Temporada 3 - Capítulo 10| "Feliz natal, Jesse!" • Parte 1
Ilha de Shallow Wood, manhã de 25 de dezembro.
As circunstâncias indicavam que aquele não era o melhor momento para as festividades programadas, mas ainda assim, não havia como ignorar aquele dia. Era finalmente natal, a mais pura data comemorativa do ano. Mesmo que aqueles hóspedes quisessem esquecer qualquer coisa e permanecer em suas camas até o anoitecer, precisavam passar por isso.
— Será que pode me ajudar com os enfeites do lado de fora, Beatrice? — Rose passou pela garota com um sorriso arregalado entre suas bochechas e uma caixa de pisca-piscas azuis.
A ruiva assentiu rapidamente. Não tinha outra escolha. Logo no topo da escada, distante delas duas, Jesse apoiava sua mão sobre o corrimão. Aquela movimentação toda no andar de baixo fazia parecer que não estavam mais vivendo um pesadelo. Como se cobrissem tudo com um tapete gigante.
— Aí está você. Dormiu bem esta noite? — Madison beijou sua bochecha. — Vista-se e coma alguma coisa, querida. Melissa está te procurando.
— Não se preocupe, srta. Greene! Já estou aqui. — Melissa apareceu de repente, tomando seu lugar.
— Ah, certo. Vou deixá-las a sós então. Feliz natal, garotas. — Madison também optou por exalar um sorriso singelo e logo as deixou sozinhas.
E Jesse mal teve tempo de dizer uma palavra entre um cumprimento e outro. Apenas deixou que sua mãe falasse por ela enquanto continuava estranhando o comportamento daquelas pessoas. Como se tivessem esquecido do que aconteceu.
— Eu sei o que deve estar pensando, Jesse. — Melissa começou a falar.
— No quê? Em como todos aqui estão agindo como se esta fosse uma manhã normal? — ela respondeu e cruzou os braços, insatisfeita.
— O quê? Não! Eu até gosto dessa sensação. Na verdade, falava sobre o que encontramos no bunker. Você disse que não conseguiu falar com sua mãe na outra noite, então... o que pretende fazer? — seu tom de voz diminuiu. Ela não queria que os outros ouvissem aquela conversa.
— Eu sei disso. Acho que... — Jesse respirou fundo enquanto observava as pessoas no andar de baixo. — que talvez não seja o momento ainda. Talvez isso acabe depois do festival hoje à noite. Mesmo que não deixemos a ilha, acho que vai ser melhor falar com ela depois disso.
— Hm... você é quem sabe. — um riso breve. — Quanto ao festival, minha mãe tentou insistir que eu ficasse na pousada. Mas sinceramente, não acho que faça alguma diferença.
— Sam vai acompanhar o xerife durante a noite. Então... acho que vou comparecer por conta dele. — Jesse deu de ombros.
— Eu e Johnny vemos vocês dois lá, então. Toma cuidado. — a loira desceu as escadas no mesmo instante.
Salão principal, aproximadamente meio dia.
Rose se sentou ao lado de Jackie no pé da escada. A casa fora enfeitada por completo pelas duas antes do fim da manhã. E então, a campainha tocou. Era o xerife Tom, e isso nem os assustava mais. Desde o início da semana sua presença se tornara comum em todas as manhãs. Era normal, cotidiano. Só torciam pra que a notícia que ele trouxera não fosse a de um novo corpo encontrado.
— O que o traz aqui outra vez, xerife? — Frankie se aproximou da porta aberta.
— Não se preocupem, não há nada de errado. — o homem levou suas mãos até a cintura. — Só vim checar como as coisas estão indo para hoje à noite. Sei que tem sido uma semana horrível. Três assassinatos e um sequestro. E... eu sinto muito por isso.
— Tudo bem, Tom. — o grisalho colocou a mão sobre o ombro dele. — Não poderíamos fazer nada de qualquer forma. Não é sua culpa também. Além disso, é natal.
— Fico feliz com isso, Frankie. Mas ainda quero me certificar de que estejam seguros esta noite. Então pedi que meus oficiais cumprissem a ronda aqui na pousada até o fim da noite, caso alguém decida permanecer em casa. — ele anotou alguma coisa em sua caderneta.
Todos continuaram em silêncio. Afinal, não tinham o que dizer. A incerteza de que algo ruim pudesse vir a ocorrer ainda os perseguia, e independente da escolha que tomassem — ficar na pousada ou comparecer ao evento — estavam sujeitos a algo ruim. Ninguém sabia onde o culpado estava. Talvez estivesse ao lado deles agora mesmo.
De volta ao restante do dia. Tom Colleman deixou a pousada alguns minutos depois de dar o comunicado e então os hóspedes voltaram à sua rotina normal. A hora estava prestes a chegar. Com o anoitecer, uma ventania gelada e ríspida. Era um clima estranho para uma noite de natal.
Em contrapartida, a ilha nunca pareceu tão iluminada e falante como naquela noite. As barracas vermelhas e amarelas se distribuíam na área central, próxima ao hospital. Um palco improvisado e cadeiras organizadas ao lado. Por fim, as viaturas circundavam o festival de ponta à ponta.
