XIV - Delírio adolescente

     Olivia nunca foi do tipo que saía escondida por aí, deixava este posto de adulto irresponsável para o seu irmão. Oscar estava cansado e sem muita vontade de sair. Mas de repente lá estavam os dois, sentados lado a lado na caminhonete, totalmente em silêncio enquanto observavam a estrada escura. Ambos acreditavam que o outro sequer se lembrava daquele quase-beijo, e além de tudo, ela o considerava um amigo e precisava de uma companhia agradável em um ambiente descontraído para esquecer todos os estresses daquele dia.

     O pub estava cheio, assim como em toda sexta-feira. Todos os lugares estavam ocupados, então os dois pediram uma cerveja no balcão e se escoraram por uma das paredes de tijolos enquanto observavam a decoração industrial do ambiente à meia luz.


– É a primeira vez que você vem aqui? – Olivia perguntou.

– Não, já vim algumas vezes. E você?

– Primeira vez.


     Mais uma vez Olivia se encontrava em silêncio. Não estava tão confortável – mesmo aquilo sendo ideia sua – e aos poucos se arrependia por ter proposto de fugirem na calada da noite como dois adolescentes. 


– Você pediu pra vir aqui pra ficar com essa cara de enterro? – Oscar perguntou, a tirando de sua distração.

– Não, eu só me distraí – sorriu.

– E então... Sobre o que você precisa conversar?

– Eu não preciso falar nada, eu tenho certeza que você ouviu – suspirou – O circo inteiro ouviu.

– Eu não tenho como negar – encolheu os ombros – O Adam não dá uma folga, né?

– Por incrível que pareça, dessa vez eu estou do lado do meu irmão... Mas eu não quero falar sobre isso – bufou.

– Você disse que queria vir aqui pra conversar...

– Talvez eu não queira mais. Eu só queria uma companhia... não quero ficar na minha casa, mas também não quis incomodar a Megan de novo, e bom, você... você é meu amigo. Você nem precisa falar muito, eu sei que você não gosta. Só me faz companhia... vamos beber e aproveitar a sexta-feira.

– Beber como dois adolescentes que roubam o carro do pai pra sair na calada da noite e encher a cara? – sorriu.

– Exatamente! Você vai me acompanhar nesse delírio adolescente?

– E eu tenho escolha?


     Olivia sorriu para Oscar, que esboçou um pequeno sorriso enquanto levava a cerveja à boca. Ela olhava ao redor e percebia que diferentemente do último pub em que o elenco se reuniu no dia em que ela se acidentou, ninguém ali parecia se importar muito com os dois, que ainda vestiam parte de seus figurinos e tinham restos de maquiagem no rosto.

     Enquanto ela se distraía com as outras pessoas, Oscar passou a observá-la. Olivia estava com os cabelos presos em um rabo de cavalo e sua franja emoldurava seu rosto com pequenos focos de glitter que o demaquilante não removeu, além da sombra preta mal tirada dos olhos. Ele sorriu ao vê-la virar toda a sua cerveja de olhos fechados e dar um alto suspiro de satisfação.


– Por que você tá rindo? – Olivia o encarou com um sorriso também.

– Você estava com sede, pelo jeito.

– E você não?! – arqueou uma sobrancelha.

– Meu caneco ainda está pela metade – ergueu o copo.

– Você é lento demais – riu – Vou pegar mais um, quer?


     Oscar assentiu e virou o que restava de sua cerveja. Olivia pegou o caneco de sua mão e saiu em direção ao balcão, mas demorou alguns minutos até ser atendida. Quando voltou com os dois copos cheios, não o viu. Olhou ao redor e avistou o homem alto acenando para ela a poucos metros de distância, apontando para uma mesa com dois bancos livres.


– Nossa, ainda bem, eu já estava exausta de ficar em pé – sentou-se ao seu lado.

– E você precisa poupar essa sua perna aí, os treinos precisam voltar... não precisam?

– Ah sim... precisam – pigarreou ao se lembrar da razão pela qual vinha fugindo de Oscar nos últimos dias – Antes que eu precise voltar a me equilibrar naquela maldita linha d'água.

