That was not a dream

HARRY POTTER
21 de outubro de 1999

Mal abro os olhos e já sinto minha cabeça doer de um jeito infernal. Santo Deus, eu estou péssimo, detonado. Rolo para o lado e antes que eu possa ver por onde, caio da cama de cara no chão. Solto um gemido alto, querendo chorar.

— Cala a boca, Harry!— Ron reclama na cama ao lado e eu luto para me levantar, sem força nos braços. Meu melhor amigo está com as cortinas do dossel da sua cama fechadas, o rosto afundado no travesseiro. Tateio a mesa de cabeceira atrás dos meus óculos e me pergunto quando foi que eu fui para cama.

Parece que eu tomei uma surra, mas assim que eu levanto tenho que ir correndo para o banheiro, quase não tenho tempo de levantar a tampa da privada antes de colocar o pouco que tinha no meu estômago para fora. Se o whisky de fogo desce queimando, quando sobe é pior ainda. Sem forças depois de vomitar, me joguei no chão deitando de barriga para cima. Minha cabeça fica girando de um jeito absurdo.

Eu preciso da Gina. Ela sempre deixa uma poção pronta para passar a ressaca que eu sei.

A base de muita força de vontade, eu me obrigo a levantar, e tenho de usar a pia de apoio para conseguir ficar menos bambo. Me olho no espelho, meus cabelos estão mais desgrenhados do que nunca, meus olhos estão cerrados e vermelhos, minha roupa está toda amassada. Uno as sobrancelhas — tanto por causa da dor de cabeça quanto por causa da confusão que se instala no meu cérebro — e passo a mão nos lábios sentindo que está faltando alguma coisa.

Lembro de ter beijado alguém. Por que eu faria uma coisa dessas? Quem foi que eu beijei?

Tiro os óculos mais uma vez para lavar o rosto com um pouco de calma. É como se eu estivesse tentando me lembrar de um sonho muito bom, mas ele me escapasse por entre os dedos. Não sei diferir o que é realidade e o que não é.

Quando paro de esfregar o rosto, uma luz surge no fim do túnel. Lentamente eu ergo o rosto e encaro meu reflexo espantado. Minha boca se abre um pouco fazendo o formato de "o", meus olhos crescem e meu estômago se encolhe.

Eu me lembro das risadas, das palmas e dos gritos. A memória parece em meio a uma névoa. Eu beijei a Nixie!? EU BEIJEI A NIXIE!???

Santo Cristo.

Corro de volta para o quarto e vou sacudir Ron para acordá-lo, quase rasgando a cortina ao puxá-la para o lado. O ruivo bate no meu braço e faz de tudo para me afastar.

— Me esquece, eu não vou treinar hoje, Harry!— ele resmunga.

— Eu beijei ela? Eu beijei ela?— preciso saber se foi real, meu coração disparou e minha voz ficou alta e aguda.

Acho que a probabilidade de isso ter acontecido me deixou muito empolgado.

Ron estala a língua e abre os olhos para me encarar com tédio, a cara sardenta amassada e inchada. Seu sono devia estar ótimo.

— Do que é que você tá falando?— ele pergunta em uma voz rouca.

— Nixie. Ela voltou e eu beijei ela, não foi!?

Ron franze a testa e balança a cabeça.

— Tá doido? Ela foi embora com o Zabini. Ele sim deve ter beijado ela.— ele volta a enfiar a cara no travesseiro e meus ombros caem. Eu sonhei...

Mas pareceu tão real.

Ron lentamente se vira para mim de novo, um vinco entre as sobrancelhas ruivas.

— Você queria ter beijado a Nixie?— ele me pergunta e eu sinto vontade de engolir minha língua. Meu rosto ferve e eu recuo, fechando a fina cortina vermelha entre nós por mais inútil que seja o resultado, já que ele ainda pode me ver. Ron se senta na cama e eu lhe dou as costas indo mexer no meu baú com a urgência para tomar um banho— Harry, você queria beijar a Nixie?

