Estaremos Juntos
– Mãe, pai, eu amo vocês, amo muito, muito vocês — Abraço os dois e os meus olhos se enchem de lágrimas. Sei que é pouco tempo que tenho. Preciso ir novamente.
– Oh meu filho, estaremos juntos para sempre — Meu disse essas palavras. E ele não faz ideia como essa simples frase me marcou em todo esse tempo.
– Não precisa chorar meu filho. Porque está chorando? Mamãe ama você — Minha mãe é maravilhosa, sensível e doce. Como ela faz falta.
– Não é nada mãe, é bobagem, eu sou chorão mesmo — Dou uma risada forçada para poder aliviar eles. Não quero preocupa-los.
Eu me sento no sofá e vejo eles ali, comendo bolo e tomando café e observamos juntos um belo aquário que há na sala, enquanto somos aquecidos pela chaminé naquele momento. Eu preciso ir. Está na hora de subir.
Deixo eles no sofá conversando e sem perceberem, subo as escadas, ando pelo corredor relutante por dentro. Eu quero ficar. Quero muito ficar. E eu não posso. Abro a porta do meu quarto e eu fecho ao entrar.
Pôsteres de banda que eu sou fã, a cama bem arrumada. Parede azul mar e estrelas desenhadas no teto do quarto, são detalhes que sempre me chamou atenção. Quarto escuro, computador desligado, eu me sento na cama reflexivo. Meus olhos se encontram com chão de madeira e me perco nos meus pensamentos. Eu preciso ir. Eu tenho que ir. Está na hora de ir.
Eu me agacho e puxo uma caixa debaixo da minha cama. Abro ela e o revólver está lá. Intacto. O sentimento de apatia é gigantesco em mim, mas eu preciso fazer isso se for consertar o que preciso fazer. Ja fiz isso antes. E estranhamente voltei no tempo. Justamente naquele dia.
Pego a arma.... e.... Aperto o gatilho....
Várias cores eu vejo em volta de mim. Amarelo, vermelho, azul, branco. Muitas cores e outras que eu nunca vi na minha vida inteira. Vários tons, contrastes e jeitos. Estou caindo em um limbo mas não sinto medo da queda. Estou caindo, caindo e caindo no meio das cores. Até que chego na superfície.
As cores são tintas, e estou no corredor com várias portas e várias portas, e nelas há números indicando o ano de cada acontecimento importante da minha vida. Nos últimos anos a maioria deles são de dor. Desde que aconteceu aquilo, eu não aguentei, e eu... Eu tentei... É vergonhoso eu falar, pois é sensível demais para mim. Eu não conseguir, e a minha decisão foi tentar parar tudo isso logo dando o fim na minha própria vida. Eu não aguentei. A dor é forte aqui dentro. A culpa é implacável aqui dentro de mim.
Cada porta tem data, e um nome para tal acontecimento.
"2017, acidente" Foi nesse dia que tudo aconteceu. As outras portas não importam para mim, mas tem "primeiro beijo" "Aniversário da Camila" "Escola com amigos" e entre outros que sinceramente não quero saber.
Misteriosamente eu não morro. Estranhamente eu volto no tempo e sou levado a essa data. Abro a porta e escuto um som de violão, a música tocada é "Asleep" da banda "The Smiths". Sou eu no meu quarto tocando essa canção. Vou andando até esse outro eu. Encosto nas costas dele e eu entro em seu corpo.
– Voltei — Mas continuo tocando a música, e eu me preparo pra cantar a primeira parte. Só a primeira, antes de tentar acertar as coisas.
– "Sing me to sleep
Sing me to sleep
I'm tired and I
I want to go to bed
Sing me to sleep
Sing me to sleep
And then leave me alone
Don't try to wake me in the morning
'Cause I will be gone
Don't feel bad for me
I want you to know
Deep in the cell of my heart
I will feel so glad to go"
Continuo tocando a parte sonora, e eu preciso parar. É um dia difícil pra mim. É a terceira vez que eu volto pra cá desde quando descobrir que faço isso.
Coloco o violão em um canto e desço até a sala onde vejo os meus pais.
– Olá filhão, chama sua irmã e seu irmão. Vamos sair daqui a pouco — Meu Deus, eles estão tão novos nessa época, estamos em 2025, aqui é 2017. Que loucura tudo isso. Mesmo estando aqui na terceira vez, ainda não me acostumei com tudo isso.
– Pai... Vamos pra praia não? É... eu não quero ir, na verdade, vamos ficar aqui mesmo. Olha, tá tendo cada filme legal no cinema. Quero ir no cinema com vocês — Ele me olha estranhando com o que eu disse.
– Ué porque mudou de idéia? Estava tão empolgado hoje cedo — Nisso ele tem razão, mas eu não sabia o que iria acontecer nesse dia.
– Sim mas... — Ele me interrompe.
– Charles, chama sua irmã. Precisamos ir, seus avos estão doentes já se esqueceu? — Merda é verdade. Mas mesmo assim preciso fazer alguma coisa. Eu não quero perder os meus irmãos nesse acidente. Meus pais sofreram tanto com a perda deles, tanto, que eu entrei em um buraco que não conseguir mais sair. Ver eles me trazem a dor. Eles seguiram em frente, mas eu não conseguir.
Refletindo ali, escuto a voz deles dois brigando com alguma coisa.
– Ah cala a boca seu bobão — Minha irma Luiza falando com Paulo. Eles são gêmeos, isso porque a família por parte da minha mãe é, então dá pra entender né.
– Bobona é você cara de cavalo cururu — Responde Paulo. Olhando para eles, com seus apenas dez anos, me faz sorrir de saudades que faz o meu coração apertar. Como eu os amo.
– Vocês dois podem parar? — Eles olham para mim e ignoram. Vou até eles e me agacho para ficar a altura deles. Eles me olham estranhando e eu os abraço.
– Eu juro que eu tentei, eu juro. Amo muito vocês. Apesar de tudo, estaremos juntos meus amores. Sempre, sempre e sempre...
– Sai daqui seu esquisitão — Luiza me empurra e sai correndo, e Paulo faz a mesma coisa e segue ela. Fico sozinho ali, no meio da minha dor em pensar em perdê-los.
Na minha primeira volta, tentei furar os pneus, não deu certo. Na segunda volta entrei no carro e corri para bem longe. Mas os meus irmãos brincando, caíram na escadas, ambos bateram a cabeça e morreram. Justo tinha que ser assim. Nada que eu faça resolva, eles sempre se vão.Não adianta o que eu faça. Eles sempre morrem.
Fecho os meus olhos, e me lembrando de todas essas voltas no tempo, acho que eu sei o que precisa ser feito. Desde essa última tentativa eu já estava pensando nisso, aceitar que eles se foram, aceitar que é a hora deles. Aceitar que os meus pais, apesar de sofrerem, conseguiram seguir em frente, e é injusto eu desistir e deixar eles sozinhos no mundo. Preciso seguir em frente.
– Tá pronto pra ir Charles? Você vai? — Disse minha mãe, e nessa hora eu sempre falava não. Eu não aguentaria vivenciar esse acidente de novo...
– Eu vou mãe. Estaremos juntos nessa viagem — Sorrio para ela, enquanto a porta é aberta pelo o meu pai, e uma grande luz do dia invade a minha casa com o sol Iluminando o meu rosto. Recebi uma nova chance de viver, apesar de tudo, preciso seguir em frente e jamais desistir. Apesar da dor. Eu precisava voltar e passar o meu último dia ao lado dos meus irmãos.
FIM
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