— O que querem fazer? — Johnny questionou, enquanto caminhava ao lado dos outros.
— Na verdade, preciso encontrar o meu pai primeiro. Divirtam-se sem mim, prometo que vejo vocês daqui a pouco! — Sam esboçou um sorriso e então levou seus dedos até a bochecha de Jesse. — Toma cuidado. Eu volto logo.
— Tá bem. — Melissa deu de ombros. — Talvez devessemos procurar uma dessas atrações.
— Que tal o labirinto? — disse Johnny, entusiasmado.
— Labirinto? — a loira retrucou. — Achei que isso fosse um evento natalino. Fala sério!
— Eles o abrem todos os anos. É feito de palha e... feno, em sua maioria. É divertido, você só precisa entrar lá e encontrar uma caixa de presente escondida, ou algo assim. Então recebe um prêmio. — explicou.
— Parece estranho, mas eu topo. Vocês vêm com a gente? — Melissa se virou para os três que sobraram.
— Não é bem a minha praia. Mas boa sorte. — Josh acenou para os dois, enquanto se afastavam. As outras duas meninas também recusaram o convite.
— Eu posso levá-lo a um lugar? Não fica tão longe daqui. — Penélope sussurrou perto do ouvido de Joshua.
— É... é claro. Não quer comer alguma coisa antes? — ele insistiu, apontando para as barracas próximas.
— Não estou com fome. Rápido, essa é a hora perfeita! — ela sorriu e então o puxou pela mão. — Jesse, não vem com a gente?
— Ah, eu... eu acho melhor não. Vou dar uma volta por aí. Vejo vocês depois. — ela levou suas mãos até os bolsos do casaco, pressionando seus lábios.
— Tem certeza de que vai ficar bem sozinha? — Josh perguntou antes que partisssem.
A garota apenas assentiu com a cabeça. E lá se foram os dois jovens. Desapareceram perto das árvores alguns segundos depois. E por fim, Jesse estava sozinha. Respirou fundo e voltou a caminhar no meio daquela multidão entusiasmada, ignorando o barulho da música alta e de algumas garotinhas brincando próximo à barraca de sorvetes.
Sam havia encontrado seu pai perto dos perímetros do grande festejo, onde o barulho era menos perceptível. O homem segurava firme seu rádio transmissor em uma mão, enquanto guardava a outra no bolso. Pelos olhos cerrados do grisalho, o menino percebeu que ele parecia preocupado.
— Está tudo indo bem? — Sam se sentou ao lado dele, sobre uma mureta pequena.
— Bom te ver. Consegue ouvir esse som? — Tom esgueirou seus olhos pelas árvores atrás deles e depois sobre as viaturas próximas.
— É a música alta, pai. Tem muita gente lá. Esse lugar tá uma loucura. — suspirou, cansado.
— Não. Não é a música... eu acho que é o vento. — parecia apreensivo. — Um sopro gelado desde o início da noite. E com ele, a sensação...
— Sensação de quê? — Sam demonstrou preocupação.
— De que há algo errado, Sammy... — o xerife pousou sua mão pesada sobre o ombro dele. — Por favor, fique por perto. Começo a pensar que as coisas aqui mudam rapidamente. Não acompanham a maré.
Tom estufou o peito e apanhou o rádio outra vez, começando a caminhar através do canteiro que contornava a área. Deveria continuar a ronda naquela noite. E Sam, agora com tamanha incerteza, voltou para perto da multidão outra vez, imaginando onde seus amigos deveriam estar.
Não sendo surpreendente, Johnny e Melissa provavelmente encostavam seus corpos quentes sobre o feno, que dizem causar irritação à pele, enquanto se beijavam dentro daquele labirinto escuro. Nunca pensariam naquela noite estrelada como algo que os causasse medo. Talvez devessem.
Quanto aos outros dois, tendo optado por escapar daquele evento de forma precipitada, se aventuravam em algum lugar da floresta escura agora. Mesmo que os avisos deixassem claro o perigo daquele lugar, Penélope alegava ao amigo não encontrar diferença entre uma floresta escura e um espaço repleto de viaturas. Não em Shallow Wood.
— Anda, essa é a hora perfeita! — suas mãos quase escorregaram, mas ela continuou guiando-o até a ponta do penhasco.
— Então... esse era o lugar. — Josh se surpreendeu ao enxergar uma enorme luz arredondada sobre ele. Era a lua que se explodia alegremente naquela noite.
— Não é bonito? — Penélope o questionou enquanto abria seus braços junto de uma respiração profunda.
— É... lindo. — ele se sentou ao seu lado.
— Um, dois... — ela começou uma contagem junto de um sorriso juvenil.
— O que vai fazer? — arqueou a sobrancelha.
— Gritar, é claro. E... três. — seus olhos brilharam. — ESTAMOS VIVOS!
