francês?
Ela respondeu:
— Oh sim. Eu gosto do sotaque. — Deu de ombros, despreocupada.
Foi aí que tudo começou. Simplesmente assim. De uma hora para outra, num momento em que eu menos esperava.... Aconteceu! A verdade meus caros? A gente nunca sabe quando isso vai acontecer, sabe... Nunca se sabe.
Se existisse um milhão de possibilidades para aquele momento, oitocentos mil quatrocentos e quarenta e sete eu teria feito a mesma coisa. O restante, cento e noventa e nove mil quinhentos e cinquenta e três versões, eu teria feito diferente. Talvez.
Instintivamente eu me coloquei a disposição de lhe mostrar o cinema. Mostrar! Eu poderia anotar num papel a localização certa, até desenhar o percorrer das ruas, sendo que eram duas quadras dali o mais perto; poderia lhe dá boas instruções, suficientes para encontrar o cinema. Mas assim como diz o poeta francês Jean Racine, e faço deles as minhas palavras, a real sensação naquele momento: "o amor é um fogo que ninguém consegue ocultar na alma; quem o sente o revela na voz, nos olhos e no silêncio". E ainda acrescento, simplesmente, pelo o impulso de uma história introdutória sem ao menos imaginar o real significado daquilo tudo, sequer imaginar ou supor se estaria sendo patético em minhas atribuições (?). Assim "entrego-me cegamente ao impulso que me arrasta".
O homem é um ser patético, de qualquer forma.
— Não tem problemas. Será um prazer lhe acompanhar até lá... — A olhei de soslaio. Ela parecia um pouco retraída. — Claro, se você não se incomodar. Não quero ser inconveniente.
Eu estava sendo. Com certeza. E sabia disso, mas eu queria ser inconveniente, se isso significasse poder conhece-la melhor.
— Oh não! Não está. — Negou, docemente. — Acontece que não queria lhe atrapalhar.
— Que nada! — Fui bastante despreocupado nessa exclamação. Pareceu funcionar. Ela relaxou. Então continuei: — Além do mais, estava mesmo querendo ver este filme. É um clássico!
Lembram-se da estupidez humana?
— Na verdade, — ela riu — ele foi lançado agora.
— Claro que sim, mas o que quis dizer é que...
Me calei.
Estupidez humana. Isto.
— Você sabe francês? — perguntou.
Não. Eu não sabia. Achava francês um idioma extremamente feio. Até mesmo fanho e desengonçado.
— Hum... Bonjour mademoiselle?* — A minha tentativa de imitar o sotaque foi tão horrível e empolgante que sem querer cuspir nela. Aquelas coisas de momentos... Quanto mais você quer impressionar alguém mais você está propicio a fracassar e passar vergonha. É a pura realidade. — Hum... Me desculpe.
Olhei horrorizado para ela me repreendendo por tudo aquilo. Tinha tanto tempo que não me envolvia com uma garota assim que me sentia um adolescente; como se eu tivesse acabado de entrar no ensino médio e fosse o único cara que nunca tinha beijado e sido beijado por uma garota - com exceção da minha mãe. A verdade é que nunca fui bom em relacionamentos... Eu acreditava em amor, em construí uma família, em ter alguém... Só não conseguia imaginar isso para mim. Totalmente desacreditado.
Aquela noite, quando cambaleiei para o lado ajeitando o casaco, me amaldiçoei acreditando que tinha estragado tudo, sem nem mesmo ter começado. É claro! Nenhuma garota gosta de ser cuspida. No final das contas Heitor tinha razão quando dizia que eu era um medroso, que deveria sair do meu casulo. Eu realmente era. Quando viramos a esquina perto do cinema, preparava para cair fora... É. Fugir. Sair correndo como um adolescente imbecil e fingir que aquilo não tinha acontecido.
Foi então que ela riu. Riu muito e disse que quando estava empolgada fazia aquilo o tempo todo, e era sempre uma vergonha diferente; "como aconteceu numa entrevista de emprego e cuspi em todo o meu currículo em cima da mesa". Até brincou, dizendo que "acho que já estamos até trocando salivas, hum?"
Ela foi tão carismática, de uma forma que você sabe que não é forçada, que senti como se fôssemos íntimos, e poderia tê-la ali sempre. O tipo de pessoa que você quer manter por perto. Porque é confortável.
— Então, monsieur *... Por que está indo ver um filme francês se não entende francês?
— Oh sim! — disse a imitando, colocando a mão na cintura e me sentindo terrivelmente aliviado. — Gosto do sotaque. É charmoso.
Sorriu. E pelo incrível que parece, ou poético, clichê demais, o sorriso dela parecia que tinha vida própria ou um sistema operacional que enviou comandos assustadores e interessantes para meu corpo. Eu queria poder ver mais daqueles sorrisos... Eles eram bons... e... sabe, leves!
A verdade, óbvia, é que mesmo naquele contato, ela tinha total razão: eu queria trocar salivas com ela; não só, mas muito mais...
O filme começou oito horas em ponto. A sessão não estava lotada. Mas nunca imaginei que tantas pessoas entendiam francês, contando que para mim o idioma era feio. A maioria dos presentes eram casais, o que dizia previamente sobre o filme. Um pôster era exibido do lado de fora com um casal tentando pegar a mão um do outro. Parecia romance. Água com açúcar. Não era meu preferido.