– Não era tão ruim assim... Mas se você não me passar a minha cerveja que você foi buscar até agora não me entregou, aí sim seus treinos vão se resumir a andar na linha d'água.


     Oscar sorriu para Olivia, que mandou um caneco até ele, o arrastando com um suave ruído pela mesa. Com agilidade o homem o pegou e, sem demorar, os dois deram um gole, o dela sempre era maior que o dele, e iniciaram o glorioso trabalho de evitar o olhar um do outro. Mesmo com o som da música fazendo as janelas do lugar estremecerem, o silêncio entre eles parecia ensurdecedor.

     Enquanto Olivia se xingava mentalmente por ter tido uma ideia tão idiota quanto aquela – quase ainda pior do que a do último domingo quando pensou em beijá-lo –, Oscar se esforçava para não dar um chute na própria bunda por ter aceitado o pedido dela de irem até ali.

     "Se ela não fosse tão importante...", pensou franzindo a testa enquanto encarava um homem gordo bater na mesa ao lado e dando uma estrondosa gargalhada. Se não tivesse aquela expressão triste de quem precisava urgentemente de um momento de paz, ele teria negado. Ah, aquele maldito quase-beijo o estava infernizando desde a noite da festa, e se não fosse aquela carinha de cão abandonado ele teria conseguido evitá-la. Mas seu maravilhoso plano caiu por terra ao ouvir os gritos de David e Adam e ao ver seu rosto abatido e tristonho.

     Então ele estava ali, completamente tenso, sentado naquele lugar apinhado de gente junto com Olivia, que parecia tão perdida quanto ele. Com um suspiro, decidiu que precisava aliviar o clima e, lembrando-se do momento em que ela o chamou de lento, decidiu o que deveria fazer.


– Sabe, no meu antigo circo eu detinha o recorde de doses de tequila – disse em um tom orgulhoso.


     Isso atraiu a atenção da moça que levou seu olhar imediatamente para ele e abriu um sorriso desconfiado.


– Mentiroso! – ela o acusou.

– Não, não. É a mais pura verdade. Trinta e quatro doses.

Oscar! E você entrou em coma depois, imagino! – ela riu divertida e aliviada por ele ter sugerido um assunto tão leve.

– Oh, você não faz ideia – estremeceu no banco – É por isso que eu quase não bebo mais, na verdade. Eu acordei mijado e... bom, você deve imaginar a situação.

– Não é a melhor cena para se imaginar – sorriu – Mas e quanto aos canecos de cerveja, hein? – arqueou uma sobrancelha como se o desafiasse – Qual é o seu placar nisso?

– Bom... Nunca fizemos uma competição com cerveja – deu de ombros.

– Pois então faremos uma agora! – bateu a mão sobre a mesa – E prepare-se, querido, pois essa eu vou ganhar! – ameaçou com um sorriso e virou o que restava do caneco que acabou de trazer.


     Oscar nem teve a chance de recusar, pois ela se levantou limpando a espuma da boca com o dorso da mão e foi em direção ao balcão atrás de mais duas cervejas. Bom, se Olivia queria guerra, ele faria o melhor para ser um oponente à sua altura – e ele tinha consciência de que não seria fácil, já que ela havia deixado claro que estava ali para beber.

     O sorriso de Oscar aumentou ao vê-la carregando quatro canecos por suas alças, tentando não desperdiçar nem mesmo uma gota de cerveja. Olivia os colocou sobre a mesa e arrastou dois até ele, que ergueu um dos canecos cheios em sua direção, solicitando um brinde.


– A gente precisa de regras – Oscar falou assim que ela bateu seu caneco contra o dele.

– Isso não é uma competição oficial, só bebe!


     Olivia virou o caneco em sua boca e Oscar sequer moveu o seu, verdadeiramente espantado e admirado pela velocidade em que ela engolia a cerveja. "Eu estou ganhando", ela falou assim que bateu o primeiro copo sobre a mesa, indo em direção ao segundo. O rapaz se apressou em desviar o olhar para o caneco em sua mão, o virando na maior velocidade que conseguia. Ele a alcançou com facilidade, e os dois terminaram o segundo copo praticamente juntos.