Sua voz foi acolhida pelo imenso vazio após aquela ponta do penhasco. Como se a água turbulenta lá embaixo a escutasse, retribuiu com um balançar mais forte de suas próprias ondas. O rapaz se encontrou confuso, é claro, na primeira vez. Mas quando Penny pronunciou aquela frase de novo, ele se sentiu confortável.
Não poderia ser menos óbvio do que isso: Penélope Russell e Joshua Evans, naquele exato momento, estavam vivos e em segurança. Suas vozes se perderiam no espaço e no tempo logo depois que deixassem aquele lugar. Mas enquanto tinham a chance, deveriam garantir que aquele penhasco os ouvisse. Porque eram sobreviventes. E de que outra forma fazer isso senão gritando com toda a sua força?
Pousada Woodhouse, 20:30 da noite.
O silêncio inquietante havia abraçado a residência desde que os jovens a deixaram no início da noite. Nenhuma voz. Nenhum barulho de passos subindo ou descendo as escadas. Somente a luz fraca das lanternas dos dois oficiais que caminhavam ao redor da pousada.
Na sala de estar, Madison cerrava seus punhos incoformada com o sentimento de preocupação por sua filha, embora o xerife Colleman tivesse garantido a ela que tudo acabaria bem. Não conseguia prestar atenção no programa natalino na televisão e nem pensar em outra coisa que não fosse isso.
— Eu preparei algumas bebidas quentes de baunilha. Quem vai querer? — Rose adentrou a sala com uma bandeja em mãos.
— Graças a Deus! Parecem deliciosas, Rose. — Jullie estampou um sorriso e apanhou uma das taças.
E então o silêncio voltou a envolvê-las. O som das taças batendo umas nas outras e depois os olhares se encarando. Permaneceram, as quatro mulheres, tentando desviar o próprio olhar vazio enquanto ignoravam o comercial maçante no monitor.
— Vamos continuar assim até o amanhecer? Que saco. — Jullie comentou, revirando os olhos e bebendo o último gole em sua taça.
— Não posso reclamar. Pelo menos estamos seguras. — Madison abraçou os próprios cotovelos ao sentir um leve arrepio.
— Querem ouvir uma história? — Kendra pronunciou, ao erguer sua cabeça e largar a taça sobre a mesa de centro. — Pode não ser a história de natal mais bonita. Na verdade, não gosto muito dela. Mas meu pai costumava me contá-la todo ano, mesmo que minha mãe a achasse horrorosa.
— Sempre há tempo para uma história natalina. — ingênua, Rose gargalhou e serviu mais um pouco da bebida.
— Para alguns, pode ser assustadora. Mas nada que nos tire do cotidiano dos últimos dias. — Kendra cruzou seus braços e preparou os lábios. — É uma história sobre cinco mulheres que ficaram sozinhas na noite de natal em uma pousada. Uma pousada como essa.
— Pode provar que não inventou isso agora? — Jullie deu de ombros.
— Acredite, não é mentira. Não a estaria contando se não fosse por tamanha coincidência. — um riso breve. — Elas acharam que teriam a noite mais animada de todas. Não haviam se preocupado com nada até o momento. Apenas com a programação natalina e... bebidas quentes.
— O que aconteceu com elas? — Rose questionou após um silêncio de quase dez segundos, angustiada.
— Uma batida na porta. As coisas começaram a dar errado após as dez e meia da noite, com uma visita inoportuna. — Kendra continuou.
— Pode parar, por favor. — Madison protestou. — Está claro que está tentando nos assustar. Mas pecou no seu roteiro, Smith. Não somos cinco mulheres. Apenas quatro.
— É claro, Greene. — respondeu em tom de deboche. — Eu nunca disse que a história era sobre nós.
— Isso é bobagem. Se quiserem continuar ouvindo histórias de terror, boa sorte. Estarei no meu quarto. — Jullie levantou do sofá e saiu andando pelo corredor. — A propósito... Frankie pediu que avisasse que iria até a capela mais cedo. Então somos só nós. Tomem cuidado. — por fim, a mulher desapareceu após os degraus.
— História interessante, Kendra. — Rose voltou a encará-la. — Mas prefiro não saber o final.
A mulher deu de ombros e voltou a prestar atenção na televisão. E a casa, é claro, voltou a ficar em silêncio. Como Jullie Morris disse, eram apenas quatro mulheres sozinhas na noite de natal com a suposta presença dos oficiais do lado de fora. Se ainda estivessem lá. O que de ruim poderia acontecer? Afinal, aquela não era uma história natalina a ser contada.
No festival, perto das 21:00 horas da noite.
Jesse se perdeu entre aquelas tantas pessoas que circulavam apressadas. Respiração ofegante, o peito saltando com a sensação de que havia algo se aproximando. Mas estava sozinha, ela sabia disso. Somente ela e a multidão que aproveitava a música vinda do palco.
Jackie Argent se apresentava ao lado de outros dois garotos. Pelo seu olhar, era fácil imaginar que não se encontrava contente, muito menos entusiasmada com a apresentação. Mas na ausência de sua melhor amiga, ainda precisava estar ali. O show precisava continuar.
