Temporada 1 - Capítulo 13| "Xeque-mate" • Final
Aqueles adolescentes juravam por suas vidas que a noite não poderia piorar. Mas ela iria. Seth e Zoe haviam se separado do restante do grupo, alegando a necessidade de irem até suas casas antes de encontrar o vilão na casa abandonada. Enquanto isso, Jesse e os outros foram com o carro de Millye até a floresta, onde ficava a mansão. Jenny, por sua vez, decidiu que continuaria ao lado de Claire até o final da noite. Apesar de ter levado uma facada pouco profunda, a menina dispensou entrar naquele hospital mais uma vez.
E então, os sete finalmente se encontraram na entrada da floresta escura. Era hora de tirar a máscara e descobrir quem estava fazendo aquilo. E o mais importante: por quê? O que alguém ganharia com isso? Dinheiro, amigos, fama? Bem, talvez ele só quisesse brincar.
Floresta da estrada 96, 23:44 da noite de 31 de outubro.
— Seth? Graças a Deus! Por que demorou tanto? — disse Jesse, abraçando o garoto ao vê-lo se aproximar.
— Eu precisava de um banho. Tirei aquela fantasia ridícula e chequei se meus pais já haviam chegado. Mas... não tinha ninguém ninguém. — Seth abaixou a cabeça. — Já faz dias, não sei o porquê de ainda não terem voltado. Enfim, eu trouxe isso. — ele tirou algo do bolso. — Encontrei no porão e achei que fosse útil.
— Seth Hastings! Ficou louco? — Claire gritou, assustada. — Isso é a droga de uma arma? Quer que passemos a noite na delegacia?
— Na verdade seria muito melhor do que passar a noite nesse lugar. — ele apontou para a floresta à frente deles. — Claire, aquele desgraçado deixou claro que quer nos matar. Precisamos nos proteger. — o menino começou a caminhar, depois de guardar o revólver no casaco.
— Seth está certo. Se o bicho papão quiser acabar com um de nós sozinho, não vamos nos defender só com as próprias mãos. — Jesse respondeu. — Vamos andando, já é quase meia noite.
— E quanto aos outros dois? Nenhum sinal da Zoe ou do Jaremy? — Josh olhou ao redor, antes de seguir o restante do grupo.
— Estou aqui. Não gosto de ignorar convites. — Zoe se aproximou, fechando o zíper do seu casaco.
— Fascinante. — Millye suspirou.
— Bem, então... se estamos todos aqui, eu acho que já ficou bem claro quem está naquela mansão agora. — Claire exclamou, voltando seus olhos para o cenário sombro que os cercava.
— Ainda é cedo, Claire. — Jesse se virou. — Só precisamos ficar juntos e manter todos por perto. Se for realmente o Jaremy, acho que já ganhamos o jogo.
O restante do grupo apenas concordou com o que a garota disse. Seth ultrapassava as árvores enquanto mantinha a mão esquerda no seu bolso, segurando o cabo da arma. Jesse e as outras garotas vinham logo atrás, enquanto Josh era o último. Durante os poucos minutos que permaneceram naquele caminho escuro, todos eles ficaram em silêncio. Não havia nada para dizer, só queriam sair logo daquele lugar e voltar a viver vidas normais.
A lua já havia se posicionado no centro do céu estrelado, e alguns animais ao redor provocavam barulhos inquietantes, que tornavam mais tensa ainda a situação. Depois de alguns minutos caminhando, Seth finalmente encontrou o terreno.
— Isso é enorme. Parece mais uma escola do que uma casa. — Jesse observava a construção.
— Não é à toa que dizem que esse lugar é mal assombrado. — Josh apoiou os braços na cintura.
— Fala sério! — Jenny quebrou o silêncio. — Estamos em 2018. Vamos mesmo seguir o clássico roteiro de "jovens inocentes adentraram o lugar sem saber o que viria pela frente"? Tá tão na cara que isso é uma armadilha! — ela se posicionou na frente dos outros.
— É isso, ou ficar aqui fora esperando. Você é quem sabe, Jenny. — Jesse suspirou, ignorando a presença da menina e subindo os degraus da pequena escada.
— O que é isso? Um bilhete? — Seth se aproximou, ao perceber que Jesse havia pego algo do chão.
— Parece que sim. São como... instruções. — Jesse abriu a carta e depois se virou para o restante, lendo em voz alta o que o texto dizia.
"— Bem-vindos ao palco da história mais assustadora de Rainwood! Estão prontos para jogar? Antes de entrarem, vamos tornar a brincadeira mais divertida: dividam-se em dois grupos. Um entrará pela porta da frente e o outro deve dar a volta no terreno, até que encontrem a porta lateral. Dois grupos, diversão em dobro! Espero ansiosamente por vocês."
