19 | Coragem


(Dante Kafka)

Bocejo distraído enquanto acaricio os cabelos de Jay que tem a cabeça deitada em meu ombro, ambos não dormimos ontem e enquanto ele descansa me abraçando a única coisa que me mantém acordado são as constantes saculejadas do carro. O silêncio dominaria o ambiente não fosse o aparelho respiratório do escritor, e Nancy dirige o automóvel alugado com uma concentração devota, suspiro olhando pela janela.

Gotas de chuva descem pelo vidro embaçado e o chuvisco cria uma leve neblina, nenhum carro passa por nós enquanto percorremos o nosso caminha de volta a pousada. Sorrio triste, a despedida dos avós de Jay não foi fácil, contendo as lágrimas ele os fez prometer visita-lo logo, em compensação contar sobre o nosso super recente relacionamento foi. Peter e Anne até mesmo já achavam que quando chegamos éramos namorados, o que me fez pensar no porque de não ter pedido ele em namoro antes.

Medo e precaução, eu tinha que fazer dar certo porque era o Jay.

Me volto para o ruivo o observando dormir. Os cílios longos quase transparentes fazendo-me querer beija-los, ajeito a máscara que esconde seu pequeno nariz arrebitado e os seus lábios o vendo resmungar no sono. Rio em um suspiro com tamanha fofura e ergo as orbes para o espelho retrovisor dando com as íris verdes da gêmea.

Está sorri de modo brincalhão e pisca para mim voltando logo a focar na estrada, nego com a cabeça sorrindo então noto já estarmos chegando.

— Ei tomatinho — Chamo Jay com gentileza, ele pisca os olhos despertando como um gato manhoso. — Estamos chegando.

O escritor coça os olhos e olha ao redor comprimentando a irmã que acena em resposta, tira a máscara e me dá um beijo na bochecha agradecendo. Observo ele desligar o aparelho e guarda-lo na maleta da mesma forma que faz após toda viajem, são muitos poucos os que ele deixa ver-lo o usando, diz que se sente muito vulnerável.

O carro pára e preguiçosamente o deixamos com as mochilas nas costas, tento pegar a de Jay que agradece mas nega com a cabeça, sua irmã revira as orbes pela teimosia do irmão. O escritor e eu abrimos um guarda-chuva transparente e caminhamos de braços dados até a residência, Nancy porém passa pela gente correndo sem se preocupar em abrir um ou se juntar a nôs.

Ela abre a porta, no entanto para olhando para o seu interior, então se volta para a gente com o senho franzido, o gêmeo dela e eu nos entre olhamos e apertamos o passo quase correndo para chegar lá.

Somos recebidos por uma grande comoção, vozes falam ao mesmo tempo com uma feminina se sobressaindo sobre a outra, a voz de Sara. Jay entra antes que Nancy e eu possamos impedi-lo, então o seguimos entrando na recepção. Nos damos com uma sena para lá de estranha, o entregador sentado com a cabeça entre as mãos a menina Sara chorando encostada no balcão e o senhor Harrison tentando acalmar James que anda de um lado para o outro com as mãos na cabeça quase gritando:

— Sara me conta, o que é que você quer? Viver aqui para sempre como eu!? —  A morena acaba por soluçar mais alto escondendo o rosto com o braço, James suspira e tenta mais calmo: — Filha você merece mais do que isso.

Ela enfim olha para ele com os olhos vermelhos e marejados, nega com a cabeça e passa apressadamente por nós indo para a praia. O ruivo encara o proprietário da pousada com raiva e sai atrás dela me entregando a mochila azul esverdeada.

James suspira com os olhos baixos e vai para o seu escritório, me viro para a saída tendendo ir atrás do escritor, contudo a ruiva me segura pelo ombro dizendo que é melhor o irmão cuidar disso. Realmente, não tenho praticamente nada haver com este assunto, mesmo que a chateação do ruivo me preocupe. Acabo concordando colocando a outra mochila no ombro vago e a observando subir para o seu quarto.

George finalmente me nota e se aproxima de mim com sua cadeira, ele sorri de lado e percebo imediatamente seus traços cançados bem como o cabelo prateado despenteado.

