XI - Nunca tire os olhos do alvo

     O celular de Olivia despertou às dez da manhã daquela quinta-feira, mas ela já estava acordada há pelo menos uma hora. Acordou várias vezes durante a noite após alguns pesadelos. Em alguns, o público a vaiava. Em outros, Oscar a acertava com as facas. Tudo aquilo era a ansiedade em estrear ao lado do rapaz, que marcou de ensaiarem o número ainda naquela manhã.

     Após tomar seu café da manhã e convencer seu pai que nada daquilo seria perigoso, apressou-se até o circo. Assim que chegou, encontrou Oscar treinando sozinho com seus kettlebells e halteres no meio do picadeiro. Ele estava concentrado, sequer percebeu quando Olivia sentou-se na arquibancada e ficou o observando se exercitar.

     Ao terminar uma de suas séries de exercícios, Oscar apoiou as mãos nos joelhos e tentou regular sua respiração cansada. Ouviu um pigarreado e olhou para o lado, vendo Olivia sentada com um sorriso no rosto. Ele não se lembrava quando foi que passou a achá-la bonita, mas naquele momento a sua beleza era evidente, mesmo estando com olheiras e um coque desajeitado provavelmente feito na noite anterior.


– Então é assim que o homem mais forte do mundo treina? – ela sorriu.

– Homem mais forte... – estalou a língua – Vem aqui pra eu te mostrar uma coisa.


     Olivia se levantou e foi até o meio do picadeiro sem desviar os olhos dele. Ela não costumava reparar em Oscar, mas não conseguia negar para si mesma que seu cabelo desgrenhado e seu rosto cansado de quem estava há um bom tempo se exercitando o davam um charme um tanto quanto rústico, exatamente do jeito que ela gostava. "Para com isso, Olivia", se repreendeu mentalmente e abriu um sorriso para disfarçar, como se ele pudesse ler sua mente.


– Vou te contar um segredo – ele sussurrou.

– Sou boa em guardar segredos – piscou.

– Esse aqui tem 40kg – pegou um kettlebell vermelho – Eu uso esse pra treinar no dia a dia. Já esse aqui – pegou um kettlebell preto – tem 15kg. Eu uso quatro desses nas apresentações. Mas como você pode ver, tem um adesivo de 60kg neles.

– Meu Deus, você é uma farsa! – colocou as mãos sobre a boca, exagerando na indignação.

– É a magia do circo – piscou – Ou você acha que eu consigo ficar jogando 120kg de um lado pro outro numa boa? Depois pegar 240kg de uma vez? – riu – Sem chance.

– E os halteres? – Olivia não escondeu a curiosidade.

– 20kg cada um. As anilhas de 50kg também são adulteradas – deu de ombros.

– Você é uma mentira – maneou a cabeça e deu um sorriso irônico.


     Oscar sorriu e foi guardar seu equipamento. Olivia acabou se distraindo enquanto fazia as contas de quantos quilos ele de fato levantava todas as noites durante suas exibições. Foi desperta pelo barulho das rodinhas do alvo de madeira sobre o tablado. Não estava apreensiva... até ver o rapaz brincando de jogar as facas no ar.

     Posicionada em frente ao alvo todo perfurado, Olivia esperou Oscar organizar suas facas para poder prender seus braços. O rapaz se aproximou e passou a tira de couro ao redor de seu pulso, a afivelando rente à madeira. Quando partiu para o braço esquerdo, notou que talvez estivesse com seu corpo próximo demais do dela e deu um passo para trás. Afivelou o outro pulso e se distanciou.

– Você já esteve aí antes, não precisa se desesperar... – Oscar falou ao preparar suas facas e Olivia apenas engoliu seco e assentiu. 


     Oscar semicerrou os olhos e mirou o alvo. Um grito saiu da garganta de Olivia quando a lâmina fincou na madeira. 


– Você não pode gritar durante a apresentação – ele falou e logo lançou mais uma. Nessa ela mal teve tempo de pensar. Na terceira já voltava a se acostumar com aquilo, mesmo só tendo participado do número uma vez.