- Um velho amigo
— SANTO DEUS! ISSO É LOUCURA! — Jenny se sentou no primeiro degrau.
— ESCUTA AQUI, JENNY! — Zoe puxou a garota pelos braços. — SUZEN E MARYAN MORRERAM NAS MÃOS DESSE DESGRAÇADO! SE VOCÊ PRETENDIA AMARELAR, ERA MELHOR TER FEITO ISSO ANTES! NINGUÉM VAI DESISTIR AGORA!
Jesse e os outros observaram o temperamento da menina enquanto ficavam em silêncio. Claire pensou em intervir para tirar a sua melhor amiga das mãos da outra garota, mas até ela concordava com aquelas medidas.
— Eu... eu... — Jenny encarava Zoe sem saber o que dizer. — Certo. Vamos logo. — a loira levantou, cobrindo seu corpo com parte da manta rosa que carregava.
— Então... vamos lá. — Josh caminhou até o centro do círculo. — Eu, Seth e Jesse vamos entrar pela frente. Millye, Zoe, Claire e Jenny podem dar a volta. Alguém não concorda com isso?
Ninguém disse nada, então estava resolvido: era hora de iniciar o jogo. Os grupos se separaram e cada um seguiu o caminho que lhe cabia.
— Qual é o problema? — disse Zoe, ao perceber que Millye a fitava sem parar.
— Nada. Só que ainda não tirei você da lista. — a de óculos suspirou, deixando Zoe passar à sua frente enquanto seguiam as outras duas.
Zoe ignorou a resposta da outra, começando a caminhar mais rápido em direção à porta que levava ao lado de dentro. Jenny apoiou seu braço no ombro de Claire, ainda com dificuldade por conta da facada. Enquanto isso, do outro lado os três já haviam adentrado aquele lugar escuro e tenebroso.
— Okay, só precisamos ficar juntos. Jesse, você pode me dar a mão... se quiser. — Seth encarou a menina, começando a caminhar.
— Brilhante, Seth. Brilhante. — Josh falou em voz baixa, depois de revirar os olhos.
Jesse estava certa: aquela construção se assemelhava muito mais a uma escola do que uma simples casa. Ninguém sabia o que de fato aconteceu ali para que o lugar se tornasse tão famoso, mas era visível que os corredores escuros deixavam qualquer um com medo. E quanto mais os três andavam, mais pareciam estar perdidos. Josh tentou se manter perto de Seth e Jesse, mas era quase impossível que o menino não se fascinasse com aquele cenário, que parecia ter sido detalhadamente preparado para um filme de terror.
Ainda do lado de fora, Millye havia parado para limpar seus óculos, sem perceber que Claire e as outras duas já tinham encontrado a porta.
— Meninas? — a Campbell se espantou ao levar as lentes até seu rosto. — Droga. Já devem ter entrado. — a menina apertou o passo, mas antes que alcançasse a porta, ouviu um barulho vindo dos arbustos. — Quem está aí? — se virou rápido.
Dez segundos se passaram, e nada. O local permaneceu quieto enquanto ela observava as árvores se mexendo. O único barulho que por ali passava era o do vento que percorria a floresta naquela noite fria. Então Millye ousou perguntar mais uma vez.
— Eu fiz uma pergunta. — ela cerrou seus punhos, se aproximando mais dos arbustos. — Quem está aí? — dessa vez a garota usou um tom mais grave na voz, tentando esconder o medo.
— Está tendo alucinações agora, Campbell? — a voz rouca de Jaremy tomou os ouvidos da menina.
— DROGA! — Millye deu um pulo ao ouvir a voz se aproximando por trás. — O que faz aqui?
— Fica calma, esquentadinha. Eu só não queria ser o próximo a morrer. Que escolha eu tinha a não ser seguir as regras? — Jaremy aproximou seu corpo do dela.
— Fica longe de mim, Jaremy. Ou eu vou... eu vou... — Millye enrolava-se em suas próprias palavras.
— Vai o quê? Eu acho que o cara com a arma aqui sou eu. — Jaremy mostrou o revólver que tinha em mãos.
— Se apontar essa arma para mim, eu vou gritar. Vou gritar tão alto que qualquer um nessa floresta vai ouvir. EU DISSE PRA FICAR LONGE! — ela reafirmou.
— Eu não acho que isso seria muito eficaz, Campbell. — levou sua mão pesada até a boca da garota, pousando-a sobre seus lábios. — Seria bem difícil que alguém ouvisse você agora, não acha? — ele riu, se afastando de novo. — Mas relaxa. Eu não sou o assassino.