— Esquece, eu só tive um sonho muito realista.— resmungo pegando algumas peças de roupa, uma toalha e voltando para o banheiro, constrangido e derrotado.

Eu queria?

[...]

Me sento ao lado de Brandon a mesa e meu irmão me olha devorando um pedaço de pão como se não comesse nada há dias. Comprimo os lábios oferecendo um sorriso fraco para Gina e Hermione que trocam olhares e sorriem maliciosas.

— Dormiu bem, black-out?— ele pergunta e eu franzo a testa, o encarando. Ele está bem melhor que eu. Deve ter sido para ele que Gina deu a última poção que ela havia preparado. Por que caralho ela só preparou três?

— Maravilhosamente bem.— uso do sarcasmo porque é mais que óbvio que eu estou detonado. Ainda tenho que treinar hoje, mas não faço ideia de como vou montar em uma vassoura nesse estado. Foi uma péssima ideia, essa festinha. Perdemos um domingo de treino. Pego meu prato e me sirvo de macarrão e asinha de frango, meu estômago ronca alto de desejo. Estava completamente incapacitado de vir para o café da manhã, então com certeza vou abusar no almoço.

— Aposto que foi graças ao beijinho de boa noite.— Gina caçoa do outro lado da mesa e eu paro de me mexer quando meus amigos começam a rir baixinho. Cravo os olhos na Weasley fêmea.

— D-do que você tá falando?— indago com a voz trêmula, meu rosto queima de vergonha. Brandon bate no meu braço para chamar minha atenção, todo sorrisos.

— Vai dizer que esqueceu, black-out?— ele pergunta— Deve ter batido a cabeça quando caiu, porque o beijo foi tão bom que você desmaiou.— ele ri. Eu olho para todos os lados sem fixar os olhos em lugar nenhum— Eu juro que até bati palmas em pé de tão orgulhoso que fiquei quando você finalmente tomou uma atitude.

Agarro o braço do meu irmão com certa força.

— Do que você está falando?— sibilo.

— Do seu beijo, cara. Com a Nixie.— ele franze a testa, descrente que eu tenha esquecido de verdade.

Não foi um sonho. Eu perco o fôlego e acho que meu coração até para por uns segundos.

— Não foi um sonho.— sussurro perdendo o foco do olhar.

— Não mesmo, a menos que tenha rolado um puta surto coletivo já que todo mundo viu você agarrando ela!— Brandon bagunça meus cabelos como se eu fosse um cachorro e sorri— Foi lindo, irmão. Lindo mesmo.

Pego um pedaço de pão, desnorteado. Minha mente demora para aceitar.

— Como foi beijá-la, Harry?— Gina pergunta enquanto eu mastigo perdido em lembranças nubladas da noite anterior. Eu os olho e vejo seus olhos brilhando de expectativa para que eu lhes conte em detalhes como me senti ao beijar Nixie Black.

— Licença.— resmungo segurando a onda de surto o melhor que posso, me levanto e saio do salão em passos apressados, mesmo que sob protestos. Meu coração martelando loucamente pela segunda vez no dia.

Quando estou no corredor sozinho, andando em passos largos porque a adrenalina está correndo pelo meu corpo mesmo sem nenhum lugar melhor para ir, meus pensamentos voltam para Nixie e seu beijo de pêssego, e um sorriso cresce nos meus lábios sem que eu possa impedir.

━━━━━━━ • ━━━━━━━

NIXIE BLACK

— O que você está fazendo aí?— a voz familiar me pergunta e eu me encolho pelo susto, acabando por abraçar meu caderno de desenhos de maneira suspeita. Lentamente eu olho para cima e me deparo com o olhar intrigado de meu primo. Draco Malfoy passa a mão nos fios platinados que caiam sobre sua testa e se aproxima de mim brincando com um livro de feitiços avançados nas mãos repletas de anéis de prata.— Nunca te vi perder um almoço, Diggory.— ele se abaixa na minha frente e eu solto um suspiro, sem jeito. Nem consegui dormir essa noite, tão confusa e assustada que fiquei quando Harry Potter me beijou. Eu nunca esperei por tal atitude, e fiquei tão chocada que saí correndo dali como uma covarde, nem o ajudei quando ele caiu no chão.