     Quando a oitava faca foi lançada, Olivia já estava sorrindo e fazendo brincadeiras. Oscar caminhou até o alvo em que ela estava amarrada e começou a remover as lâminas da madeira. Mais uma vez estavam perto demais. "Esse é o melhor que consegue fazer, senhor atirador de facas?", ela perguntou com um sorriso irônico e por um momento ele ficou em dúvida sobre o que ela queria dizer. A resposta de Oscar foi apenas um sorriso cínico enquanto removia a última faca, com uma força maior que a necessária.

     As oito facas foram lançadas mais uma vez, mas dessa vez a distância entre as lâminas e o corpo de Olivia era muito menor, fazendo com que ela se arrependesse de desafiá-lo. Oscar apressou-se em soltar as fivelas que a seguravam, e a primeira coisa que Olivia fez foi massagear os pulsos.


– Sua precisão foi incrível – ela falou ao observar as facas ainda fincadas na madeira.

– Foi só pra te assustar – sorriu enquanto removia uma a uma.

– Funcionou – ergueu as sobrancelhas – Você deve ter treinado muito pra confiar que não me acertaria.

– Eu fui na sorte – Oscar sorriu e deu de ombros.

– Eu não acredito que minha vida dependeu da sua sorte, Oscar! – Olivia ralhou.

– Calma! É brincadeira! Eu sabia o que estava fazendo – ele continuou a sorrir – Não é tão difícil quanto parece... Quer tentar?

– E se eu te acertar?!

– Eu não sou louco de ficar no alvo. Você vai tentar no alvo vazio.


     Olivia assentiu com um sorriso travesso, pois desde que Oscar começou a se apresentar com aquele número ela tinha vontade de testar sua pontaria – inclusive sabia que não era das melhores, já que nunca acertava o cesto de lixo com bolinhas de papel. O rapaz a entregou uma faca e apontou para o alvo.


– A primeira você vai jogar do seu jeito, quero ver o seu lançamento.


     Com a faca em mãos, Olivia estreitou os olhos e mirou o alvo. Oscar esboçou um sorriso com a forma desajeitada com que ela lançou o objeto, que apenas bateu com o cabo na madeira e caiu no chão. Ela não esperou pela explicação, pegou mais uma e lançou, agora segurando pela lâmina, assim como ele fazia. Essa passou direto por cima do alvo. A terceira chegou a bater com a ponta sobre a tábua, mas não teve força o suficiente para se segurar.


– Você está lançando como se fosse uma bola de baseball. Primeiro você coloca a sua perna esquerda na frente e a direita atrás, mas deixa todo o peso do corpo na perna direita. Na hora de lançar, projeta o peso para a perna esquerda.


     Ela fez como ele explicou, mas nenhuma faca se cravou. "Me deixa te ajudar", ele falou com a voz surpreendentemente bem-humorada. Se posicionou atrás de Olivia e segurou sua mão, a trazendo até a lateral do rosto. "Você tem que trazer o pulso até aqui atrás, porque o alvo está perto", Oscar falou próximo ao seu ouvido, a fazendo arrepiar com o hálito quente em seu pescoço.

– Quando for lançar, transfere o peso pra perna esquerda e só solta a lâmina quando seu braço estiver quase esticado – Oscar continuou, sem perceber que os cabelos da nuca de Olivia estavam eriçados.

– Você sabe que eu não posso colocar muito peso na perna esquerda – ela virou o rosto para respondê-lo e de repente seus rostos estavam mais próximos do que nunca.

– Nunca tire os olhos do alvo, isso pode te desconcentrar – Oscar respondeu a olhando nos olhos. 


     Olivia assentiu e voltou o rosto para a frente, mirando na tábua. Ele soltou sua mão e ela lançou a faca, mas mais uma vez errou o alvo. Talvez a proximidade dele também a desconcentrasse. Ele percebeu que já não tinha mais motivos para estar tão próximo a ela e recuou alguns passos.

     Olivia pegou uma faca, posicionou o corpo como o rapaz havia explicado e concentrou-se no alvo. Evitou pensar em qualquer outra coisa que não fosse aquele grande pedaço de madeira. Lançou o objeto e viu a lâmina se fincar na madeira pela primeira vez. "Eu acertei!", comemorou com um sorriso e pulou nos braços de Oscar para um abraço. Ele apenas apoiou as mãos em sua cintura, não incomodado com o abraço, mas com a sensação que ele deixou.

