24 | Volta pra mim
Nota: Achei melhor avisar no início, o que está em (itálico) é um flashback.
(Dante Kafka)
A primeira vez que coloquei os olhos em Jay juro ter visto um anjo. Suas maneiras e a sua alegria que acabavam por me contagiar inteiramente, me fazia sentir estar na presença de um.
Agora porém meu peito dói em completa agonia, por ver a vida tentar se esvair do corpo do ruivo que repousa a minha frente, suspiro cançado, isso está tão errado. As máquinas ligadas a seu corpo tem um aspecto maléfico, como se fossem elas as responsáveis por sua situação. Elas na verdade, asseguram sua abatida vida.
Arrasto minha cadeira mais para perto da cama e seguro sua mão que repousa ao lado, Jay suspira longamente em seu sono profundo.
— Volta pra mim. — Sussurro fechando os olhos para beijar sua pálida mão macia.
— Volta pra mim. — Repito ao abrir os olhos.
Do escritor porém, não obtenho nenhuma reação.
Olhando pela janela noto alguns ganhos repletos de folhas verdes que alcançam o segundo andar, o brilho da manhã tem de passar por eles para chegar ao quarto, e isso me faz sorrir pois o gêmeo teria gostado desse efeito. Um delicioso aroma de café entra então carregado por uma brisa, e isso também me lembra dele, tudo me lembra dele.
(...)
A chuva cai como um verdadeiro dilúvio lá fora, Jay e eu estamos entretanto protegidos pelas paredes e pelo teto de seu apartamento. Subo as pernas para o sofá marrom de camurça mexendo os dedos dos pés para espantar o frio, e deixo com um pesado suspiro os papéis sob meu colo de lado.
Erguendo os olhos vislumbro a silhueta do ruivo a minha frente, em sua face adorna um delicado óculos de arame, e em sua mão um livro qualquer. Noto pela primeira vez o descuido com seu cabelo que a essa altura alcança os ombros, isso todavia acaba por lhe dar um ar mais jovial se não angelical. E então um sorriso parte o rosto do mais novo quando este se volta para mim com um sorriso envergonhado.
— Que foi? — Pergunta tirando os óculos para o pousar sob o livro.
— Você, — Respondo suavemente, o deixando ainda mais confuso. — é só você.
O escritor deixa o livro de lado e se levanta vindo em minha direção, suas íris esverdeadas fixas as minhas em provocação. Jay se abaixa colocando a mão por entre meus fios negros e sem demora uno meus lábios aos seus, ele me beija calmamente e se separa da mesma forma, mordendo levemente meu lábio inferior.
— Quer café? — Indaga indo para a cozinha.
— Você deveria descansar. — Comento me virando para ve-lo.
— E você deveria parar de dizer isso. — O ruivo retruca com um sorriso desafiador. — Mas se quer tanto me ver deitado, é só me mostrar o caminho.
E sorrindo de lado sigo seus passos até a cozinha, sendo recebido por um beijo apaixonado de Jay que faz instantaneamente meu corpo inteiro arder.
(...)
Consigo mesmo agora sentir a sensação de envolver o corpo do gêmeo com meus braços, seu calor e seu fogo que arde intensamente. Abro os olhos que nem avia percebido ter fechado e mantenho as orbes grudadas a janela, temendo provar olhando para Jay inerte que tudo foi apenas uma lembrança.
O que ele lia mesmo? Algum autor do século dezenove... Disse-me estar fazendo uma pesquisa aquela altura, porém não prestei muita atenção, estava absorto em trabalho.
— O retrato de Dorian Gray. — Me recordo em um suspiro.
— Uma bela história. — Escuto uma voz atrás de mim dizer, fazendo eu me virar em assombro. — O jovem eloquente e vaidoso, cuja vaidade foi sua própria ruína além da de outros.
Anne se retém ao batente da porta aberta, seus olhos azuis vivos e vibrantes fixos em mim com carinho, olho para meu colo inconscientemente como que esperando uma repreenção. Escuto mais passos, e sei mesmo sem ousar erguer o olhar que Peter agora também está diante de mim. Os dois avós de Jay caminham em direção a cama e sinto como uma facada quando o senhor Green toca levemente o meu ombro.
Ergo a face, o casal já idoso esta abraçado, o amor resplandecendo em seus rostos pelo neto, não há dor, nem raiva, apenas felicidade por ele ainda estar aqui. Os cabelos brancos de Peter que um dia já foram ruivos reluzem com a luz da manhã, e o aperto leve que ele dá em meu ombro me passa uma sensação puramente paternal, não fosse a situação sorriria.
— Me desculpem, — Pronúncio sem sentir alívio algum, e eles se voltam para mim, Anne inclina levemente a cabeça tentando entender. — eu desapontei vocês.
Ela abre a boca para dizer algo mas Peter fala primeiro, com um sorriso de lado:
— Dante, filho, não diga uma asneira dessas, foi sorte ele ter você, imagine o que teria acontecido se ele estivesse sozinho como sempre está. Você esteve lá, e está aqui, para nós isso é o bastante.
Anne concorda com a cabeça e completa:
— Além disso, não há nada pelo que se desculpar, porque aconteceu antes e vai acontecer novamente.
— O nosso neto precisa viver. — Continua após uma breve entre olhada com o marido, a fazendo sorrir. — E viver tem seus riscos.
Ela vem até mim beijando o topo da minha cabeça, e como se não estivéssemos diante do corpo acamado do neto deles fala que estou em um estado deplorável.
— Como chegaram tão rápido? — Mudo de assunto.
— Anne e eu temos um fundo de emergência para essas coisas.
— E só demoramos mais pois fomos falar com a doutora Emily. — A senhora Green diz.
— Alguma novidade? — Indago baixo, de forma esperançosa e ela suspira de forma desconçoladora.
— Só que ele pode acordar a qualquer momento, — Peter responde dando a volta na cama para tirar fios ruivos do rosto de Jay. — Contudo ele ainda precisa de muito antibiótico, o pulmão dele não ajuda na recuperação.
Suspiro de forma triste. É tão estranho ve-lo deitado aqui, estar com ele e ao mesmo tempo não estar. Sabe? É quase como se Jay não estivesse aqui conosco, sinto como se o seu corpo estivesse nesta cama, entretanto ele tivesse ficado dentro de um de seus livros de fantasia.
Me inclino para o colo de Jay segurando sua mão quente, não, ele está aqui, penso sorrindo, e pode acordar a qualquer momento, não posso recebe-lo como se alguém tivesse morrido, se Peter e Anne podem sorrir neste momento de dor eu também posso. Pelo tomatinho.
— Já ia me esquecendo. — Fala a senhora Green fazendo-me olhar para trás. — Sua mãe pediu para te entregar umas roupas.
Com um leve sorriso pego o pacote agradecendo pela gentileza. Peter sai quase na mesma hora se lembrando que tem pegar uma mochila com coisas do ruivo no carro, ela aperta a minha bochecha com os dedos trêmulos me fazendo sorrir e corar.
Jay vai acordar e enfim irei ver suas incríveis esmeraldas novamente, talvez eu não tenha realmente tanta culpa como penso. Tudo vai ficar bem, não é mesmo?
***Obrigada por ler até aqui :)***
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*Até o próximo capítulo*
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