     Para que ela não precisasse se levantar novamente, Oscar foi até o balcão e voltou com os quatro canecos cheios mais uma vez. Em momento algum foi acordado a velocidade em que eles deveriam beber, já que a quantidade é que importava, mas a competição de quem bebia mais rápido de repente parecia tão importante quanto.

– Essa não valeu! Você derrubou metade! – Oscar reclamou, mas recebeu apenas um dedo do meio como resposta enquanto Olivia terminava de virar seu quinto caneco. Ele já havia terminado o sexto.

– Ei, esse era meu! – Olivia reclamou e Oscar deu de ombros esboçando um sorriso cínico por trás do sétimo copo.


     Após dez canecos, as idas ao banheiro já estavam frequentes e ambos estavam bêbados. O pub ainda estava cheio, mas não tanto quanto antes. Olivia se levantou para buscar mais dois canecos, mas Oscar a segurou pela mão. Mesmo adorando o rumo que aquela noite levou e a forma como conseguiram se distrair, eles ainda precisariam voltar para o circo em segurança.


– Você é um chato – Olivia bateu o punho contra seu peito enquanto reclamava com a voz arrastada – Eu ainda aguento mais!

– Eu não tenho dúvidas disso – sua voz estava tão arrastada quanto a dela – Mas a gente tem que voltar pra casa hoje ainda. E vivos.

– Eu ganhei de você-ê! – cantarolou.

– Claro que não! Nós empatamos. Dez a dez.

– Vamos desempatar ali – apontou para um jogo de dardos pregado na parede.

– Sério? Você quer desempatar num jogo de pontaria? Você é péssima nisso! – Oscar riu.


     Olivia deu de ombros e tentou arrastá-lo até o jogo que estava vazio. Os dois dividiram os dardos e ela começou a lançar, mas não acertou nem mesmo o alvo. Oscar riu e disse que ela não tinha chance contra ele. Assim que atirou, o dardo se fincou na parede, mas bem longe do alvo.


– Acho que você não tá se concentrando – Olivia segurou seu braço – Vem aqui, deixa eu te ensinar.

– Você quer me ensinar? – Oscar desceu os olhos até os dela.

– Eu tive um bom professor.


     Na ponta dos pés, Olivia se posicionou atrás de Oscar e segurou sua mão, a trazendo até a lateral da cabeça. 


– O alvo tá perto, então você lança daqui – repetiu o que ele a explicou uma vez, o fazendo rir – O mais importante é a concentração, nunca tire os olhos do alvo – ela sorriu e de repente ele sequer se lembrava do que estavam fazendo ali – Agora é só lançar.


     Oscar não desviou os olhos dos dela em nenhum momento, assim como ela também não fez questão. O dardo se pendurou na ponta do alvo e caiu no chão, mas ele não se importava. De repente aquela mesma vontade do último fim de semana ressurgiu e a proximidade entre os dois não estava colaborando. Mas Olivia era sua amiga. Apenas sua amiga.


– Acho que a gente tá bêbado demais pra esse jogo – recuou – Melhor desempatar na cerveja.


     Olivia sorriu aliviada. Claro que aquele breve toque e aquela troca de olhares despertou algumas vontades em si, mas ela acreditava que era apenas efeito dos muitos litros de cerveja. Oscar apressou-se em ir até o balcão e não demorou para que voltasse com três canecos cheios, derrubando um pouco do líquido ao colocá-los sobre a mesa.


– Esse é o nosso desempate. Quem pegar o último copo, vence.


     Uma contagem regressiva rápida aconteceu, e os dois deixaram os modos de lado ao virarem toda a cerveja de uma vez, deixando alguns respingos caírem sobre a roupa. Assim que Oscar bateu seu caneco sobre a mesa e foi pegar o do desempate, Olivia avançou sobre ele e roubou de sua mão, virando o copo em uma velocidade impressionante.


– Ganhei! – falou com uma euforia que só a bebida foi capaz de proporcionar.

– Você roubou! Eu já estava com o copo na mão! – Oscar estava rindo de uma maneira que também só a bebida fazia.