– Parabéns, mas se eu estivesse lá, você teria acertado o meu peito – apontou para onde a faca havia se cravado.

– Se fosse a Megan, seria bem na cabeça – Olivia falou ao se virar.

– Sorte a dela não estar aqui então – Oscar sorriu.

– Sorte a sua de não estar amarrado ao alvo – abriu um sorriso cínico – Quer se arriscar?


     "Chega de brincar com isso", Oscar guardou as facas e foi até o gancho do trapézio, o trazendo até o centro do picadeiro. Olivia estava animada, ainda não haviam treinado naquela semana e ela estava ansiosa. Com mais confiança do que nos outros dias, ela se pendurou em sua barra e logo ficou de pé sem a ajuda de Oscar, que se sentou no chão e ficou a observando se balançar.

     "Eu vou tentar o developpé", ela abriu um sorriso quase infantil, o fazendo sorrir também. Oscar acreditava que ela conseguiria, então continuou sentado a observando. Olivia começou a levantar a perna esquerda, mas quando chegava a uma certa altura, sentia os músculos se repuxarem e desistia. Mas não desistiria dessa vez. Sabia que não conseguiria erguer o pé até a altura da cabeça, mas queria ver até onde seria capaz.

     Soltou uma das mãos e tentou forçar a perna, mas acabou se desequilibrando. Olivia gritou o nome de Oscar, que se levantou em um pulo e a segurou pela cintura, mas tropeçou nos próprios pés e caiu de costas no chão, fazendo com que o corpo dela caísse sobre o seu. Uma crise de riso a tomou quando viu o semblante assustado do rapaz. Logo a risada o contagiou e ele começou a rir da situação. Os dois se encararam e as risadas foram diminuindo até que restasse apenas um sorriso em seus rostos.

– A próxima vez que você perguntar quando foi que me deixou cair, eu vou lembrar de hoje – Olivia sorriu.

– Mas ainda assim eu amorteci a sua queda...

– Ah sim... – deu dois tapinhas no peito de Oscar e se apoiou nele para conseguir se levantar – Obrigada por isso.


     Depois daquela queda os dois decidiram encerrar o treino. No caminho até seus trailers, conversavam mais do que qualquer outro dia. Despediram-se e Olivia se apressou para ajeitar seu figurino. Ainda faltava algumas horas para o espetáculo, mas ela estava tão ansiosa para voltar aos palcos que não queria correr o risco de atrasar um minuto sequer.

     A primeira apresentação estava acontecendo, e da coxia Olivia e Megan espiavam o número de Alice e Benjamin. Elas fofocavam sem parar até que Oscar surgiu por detrás das duas. A ruiva ergueu o olhar até ele e o desceu até sua amiga que sequer havia percebido a presença do rapaz. "Nós somos os próximos", ele falou, fazendo Olivia se assustar e Megan rir.

     "E agora com vocês, o lançamento de facas, com Oscar e Olivia!", Richard falou com entusiasmo. Olivia vibrou ao ouvir seu nome ser anunciado no microfone mais uma vez e sorriu para Megan, que deu um abraço rápido na amiga e começou a aplaudi-la enquanto gritava seu nome da coxia.

     O dois foram até o picadeiro em meio a palmas e ela precisou segurar as lágrimas de emoção que queriam aparecer. Após alguns passos teatrais não tão elaborados, Olivia foi até o alvo e estendeu os braços para que Oscar pudesse prendê-los à madeira.


– Bem-vinda de volta – ele falou com um sorriso ao afivelar a tira de couro – Aproveite as palmas. Elas são para nós.


Feliz Ano Novo meus amores!

Espero que todos estejam bem! ♥

Sobre esse capítulo, finalmente rolou um climinha mais evidente entre eles né? Eu fico um tempo sem postar ou sem ler os capítulos e quando volto eu lembro o porquê eu amo esses dois! kk

É isso, espero que tenham gostado do capítulo, mas deixo uma perguntinha aqui: vocês acham que esse climinha vai trazer um beijo em breve ou que vai demorar? Façam suas apostas!

Beijinhos e vejo vocês em breve! ♥

Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top