A loira iniciou passos de dança equilibrados enquanto os dois rapazes, que faziam parte da banda, continuavam a melodia. Uma canção conhecida, Kids in America, e que trazia tamanho contágio e euforia àquele público. Nada parecia errado.
Quanto à Jesse, ainda não conseguia ficar calma. Prestava tanta atenção nos risos e na conversa alta dos jovens ao seu lado que mal percebeu o momento em que seu telefone começou a tocar. Não era uma chamada de Sam. Não era o Josh, a Melissa ou sua mãe. Um número desconhecido, outra vez.
— Aproveitando a festa? — o convidado surpresa foi mais rápido que as palavras de dúvida da menina.
— Eu sabia. Sabia que tinha algo a ver com isso! — Jesse cerrou seus punhos e começou a caminhar para longe. — Você estava esperando por esse momento. Não estava?
— Como poderia? Eu não sei onde você está, Jesse. Talvez... talvez eu saiba. Por que anda tão apressada desta forma? — sua voz a fez paralisar onde estava. — Não precisa ficar com medo.
— Onde... você está? — perguntou assustada, a voz falha e ansiosa.
— Isso não importa agora. Mas, me diga... acha que consegue chegar ao fim desta comemoração sangrenta? — ele retrucou.
— San... sangrenta? — ela engoliu em seco. — Não vai nos machucar outra vez. Eu não quero ouvir a mesma ameaça repetitiva, seu idiota. Quero que me diga o que preciso fazer para acabar com isso. Eu... não aguento mais. — protestou, sendo perceptível a mudança da cadência em sua voz.
— Eu sei que é capaz de fazer isso, Jesse. Mas será que está procurando no lugar certo? — outra vez, ele provocou a sensação de medo repentino em seu corpo.
— Onde eu deveria procurar? — Jesse levou a outra mão até o ouvido na tentativa de ignorar o barulho e a música alta.
Nesse instante, Jackie parecia mais do que preocupada sobre aquele palco. Ela encarava Jesse, na multidão, com um olhar suspeito. Sabia que tinha algo acontecendo e que provavelmente precisava de ajuda. Mas continuou seguindo os passos da canção na esperança de que acabasse com aquilo logo.
Seu temor e incerteza não a libertavam. Jesse, a essa altura, percebera a troca de olhares que significavam alguma coisa. Algo estava prestes a acontecer e as duas sabiam, mas não havia como interromper a apresentação. Foi quando Jesse parou de andar, estando exatamente no centro da área em que o público se reunira, e ouviu finalmente a resposta do Fantasma do outro lado da linha.
— Talvez devesse perguntar à sua mãe. — a chamada se encerrou de forma ligeira.
Jackie esgueirou seus olhos até o grande globo luminoso pendurado no topo da tenda que cobria o lugar. Havia alguém lá, perto dos holofotes, colocando suas mãos sobre o objeto. Ele seria liberto e só pararia ao tocar o chão. Exatamente onde Jesse se encontrava.
A música se aproximava do fim. Jackie tirou suas mãos do chão e correu até o microfone central o mais rápido que pôde, apanhando-o. Ela aproximou seus lábios e gritou com toda a sua força.
— JESSE, CUIDADO! — seu comportamento assustou a todos que assistiam à apresentação. Mas isso não importava, porque alguém naquele lugar acabara de cometer uma tentativa de homicídio.
Jesse teve tempo de se afastar do centro quando identificou a voz da dançarina. Ela apoiou suas mãos sobre o chão e encolheu as pernas, assustada. Mas sobre alguma coisa, as duas estavam certas: aquilo era uma armadilha. Algo estava planejado.
Assim que as pessoas se afastaram, em razão do barulho estrondoso que o globo fizera ao cair no chão, Jackie levou as mãos até o peito. Os dois garotos continuavam parados, um de cada lado dela. E antes que pudesse ter uma reação minimamente programada, um som estridente tomou seus ouvidos.
Eram como lâminas se aproximando. E de fato, estavam. A próxima coisa que Jackie sentiu foi o sangue quente daqueles dois rapazes atingindo seu rosto imediatamente depois que seus corpos foram cortados ao meio.
A armadilha havia sido projetada para que duas enormes lâminas se deprendessem do teto quando o globo tocasse o chão. Um segundo a mais, um segundo a menos, um passo à esquerda ou à direita, e seria o corpo dela sobre aquele palco. Ou metade dele.
A jovem continuava traumatizada. O sangue ainda ardia sobre sua pele. Seu vestido fora tomado por vermelho, e nada que fizesse iria reverter aquela situação. Então ela gritou. Gritou o mais alto que conseguiu para libertar de si mesma o sentimento de medo e agonia ao encarar os pedaços de seus colegas de palco sobre o chão.
Agora fazia algum sentindo a expressão "comemoração sangrenta", à qual o mascarado havia se referido tantas vezes. Jesse foi a única pessoa a subir naquele palco após o ocorrido e agarrar com toda a sua força a menina, em prantos. Ela manteve a cabeça de Jackie sobre seu peito enquanto a multidão se dissolvia para todos os lados. Gritos de socorro e o barulho das sirenes foram ativados.
