2 | Uma surpresa agradável
***Obrigada pelos comentários no capítulo anterior! Eu só iria postar este capítulo no sábado, mas não me aguentei de ansiedade hehehe.***
(Dante Kafka)
O Texas é um ótimo lugar para se morar, o ar tão puro quanto uma freira. Contudo o calor me faz querer fugir da cidade de Austin deixando tudo para trás, incluindo minhas roupas.
Abro os dois primeiros botões da minha camisa social branca, sentindo o suor escorrer pelas minhas costas.
Tive de pedir informações a dois senhores, mas cheguei ao lugar certo: um pequeno edifício semelhante a um prédio, cada janela com sua respectiva varanda. Através das grades consigo ver três crianças jogando bola, toco a campainha com o número que me foi dado por Oscar.
A porta e destravada, olho ao redor estranhando ninguém vir me receber mas entro antes que ela torne a fechar.
Oscar me avisou sobre algumas coisas, inclusive que Jay Green, meu novo escritor, sofre de uma rara doença. Porém confessou que ele próprio não sabe muito sobre isso, um longo suspiro de frustração escapa pelos meus lábios.
E não consigo evitar imaginar, ao subir as escadas, um homem idoso deitado em uma cama, tossindo e bebendo água de canudinho.
Paro de frente à primeira porta que encontro quando saio das escadas, e depois de conferir que o endereço está correto bato hesitante.
Para meu total espanto a porta é aberta não por um idoso, mas por um jovem que não parece ter mais que vinte anos.
— Desculpe não recebe-lo, estava tentando dar um jeito aqui. — Diz me convidando a entrar, a mão tirando de seus olhos verdes uma mecha rebelde de seu cabelo ruivo.
Digo um monótono "tudo bem" quando ele fecha a porta atrás de mim. O local estava devidamente limpo, mas bastante desorganizado, diversos livros e até móveis fora do lugar.
Nós sentamos em poltronas marrons, um de frente para o outro, eram os únicos acentos do aposento.
— Pelo que sei Senhor... — Começo mas sou cortado.
— Por favor, só Jay, sei que deve estar confuso mas realmente só tenho dezenove anos. — Esclarece delicadamente, um sorriso tranquilo nunca deixando seus lábios.
— Okay, Jay. — Continuo sem conseguir evitar um sorriso ao pronunciar seu nome. — De acordo com o que me informaram, a história está quase completa, com a exceção de um capítulo, o último.
Ele acena afirmativamente, e eu observo distraidamente suas feições. Apesar dele ter em si as cores mais vivas, vermelho e verde, elas são opacas, assim como sua pele pálida.
— Posso ler a sua última tentativa? — Pergunto tentando ignorar minha curiosidade.
— Claro. — Garante me entregando as folhas que estavam na mesinha de madeira ao seu lado. Quando começo a ler Jay se inclina para frente, me observando.
No final do quarto parágrafo quase paro de ler para perguntar qual era o problema, no entanto li até o final, e notei uma coisa que estava além das palavras. Não parecia dele fazer um final assim, era figurativo demais.
— Os fãs vão perceber. — Concluo devolvendo o manuscrito.
O ruivo balança a cabeça, cançado. Noto uma mancha escura ao redor de seus olhos, olheiras são algo comum em escritores, mas parece errado elas estarem ali, um único erro em um rosto tão puro, chegando a ser angelical com seus cachinhos ruivos.
Afasto esse pensamento e ponderei por alguns instantes, o final podia não ser perfeito, mas era satisfatório. Então digo:
— Não é o seu melhor final, mas por que não publica-lo?
— Não vou publicar qualquer merda. — Responde franzindo o senho. — Eles esperam o melhor de mim, então é o que vou dar.
Neste momento ele inclina a cabeça para o lado, sem entender, pois estou sorrindo. Não poderia dizer isso a ele, mas acompanho seu trabalho a muito tempo, por isso achei o erro no final, e acho que foi por isso que o senhor Quiroga me escolheu.