— Nossa! Me sinto muito mais segura agora. — Millye cruzou os braços, bufando. — E por que eu deveria acreditar em você?
— Porque eu estou falando a verdade! Você me viu sendo esfaqueado nessa mesma floresta, Millye. Qual é?! — Jaremy falou.
— E eu também vi a marca de facada no seu braço. Sabe quem também foi esfaqueada no braço? Riley Belmont. E segundo a Jesse, você apareceu assim na manhã seguinte ao ataque dela. — Millye explicou. — Me dê dois motivos pra que eu acredite em você agora, Jaremy.
— Olha só, eu garanto que foi tudo uma coincidência. Eu ajudo meu pai aos domingos na marcenaria, foi um acidente. A Jesse estava confusa naquela manhã, e... eu também. Devo ter passado a impressão errada. Quanto à Riley, pelo amor de Deus, eu nem sei quem é Riley! Agora será que podemos ir em frente? — o garoto respondeu, gesticulando enquanto segurava a arma.
— Eu não... não... — Millye tentava encontrar uma resposta. — Você vai na frente, e eu fico com a arma. Se tentar qualquer coisa, Jeremy, eu atiro.
— Como quiser, gata. — Jaremy sorriu, entregando o revólver para ela e começando a caminhar.
— E não esqueça que eu só estou confiando em você porque não tenho outra escolha. — Millye suspirou, seguindo a caminhada enquanto olhava fixamente para o garoto.
Nesse momento, Claire, Jenny e Zoe já haviam percorrido boa parte do caminho. E o mais interessante é que nenhuma delas havia dado falta de Millye.
— Certo, então... são dois caminhos. — Claire observou uma bifurcação à frente delas. — Millye, você é a esperta aqui. O que fazemos? — a garota virou-se, podendo observar Zoe, Jenny e... nada de Millye. — Millye? Droga, onde ela está?
— Quê? Como assim? — Jenny olhou ao redor. — Eu tenho certeza de que ela estava atrás de mim agora mesmo! Ou... eu acho. — a menina coçou a cabeça. — Não vou me surpreender se a esquisita aí tiver esfaqueado a nerd e escondido seu corpo.
— Dá um tempo, porra. — Zoe se afastou da loira.
— Eu não acredito nisso! — Claire cruzou os braços. — Nossa única tarefa era que ficássemos juntas. O que fazemos agora?
— Será que dá pra ficarem calmas? Parecem dois esquilos em pânico. A Millye já deve ter entrado, ela sabe se virar. Vamos continuar. — Zoe voltou a caminhar.
— O que exatamente estamos procurando? Aliás, estamos procurando por algo ou só esperando que ele nos mate? — Jenny interveio.
— Eu espero que não. Talvez haja algo mais à frente, ou... eu não sei. Só precisamos ficar vivas até que esse pesadelo acabe. — Claire explicou, sendo a última no corredor, e quase ficando para trás.
— Ainda não entenderam? — Zoe se virou mais uma vez. — É como uma caçada. A diferença é que não sabemos se somos o predador ou a presa. Agora andem, não quero perder tempo aqui. — ela voltou a seguir o caminho.
Não tão longe dali, Jesse e Josh caminhavam um ao lado do outro quando a menina se deu conta de que suas mãos não sentiam o calor das de Seth há um bom tempo. De imediato sentiu um arrepio. Não parecia real que só agora tivesse percebido que não estavam mais de mãos dadas.
— Jo... Josh. Onde está o... — Jesse se virou, apontando a lanterna para a figura que estava perto do fim do corredor, parada. Era o Seth. — Hastings... está tudo bem?
— Eu acho que a resposta é não. — Josh observou o comportamento estranho do rapaz.
— Ele deve estar... pensando de novo. Merda. Josh, fica aqui. Não sai desse lugar, entendeu? — Jesse se afastou do menino, caminhando até perto de Seth.
— O quê? Jesse! Está brincando comigo? — Josh gritou. — Ok. Essa foi definitivamente a ideia mais burra que você já teve. Parabéns, Jesse Greene! — ele tentou dizer, mas a menina já havia ido embora.
Jesse caminhava rapidamente através das paredes escuras no intuito de alcançá-lo, mas Seth parecia se distanciar cada vez mais.
— SETH! — ela gritou, ao alcançá-lo finalmente. — O que aconteceu?
— Jesse, ela está aqui de novo. — o menino a encarou com uma expressão amedrontada.
— Seth, precisa ficar calmo. Nós já falamos sobre isso. Não há ninguém aqui! — Jesse tentou segurar a mão dele, mas o rapaz se soltou novamente.
