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Saíram do mosteiro. O sol já estava baixando, mas eles ainda teriam uma ou duas horas de claridade. Ele trouxera o novo arco e pretendia mostrá-lo à Marion.
Caminharam pelo campo em direção ao rio enquanto ela contava algumas histórias engraçadas que tinham acontecido em Locksley durante sua ausência. Uma das camareiras havia sido pega namorando um guarda do castelo; Mary, a cozinheira, brigara com o marido novamente e jogara nele uma cesta cheia de ovos... Ele sorria com saudades destas pequenas intrigas do dia a dia e tentava esquecer a dor em seu peito toda vez que olhava para ela.
— Gostei do seu vestido... — ele disse depois de um tempo, apenas porque queria falar qualquer coisa menos o que se passava em seu coração.
Marion soltou uma risada e rodopiou algumas vezes pelo relvado baixo, coberto pelas minúsculas flores de primavera. Algumas delas se soltaram e a acompanharam em seus volteios, espalhando-se pelo ar. Aquilo fez o coração dele doer ainda mais e ele engoliu em seco, olhou para baixo e continuou andando, arrependido por ter feito aquele comentário.
— Você me acha bonita, Robert? — ela o encarava com os olhos verdes inquisidores.
Ele deu de ombros com um grunhido e apressou um pouco o passo.
Por fim, chegaram onde o rio fazia uma curva e entrava em um pequeno bosque. As águas transparentes corriam rápidas e murmuravam entre as pedras. Ao longe, se via a silhueta escura do mosteiro.
Robert tirou o arco do ombro e preparou uma flecha. — Ele é mais longo, tenho que fazer mais força para atirar, mas veja a velocidade da flecha! — disse.
Encaixou uma delas na corda, distendeu-a ao máximo e depois a soltou. A flecha voou veloz e cravou no tronco de uma árvore distante. Em seguida, pegou mais uma flecha da alijava que trazia presa às costas e repetiu o feito, acertando-a bem próxima à primeira.
Marion bateu palmas, parabenizando-o com uma exclamação de admiração.
— Quero tentar! — pediu em seguida.
— Você não tem força para envergá-lo — ele a avisou, entregando-lhe o arco.
Ela levantou-o, posicionou a flecha e tentou distender a corda, porém não tinha força suficiente para isso.
— Me ajude, não fique aí só olhando! — pediu.
Ele hesitou.
— Venha! O que há com você? — ela perguntou impaciente.
Ele suspirou e se pôs atrás dela, embora tentasse se manter o mais afastado possível. Colocou a mão esquerda sobre a dela, segurou o arco e a ajudou a puxar a corda. Seu coração bateu mais rápido com aquela proximidade e a lembrança dos beijos na floresta o tomou de assalto, fazendo seu corpo estremecer. Quando crianças, eles sempre estavam colados um ao outro, brigando ou se abraçando, mas agora ele não conseguia mais ficar perto dela sem que seu corpo e sua alma ardessem insuportavelmente.
— Inferno! — praguejou em silêncio.
Dispararam a flecha e ela voou longe, sem acertar a árvore. Ele tinha se distraído e não mirara direito.
Mesmo assim, ela deu um grito de alegria.
— Mais uma! Está não valeu! — exclamou.
Robert respirou fundo. Aquilo era uma verdadeira tortura!
Posicionaram-se novamente. Desta vez, ele esforçou-se para ficar concentrado no alvo, apesar do cheiro delicioso de mel e rosas dos cabelos dela. Procurou esquecê-lo e juntou o corpo ao dela, distendendo o arco como se fossem um só.
A flecha acertou o centro da árvore.
Ela virou o rosto para ele com um sorriso. Os olhos verdes e brilhantes e o calor de seu corpo o envolveram como um incêndio que ardeu em sua alma, devorando sua mente no caminho. Ele a abraçou e começou a beijá-la sem pensar no que estava fazendo, o prazer misturado a uma agonia que era quase uma dor física. Seria amor o que sentia ou apenas uma espécie de loucura?
Ela deu um suspiro e afastou o rosto, murmurando algo. Por um instante, ele pensou que Marion lhe pediria para parar, mas ao invés disso, ela recomeçou a beijar seus lábios, explorando-os com uma curiosidade inocente, porém extremamente sensual. Uma onda de fogo o inundou, pegando-o desprevenido e quase o afogando em águas ferventes. — Marion, por favor, se continuarmos eu... — murmurou e fez um esforço enorme para soltá-la.
— Desculpe-me! — Ela deu um passo para trás com um ar embaraçado.
Ele respirou fundo. A pouca paz que conseguira conquistar nos dias passados no mosteiro tinha ido embora, deixando no lugar uma sensação de penúria e uma dor atroz que lhe queimava o coração e o transformava em cinzas.
— Vou pegar as flechas — disse com um suspiro de frustração, apontando para a árvore ao longe. — Temos que voltar, vai anoitecer! Não queremos nos perder de novo, não é mesmo? — continuou em tom amargo, e depois virou e afastou-se rapidamente.
Ela foi atrás dele.
— Rob, amanhã nós deveremos retornar a Locksley. Você vai conosco, não vai? — perguntou.
— Você realmente quer se casar, Marion?
— Você já me perguntou isso na floresta...
Ele parou, o cenho franzido na tentativa de lembrar-se do que ocorrera.
— Me esqueci! Não consigo me lembrar de muitas coisas. E não sei o que foi sonho ou realidade — ele confessou, voltando-se para ela.
Ela dançara nua na fogueira. Ele transformara-se num lobo e a devorara. Os sonhos estavam ficando mais confusos agora, mas não menos intensos.
— Responda-me! Você irá se casar? E se eu pedisse para que não o fizesse? — ele perguntou ansioso.