Enquanto isso, consideravelmente longe da confusão que se instaurava na maior parte do festival, o romance adolescente tranquilizava àqueles que permaneciam dentro do labirinto de feno. Nenhum grito ou pedido de socorro vinha de perto. Na verdade, não havia barulho algum, e isso tornava a situação um tanto mais estranha.
— Pode parar por um segundo? Eu... eu não sei. Tenho um pressentimento estranho. — Melissa retirou cuidadosamente as mãos do garoto de cima de seu quadril.
— Por quê? Quer ir para outro lugar? — Johnny descansou seus lábios, recuperano o fôlego.
— Talvez devêssemos voltar para lá. — ela moveu seus olhos para a esquerda, tentando ouvir alguma coisa. — Está vendo? Não consigo mais ouvir as crianças na entrada. Lembro das vozes animadas, esperando a vez delas.
— Relaxa. Devem ter ido embora. Ou... nos afastamos demais da entrada. — um sorriso, e em seguida ele colocou suas mãos sobre o rosto de Melissa outra vez, puxando sua boca até a dele.
— Espera, Johnny. Eu falo sério. — ela recuou pela segunda vez. — Consegue se lembrar de onde foi que viemos? Acho... que estamos perdidos.
— Tenho certeza de que entramos por aqui. — apontou para o caminho da esquerda. — Ou talvez... foi por ali. — direita, agora.
— Droga. — Melissa começou a se demonstrar impaciente.
— Ok. Havia uma decoração de alcaçuz no último corredor pelo qual passamos. Se lembra dela? — ele perguntou, e a menina assentiu. — Certo. Vou dar alguns passos até aquele caminho e conferir. Volto em menos de dez segundos. Por favor, não saia daqui.
Melissa então acolheu o próprio corpo, cobrindo sua cabeça com o casaco e permitindo recostar-se sobre a parede macia. Johnny desapareceu após alguns instantes e, de repente, o som de seus passos também. Ela estava sozinha.
O rapaz caminhou até o corredor anterior como prometido. Ao alcançá-lo, seus olhos se confundiram imediatamente com a decoração natalina. Percebeu por fim que os enfeites em forma de alcaçuz estavam presentes no labirinto inteiro. Inclusive, é claro, no corredor em que havia deixado a garota.
Russell retornou até o local combinado o mais rápido possível e, para a sua surpresa, assim que chegou se deu conta de que ela não estava mais lá. Mas seu celular estava, e com a tela acesa, o que significava que havia saído há pouco.
— Melissa! Pedi que não saísse daqui! — exclamou em voz alta, mas não obteve resposta. — Meu Deus do céu. Melissa!
Talvez estivesse quebrando sua própria regra ao se afastar da luz daquele aparelho celular, mas não se importava. O garoto começou a caminhar desesperadamente entre as passagens estreitas que compunham o lugar. Precisava encontrá-la.
Seu coração ameaçava atravessar suas entranhas e pular boca a fora se não se certificasse, ao menos, de que ela estava bem. Precisava saber disso antes que enlouquecesse. Foi sua ideia entrar ali e se algo de ruim viesse a acontecer também seria culpa sua.
— Johnny! — aquela voz, outra vez. Macia e enfraquecida como sempre era. A não ser, é claro, quando Morris estava irritada com alguma coisa.
— O que está fazendo aqui? — Johnny se virou rapidamente, encarando-a sentada perto de um beco sem saída. — Minha nossa, Melissa. Achei que estivesse em perigo. — as sobrancelhas arqueadas, expressão de descontentamento. Mas na verdade estava aliviado.
— Eu... eu acho que estamos. — ressoou com uma voz ríspida, assustada.
— O quê? — o rapaz abaixou a guarda e correu até ela, segurando sua mão. — Do que está falando? Por que parece tão fria? — ele tocou sua pele gélida. Mórbida.
— Tinha alguém aqui. Eu o vi caminhando entre o feno. Acho... que estava nos procurando, Johnny. — ela cobriu a própria cara com sua mão logo depois de dar a notícia.
— Então se escondeu aqui? E quanto ao seu celular? — Johnny a ajudou a levantar e os dois começaram a caminhar novamente sem fazer muito barulho.
— Devo ter deixado cair quando corri. Eu não sei. — suspirou ansiosa. — Acha que conseguimos encontrar a saída antes... que ele nos encontre?
— É claro que sim. Eu voltei até aquele corredor. Estou certo de que devemos ir para lá. — ele fez parecer que tinha certeza. Na verdade, era só um palpite sem fundamento como qualquer outro.
Johnny se certificou de que a menina estava logo atrás dele e então seguiu o caminho. O silêncio atenuante estava a um passo de deixá-los loucos. Mas de repente, sumiu. As folhas secas utilizadas na decoração começaram a se mexer desesperadamente, como se alguém estivesse as arrastando.