— NÃO! — Seth afastou-se dela. — Você não entende, eu... eu preciso ir. Preciso ir agora. — o menino começou a caminhar mais rápido naquela escuridão imersiva.
— SETH! VOLTA AQUI! — Jesse começou a persegui-lo.
A menina havia entrado em pânico. Seth estava fora de si, e cada vez mais parecia ser puxado para dentro daquele pesadelo. Era como se ele precisasse de ajuda, mas Jesse nunca conseguia alcançá-lo. E quanto mais tempo passava, mais ela tinha a certeza de que o garoto corria perigo. Havia um assassino naquele lugar, talvez observando os dois neste mesmo momento, apenas esperando a hora certa para atacar.
Do outro lado daquele labirinto, as coisas não estavam tão diferentes. Claire havia percebido que o escuro estonteante havia separado ela das outras duas, fazendo com que a menina se distanciasse consideravelmente.
— Zoe? — Claire apontou a lanterna para a frente. — Jenny? Onde... onde vocês estão? Não, não, não! NÃO! DROGA! — Claire jogou a lanterna no chão, com raiva.
A menina havia começado a se apavorar. Era impossível que as pessoas simplesmente sumissem assim naquele lugar. Claire começou a caminhar para o lado oposto, uma vez que não sabia mais qual caminho seguir.
— Vamos, vamos, precisa ter alguém aqui! MILLYE! JESSE! — Claire tentou impedir que seus olhos lacrimejassem, mas era tão falho quanto a teoria de que ela sairia ilesa daquela casa. — POR FAVOR, ALGUÉM! — ela correu, correu, e correu mais ainda.
Não havia ninguém lá, nenhuma alma viva aos arredores daquele corredor. Claire estava totalmente sozinha. E poucos segundos depois sentiu uma coisa estranha. Todo o medo que lhe cercava naquele momento encontrou uma porta de entrada.
— Por favor, Jesse... por favor. Você disse que ficaríamos bem. — Claire limpava suas lágrimas, andando de costas enquanto tentava não se perder em seus próprios pensamentos. — Você disse que... disse... o quê? — a menina parou de falar ao ouvir um barulho. — SOCORRO!
Ela tentou gritar, mas não adiantaria. De repente, Jensen sentiu duas mãos agarrando seu corpo. E antes que se virasse por completo, já havia sido entregue de vez àquele terror sem rosto. Sua boca foi coberta pelo manto negro que ele carregava, e Claire por fim entendeu: o jogo havia acabado para ela. Ninguém a viu e nem ouviu seu grito de desespero. Acabou.
A noite continuava para todos os outros que estavam presos naquela mansão. Relativamente perto de onde a garota da boina fora levada, Millye ainda observava cada movimento do garoto à frente dela, enquanto andavam pelos corredores frios do lugar.
— Você também ouviu isso? — Jaremy se virou, repentinamente.
— Se estiver tentando me fazer de boba, Jaremy, pode esquecer. — Millye revirou os olhos e levou sua mão até o revólver mais uma vez. — Continua andando.
— Será que dá pra deixar de ser tão irritada? Que saco! Estou tentando salvar a sua vida, quatro olhos. Eu disse que... — o garoto engoliu em seco a próxima frase quando ambos perceberam que havia de fato alguém se aproximando. — Tá ouvindo agora?
— Droga. Droga! O que a gente faz? — Millye se desesperou, encarando todos os caminhos ao redor dos dois.
— Sei lá, você é a garota com a arma na mão. — Jeremy respondeu.
— Eu... — Millye parecia ter paralisado. Seus dedos não se mexiam e ela continuava segurando a arma apontada para a parede, enquanto aquele carrasco se aproximava.
— Millye? MILLYE! RÁPIDO, MILLYE! — Jaremy começou a gritar, esperando que ela fizesse alguma coisa, mas a menina continuava sem se mover. — MILLYE, A ARMA!
E nada. Então ele agarrou o braço dela de uma vez, soltando-o somente depois que haviam ultrapassado a porta mais próxima. Os dois agora estavam presos em uma pequena saleta escura. O espaço era tão estreito que seus corpos ficavam colados o tempo todo.
— Que merda deu em você? — Jaremy tentou sussurrar, mesmo que sua vontade fosse de gritar com ela. — Podíamos ter morrido! Sabia disso?
— Eu não... me desculpa. Eu não sei o que aconteceu, eu só não consegui. — Millye cerrou seus punhos, de olhos fechados.
— Só fica quieta. Ele deve ter ido embora. — Jaremy respondeu.