— Se eu vivesse em um lugar onde dever e honra não existissem? Não, não iria! Mas este lugar não existe e irei me casar porque é meu dever fazer isto — Marion respondeu em tom decidido.
Ela recomeçou a andar e Robert a seguiu.
— E como poderei ficar em Locksley e assistir você casar-se com outro? Como acha que eu me sentiria? — perguntou com aflição, segurando-a pelo braço.
Ela deu de ombros e desviou o olhar para o chão.
— Nossa! Quantas perguntas! Como vou saber sobre tudo isso?
— Então desista do casamento, Marion! — ele pediu impulsivamente, dominado pela agonia de perdê-la.
— E por que eu faria isso? — Os olhos dela o fitaram inquisidores.
— Para ficar comigo — ele disse, apertando o braço dela com força como se pudesse retê-la junto dele.
Marion ficou em silêncio, analisando-o atentamente. Ele estava mais magro e olheiras fundas circundavam seus olhos. Sim, ele estivera sofrendo nos últimos dias. Mas seria por causa dela? É claro que não! A lembrança do último jantar não a deixava, e as palavras de Bethany, "Robert tem tendência a amar várias mulheres ao mesmo tempo..." O coração dele era mutável como a lua!
— Não! — ela decidiu-se finalmente. — E você está me machucando! — reclamou, tentando soltar o braço que ele segurava.
Os lábios dele se torceram em um sorriso de decepção e uma tristeza infinita o invadiu junto com a certeza de que sua vida anterior tinha terminado. Não haveria mais dias calmos e tranquilos enquanto estivesse ao lado dela. Soltou o braço e murmurou um pedido de desculpas quase inaudível. Afastou-se em direção à árvore onde a flecha estava fincada e a arrancou do tronco. A outra desaparecera em meio às árvores.
—Vamos! — ele a chamou em tom seco e apressou o passo de volta ao mosteiro sem esperar que ela o alcançasse.
— Onde está Robert? — Bethany perguntou, voltando-se para Marion. Seus olhos preocupados procuravam o filho pelo pátio, assim que saíram da capela do mosteiro. Haviam acabado de fazer suas preces na missa matinal, despedindo-se de padre Ralph e agora estavam prontas para partir de volta a Locksley.
— Não sei! — Marion respondeu com um ar contrariado. Haviam voltado ao mosteiro em silêncio na tarde anterior; feito uma refeição noturna rápida e mais silenciosa ainda acompanhados por Bethany e William, e depois não o vira mais.
William e dois soldados que o escoltavam já aguardavam montados em seus cavalos em frente ao portão de madeira.
Bethany adiantou-se em direção à hospedaria, apressada, mas parou no meio do caminho e soltou um suspiro de impaciência quando enfim viu o filho sair pela porta. — Por que não está pronto? — ela perguntou, estranhando sua aparência. Trouxera-lhe uma bela túnica de couro azul escuro e camisas de linho fino, além de uma calça e botas de montar, entretanto ele vestia apenas as roupas simples do dia anterior. — Temos que ir. Seu pai nos espera ainda hoje! — insistiu ansiosa.
— Não... Não irei com vocês. Preciso terminar de estudar um dos livros — ele disse. Seu olhar resvalou brevemente em Marion e depois voltou-se para a mãe com um leve brilho de desafio.
— Pois o leve! Tenho certeza de que padre Ralph o emprestará— ela argumentou com nervosismo na voz. Thomas ficaria furioso e decepcionado se ele não retornasse.
Ele balançou a cabeça em negativa.
—Decidi ficar aqui — reafirmou.
— Seu pai tem razão, você é orgulhoso e arrogante! Sabe o tempo que me custou convencê-lo a perdoá-lo? E agora você o insulta novamente, recusando-se a voltar! — ela exclamou impaciente e seus olhos se escureceram de raiva. — O que vai fazer então? Morar neste mosteiro? Não se esqueça de que ainda estamos nas terras de Locksley e de que fazemos doações frequentes para a manutenção deste lugar, portanto não existe diferença entre você ficar aqui ou no castelo... Ainda estará vivendo sob a proteção de seu pai e do conde!
Ele respirou fundo quando a verdade daquilo iluminou sua alma como um raio. Ela tinha razão! Ele se comportara como uma criança pequena, que fugindo por um instante dos olhos de sua ama imaginava estar livre dela. Que ridículo havia sido! Como uma criança mimada... Seus lábios se torceram com o amargor do autodesprezo. Ele relanceou seu olhar para Marion. É claro que ela pensava isto também! É por isso que ela jamais aceitaria qualquer proposta da parte dele.
Marion o encarava com os olhos marejados de lágrimas.
— Volte conosco! — ela implorou num sussurro.
Uma parte dele queria ceder, mas sabia que se voltasse o amor que ardia em sua alma como fogo transformaria a vida dele e a de todos ao redor em um inferno. Além disso, seu orgulho falava mais alto. Ele balançou a cabeça mais uma vez, negando e, em seguida, afastou-se.
Bethany soltou uma imprecação de raiva, virou-se com ar furioso e afastou-se pisando duro.
Da porta da hospedaria, Robert percebeu que William apeara de seu cavalo, estendia a mão para ela e a ajudava a montar, segurando-a pela cintura. Maldição! praguejou. Ele sentiu vontade de matá-lo. Mesmo que os malditos boatos fossem uma mentira, mesmo assim ele ficaria feliz com a morte dele!
— Venha, Marion! — ouviu Bethany, chamando-a no portão.
Marion havia ficado e o olhava com um ar indeciso. Ele se deteve no beiral da porta e estendeu a mão na direção dela.
— Fique! — suplicou.
nota da autora: E então, vocês iriam ou ficariam? Comments!
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