capítulo 10





“Um dia a vida sempre nos pega desprevenido e nos tira da nossa zona de conforto. Quando esse dia chega temos poucas opções, já que o inesperado trás consigo suas próprias surpresas, e consequências...”






”É BIG! É BIG! É HORA É HORA É HORA! RA-TIM-BUMMM! KAROL! KAROL! KAROL! KAROL! KAROL!”

Todos sorríamos e nos alegrávamos ao final da tão conhecida cantiga de aniversário. O esperado dia de comemorarmos mais um ano de vida da Karol enfim havia chegado.

Luiza trouxera duas caixas de isopor cheias de cerveja, Arthur o violão, e eu o bolo. O cenário estava preparado para nos divertirmos e sairmos um pouco da loucura que era a faculdade de medicina.

Era finalzinho de tarde, quase transição para a noite, e nós já estávamos ali há pelo menos três  horas. Metade de uma das caixas de cerveja já havia ido embora, e à essa altura o álcool começava a nos pegar.

Luiza, mesmo com o vento frio que soprava do mar incomodando a todos, decidiu tirar a camisa e ficar só de top, o que achamos uma loucura; mas se não fizesse algo do tipo não seria ela. Arthur acendeu uma fogueira e agora todos estávamos em volta dela, dançando e cantando ao som de legião urbana.

Para minha grata surpresa, o mineirinho realmente sabia cantar e tocar muito bem, e o programa sugerido por Luiza, que eu achei que seria um fiasco, estava se mostrando muito divertido.

A praia do Seixal era de areia natural, e ficava na costa norte da ilha da Madeira. Era uma das praias mais visitadas de lá, graças ao seu cenário arrebatador.
A areia era negra fina, e suavizada pelo verde reluzente das montanhas circundantes. Tinha um pequeno porto/cais junto à praia, que fazia quebrar ligeiramente a força das ondas. Nas proximidades, encontravam-se também piscinas naturais do Seixal, onde podia-se dar belos mergulhos, quando o tempo era propício, o que não era o caso hoje.

No início não concordei muito com a ideia de irmos para outra cidade comemorar o aniversário da Karol, mas agora podia dizer que fora a decisão mais acertada.

Outras pessoas também visitaram a praia naquele dia, mas à medida que a pouca luz do sol ia  recuando, a maioria delas foi indo embora, com exceção de uns poucos casais, e mais um montinho de pessoas também juntas ao redor de outra fogueira no lado leste da praia.

Quando a noite enfim nos e envolvia por completo, restavam apenas algumas cervejas, e eu já estava mais tonta que pretendia estar. Naquele momento decidimos que era a hora de entregarmos os presentes. Luiza foi a primeira. Ela se abaixou e pegou a sacola de papel que havia trazido. De dentro ela tirou uma camiseta branca e entregou para Karol. Ao segurá-la nas mãos, a carioca percebeu que havia uma foto da Luiza sorrindo.
Eu e Arthur desatamos a rir, enquanto Karol dava um sorriso amarelo meio constrangida.

— Obrigado, amiga, eu acho... — Ela disse meio sem graça.

— De nada, amiga! — Respondeu Luiza, com o sorriso maquiavélico que só ela tinha. — É para usar todos os dias, viu!

Todos rimos novamente, inclusive Karol.

Eu fui na minha mochila e peguei um pacote pardo com um lacinho vermelho por cima.
— Não é tão bacana quanto a camiseta da Luiza...

— E não é mesmo! —  a paulista interrompeu.

— Mas... —  olhei de canto de olho para ver se Luiza não me interromperia novamente. — É de coração. — Ao concluir, entreguei o pacote para Karol.

Ela pegou, abriu lentamente e deu um gritinho agudo ao ver o conteúdo do pacote.
— NÃO ACREDITO AMIGA! A COLEÇÃO COMPLETA?!

Assenti em confirmação e ela me abraçou com euforia emitindo gritinhos agudos.
— Muito muito muito muito muiiiito obrigada!

— Não foi fácil, mas enfim consegui encontrar.

Ela começou a folhear cada uma das revistas em quadrinhos do homem aranha, pelas quais era tão apaixonada e colecionava desde a adolescência.
— A edição completa, amiga... Eu não acredito... — Falava sem olhar para mim, enquanto descobria lentamente cada nova folha.

— Sei há quanto tempo você estava procurando.

— Agora minha coleção está completa... Eu amei, amiga... Sério, amei demais!

— Depois da camiseta, né? — disse Luiza.

De repente Arthur pigarreou alto para que ouvíssemos.
— Agora é minha vez! Peço que façam silêncio por favor.
Nós assentimos, então ele pegou o violão e começou a cantar uma música que nunca tínhamos ouvido.


