14 | Ficarei contigo nos momentos de dor
(Dante Kafka)
Evitar Jay após o transcorrido no barco não foi nada fácil, quis dar um tempo a ele, espaço, e principalmente deixa-lo descansar. No entanto, já não o vejo desde ontem a noite quando me deu um singelo e simples sorriso antes de fechar os olhos ao meu lado e dormir, tentando ocultar o que qualquer um poderia ver. Ele não estava bem.
Já está quase anoitecendo novamente, e não cruzei com o escritor uma vez sequer hoje. Quando levantei ele já não estava no quarto, nem Nancy no dela.
Suspiro massageando as têmporas, me viro então para a janela e sentado na poltrona acolchoada observo o tremeluzir de uma árvore ao vento. Ontem depois que voltamos do passeio, neste mesmo ponto vi de pé, Robert e Jay conversarem.
Não sei se foi o bom senso ou alguma força maligna que me impediu de interfirir, só sei que é o que eu devia ter feito. Ainda mais quando vi Jay sair de lá consternado.
— Que se dane o tempo, onde diabos Jay se enfiou? — Penso em voz alta me levantando e olhando ao redor. A sala está vazia, já que todos estão aproveitando o bom tempo lá fora.
E para lá vou, pensando encontra-lo. Passo apressado pelo extenso corredor, não me demorando na porta antes de abri-la, levo uma mão aos olhos, os protegendo da luz que me sega.
A quase uma semana que o sol não aparecia como hoje, Jay tem razão, ele brilha mais depois de certo tempo oculto. Com o tomate em mente baixo a mão e vasculho o local com os olhos, a praia está muito mais cheia que o abtual, grupos de senhores e senhoras sentados ao sol, crianças correndo umas atrás das outras. Contudo ao contrário do que se pode imaginar, todos usavam leves roupas de frio, apesar do sol, o vento ainda gelava os ossos.
Onde Jay estaria se não aqui?
Localizo então o senhor Harrison, com sua cadeira ele se dirigia para a árvore que a pouco vi pela janela.
— George! — Chamo correndo em sua direção, ele se vira com um sorriso acolhedor.
— Dante meu amigo, como tem passado? — Me recebe, porém ao ver minha expressão preocupada completa quando paro a sua frente:
— Nada bem suponho.
Suspiro dando uma breve olhadela para a casa de onde saíra, com a esperança de ver olhos verdes me olhando de uma janela. Isso não acontece, então me volto para George. Seus cabelos grisalhos penteados para trás, como os do filho, mas suas orbes expressam uma vida que Robert não conseguiria copiar.
— Não vi Jay o dia todo, poderia supor que a culpa é minha. Mas o vi conversando com o seu filho, e desculpe-me pois tenho motivos para desconfiar dele. — Digo o observando, ele não se chateia, e para a minha surpresa concorda.
— Entendo o que quer dizer meu amigo, ele é meu filho mas não sou cego. — Responde e ri perante meu espanto. — Não vinhemos só para passar as férias, como já lhe disse. Esse idiota é viciado de tal forma em trabalho que é capaz de fazer qualquer coisa para conseguir o que quer, e seguindo essa filosofia já fez coisas bem ruins.
— Como o que? — Pergunto sem conseguir me conter.
Troco o peso de um pé para o outro, desconfortável, pois ele me olha calculadamente. George é bem aberto comigo, no entanto isso não é sobre ele, é sobre Robert, ele pode muito bem não querer falar sobre isso.
Então para a minha surpresa me conta baixo, virando suas íris para o mar:
— Ele as vezes é um pouco agressivo. Ainda na escola foi para o reformatório por jogar sua cadeira em um professor, que não quis dar-le melhor nota em um trabalho.
— Isso fez mal a ele, pois saiu cheio de raiva, principalmente, de mim. — Confessa com um suspiro. — Quando se tornou advogado me despreocupei, uma profissão tão nobre lhe faria bem, pensei.
Aperto então meus lábios para não dizer em voz alta meu pensamento. Uma carreira nobre em mãos nobres, e isso raramente acontece, então há advogados como ele por toda parte.