— Jaremy... — Millye levantou seus olhos, percebendo a respiração ofegante do garoto. Seu peitoral tomava conta do espaço da menina, fazendo com que ela se sentisse desconfortável. — Será que podemos sair agora? Eu acho que não consigo respirar.
— O quê? — Jaremy voltou a olhar para ela, percebendo que seus rostos estavam quase colados. — Ah, é... sim. Desculpa. — o garoto abriu a porta devagar. — Anda, me dá a arma.
— O quê? E por que eu faria isso? — Millye ajeitou seus óculos, encarando ele.
— Eu não sei se percebeu, mas eu acabei de salvar a sua vida. A não ser que queira amarelar na hora de atirar de novo, é melhor me entregar isso. — Jaremy sorriu de canto, estendendo sua mão.
— Toma cuidado. — Millye entregou o objeto, afastando-se da passagem enquanto assistia o menino ultrapassá-la.
Jaremy caminhou até o lado de fora. Pôde perceber uma luz fraca vindo de algum dos corredores. Estava tudo bem agora, não havia nenhum maníaco psicopata esperando por ele ali. Sejá lá quem fosse, já havia ido embora agora.
— Certo. Viu só? — ele abriu os braços. — Já passou, irritadinha. Pode me agradecer de... — sua voz foi brutalmente interrompida pelo mesmo objeto que cortou sua pele.
Ele estava lá. Mais uma vez. Jaremy sentiu a faca rasgando parte do seu abdômen enquanto encarava a face negra do assassino. A respiração daquele monstro adentrava os ouvidos do garoto, enquanto ele ainda conseguia ouvir os gritos de Millye no lado de trás. E mais uma vez a menina ficou paralisada. Agora sem ter uma arma em mãos.
— JAREMY! NÃO, NÃO, NÃO! — Millye agarrou seus cabelos, sem saber o que fazer.
Era tortura. Atacar um maluco com suas próprias mãos? Esperar que seu amigo fosse estraçalhado na frente dela? É impossível saber, mas naquele momento, Millye só pensou em uma coisa: gritar. Ela gritou o mais alto que pôde.
Jaremy caiu no chão segundos depois, contraindo-se enquanto tentava pressionar o ferimento. O rapaz havia sido derrubado para o lado de dentro da pequena sala em que Millye estava, então a menina se sentiu no direito de tentar ajudá-lo, mesmo que o homem das vestes escuras ainda estivesse parado ali.
— JAREMY! NÃO FECHA OS OLHOS! — Millye colocou suas mãos sobre o sangue, tremendo sem parar. — FICA COMIGO, JAREMY!
— Mi... Millye, c... — ele tentava dizer, com dificuldade.
— O quê? — ela aproximou seu ouvido da boca do rapaz, podendo por fim identificar o que ele estava querendo dizer.
"Corre". Millye ergueu lentamente seus olhos, voltando a lembrar-se que o assassino ainda estava lá. Então Campbell saiu do chão e iniciou uma busca desesperada pela maior distância possível que poderia tomar daquele maníaco. Quanto mais ela corria, mais parecia ser puxada para trás. O mascarado aguardou cerca de três segundos antes de ir atrás da sua presa, afinal, ele mesmo sabia que iria alcançá-la de qualquer jeito.
A alguns metros de distância, Josh Evans esperava a suposta volta de Jesse e Seth, que já haviam saído há mais de dez minutos. E alguma coisa garantia a ele que eles não voltariam.
— Certo, Evans. Digamos que você esteja em um filme de terror. Quem você prefere ser: o garoto que é morto por ficar sozinho, ou o que infringe as regras e busca ajuda da polícia enquanto seus amigos não voltam? — Josh respirou fundo, imaginando consigo mesmo qual caminho deveria seguir. E de repente, o barulho do seu celular tirou-o de seus pensamentos em um instante. — Alô? — Josh questionou.
— Josh? Graças a Deus! Eu preciso de ajuda, Josh. Por favor! — a voz ofegante de Millye era perceptível na chamada de voz.
— Millye? É... estranhamente bom ouvir a sua voz! O que aconteceu? — Josh começou a caminhar.
— Eu não sei, Josh! Eu não sei! Ele estava atrás de mim, e agora eu... EU NÃO SEI! — Millye gritou, começando a chorar em meio aos suspiros de nervosismo.
— Se acalma! Eu vou tentar encontrar você, mas primeiro precisa ficar calma e prestar atenção em mim. Okay? Se entrar em pânico vai dar tudo errado. — Josh tentou tranquilizá-la enquanto percorria os tenebrosos corredores do lugar.
