Apartamento 507

- Olha, eu não faria isso se fosse você - Sua voz, pesada e sem vida, se dirige a mim. Na janela contemplando a vista, com seu terno branco e bigode por fazer. Ele olha nos meus olhos.

- Isso é o que você diz. - O confronto. Estou deitada aqui na minha cama, olhando aquele homem, o estranho homem.

- Olha esse andar do seu prédio, só vir e se jogar, e 'BUM' acabou a história - Ele diz gesticulando com as mãos, rindo e fazendo uma dancinha, isso me irrita.

- Acha que é fácil fazer isso? - Me enrolo nas cobertas e me viro para a parede, meu corpo está frio, o desejo ansiando para tentar mais uma vez. Não sei explicar muito bem o que é isso. Estou sozinha nesse quarto, todo sujo e bagunçado. Roupas jogadas no chão, papéis espalhados... Não me levanto há dias aqui, e aquele homem desapareceu de repente, não sei se eu sonhei com ele, ou se é real, devo está ficando louca, mas do nada ele aparece aqui. Me viro para janela, encaro ela... Encaro ela... O dia está nublado, frio. Me levanto e sigo andando até a janela. Já quero voltar pra cama. Abro, o vento gelado bate sobre o meu rosto, o meu corpo se arrepia pelo frio...Fecho a janela e volto para a cama, me enrolo nas cobertas e me viro para a parede novamente, escuto lentos passos atrás de mim, me viro bruscamente para ver quem é, e uma figura de homem de chapéu, barrigudo e de terno, ele é todo preto e branco, não consigo ver o seu rosto, e ele diz coisas baixas, que não compreendo o que é, são sussurros difíceis de compreender.

O homem se vira e segue andando até a porta do quarto, ele abre e sai. Me levanto devagar da cama, sigo até a sala onde se encontra ao sair do quarto. Quando chego, uma coisa no teto me chama atenção, meu corpo fica frio do nada, meus braços tremem, minhas mãos suam. Vejo uma família almoçando, cochichando alguma coisa, sim, estou vendo pessoas que nunca vi na vida almoçando no meu teto, de cabeça pra baixo, todos eles são preto e branco, é como eu os enxergo, são cores que vejo. O pai, que está à mesa, se levanta, e começa a andar todo torto pelo teto, ainda sussurrando coisas difíceis de compreender. Ele para de andar, paro junto.

- Você pertence a esse lugar? - Sua voz rouca e grave, dirige as palavras a mim. Lentamente ele vira o seu rosto para me ver. Quando olho sua face, dou um passo para trás, com susto que tomei, ele usa uma máscara de porco.

- Volte para o seu quarto, para sua cama, e não saia de lá - Suas palavras me atingem como uma faca, sinto uma força querendo me puxar para o meu quarto. E obedeço essa força.

Ao abrir a porta do meu quarto, noto uma escada rumo a uma descida infinita. O quarto simplesmente virou um corredor curto somente de escada. Olho para trás, confusa, e o homem com a máscara de porco me encara. Desço as escadas, pouco a pouco. Na parede há quadros e frases escritas abaixo delas, mas estão escritas em outra língua, no qual não compreendo. Os quadros estão embaçadas, minha visão não está ajudando. Prossigo descendo as escadas...

Descendo

Descendo

Descendo

Descendo


Descendo

Fim dela. Ufa, achei que não terminaria isso aqui. Me encontro no corredor todo escuro, enxergo nada, nada, nada. De repente, no meio da escuridão uma vela se acende, e uma frase se escreve sozinha no ar.

"Em seu quarto, a escuridão incompleta, a janela aberta, pensamentos te pega. Desce, desce, desce, o fundo do poço, uma pequena luz se revela"

Não entendi essa frase, não compreendo... Uma porta surge do nada abaixo dela. Curiosa, eu entro.

Estou no meu apartamento de novo.

Esta tudo como deixei, aquela família com a máscara de porco que estava no teto já não estão mais. Mas há algo de estranho, sinto isso. Olho para trás e abro a porta. Tudo normal. Aquela escada toda, aquela frase, a vela, já não estão mais lá. Agora é apenas um longo corredor, com piso branco e paredes manchadas com a sujeira do tempo, a iluminação é fraca, nessa pequena escuridão vejo ao fundo, uma coisa parada, segurando um objeto. Sinto frio na barriga, minhas pernas fraquejam um pouco. A figura pisca e pisca, como se fosse um erro da Matrix. Fecho a porta. O que está acontecendo? Que coisas são essas? Escuto som, é do telefone, ando pela sala até chegar nela. E atendo.