— Até que descobri que ele colocava cláusulas escondidas e absurdas em seus contratos, como juros absurdos no aluguel de casas. — Continua George agora me olhando. — Tudo isso negociado com donos de apartamentos, que o subornam.
— Tudo o que está me dizendo não me tranquiliza em relação ao Jay. — Digo sem conseguir conter um muchocho, ao que o grisalho ri.
— Eu sei, mas sabe, por incrível que pareça eu acredito que ele pode ser alguém bom. — Admite dando de ombros.
Porque ele é seu filho.
Então olhando para um ponto atrás de mim diz:
— Aquela não é Nancy a irmã dele?
Me viro automaticamente a tempo de ve-la descer as escadas da varanda, ela está indo em direção ao armazém de James, provavelmente falar com ele. Me volto para George e ainda estou abrindo a boca quando ele diz pra mim ir logo.
Sorrio ternamente e murmuro um obrigado antes de me virar e sair correndo.
Ao som dos meus passos a ruiva para e se vira, as mangas de sua blusa verde estão dobradas até os cotovelos, ambas molhadas. Franzo o senho quando fico inerte na frente dela, Nancy está encharcada.
— O que aconteceu? — Indago tirando meu blazer e entregando a ela, que sorri sem ânimo o vestindo.
Consigo sentir meu coração vacilar em uma batida.
— Obrigada, não tive tempo de vestir nada. Estava cuidando do meu irmão, ele não está nada bem. — Responde cruzando os braços. Olho para a pousada desolado, consigo sentir as vivas e verdes orbes de Nancy em mim. — Pode ir dar uma olhada nele por mim? Tenho que resolver umas coisas.
Me volto para ela imediatamente concordando, a gêmea sorri e continua a andar. Fasso o mesmo, entretanto indo na direção da grande casa, num impulso olho para trás, os cachos vermelhos da ruiva voam atrás dela como como cortinas em uma janela aberta.
— Obrigado. — Digo ao que ela para e eu também. — Você é uma ótima irmã.
— Eu sei. — Concorda sorrindo. — E você seria um ótimo namorado pra ele.
Sinto minhas bochechas esquentarem ao me virar para continuar meu caminho, o som do quebrar de uma onda é a última coisa que ouso antes de entrar na pousada fechando a porta atrás de mim. Minha boca forma então um leve sorriso, por apreciar o que parecia ser uma aceitação.
Subo as escadas suspirando feliz ao sentir o calor do interior me envolver, os degraus rangem sob meu peso. Já no extenso corredor dos quartos paro diante da nossa porta, estagnado e com a respiração acelerada.
Será que ele quer me ver?
Pelo som que me alcança percebo que o respirador está ligado. A porta branca de madeira entre aberta, a empurro devagar como na noite em que o encontrei quase morrendo de cansaço, porém, dessa vez não foi a curiosidade que me atraiu, e sim preocupação.
Seus olhos estão fechados, mas seu peito sobe e desce como as pequenas ondas. A pequena máscara que cobre sua boca e nariz é tão pálida quanto sua face, os cachos alaranjados jogados ao redor do rosto são a maior indicação de que tem alguém na cama.
Entro devagar não querendo acorda-lo, contudo ao som do meu primeiro passo as pálpebras de Jay se abrem. Ele sorri, sentindo a tensão diminuir sorrio também, aliviado.
— Está assim por culpa minha? — Indago baixo, me aproximando da cama. O ruivo franze o senho e nega com a cabeça. — O que te deixou assim então?
Ele estende a mão para mim ainda sem dizer nada, e me traz para seu lado onde me sento. Olha em meus olhos, então sei de quem é a culpa.
— Aquele filho da... — Começo fazendo menção de me levantar, tenho porém minha mão segurada.
— Ele... não fez nada. — Diz Jay com dificuldade. Sua voz está rouca e baixa então volto a me sentar, sabendo o quão difícil deve estar sendo para ele falar.