Só de me lembrar, minha pele começa a formigar porque o beijo simplesmente foi muito bom, literalmente acima das expectativas que eu nem sabia que tinha. Mordo o lábio e fecho meu caderno, colocando a pena no tinteiro que está no chão ao meu lado. Draco bate nos meus joelhos com o livro, seu jeitinho arrogante some quando estamos só nós dois.

— Eu não estou com muita fome hoje.

— Você está bem?— ele pergunta, franzindo a testa. Eu sorrio de canto e assinto.

— Estou sim, e você?

— Porque não parece.— ele completa e sorri de canto quando o olho torto.

— É só que... aconteceu algo muito estranho ontem a noite e eu não consegui dormir— eu admito, balançando a cabeça.

— Fiquei sabendo que vocês ficaram, mas se você não gostou é melhor avisar porque ele ficou amarradão.— Draco revira os olhos nebulosos vindo se sentar do meu lado no pouco espaço que tinha entre as altas estantes de livros da biblioteca. Uno as sobrancelhas, intrigada.

— Como você soube?

— Blaise me contou.— Draco retruca como se fosse óbvio.

Ah, Harry me fez esquecer que eu tinha ficado com Blaise... HARRY POTTER ME FEZ ESQUECER BLAISE ZABINI!?

— Ah, Deus...— murmuro, chocada. Abraço meu caderno com mais força ainda.

— Espera aí... de quem mais você achou que eu estava falando?— Draco pergunta, curioso. Nós nos olhamos e aos poucos um sorriso malicioso cresce nos lábios de meu primo— Quem mais você beijou ontem a noite, priminha?

Me agito e seguro seu braço com firmeza.

— Você vai ter que me prometer que não vai contar para ninguém!— exijo e Draco levanta as sobrancelhas.

— Sua garota perversa...— ele caçoa.

— Foi repentino, Draco! Eu não estava esperando que acontecesse, não estava nos meus planos.

— Tsc, tsc, pobre Blaise, você o conquista para partir o coração dele logo em seguida? Na mesma noite ainda? Não esperava isso de você, Nixie.

Dou um tapa no ombro do Malfoy que ri se encolhendo.

— Não foi de propósito! Prometa que não vai contar para ninguém!— exijo novamente.

— Depende. Tenho que ver se posso ganhar algo valioso em troca dessa informação. Quem você beijou?

— Estou falando sério, Draco!

— Você sabe que eu também.— ele retruca e eu bufo, comprimindo os lábios. É óbvio que eu sei.

— Esqueça.— resmungo, balançando a cabeça. Olho para frente e meu primo cutuca minha costela com o cotovelo.

— Você começou a contar, vamos, termine, não seja dramática.

— Não seja chato. Você não era tão impertinente assim quando nós éramos menores!— rebato.

— Como se você nunca fosse irritante. Prima, você é muito chata.— ele levanta as sobrancelhas para mim e eu sopro uma risada fraca. Nós ficamos calados por uns segundos. Por mais que haja essa rivalidade entre nós dois e por mais que a gente tenha se afastado com o tempo por conta dos nossos ciclos de amizades diferentes, eu gosto dele. Tenho quase o mesmo carinho que tenho por Cedric. Tiro o tinteiro do meio e me aproximo mais do Malfoy, deitando a cabeça em seu ombro. Ele não se retraiu, ele nunca se retrai para mim, faz com que eu tenha esperança que um dia ele vai mostrar para todos quem ele realmente é.