- Ei, você não vem hoje? - É uma voz feminina, não reconheço.

- Q-quem é você? - Confusa digo, não faço a mínima quem é que seja.

- Sou eu boba, sua irmã, Cecília - Confirma ela

- Cecília? Eu, eu não tenho nenhuma irmã, ainda mais com esse nome. - Minha voz segue confusa e fria.

- Realmente hein, sempre brincalhona.

- O que você quer? - Digo com firmeza

- "Calma, tem andado muito estressada esses dias. Sei que brigamos mas irei aí ver você tá bom? Aliás, tô indo aí agora, daqui a uma hora tô aí. Ah é irmã, esconda a faca hein." - Diz ela com certa empolgação em sua voz, tentei dizer mais coisas, porém ela me cortou. Quem é essa mulher? Será que ela é uma daquelas coisas? Esconder a faca? Como assim? O que ela quis dizer com isso?

Escuto batida na porta. Mas já? Lentamente ando até a porta. Dou uma olhada no olho mágico, é ela. Ela é morena, cabelo curto, com uma vestido bege. Está com a mesma vestimenta que estou... Abro a porta. Uma figura de máscara de porco me ataca com uma faca, caio no chão com ele ou ela em cima de mim. A pessoa me soca com muita força... Apago.

Lentamente meus olhos se abrem

Meus braços amarrados...

Cheiro de enxofre...

Meu apartamento, é a sala... Está diferente...

Levanto a cabeça devagar, na minha frente uma mulher sentada com as pernas cruzadas, com um sorriso de canto em seu rosto, rindo um pouco enquanto me olhava. Me sinto paralisada, minha boca não se mexe, minhas pernas também não, apenas minha cabeça e ainda naquelas.

- Olá dorminhoca.- Sua voz, em tom de zombaria, parece que vai cair na gargalhada em qualquer momento.

- Apartamento bonito você tem não é? Ah eu esqueci, você não consegue falar. Não tem problema, eu falo por você "Quem é você?" Minha resposta "Não importa, curta o momento, sou apenas uma grande amiga" aí depois, você irá falar "O que está acontecendo? O que você quer?" Mais uma resposta "Não está acontecendo nada, e o que eu quero? Ah, eu quero diversão, ver até a onde você vai com toda a tortura e medo. Aliás, não explorei muito isso, até porque é um conto e o autor está com preguiça de contar essa história estranha e sem nexo algum, eu sou uma vilã genérica criada por ele. Antes que me pergunte, eu em pele humana me chamo Bárbara, mas eu sou mais do que isso."

Ela dar risada. Sorriso de ponta a ponta em seu rosto, dentes brancos como a neve, um olhar tão mau, tão insano, tão... mau. Sua aparência está diferente da primeira vez que a vi na porta. Agora seu cabelo é ondulado e castanho, magra, ela é linda, seus olhos são da mesma cor de seus cabelos.

- Eu sou um e todos ao mesmo tempo - Continuou ela - Sou todos em um em todo momento, sabe, eu tenho minhas vítimas, apareço de formas diferentes para cada um sabia? Pra você, apareço como uma mulher, mas posso aparecer como homem, criatura, sombras, fumaças. Ou um pensamento? Ah há, pensamentos... Sabia que eu conheço os seus garota? Cada pensamento, você olhou muito para sua janela né não? Se jogar de lá, é garota, eu te conheço. Sabe, eu só quero me divertir e desgraçar a cabeça de pessoas, e sabe, muitas tiram suas vidas, é tão.... Divertido, eu gosto disso, eu amo isso. Se eu fosse você, me jogaria logo naquela janela, sua vida não vale a pena... Me entendeu né? - Ela ri mais uma vez, uma risada que me dá calafrios - Eu gosto de conversar com minhas vítimas sabia? Gosto da intimidade, de conversar... Ai que delícia isso, me sinto tão viva... Sabe, é como se vocês fossem fantoches, e eu a controladora. Controlo todos vocês em minhas mãos. Agora garota. VOLTA PRA CAMA!

De repente me desperto. Ofegante. Não estou no meu quarto.

Acordo, me levanto da cama. O que aconteceu? Não me lembro de nada... Fico sentada na cama olhando para a janela. Um vento gelado entra por ela. Ando até a janela e a fecho. Fico olhando para a altura, lá em baixo... Várias pessoas andando para lá e para cá. Há outros prédios a frente. Coloco as mãos na janela, destranco, e a abro devagar, fico observando, um desejo estranho entra em meus pulmões, o coração acelera, um pensamento estranho me impulsiona a colocar as pernas na janela...