— Johnny, tem... tem algo errado. — ela exclamou outra vez, entre suspiros de insegurança e o seu soluço lacrimoso que não ía embora nunca.
— Não há nada aqui, Melissa. Já disse. — ele virou seus olhos até ela e depois voltou a olhar para a frente.
E embora soubesse que Melissa falava a verdade, o rapaz preferiu imaginar que eram invencíveis, que não corriam perigo. Errado estava ele. E talvez se tivesse a ouvido, teria evitado aquele encontro sangrento.
Sua barriga foi brutalmente atingida por um objeto pontudo que se assemelhava a um picador de gelo, muitas vezes usado para esculpir lindos bonecos com a neve fresca. Mas não havia boneco algum, e muito menos neve. Em poucos segundos a arma branca se encheu com o sangue quente do jovem.
Melissa não pôde gritar. Sua garganta estava presa e tudo que conseguia fazer era deixar seu corpo ser puxado pelo chão gradativamente, enquanto mantinha sua boca coberta pela mão.
— Me... Melissa... — ele estava tentando dizer alguma coisa enquanto respirava ofegante. — Saia daqui!
Implorou. E então, erguendo seus olhos encharcados novamente, a loira observou que o desconhecido começara a limpar o sangue juvenil de sua arma com as próprias mãos. E perante o seu olhar após o feito — ainda que coberto pela máscara — ela soube que era a próxima.
— ME DEIXA EM PAZ! — tentava negar com a cabeça de todas as formas, implorando que ele não a seguisse. Mas era impossível, quanto mais se afastava da poça de sangue ao redor do garoto, mais perto a criatura chegava.
Os corredores estreitos de feno e palha se transformaram em um cativeiro para a menina. Se antes era difícil encontrar a saída, agora seria impossível. Cada parede feita daquele material era exatamente igual à anterior e à seguinte. A sensação era de que ela estava em todos os lugares e ao mesmo tempo em nenhum. E o pior, ele também.
Melissa sabia que o objeto sangrento que ele carregava estava prestes a perfurar seu corpo. E se deixasse isso acontecer, devia abandonar a ideia de que ela e o rapaz pudessem escapar daquele labirinto. Seriam apenas outras duas vítimas da noite de natal cujos corpos jamais seriam encontrados.
A menina virou seus olhos pouco antes que ele a alcançasse. Então usou toda sua força, jogando seus braços à direita, e puxou parte do material que compunha a parede de feno. Os destroços caíram entre ela e o encapuzado, impedindo que ele a pegasse. Melissa levantou ligeiro, ainda assustada, e voltou a correr.
Depois de outros dez agoniantes segundos tentando despistá-lo, ela finalmente conseguiu. O silêncio voltou a tomar conta do labirinto e ela não sabia onde estava. Pelo menos ele não estava mais por perto e isso era o suficiente. Mas havia algo diferente desta vez.
Uma passagem de vento forte lhe trouxe a breve sensação de uma passagem que não fosse coberta de feno ou palha. Ela lentamente se virou, e lá estava: "Saída", escrito em letras iluminadas e com dois pequenos sinos ao lado. Era o final do labirinto. Estava livre e precisava deixar aquele lugar imediatamente.
— Não, não... eu não posso. — negava a si mesma a falsa liberdade que enxergara há pouco.
Era claro o que tinha em mente: não poderia atravessar a saída sem ter as mãos quentes de Johnny Russell tocando seu corpo. Talvez sua própria vida tenha sido um pesadelo e sua adolescência um turbilhão de traumas psicológicos por um jogo doentio. Mas se havia uma coisa, uma única coisa que aprendeu nesse tempo era que só se termina um jogo quando todas as peças forem derrubadas.
E nem ela e nem aquele menino haviam sido. Então sairiam de lá juntos. A loira deu meia volta e começou a caminhar na direção oposta, quase sem forças por conta do ocorrido. Enquanto seguia em passos errôneos, ela mantinha em sua mente uma contagem. Cada segundo que demorava a mais lhe ajudava a saber a distância entre a porta de saída e onde estava.
Logo avistou o garoto ainda no chão. Respiração acelerada, a mão sobre o ferimento e um olhar de surpresa ao enxergá-la chegando. Johnny esboçou um sorriso de imediato.
— O que está fazendo aqui, Morris? — ele se apoiou em seus braços quando ela ofereceu ajuda.
— Não é óbvio? Não achou que eu te deixaria morrer nessa merda de lugar. Achou? — Melissa o ajudou a colocar o braço ao redor de seu pescoço e então começaram a caminhar.
— Onde... onde é que ele está? — perguntou o rapaz, enquanto olhava para todos os lados.
— Provavelmente não muito longe. A saída é logo ali. — apontou. — Estamos deixando esse pesadelo agora mesmo, Johnny. Aguenta mais um pouco!
Área principal do festival, 21:55 da noite.
O desespero mútuo encharcava cada centímetro da floresta e das barracas amontoadas. Os vendedores, assustados, deixaram o lugar o mais rápido possível. A polícia tentava conter a confusão enquanto precisavam encontrar quem havia provocado o acidente no palco. Mas não sabiam como. Porque não estavam preparados.