— Como diabos você espera que eu faça isso? Tem um doido me procurando neste exato momento, Evans! E ELE VAI ME ACHAR! E parece que isso aconteceu por minha culpa. — Millye gritou.
— Okay, só... foca em mim e na minha voz, tá bom? Eu prometo que tô indo pra aí. Sabe, eu acho que já passei por algo parecido. — Josh riu.
— O quê? Do que está falando, Josh? — Millye encolheu-se na parede, abraçando seus joelhos.
— Quando a minha mãe morreu, eu... — ele começou a explicar, mas Millye pulou na frente.
— Espera. Sua mãe morreu? — ela perguntou.
— É. Eu não costumo falar disso, mas... já faz alguns anos. Meu pai era um bêbado desgraçado que batia nela, então um dia ele chegou em casa com mais raiva do que o normal. Minha mãe me escondeu no porão, e eu... eu não consegui fazer nada. Sabe? Eu só fiquei sentado no chão, tremendo e pensando que aquilo era minha culpa. — Josh suspirou, parando de andar e se sentando no gélido solo, perto de uma longa escada.
— Josh, isso é horrível. Mas não faz sentido. Por que seria sua culpa? — Millye parecia ter normalizado seu tom de voz, começando a ficar calma aos poucos.
— É, eu sei. Mas enquanto eu estava sentado naquele chão escuro e frio, eu achei que fosse. Do mesmo jeito que você, Millye. O que importa é que você precisa ficar calma agora. Ah, e a propósito, se isso te tranquiliza... sua fantasia de Annie Brackett é válida sim. Aquele filme também conta como um remake, mas foi engraçado te ver brava. — disse ele, sorrindo. — Agora me diz onde você está.
— Me sinto muito melhor agora. Eu... eu não sei onde estou. Jaremy estava comigo há alguns minutos, mas ele foi atacado. — Millye respondeu.
— Espera... ESPERA! — ele gritou. — Disse Jaremy? O Jaremy foi atacado? Calma aí, o Jaremy estava com você? Quê?
— Sim, ele estava. E... pelo visto ele não era o culpado. Eu estava errada, Josh. — ela respondeu.
— Ai, meu... Deus. Millye, então isso tudo faz sentido! — Josh escancarou um sorriso improvisado em seu rosto, levantando-se do chão na mesma hora.
— O quê? O que é que faz sentido, Josh? — Millye arqueou a sobrancelha.
— Millye, desde que uma pessoa apareceu estranhamente no nosso núcleo de convivência, eu venho percebendo algo. Pode parecer estranho e um pouco desonesto da minha parte, eu sei. Mas se eu estiver certo, então... então todas as peças se encaixaram, Millye! — Josh sussurrou.
— Como assim? Me diz logo, Josh! — ela falou.
— Bom, se Jaremy é inocente, e se a Zoe também for, já que ela estava com você quando foram atacadas no porão, então... eu acho que desvendei o mistério. — Josh disse. — Só há uma pessoa que pode ser o real assa... — o silêncio alcançou a chamada de voz, arrancando do garoto as palavras que ele diria. — Millye...
Josh tentou se manter em pé mesmo que seu coração batesse rápido como uma bomba-relógio. Não levou muito para que o jovem percebesse que foi apunhalado pelas costas. Ele lentamente soltou o celular da mão, deixando que o aparelho caísse no chão. As mãos cobertas por uma luva grossa rapidamente alcançaram a boca dele, impedindo-o de dizer qualquer que fosse sua resposta para a menina do outro lado.
— Josh? Joshua! O que foi que aconteceu? Josh, por favor! Fala comigo! — Millye implorou.
Infelizmente, ela nunca teria a resposta de que precisava. Aquele smartphone permaneceu aceso no chão por mais alguns segundos, enquanto a voz de Millye ecoava pelo local. Josh estava sendo arrastado para longe da luz do aparelho e seria entregue à eterna escuridão. Evans fora a quarta pessoa a desaparecer naquele enorme labirinto de medo e pavor na noite de trinta e um de outubro. E até agora ninguém havia encontrado uma resposta para a real identidade do mascarado. Ainda.
Zoe e Jenny seguiam em passos curtos no mesmo corredor que haviam estado desde o início. Nenhuma das duas ousou sair daquela linha reta depois que perceberam o sumisso de Claire, e tudo que queriam era encontrar algum dos outros ou ouvir qualquer voz macabra dizendo: "Podem ir embora. O jogo acabou!".
— Aposta quanto que a próxima a sumir sou eu? — a menina do casaco rosa puxou assunto, enquanto segurava seu celular.