Som da campanhia.

Fecho a janela e a tranco.

Passo pela sala, tudo está normal. Caixa de pizza sobre a mesa e uma capa de um poster com máscara de porco aterrorizante, é, antes de dormir ontem vi um filme horrível de terror, uma família de psicopatas que usa máscara de porco, que ideia brilhante. Engraçado que sonhei com isso essa noite. Que noite. A campainha toca novamente, e ando até a porta, olho no olho mágico, é um homem de óculos, asiático, aparentava ter uns quarenta anos, quem é ele? Antes de abrir a porta, dou uma geralzinha na sala, depois sigo até a porta e a abro.

- Ah oi, desculpe incomodar você, sou seu vizinho, eu e a minha esposa nos mudamos faz poucas semanas. Eu sei que será loucura, mas faz dias que eu tô falando em falar com você, conversei com a minha esposa e ela concordou em eu vir pra cá conversar contigo, ela esta vindo. Ah, olha ela ai. - Olho pro corredor, e uma moça vem em nossa direção, ela é loira, elegante, muito bonita.

- Oi minha flor, tudo bem? Me chamo Marie.

- Oi, prazer - Digo toda sem graça, o que ta rolando aqui? - Vocês querem entrar? - Pergunto sem jeito

- Não queremos incomodar, você tem certeza? - Ele pergunta todo educado, e eu permito eles entrarem. O moço entra, fica admirando meu simples apartamento, olha as paredes, quadros, noto um olhar de preocupação nele.

- Podem se sentar, fiquem a vontade - Eles se sentam juntos no sofá, faço o mesmo no sofázinho a frente, e por alguns segundos fica um silêncio um pouco constrangedor.

- Então, o motivo de eu vir aqui pode soar estranho para você - Ele começou a falar - então, sem mais delongas, vou direto ao assunto. Em algumas semanas, após me mudar pra cá junto com a minha esposa, sentia uma forte convicção de visitar esse apartamento, mas eu nunca entendi o porquê. Então, comecei a ter sonhos, e a minha esposa também começou a ter, sonhos, pesadelos, com esse apartamento. Assim que entrei aqui, tudo que vi no sonho é igual, até aquele quadro ali na parede tinha no sonho.

O que esse cara tá tentando dizer? Ele está me assustando.

- Até que, o Senhor me disse que uma garota que mora aqui passa por coisas que eu já havia passado. Sim, antes que me pergunte, eu sou cristão, mas calma, não sou um fanático, não sei se você acredita, mas precisava vir aqui e dizer que entendo você, dizer que você é muito amada. Seu nome é Valéria não é? - Os olhos dele me passa tanta confiança, bondade, não consigo sentir mentiras vindo por parte dele, e eu confirmo que sim com a cabeça, e eu não tinha palavras, nem perguntas, nunca vi esse homem na minha vida.

- Eu sei que você já pensou e tentou se matar muitas vezes Valéria. Quero dizer uma coisa, eu também já tentei me m#tar, com um revólver, mas algo me salvou, algo me fez pensar que a vida ainda vale a pena. Quando tive os sonhos, eu via você descendo as escadas infinitas, via você confusa com pessoas no seu teto com a máscara de porco, via aquela mulher, Bárbara, e também aquele homem que vive no seu quarto dizendo pra você se jogar da janela. Vi seus demônios, e sei o quanto isso perturba você.

- C-como? Onde você quer chegar? - Automaticamente as lágrimas já estavam rolando sobre minha face, difícil me controlar. A esposa dele veio até mim, se sentou no meu lado e me abraçou, encostando a minha cabeça sobre seu peito, me sentir... Amada, de certa forma.

- Valéria, Deus me mandou dizer, me trouxe até aqui, pra dizer que você é muito amada. Há uma grande batalha pela sua vida. Posso orar por você? - Fico pouco receosa, e afirmo que sim com a cabeça, a esposa dele ainda fica abraçada comigo.