     Olivia deu de ombros ainda com seu sorriso vitorioso. Oscar tateou os bolsos para pegar seu celular a fim de ver as horas e arregalou os olhos em direção a ela, que ainda comemorava sua vitória. O sorriso foi se desfazendo aos poucos ao perceber o olhar insistente do rapaz.


– Que cara é essa? – Olivia questionou.

– Você trouxe a sua carteira? – Oscar tamborilava os dedos nervosamente sobre a mesa.

– Claro que s... – passou as mãos pelos bolsos procurando por sua carteira, mas foi em vão – Eu acho que não.

– Porra, como eu sou burro! – passou as mãos pelo rosto completamente irritado e se levantou – A minha ficou no casaco... E eu deixei em casa.

– Puta merda, Oscar! – bateu as mãos sobre a mesa – E agora?!

– Como o seu pé está? – arqueou uma sobrancelha a fazendo entender o que ele pretendia.

– Você não quer que eu faça isso... – Olivia sorriu desacreditada enquanto se levantava e ia até ele.

– Acho que a gente não tem outra alternativa... – segurou sua mão e a guiou disfarçadamente até a porta, olhando ao redor para ver se ninguém estava percebendo suas intenções.

– Eu acho que consigo correr.


     Os dois já estavam próximos o suficiente da porta, então Oscar a abriu e os dois saíram correndo e dando risada, fazendo com que as pessoas dentro do pub se virassem ao mesmo tempo para eles. Um dos homens atrás do balcão se apressou, mas enquanto tentava desviar dos clientes, os dois corriam pelas ruas.

     Olivia sentiu sua perna falhar, então Oscar a agarrou pelo quadril e a jogou sobre o ombro sem muito jeito, a carregando feito um saco de batatas. Os dois bêbados que corriam pelas ruas de pedras de Windenburg não conseguiram parar de rir nem mesmo quando chegaram na caminhonete estacionada a dois quarteirões do pub.

     Sem muita delicadeza, Oscar colocou Olivia no chão e se apoiou no carro até conseguir abrir a porta. Sentou-se no banco do motorista e destravou a porta para que Olivia pudesse se sentar ao seu lado. Ela se jogou no banco do passageiro e ainda sorrindo, o observou de olhos fechados e com a cabeça jogada para trás enquanto tentava regular sua respiração.

     Oscar sentiu o olhar dela sobre si e abriu os olhos, esboçando um sorriso no canto dos lábios. Olivia não conseguia decifrar seu olhar, mas a adrenalina ainda presente em seu corpo se misturava com o álcool e a dizia que ela sabia bem o que deveria fazer. Então ela agiu.

     Em um movimento um tanto quanto desengonçado e ainda rápido demais para quem estava vendo tudo girar, Olivia segurou o rosto de Oscar com as mãos e se aproximou, roçando seus lábios nos dele. Um arrepio tomou sua nuca quando os dedos do rapaz se entrelaçaram em seus cabelos e suas línguas se encontraram. O beijo estava tão agitado quanto os corações daqueles dois, cheios de adrenalina e desejo. E álcool. E foi isso que o fez terminar o beijo.


– Olivia, não... – falou com a voz ofegante.

– Por quê? – Olivia segurou seu queixo e mordiscou seu lábio inferior, quase o fazendo se arrepender por ter dito não.

– Eu quero te dar um beijo que você se lembre no dia seguinte – afastou seu rosto e acariciou sua bochecha com as pontas dos dedos – E do jeito que você tá, isso não vai acontecer hoje.

– Oscar... – Olivia soluçou – Eu vou...


     "Me lembrar", Oscar torceu para que ela dissesse.


– Eu vou vomitar.


Sim, eu estou quebrando as minhas próprias regras e postando dois capítulos no mesmo dia! Aqui é 8 ou 80, ou fico duas semanas sem postar nada ou trago dois no mesmo dia!

Eu estava ansiosíssima para postar esse aqui, finalmente o beijo saiu! Foi do jeito que queríamos? Não. Mas saiu e isso vocês não podem negar haha

E que reação da Liv, não é? Coitado do Oscar, saber que querem vomitar depois de beijá-lo.

Falando nele, foto dele na mídia porque sim.

Beijinhos! ♥

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