— Silêncio, Jenny. Se continuar dizendo isso, pode ter certeza que eu mesma faço acontecer. — Zoe suspirou.
— Zoe... você me odeia? — perguntou ela. — É que talvez eu morra aqui, então acho válido saber.
— Caramba! Pra uma das 'Bad Girls' da Rainwood High você parece bem vulnerável agora. — a outra sorriu.
— Como é? Você não esperava que eu fosse grossa e arrogante o tempo todo. Esperava? — Jenny cruzou os braços. — É difícil manter o papel de rainha má, mas... é preciso. Ou você toma o trono, ou você é o trono e as pessoas sobem em cima de você. — ela suspirou. — Pelo menos eu achava que a escola era o ambiente mais assustador, até que chegássemos nesse lugar nojento.
— É. Você não parece tão má assim agora. É mais fácil conversar com você em uma casa abandonada do que nos corredores da escola. — Zoe se virou para ela. — Sabe de uma coisa? Até que... JENNY, CUIDADO!
— O... o quê? — Jenny estranhou o aviso da garota, percebendo em seguida o que de fato havia lá. — NÃO!
Então Josh Evans havia sido a quarta pessoa? Bem, Jenny acabara de ser a quinta. A loira tentou virar seu corpo na mesma hora, mas era tarde demais. O manto preto envolveu-a naquele mar de escuridão, puxando a menina para trás antes que Zoe pudesse fazer alguma coisa. Seu celular caiu no chão, iluminando o pequeno espaço à frente da outra.
— Je... Jenny? — Zoe perguntou, encarando o vazio que lhe cercava. — Não, não, não. NÃO! VAI SE FERRAR, SEU DESGRAÇADO!
Era evidente que Zoe não tinha outra escolha a não ser gritar e se enraivecer, como sempre fazia perante qualquer situação. Infelizmente, dessa vez seu ódio não salvaria ninguém. Talvez no fundo, bem no fundo, Zoe tinha era medo de acabar sozinha em um lugar em que tudo o que lhe cercava era ele: o próprio medo. E agora, ela estava lá.
A adolescente se afastou devagar do local em que ouviu os últimos murmúrios da sua quase nova amiga. E agora restaram três. As últimas três garotas que ainda não haviam sido agarradas pelo mal naquela noite. A questão era: alguma delas iria de fato sair viva daquele tabuleiro mortal, ou todas as peças cairiam antes do jogo acabar?
Zoe começou a caminhar mais rápido em direção ao que parecia ser uma sala, pouco à frente. Sua respiração entregava o nervosismo que ela carregava em si. Sem saber o que fazer, sem uma arma para se defender e sem ninguém para lhe ajudar. Zoe nunca havia se sentido tão vulnerável assim. Até que de repente...
— ZOE! — alguém surgiu no meio daquela mistura de escuridão e pavor, agarrando a garota.
— AH! — ela tentou gritar, mas o sujeito cobriu sua boca na mesma hora, abafando seu grito. — Mi... Millye? — Zoe pôde dizer, depois de empurrar os dedos da outra para longe.
— Sou eu. Onde estão as outras duas? — Millye estampava preocupação e insegurança nos traços do rosto, enquanto olhava ao redor rapidamente.
— Eu... eu não sei. Jenny estava aqui agora, e... eu não sei! — Zoe ergueu o tom de voz. — Tudo deu errado. E agora nós duas vamos morrer também. Ninguém vai sair dessa merda de lugar, porra!
— Não surta agora, Zoe! — Millye empurrou a garota até a parede e agarrou a gola da sua blusa.
— Por que diabos fez isso? Ficou maluca? — Zoe jogou seu cabelo para o lado de trás, voltando a olhar para Millye. — A última vez que fez esse movimento foi no ano passado, mas... foi por um bom motivo.
— Me... me desculpa. Eu entrei em pânico. Há menos de meia hora estava sentada naquele chão gelado, imaginando que seria a próxima a morrer nesse labirinto. E agora, olha só pra mim. — Millye se afastou, em seguida dando atenção para as últimas palavras que ouviu da boca de Zoe. — Espera. Como se lembra disso?
— Você não se lembra, Campbell? — seu suspiro acalmou os ânimos das duas. — Achei que ainda guardasse algum sentimento.
— Eu não deveria, né? Você é a garota que trocou um caso de verão por qualquer atleta do ensino médio. — o riso de Millye se fez presente, mas não tinha nada de arrogante ou ameaçador. Ela se lembrava da situação como algo que não puderam evitar.
— Eu sinto muito por isso. O nome dele era Phill, que droga de nome horrível. — Zoe revirou os olhos. — Mas... bem, eu também não me perdoaria. Acho que eu só não queria encarar a rejeição familiar por garotas beijando outras garotas.