Como foi doce pousar e te ver bem ali.
Meu coração quase parou logo assim que te vi.
Esse seu jeito de olhar me fisgou,  seu lindo  sorriso se abriu para mim, o meu mundo hoje tem mais cor por que te conheci.
Eu nunca pensei que seria tão feliz assim.
Que dure um minuto, que dure pra sempre aqui.
Se existe um futuro em que não há você, prometo, eu juro nele não viver.
És meu alicate, sou teu bisturi, loirinha o meu marcapasso só bate por ti.
Ai de mim se não tivesse encontrado você.
Meu sol da manhã, rosa do meu jardim, não posso imaginar outro alguém pra chamar de bebê.


O silêncio que nós três fizemos enquanto Artur cantava, foi muito mais significativo que qualquer salva de palmas, e elas realmente não se fizeram necessárias, já que  demonstrávamos consternadas e com olhos marejados o quanto amamos aquela linda declaração de amor.

— Amor... — Karol foi até Arthur e o beijou. — foi o melhor presente que já ganhei na vida! — Disse visivelmente emocionada.

— Até mais que minha camiseta? Ah... Sua ingrata! — Brincou Luiza, também com os olhos marejados. 

— Foi páreo duro, amiga, mas Arthur ganhou por pouco.  — brincou Karol.

— No próximo faço uma do Alvarenga também, daí quero ver o Arthur me ganhar! — Naquele momento os risos foram mais genuínos, mas não o meu, que apenas sorri para não ficar estranho; e estranha estava minha situação com aquele homem que me abalava tanto. Mas não queria demonstrar nada para não acabar com a alegria dos meus amigos.

Assim que os risos cessaram, Arthur deixou o violão de lado e ajoelhou-se sobre uma das pernas.
Então ele levou a mão até o bolso e tirou uma caixinha preta de lá.
— Sabe, loirinha... — ele começou a falar, enquanto Karol ficou paralisada de boca aberta e com  os olhos arregalados — Para mim não foi difícil chegar a essa conclusão.  Na verdade levou apenas cinco minutos depois que desci daquele avião — Eu suspirei ao ver aquela cena acontecendo bem à minha frente, mas por algum motivo Luíza não parecia surpresa. — mas ainda assim, — ele continuou — grandes momentos exigem grandes cenários e grandes acontecimentos. Por isso, hoje, no dia em que nasceu o amor da minha vida, nesse lugar maravilhoso, achei propício declarar ao mundo o quanto te amo e sempre te amarei. — Àquela altura as lágrimas já esquentavam meu rosto. — Meu amor... — ele abriu a caixinha e tirou um anel de noivado com uma pedrinha brilhante em cima — poderia conceder a este pobre apaixonado a honra de viver ao meu lado enquanto Deus assim permitir? 

— Acho que ele quis dizer que quer casar com você! — gracejou Luiza. Só mesmo ela para arrancar um sorriso das pessoas em um momento como aquele.

Karol, já sem conseguir produzir palavras por conta dos soluços que a acometiam, balançou a cabeça repetidas vezes em um gesto positivo, mas por fim conseguiu falar:
— Si-sim! Sim! SIMMMMM!
Arthur se levantou e os dois se beijaram ardentemente ali na nossa frente.

— Esperem a lua de mel seus apressadinhos! — Disse Luiza.

Arthur se afastou de Karol e a olhou nos olhos.
— Eu te amo demais!

— Eu também! — Devolveu a noiva.

— Agora agradeça a Luiza, amor. — Disse Arthur.

— Por que? — Karol perguntou com curiosidade.

— Foi ela quem nos deu o anel de presente. Tentei recusar, mas você sabe como ela é. 

— Não achou mesmo que meu presente seria uma camiseta com minha foto né? — Luiza falou com um olhar malicioso no rosto. — Se bem que eu acho mais bacana que o anel, mas enfim...

— Ô amiga... — Karol foi até Luiza e a abraçou. — muito obrigada! E saiba que vou sim usar a camiseta! — Naquele momento a carioca voltava a sorrir.

Luiza se afastou um pouco de Karol e falou com um sorriso no rosto:
— Tudo bem! Já demos presentes, você já ficou noiva, mas agora vamos ao que interessa! — Nós nos entreolhamos com cara de paisagem, mas não falamos nada. — As cervejas, gente! Vamos logo acabar com as cervejas para podermos ir para a casa! Está um frio do diabo aqui! — Sorrimos — MÚSICA ARTHUR!

Aquele dia foi um dos mais marcantes da minha vida, com momentos tão vivos na minha mente que poderia descrever cada detalhe dele se quisesse.
A afinidade, amizade e cumplicidade que tínhamos era ímpar. Dividíamos momentos bons e ruins, e nos ajudávamos mutuamente.
Apesar de tudo o que aconteceu depois, posso dizer com certeza que aqueles anos na faculdade de medicina em Portugal foram  os mais felizes da minha vida, por que tinha como amigos: Luiza, Arthur e Karol.















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