— Você tinha razão Dante, Robert não prestava. — Fala em tom solene.

— Eu sinto por isso, preferiria estar errado — Garanto me abaixando sobre um joelho ao que ele sorri bondoso. — Como veio a descobrir?

— Bem, pouco depois que você e o senhor Green viajaram ele ficou estranho, falava sobre vingança não sei pelo que e merdas do tipo, quando o indaguei me contou que avia perdido o emprego. — O grisalho conta gesticulando com a voz emocionada. — Aí eu tolo como sou tentei consola-lo, e acabei mencionando que não achava aquele emprego muito bom no quesito moral.

— E o que aconteceu? — Questiono já imaginando.

— Meu filho surtou com mais raiva que antes e me insultou, me chamando de velho gagá e coisas piores. Se eu tinha qualquer esperança em relação a ele morreu naquele instante, então o pedi para ir embora. — Responde sobre minhas sombrancelhas erguidas.

— E ele foi? — Indago e ele confirma com a cabeça me fazendo suspirar aliviado.

Dou palmadinhas no ombro dele me levantando e pergunto baixo por fim:

— Como o senhor está? Ele é seu filho.

George suspira dando de ombros me respondendo um simples sei lá. Me despeço dele lhe dando um abraço pela primeira vez, e o deixo, indo para o quarto.

Coloco as duas mochilas de viajem na cama e me sento nela respirando bem fundo. A viagem até a casa dos avós do escritor realmente veio bem a calhar, não consigo imaginar Jay no mesmo ambiente que aquele traste por mais um dia sequer então a notícia de que ele se foi me traz tremendo alívio. Mesmo que o sentimento de raiva que ele ainda deve estar nutrindo me deixe ansioso, o meu coração palpita apenas com a possibilidade dele ferir o gêmeo.

A porta do quarto range e me volto para ela me dando com as íris verdes responsáveis pela minha preocupação, sorrio cançado e o observo atentamente fazer o mesmo, gravando cada traço seu em minha memória. As covinhas que o seu repuxar de lábios traz, os redondos olhos luminosos que se repuxam com a ação, e as sombrancelhas tensas e franzidas.

Sorrio mais abertamente para o tranquilizar e dou palmadinhas do meu lado da cama, ele encosta a porta e se senta do meu lado encostando a cabeça no meu ombro. Suspiramos em uníssono arrancando uma risada de nós dois.

— Como foi com a Sara? — Questiono o abraçando e deitando com ele.

—  Ela é sensível e de certa forma eu a entendo. — Jay fala se virando pra mim e deitando o rosto no meu peito. —  E sei que ela vai conseguir.

O seu leve sorriso me transmite confiança e calma acabando por me fazer sorrir também, acaricio a face do ruivo que esconde o rosto na curva do meu pescoço corando. Rio beijando os cachos dele com ternura, murmurando enquanto sou levado pelo sono:

Meu anjo.

•••

Batuco os dedos na madeira sentindo meu estômago roncar, Jay ao meu lado na ampla mesa retangular conversa baixo algo com James que não consigo escutar.

Não entendo bem o que fazemos aqui já que não temos o costume de comer na sala de jantar da pousada, sempre preferimos comer no quarto utilizando a pequena cozinha, coisa que Nancy deve estar fazendo agora. Acontece que o ruivo pediu esse pequeno favor quando eu acordei cheio de fome com a lua já alta no céu, e não pude resistir aos seus beijos pidoes.

Observo George e o estudante de medicina se juntarem a nós curioso sobre o desenrolar dos fatos, sou surpreendido pela mão quente do escritor envolvendo a minha que ainda batia na mesa freneticamente. Ele sorri beijando a minha palma e pede apenas mexendo os lábios que eu tenha calma, concordo sorrindo.

Na verdade não sei bem a razão da minha ansiedade, falei sobre ela com Jay antes de descermos e ele adivinhou que eu estou com medo de algo que pode acontecer. Isso meio que clareou a minha mente, só me resta saber do que de fato estou com medo.