- Meu Pai, o Senhor me trouxe aqui por um propósito, você permitiu eu ver coisas muito profundas a respeito da Valéria. O Senhor me mostrou quantas vezes ela tentou se matar, pois ela se sente sozinha, ela sofreu abusos psicológicos quando criança, o seu pai a abandonou, tanta coisa Você me mostrou, e quero dizer que você é maior que a morte Pai, por isso Senhor, que suplico e imploro, que toda maldição e norte caia por terra nesse lugar Senhor, que todo pensamento suicida, que todo demônios se retire nesse lugar Senhor. Que a Valéria habite no esconderijo do Altíssimo, pois lá ela será guardada. Por isso a coloco em suas mãos Pai, que saia toda morte na vida dela, toda perturbação, todo medo, que prisões caiam, aqui e agora Senhor. E que todo aquele que estiver lendo esse conto, seja também tocado por você também Pai, nos perdoe pelos nossos pecados, somos falhos, restaurem a nossa esperança Senhor, nos leve de volta pra você novamente. Em nome de Jesus Pai, amém.

Não consigo parar de chorar, escuto passos dele vindo até mim e me abraçando também junto com sua esposa.

- Está tudo bem minha filha, nada mais vai perturbar você, estaremos sempre aqui.

Eles ficaram ali, ao meu lado, e o único som que quer e há agora, são os das minhas lágrimas

Fiz um café para eles, conversamos mais, e ele me entregou um livro.

- Quis te entregar esse livro, se chama "Espelhos Paralelos" é baseado na minha vida, é um conto biográfico vamos dizer assim - Ele riu um pouco e prossegue - uso muitas metáforas, mas acho que boa parte delas você vai entender, esse conto fala um pouco da Marie também.

- Querida, antes de conhecer meu marido, passei por coisas semelhante a você sabe, na verdade fui sequestrada quando criança e fui mantida em uma grande casa por muitos anos, aquela casa era estranha, mas sempre me lembrava do Senhor, apesar de me sentir sozinha, eu nunca estava. Meu marido aqui é tagarela, eu já sou mais na minha por isso não falei muito, mas quero que saiba que agora você tem amigos tá? Leia esse livro, vai te ajudar muito, o que ele passou, é algo que você também poderá entender e com certeza eu creio que poderá te ajudar.

- Obrigada Marie, obrigada - Eu simplesmente não sei o que aconteceu aqui, só sei que foi bom, muito bom, nada explica o que estou sentindo agora, eu sinto paz, como nunca havia sentido antes.

Eles já estão de saída, dou um abraço neles bem apertado, os dois saem e fecho a porta, muito, muito feliz.

....

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- É amor, mais uma missão cumprida, que doideira. - Me expresso para ela, sentindo um alívio enorme.

- Oh amor, graças a Deus né, precisamos mais que nunca ficar ao lado dela, sabemos que é um longo processo.

- Exatamen... - É inacreditável, sinto forte cheiro de enxofre, Marie olha pra mim sentindo o mesmo, olhamos para trás e o cenário do corredor fica todo em vermelho, menos na parte do apartamento da Valéria. Que está todo com uma Luz Azul, os outros apartamentos pelo menos nesse corredor não tem a Luz, e isso é bem triste.

- Você e Marie, sempre no meu caminho - Essa maldita voz, era ele atrás da Luz, ele não consegue passar por ela, pois é um demônio.

- Olá Manipulador. - Que preguiça desse demônio.

- Vocês dois, eu vou acabar com vocês.

- Não se Deus deixar - Diz Marie

- Você era a Bárbara nesse tempo todo... No fundo desconfiava. - Digo com tom de nojo na minha voz, não suporto essa presença dele, essa cara, a voz.

- É o meu alimento. Mas você não consegue salvar todo mundo né, sabe quantas vidas estão nas minhas mãos agora? Muitos, e eu ainda vou continuar colocando.

- Você já está derrotado, seu tempo é curto. - Disse Marie, com uma grande convicção em sua voz.

- Eu sei, por isso tô fazendo o meu trabalho sem descansar, ver pessoas se matando por estarem sendo oprimidas é o meu prazer, eu quero mais é que elas se fodam. Olhem, sintam esse cheiro - Ele sente cheiro de algo, e inspira e expira - Isso é cheiro de sangue, cheiro de alma oprimida, cheiro de morte, isso é delicioso...Tchau meu casal favorito, em breve nos veremos, e podem ter certeza de uma coisa; eu vou matar, roubar e destruir vocês- Ele se retira numa sombra do corredor.

- Pode vir, vem com tudo, não é comigo que esta lutando - Falei isso mesmo, Jesus é maior que esse fraco demônio.

Todo o cenário que estava em vermelho, voltou ao normal. Sim, estávamos no mundo espiritual. Mas pelo menos sei que ele não mexerá com a Valéria. A nossa luta é incansável, mas não desistiremos.

FIM

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