Paro de sorrir disfarçando com uma tosse e me levanto, ele me encarava com curiosidade.
— Ficaria desapontado se não disse-se isso. — Confesso e ele ri, as bochechas mudando levemente de tom. Como pode um escritor como ele não estar acostumado a elogios? Minha curiosidade está alcançando um outro nível.
Ele me oferece um café, aceito sem pestanejar. A cozinha era um tanto apertada então permaneci na porta para não atrapalha-lo. Seus movimentos são lentos. Passa a maior parte do tempo bocejando e esfregando de leve os olhos com o dorço da mão.
— Você chegou a dormir hoje? — Pergunto sem conseguir me conter. Ele suspira rindo, um rápido inclinar de lábios e responde:
— Acredite, eu durmo mais do que preciso. — E me entrega uma xícara de café, sem açúcar, como avia pedido. A pego e o vejo colocar cinco colheres na dele.
Dizer que está resposta me deixou confuso é pouco. Talvez ele estivesse sendo irônico, mas no fundo daquelas íris verdes eu via uma sinceridade inquestionável.
Foi fácil perder meu receio após um tempo, ele não agia como um escritor divo, mas como um jovem escritor tímido. E não me decepcionei com a ironia da situação, muitos diriam que é estranho um editor de vinte cinco anos ter um escritor de dezenove. Mas pelo que ele escrevia, sua mente era bem mais velha que eu.
Tomamos o café em silêncio, e apesar da situação, não me senti incomodado. Apenas com o fato dele consegui beber tanto açúcar, caramba, durante esse curto período de tempo ele colocou mais duas colheres.
Olhei para o relógio e o informei que tinha que ir, ele pegou as duas xícaras brancas e as colocou na pia para me acompanhar até a porta. Para a minha surpresa ele me levou até a portaria. As crianças que mais cedo jogavam bola agora acenavam para ele, que devolveu o aceno animadamente.
Porém um homem que parecia ser o pai de um deles apareceu, puxando uma das crianças para dentro de casa. Ele parou por uns instantes e encarou Jay, antes de fechar a porta. Pude ouvir o ruivo trincar os dentes.
— Quem é esse babaca? — Questiono ainda olhando para a porta.
O ruivo ao meu lado balança a cabeça negativamente, como se quisesse tirar uma ideia de lá.
— Meu visinho e porteiro. — Esclarece enquanto abre a grade do portão. — Me pergunto do que ele tem medo.
— Medo? — Digo sem entender.
— Não é ele, a causa básica da violência e da raiva? — Pergunta retoricamente.
A imagem do meu pai cruza imediatamente minha cabeça, ele não parecia alguém que sentisse medo. Mas fazia sentido então apenas respondi:
— É, deve ser.
Ele me encara, e tenho que olhar pra baixo devido a nossa diferença de tamanho para fitar seus olhos. Eles transparecem curiosidade e um questionamento mudo.
— Tenho que fazer algumas pesquisas sobre o seu trabalho, volto uma vez por semana para acompanhar o seu progresso. — Digo desviando o olhar, por um momento tive receio de que ele conseguisse a resposta que procurava.
— Okay, então até semana que vem. — Diz também desviando o olhar, abro um imperceptível sorriso ao ver suas bochechas coradas.
— Até. — Falo finalmente me afastando do portão. E ele continuou lá, até que eu virasse a primeira esquina, o perdendo de vista.
Tenho que fazer uma profunda pesquisa nas redes sociais dele, matérias, e na sua última obra. Na minha carreira de cinco anos como editor nunca conheci escritor mais excepcional, esse é um desafio, que pretendo ganhar.
E não é mais apenas pela Editora, ou por Oscar, agora que o conheço, é por Jay também. Que a próxima semana chegue logo, desejo, ciente de estar sorrindo.
***Obrigada por ler até aqui, se gostou do capítulo não se esqueça de votar. Por que vocês acham que Dante pensou no pai dele quando Jay falou sobre violência?***
***Até o próximo capítulo :)***
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