— Alguém que eu sempre gostei...— franzo a testa para mim mesma, curiosa com minha escolha de palavras, mas seria mentira?— me beijou do nada ontem a noite. E agora eu estou me escondendo porque... eu nem sei porquê, para ser bem franca.

— O beijo foi estranho?— Draco perguntou. Um sorriso bobo nasceu nos meus lábios.

— Não. Não, muito pelo contrário. Foi espontâneo... gostoso.— murmuro a última parte tão baixo que eu mesma quase não ouço, passo a língua nos lábios como se ainda fosse capaz de sentir o gosto dos lábios dele— Mas como ele não estava muito sóbrio acho que estou com medo de ter sido só um momento de muita empolgação e pode ser que ele nem se lembre disso agora já que ele desmaiou logo em seguida.— ergo a cabeça e faço uma careta sem graça para Draco.

Draco me encarou em silêncio pelo que pareceu ser uma eternidade.

— É o Potter, não é?

Um frio percorre minha espinha. Draco é muito inteligente, não tem como desmerecer sua perspicácia.

— Como chegou a essa conclusão?— pergunto buscando manter a mascara neutra no rosto.

— Harry Potter é o único garoto nessa escola estúpido o suficiente para te deixar esperando por tanto tempo quando você vive deixando mais do que evidente seu interesse por ele. Acertei, não acertei?— ele levanta a sobrancelha em busca da aprovação recolho os lábios e baixo o olhar— Eu sei que vocês foram no dormitório dos patetas grifanos, Blaise também me contou essa parte, e dado todos os idiotas que vivem ali gastando oxigênio, Harry Potter é o único para quem você já olhou de outra forma dentro do seu ciclo de amigos.

Cerro os olhos para Draco e ele sorri de canto.

— Não me julgue, eu gosto de observar seu bando. São... fáceis de criticar.— ele fala e eu reviro os olhos empurrando seu ombro.

— Você é ridículo.

— Não mais do que seu amado Potter.— ele rebate e eu desvio o olhar sentindo minhas bochechas esquentando— Fala sério, Diggory, você poderia ter qualquer um na palma da sua mão. Você é bonita, quase inteligente.— eu solto uma risada de escárnio para seu quase elogio— Você poderia ter o Blaise. Eu sabia que você tinha mal gosto, mas um Potter?— ele fala o nome de seu maior rival com nojo.

— Você não o conhece como eu, Draco.— murmuro.

— Conheço o suficiente para poder dizer com critério que ele é uma piada.

Bufo, não querendo discutir a respeito porque, para a hipocrisia de meu primo, ele é tão teimoso quanto qualquer grifano que eu conheça.

— Não importa, ele só me deu um beijo enquanto estava absurdamente bêbado, isso não tem que mudar a nossa amizade. E eu mal comecei a sair com o Blaise...— lamento.

— Nixie, por favor...— Draco me interrompe com a voz pesando em sarcasmo. Eu o olho— Harry Potter nunca foi só seu amigo. Eu sou seu amigo.

— Você é?— pergunto em voz baixa, Draco apenas revira os olhos.

— Você entendeu o que eu quis dizer.— ele resmunga.

— Draquinho...— eu o olho de perfil e passo a mão no seu ombro como quem não quer nada— Já que você é um observador nato do meu bando... houve algum momento em que Harry olhou para mim da mesma forma que eu olho para ele?

Draco soprou uma risada e se levantou. Algo me dizia que a resposta não viria.

— Ei!

— E eu pensava que o Potter era lerdo, tenha santa paciência, Diggory!— ele sacode seu livro de feitiços para mim. E então ele me dá as costas e começa a se afastar.

— Malfoy, onde vai?!— pergunto, confusa por ser abandonada sem mais nem menos.

— Vou avisar Blaise que vocês não tem futuro.

— Espera aí! Você prometeu não contar para ninguém!— eu recolho meu material do chão levantando às pressas.

— Não prometi não.

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