— Só perdi o controle. — Explica olhando para as nossas mãos. — Acontece quando fico... — Me aproximo mais o ajudando a ficar ereto pois ele tosse.
— Eu sei, nervoso. Mas aposto que tem dedo do Robert, viu, vi você desviando o olhar. — Alego ainda o segurando pelos ombros, o escritor me olha e suspira. — Por favor me deixe ajudar.
Ele pede minha ajuda para que possa se sentar, coloco então dois grandes travesseiros em suas costas. O ajudo a se recostar, noto então que Jay consegue respirar melhor.
— Muito obrigado Dante, eu senti... como se estivesse me afogando. — Fala enfim, completando a sentença em um sussurro.
Passo as mãos em seus cabelos, deixando o rosto do escritor livre.
— Você pode contar comigo sempre, é só chamar que vou estar aqui tá? — Garanto ao que ele concorda com um sorriso.
— Você e minha irmã me mimam demais. — Ele responde, mas então fica sério. — Quer mesmo saber o que aconteceu?
— Sim eu preciso, pra poder te ajudar. — Afirmo ao que o ruivo respira fundo antes de voltar suas orbes para a janela fechada.
— A alguns dias, Robert veio até mim se oferecendo para ser meu empresário. — Jay conta respirando com dificuldade. — Eu recusei, não confio nele e nem preciso disso.
— E o que aconteceu quando vocês conversaram ontem? — Pergunto baixo fazendo carinho em sua mão que está pousada em seu colo.
Jay então me olha e ri surpreso, provavelmente já sabendo que eu o estava vigiando naquele dia. No entanto suas íris tremem, e o sorriso morre quando responde:
— Robert ameaçou comprar a pousada da prefeitura, ele notou que sou próximo da Sara e que ela gosta daqui. E descobriu...
— O que? — Questiono ao ver que ele não vai continuar.
— Uma coisa do meu passado que eu preferiria esquecer, e que me doeu muito ouvir. — O ruivo admite e eu concordo entendendo, também tenho minhas más memórias.
— Isso foi chantagem Jay, e esse cara é do tipo que joga sujo. Do tipo perigoso, devia ter contado antes. — Eu digo, ao que ele concorda com o olhar cabisbaixo. — Mas ta tudo bem, você contou. Vou resolver isso, por favor apenas se recupere.
E me levanto, e apesar da calma em minha voz serro os punhos com o engomadinho em mente. Sinto então uma mão em meu punho, me viro e vejo o escritor me olhar suplicante.
— Por favor... fica aqui. — Ele pede. Seus olhos fundos e a voz trêmula, a dor em seu peito notável pela força com que aperta a camisa.
— Okay. — Digo voltando para seu lado, desta vez me deitando, o ajudo a fazer o mesmo.
Robert pode esperar, Jay precisa dormir para se recuperar. Ficamos então um de frente para o outro, o quarto foi ficando escuro com forme conversavamos, agora apenas uma luz tênue entra pela janela. E as íris verdes do escritor brilham como duas esmeraldas, sorrio e sei mesmo com a máscara que ele sorri também.
Passo meus braços ao redor de seu corpo o trazendo para mim, ele arqueja com seu rosto na curva do meu pescoço. E meu sorriso aumenta mais ainda quando o sinto entrelaçar as pernas nas minhas.
É, Robert pode esperar.
Enterro meu rosto no emaranhado de cachos do ruivo, e sinto um doce cheiro de uva. Um aroma tão doce como o dono que se aconchega mais a mim.
Então franzo o senho, Jay faz com que a gente se esqueça, mas ele não está bem, sua respiração está pesada, sinto isso sob o meu peito. E essa dor que ele sente e culpa daquele empresário de merda.
Sinto muito George, mas não acho que seu filho tenha jeito, vou resolver isso por bem ou por mal.
***Desculpem qualquer erro, não tive tempo de fazer uma revisão mais aprofundada.***
***Eita, e parece que o nosso Dante está um pouquinho puto da vida, o que será que ele vai fazer?***
***Não se esqueça de voltar, um beijo e até o próximo capítulo! (^^)***
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