Nos localizamos no meio da sala. O filme tinha duração de uma hora e cinquenta e seis minutos.
Ela parecia totalmente centrada nas cenas que se desenrolava. Quem a visse diria que ela estava entendendo tudo. Mas nunca soube se ela realmente estava, ou realmente não entendia o idioma.
— Está entendendo alguma coisa? — perguntei, inclinando-me um pouco para ela, sem tirar os olhos da tela.
Ela comeu um pouco de pipoca e se aproximou, sorrateiramente.
— Não. Você está? — sussurrou.
Neguei. Não conseguia ficar em silêncio, prestar atenção no filme; não quando ela estava ao meu lado ligeiramente inclinada em minha direção, e sua presença tomava toda a minha atenção.
Na tela, um casal, aquele do cartaz, pareciam estar se despedindo. Ele falava com fervor e a sua amada parecia prestes a cair no choro. Eu não estava entendendo porcaria nenhuma.
Ao meu lado, ela franzia a testa e comia mais pipoca... Depois mais e mais caretas. Isso era muito engraçado.
— Parece que ele está dizendo: "Eu sempre fui bobão" — disse, sem conseguir ficar calado, referindo-me ao cavalheiro do filme, exasperado.
Ela riu e negou.
— Não. Ele parece dizer... "Não olhe para mim. Sou um cara careca" — dublou o cara, entrando na brincadeira.
Eu rir.
— "Eu adoro carecas" — continuei, fazendo uma voz feminina entrando na personagem.
— "Você não pode ter certeza disso. O futuro dos nossos filhos depende disso" — O cavalheiro do filme passa a mão no rosto nervoso e se volta para sua amada. Ela continuou energética, botando a mão no coração: — "Eu te amo. Amo mais que tudo. Mas não quero que você seja a mulher que se casou com um careca. Não poderei com isso. É o nosso fim".
Eles deram as mãos — a cena exata do pôster.
— "Espere! Não se vá. Eu não me import..."
— "É preciso. Um careca sempre será careca. Não há nada que possamos fazer..."
— "Por favor, Jorge! Ao menos... ao menos... deixe beija-la?!"
Ela riu baixinho ao meu lado, e me cutucou divertida.
Os personagens se abraçaram e a sala caiu em silêncio — isso porque a maioria dos casais estavam se agarrando e não prestando atenção no filme. O que era uma boa ideia para quem não entendia o idioma.
Eles se separaram e o cavalheiro disse alguma coisa, que minha companheira interpretou como: "Pode beija-la".
Estava prestes a explodir em gargalhadas, quando a cena do filme foi o limite. A personagem nas pontas dos pés deu-lhe um beijo na ponta da careca e outro nos lábios. Foi instantâneo. Caímos na risada. As gargalhadas dela era tão divertida e contagiante que me faziam rir cada vez mais. Parecíamos dois malucos. As pessoas nos olhavam contrariados e aqueles que realmente prestavam atenção, chamavam nossa atenção. Mas nada mais importava. O mundo era nosso. O mundo era dela e de suas meias três quartos e cabelo dos anos quarenta. Eu era dela. Porque ela era incrível.
O filme terminou sem nenhum problema. Diferente de mim, que tinha o maior dos problemas: Eu estava completamente encantado por ela, dentre um milhão de possibilidades, sem tirar nem por. Meu deus, como isso é possível?
— Foi o filme mais divertido que já vi — ela disse, enquanto caminhávamos para fora.
— Qual será o verdadeiro enredo? — questionei.
— Acho melhor não sabermos. — Ela riu, como se soubesse de algo que eu não tinha conhecimento. De qualquer forma, eu concordei.
O restante da noite foi terminada numa lanchonete com competição de quem comia mais catch-up. Ela venceu. Nunca vi alguém gostar tanto de catch-up na minha vida! Ela era tão divertida que fez amizade com o dono do estabelecimento em questão de minutos. Era também muito inteligente e perspicaz. A impressão que eu tinha era que tudo que saía da sua boca era uma profecia, uma descoberta, um mundo. Era impossível não a desejar, apaixonar-se, se encantar...
Eu a chamei para sair no dia seguinte. Sábado. Levaria-a para conhecer o La musique, o melhor karaokê da cidade! Para ela seria eternamente o cinema falso (ela amou o lugar!)
Para mim, o La musique, seria o lugar que a vi pela primeira vez, às sete horas e cinquenta e um minutos. (Eu nunca esquecerei aquele lugar, por quaisquer rumos que tenhamos tomado).
Porque foi lá onde tudo começou, e onde tudo teve um fim.
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* (N/A) Tops (tattoo you), é uma música da banda de rock britânica, formada em Londres de 1962, Rolling Stones.
* (N/A) "Você é muito natural, não precisa atuar na escola".
* (N/A) Bom dia senhorita.
* (N/A) Cavalheiro.
n o t a :
Adicionei a música We Can Work It Out versão do Stevie aí para vocês conhecerem e ir ouvindo enquanto leiam! Sempre foi uma das minhas músicas preferidas tbm, ouvi muitoo escrevendo esse conto, aliás, ela me deixa mega animada! A real que o artista é espetacular, vamos combinar! Se curte o estilo, super recomendo conhecerem!
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