Jesse podia sentir seu coração como se pulsasse através do corpo todo. Sua visão começara a se corromper conforme continuava sendo empurrada pelos demais. Ela sabia que precisava encontrar seu namorado e seus amigos antes que algo horrível acontecesse, mas a voz do ruivo em seu smartphone parecia cada vez mais baixa.
— Eu não consigo ouvir, Jesse! Precisa me dizer onde está! — Sam parecia nervoso.
— Sam, eu... eu... — sua voz seguia ansiosa e fraca. — eu estou bem aqui. Mas não consigo te ver!
E era verdade. Seus olhos reviravam-se para todos os lados de uma só vez, mas tudo o que enxergava eram mais e mais desconhecidos. A menina sentiu seu pescoço se arrepiar por completo quando avistou sangue entre aquelas pessoas. Haviam se machucado de alguma forma.
E então entendeu, porque finalmente reconheceu as palavras que gritavam. "Socorro!", "Está se aproximando!". Quem? Quem estava se aproximando? As pessoas estavam feridas por toda parte. E por fim, erguendo seus olhos os levando mais ao centro, Jesse o enxergou.
Parado no meio da multidão, tomando a forma de uma vítima assustada mas não conseguindo esconder a faca que guardava na cintura. Era o mascarado. O Fantasma Negro, o único que poderia ser responsável pela morte daqueles dois rapazes e por todas aquelas pessoas sangrando enquanto corriam apavoradas.
— JESSE! JESSE! EU ESTOU LOGO ATRÁS DE VOCÊ! — a voz agoniante de Sam saltou do aparelho.
Ele estava lá. Então a menina deixou que seu olhar se dispersasse e correu até o ruivo o mais rápido que pôde. O sentimento de solidão e insegurança foi embora assim que ele tocou seu corpo com suas mãos frias.
— Graças a Deus você está bem. Viu o que aconteceu? — ele perguntava, enquanto esgueirava seus olhos por cada espaço no corpo da jovem. — De quem é esse sangue?
— Eu... eu estava perto do palco quando aquilo aconteceu. — Jesse tentou limpar, em uma tentativa falha, as manchas avermelhadas em seu vestido. — Jackie estava comigo mas acho que nos separamos em algum momento.
— Talvez ela esteja segura agora. Meu pai e os outros estão tentando evacuar todo mundo dessa área antes que mais alguém se machuque. Estão levando todos para o hospital. — Sam tentava se acalmar enquanto falava.
— Ele continua aqui. Eu o enxerguei no meio da multidão. Acho que está tentando fazer alguma coisa ainda, Sam. Não podemos ficar aqui. — exclamou.
— Nós também o vimos! — Josh gritou, ao se aproximar junto de Penélope.
— Onde vocês dois estavam? — o ruivo perguntou.
— Não estávamos no festival. Quando chegamos... essa loucura já havia começado. — Josh levou a mão até a cabeça.
— Algum de vocês viu o meu irmão? — a garota questionou, enérgica.
E como se sua dúvida pudesse ser respondida magicamente, Johnny e Melissa foram os próximos a encontrar o grupo. O rapaz ainda se apoiava no ombro da menina e sua ferida havia machado a camisa que usava, mas tirando isso, aparentavam estar bem.
— Johnny! Johnny, finalmente. — Penélope envolveu seu corpo em um abraço duradouro.
— Você está bem? Estão todos bem? — ela assentiu, e então ele voltou a abraçá-la.
— Olá. — Beatrice se juntou a eles sem que qualquer um percebesse sua chegada. — Esse lugar virou um inferno. O que estão pensando em fazer?
— Acho que o lugar mais seguro agora deve ser a pousada. — disse Jesse. — Vocês devem ir para lá.
— Mas precisamos encontrar a Jackie. — Sam protestou. — Eu fico com você. — encarou a garota.
— E eu preciso levar Johnny até uma daquelas ambulâncias. — Melissa apontou com a cabeça.
— Nós queremos ajudar também. Vamos ficar e procurar a Jackie. — Joshua protestou.
— Nada disso! Penélope vai voltar com Beatrice para aquela pousada agora mesmo. — Johnny refutou, seus olhos cerrados e o peito estufado.
— Johnny, não tem que se preocupar. Josh e eu sabemos nos cuidar. Por favor, vá para o hospital o mais rápido possível. Nos vemos depois. — a garota beijou a bochecha do rapaz e então se afastou, sem ao menos ouvir o que ele tinha a dizer.
— Toma conta dela. Se algo acontecer com a Penny... — Johnny sussurrou somente ao Josh, e então levou seu dedo indicador até perto do pescoço, sinalizando uma ameaça.
— Então... ninguém vem comigo? — Beatrice levou a mão até a nuca, esfregando os dedos sobre o cabelo.
— Eu! Eu vou com você. — surpreendendo a todos ali reunidos, Scarlett agarrou os braços da ruiva com força.