Então Sara entra no cômodo, com passos leves e medrosos que nem um gato acuado. Seu pai ergue imediatamente o olhar culpado e ao abrir a boca para tentar dizer algo a morena balança a cabeça negativamente, se aproxima dele ajoelhando-se ao seu lado entre ele e Jay. A observo, com um leve sorriso pegar disfarçadamente na mão do ruivo com sua palma trêmula, e dizer baixo, hesitantemente:

— Pai eu te amo e sabe que faço de tudo pelo senhor, se me mandar ir para a cidade eu irei, mas saiba que eu também amo este lugar e que isso me faria muito infeliz. Eu entendo — Continua visto que as sombrancelhas dele ficaram franzidas. — que o senhor quer o melhor para mim, no entanto não acha que eu também queira isso? Quero te orgulhar e me orgulhar também, portanto tudo o que peço é que me deixe provar que posso fazer isso aqui, em Moray.

James desvia o olhar e Jay me olha como que me perguntando com uma expressão desesperada: e agora?

Então quando começo também a acreditar que não deu certo escuto os soluços, ele escondera o rosto para chorar. E muito emocionado abraça a filha pedindo perdão por ter sido tão cabeça dura, vejo o escritor limpar os olhos com o torço da mão e sei que ele também chora.

Desta forma descubro o que tem me deixado ansioso, não é apenas Robert, ele que se foda. É a saldade que desde já sinto do meu escritor, o medo de me separar dele e ser esquecido, ir embora significa que tudo vai mudar, e de modo estranho eu não quero que nada em relação ao Jay mude.

E diante das íris brilhantes dele, que exibe o tremeluzir de um lago translúcido e profundo apenas uma palavra passa pela minha mente.

Paz.

•••

Belisco as bochechas enrubecidas de Jay que me lança um olha emburrado mas mesmo assim me deixa guia-lo até o carro, arrasto minha mala preta de rodinhas até o automóvel e Jay joga sua mochila no banco detrás pela janela, quando faço o mesmo vejo alguém se aproximando pelo reflexo do vidro.

— Acho que alguém veio se despedir. — Digo cutucando o ruivo que olha para trás curioso e da um enorme sorriso.

— Oi Sara, pensei que não viria. — Fala a abraçando.

— Desculpe a demora, aqui, trouxe a sua mala. — A morena responde entregando a mala do escritor.

Este agradece e me olha balançando negativamente a cabeça, ao que coço a nuca um tanto acanhado. O ruivo passara mal na noite após o jantar, teve uma crise de tosse que parecia que iria sufoca-lo e só não adiamos a viajem de volta porque ele se negou a me fazer ter problemas com a Editora e por ter melhorado antes do amanhecer. Por essa razão Nancy o mandou não se esforçar muito, e bom, tive que concordar com ela.

— Vamos não olhe assim para o seu namorado senhor Green. — Sara se pronuncia com ar brincalhão. — Eu me ofereci para trazer, e nem está tão pesada assim.

— Eu sei, só não gosto que me tratem como porcelana. — Jay murmura com os braços cruzados.

Rio e me aproximo o abraçando por trás, dou um beijo no topo da cabeça dele e sussurro:

— Sabemos que você não é, mas as vezes precisa de cuidados. Por favor, nos deixe cuidar de você.

Ele não responde, no entanto concorda com a cabeça encabulado fazendo o meu sorriso aumentar. O escritor coloca as mãos sobre as minhas que estão envolta da sua cintura, e se recompondo se volta para a morena que observava a gente com curiosidade e divertimento.

— Vou sentir a sua falta. — Diz com a voz embargada, e como que presentinho que é a nossa hora de ir, o vento passa por nos balançando os nossos cabelos com o cheiro salgado do oceano.

— Eu também Jay, e... Obrigada por ter me dado coragem. — Ela responde limpando uma lágrima que teima em fugir dos seus olhos.

— Ter te dado? Sara querida, você já tinha. — O escritor riposta e eu o solto, para que ele receba o abraço de Sara que se precipita na direção dele chorando como as nuvens fazem em dias tristes.

E diante desta cena fungo tentando disfarçar a emoção, de ver assim tão amigos dois corações gentis.

***Oie leitores de yaoi (^^). Obrigada por ler até aqui, se gostou do capítulo não se esqueça de votar.***

***Votos e comentários estimulam muito, enfim, até o próximo capítulo :)***

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