— Scarlett? O que... o que faz aqui? E o que houve com seu rosto? — Sam perguntou, quando reconheceu um corte profundo perto do olho esquerdo da garota.
— Eu... eu o vi. Estive cara a cara com aquele monstro trazido direto do inferno. — seus olhos encaravam o chão úmido. Ela estava paralisada. — Precisam me ajudar. Eu não posso ficar aqui! — implorou.
— Está certo. Eu e Scarlett voltaremos para a pousada o mais rápido possível. Estará segura lá. — a francesa assentiu com a cabeça, entregando sua mão à jovem. — Quanto a vocês, boa sorte esta noite. Nos vemos de novo quando o terror permitir.
E então o grupo se dissolveu. As duas meninas adentraram a floresta, cujo caminho levava direto à pousada, enquanto o restante voltou para aquele furacão sonoro. Ainda era natal. A noite não havia chegado ao fim.
A estrada era escura e bruta. Por mais de dez minutos de caminhada o que se manteve foram os barulhos dos sapatos apressados sobre as folhas secas. Scarlett preferiu continuar em silêncio enquanto caminhavam, e Beatrice fez o mesmo.
— Essa noite parece não ter fim. — sussurrou aquela que estava ferida.
— Estamos quase chegando. Vai poder descansar um pouco. — Beatrice permaneceu com os olhos abertos na direção da única luz que se erguia em um lugar próximo.
— Aquilo é... — Scarlett se calou antes de pronunciar.
— É. Acho que é a luz da varanda. Vamos! — assentiu com a cabeça, voltando a caminhar.
[Música: Who Are You, Really? - Mikky Ekko]
— Nã... não. — suspirou com nervosismo. — Falo daquilo. — Scarlett ergueu seu dedo e o apontou até o escuro que bloqueava o caminho do qual vieram.
Ao esgueirar suas pupilas até a penumbra atrás delas, a francesa se encheu com a certeza de que não somente as árvores preenchiam aquele vazio. Havia outra sombra junto das folhas secas. Alguém se aproximava mais rápido do que deveria.
— Scarlett... por favor, comece a correr. — disse sem perder a calma, enquanto afastava seus pés vagarosamente.
— Para onde? — a menina juntou as duas mãos sobre o peito, engolindo em seco o seu pavor.
— Para a pousada. PARA A POUSADA! AGORA! — Beatrice ergueu parte de seu vestido com a mão esquerda e começou a correr.
O desconhecido estava chegando perto em passos curtos, o que garantia que tinham tempo de ganhar distância e alcançar aquela varanda iluminada se não demorassem muito. Entretanto, embora percorresse os olhos constantemente sobre o chão úmido no qual arrastava suas sapatilhas, a garota estrangeira não teve tempo de enxergar a armadilha.
Beatrice sentiu seu corpo sendo puxado por um vazio que se abrira, cegando seus próprios passos em menos de um segundo. Havia caído em um tipo de fossa de quase dois metros que, sem dúvida alguma, fora construída por algum motivo.
Depois de assimilar que seu corpo continuava inteiro e suas pernas não haviam se quebrado na queda, Beatrice se apoiou na parte mais alta que conseguiu e clamou por ajuda.
— SCARLETT! — implorava, com uma respiração apressada e suspiros de nervosismo. — Precisa me ajudar. Estenda um galho, qualquer coisa!
— Eu... eu não... não consigo. — apoiada sobre a borda, a garota levou a mão até a boca e balançou a cabeça em negação.
— Scarlett, por favor. Estenda sua mão! Eu acho que posso me impulsionar até... — quando percebeu, a garota havia saído de lá. — Scarlett?
— Eu não posso! Ele está se aproximando! EU NÃO POSSO! — ela continuou a negar a si mesma com o rosto enquanto se aproximava, agora sozinha, da luz amarelada sobreposta aos enfeites de natal.
— NÃO ME DEIXE AQUI! — seu pedido era inútil. Ela já havia feito isso.
E Scarlett não poderia voltar atrás. Odiava a ideia de chegar à Woodhouse sozinha e odiava mais ainda ter que deixar aquela jovem simpática para trás. Mas se não o fizesse, morreria também. Então agarrou o primeiro degrau da escada, cambaleando, e viu seus olhos se enchendo com as luzes azuis, amarelas e vermelhas.
Mas embora estivesse tão perto de se sentir segura outra vez, pôde identificar o momento exato em que um tecido preto cobriu seu rosto. Uma pancada fez seus olhos se fecharem e, de repente, aquela residência aconchegante estava mais longe do que deveria.
Seus olhos permaneceram cerrados, quase fechados, durante o caminho todo. Scarlett assistira a iluminação natalina ficando cada vez mais distante, distante e distante, enquanto ela era arrastada para o escuro que rodeava a pousada.
O gosto de sangue e a dor forte em sua nuca a impediam de gritar qualquer coisa. Pelos últimos três segundos, antes que apagasse por completo, ela reconhecera a voz de Beatrice gritando por ajuda naquele buraco escuro. Uma ajuda que nunca viria.
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