— Talvez algum dia eu faça isso. Te perdoar. — exclamou Millye, tocando na mão dela em seguida. — Mas eu não culpo você pelo que fez. O ensino médio é uma coisa louca.
— É... o ensino médio é uma coisa louca. — a menina concordou, segurando firme a mão de Millye por um tempo. — Bem, e quanto ao nosso mistério, srta. Campbell?
— Tenho a sensação de que estamos seguras por agora. Quer dizer, tinha a sensação de estar sendo observada desde que cheguei aqui. Mas agora... isso passou. — Millye se atentou ao silêncio que o vento trazia e levava.
— E o que isso muda? Ele já levou todos eles. Jenny, Claire, e o fanático do Evans. Aposta quanto que ele vai nos encontrar? — disse Zoe, inquieta.
— Espera. Disse que... que ele levou o Evans? Como sabe que ele foi pego? — Millye retirou seus óculos e desentrelaçou suas mãos.
— O quê? Eu só fiz uma suposição, quatro olhos. Obviamente ele deve ter sido pego também. Isso é como um festival para ele, então era só questão de tempo até que caísse nas mãos erradas. — Zoe terminou. — Está me olhando estranho por quê? Quem sumiu antes de entrarmos aqui e só apareceu agora foi você.
— Certo, certo. Não podemos brigar agora. Independente de quem seja o assassino, precisamos focar em sair vivas daqui. Então... me dá a sua mão, e vamos continuar caminhando. Eu vou tentar ligar para o Seth ou a Jesse. — a menina falou, estendendo a mão para Zoe.
— Você é quem sabe. Mas eu não confiaria muito na segunda opção... — Zoe segurou seus dedos, mesmo que um pouco de desconfiança ainda pousasse sobre seus olhos.
— Por que diz isso? — Millye rebateu imediatamente, assustada.
— Eu não sei, Campbell. Mas eu sei que estamos perto de arrancar a máscara desse maníaco de uma vez por todas. E eu também sei que não restaram muitas opções, se não o mais óbvio: a única pessoa que não foi atacada até agora. — Zoe esperou que o olhar de Millye se transformasse no de alguém que acreditava naquelas palavras, mas isso não aconteceu. — Pense o que quiser.
Na mesma hora, a Greene tentava iluminar o restante do caminho à sua frente com aquela lanterna de luz fraca e com uma bateria que provavelmente iria se esvair em poucos segundos. Suas mãos tremiam e sua respiração se assemelhava ao seu batimento cardíaco: rápido e descontrolado. A garota estava procurando por Seth há quase meia hora, e nada de encontrá-lo. Algo lhe dizia que ele estava em perigo, mas que ter deixado Josh para trás não tinha sido a coisa certa. Jesse estava a um passo de dar meia volta e encontrar a saída, mas de jeito nenhum poderia deixar seus amigos para trás — se é que poderia chamá-los assim. Foi quando, de repente, ela ouviu uma respiração próxima.
— Quem... quem tá aí? — Jesse tentou enxergar quem era a pessoa que parecia estar sentada no chão. — Quem é você? — ela perguntou novamente, dessa vez com mais força na voz. — Por favor, só... me diga como sair daqui. Eu não quero mais jogar esse jogo! Só quero saber onde os meus amigos estão, e... e... — era impossível que ela guardasse as lágrimas dentro de si.
— Jesse. — aquele ser irreconhecível disse, com dificuldade para virar seu rosto.
E então ela finalmente conseguiu identificar quem ele era. Seth Hastings estava escorado na parede, com duas enormes arranhões no rosto e um corte em sua cabeça. Algo muito ruim havia acontecido.
— Se... Seth? SETH! — a garota correu até ele, largando a lanterna no chão e agarrando o corpo do garoto. — Meu Deus, Seth. O que foi que aconteceu? Onde você estava? Quem fez isso com você?
— Jesse, eu... eu sinto muito. — Seth respirava ofegante, levando sua mão ensanguentada até o rosto da garota. — Eu não sei o que aconteceu. Imaginei ter visto ela mais uma vez, e algo me disse que eu precisava ir. Mas não tinha ninguém lá. Eu acho que... acho que estou ficando louco. Vou acabar como a minha irmã e o resto da família. — ele sorriu fraco, tentando esquecer da dor que sentia.
— O quê? Seth, não! Você não está doido e não vai morrer aqui. Mas precisa me dizer o que aconteceu agora. — Jesse aproximou seu rosto do dele, enquanto tentava cobrir seu ferimento com o casaco dela.
— Eu só... continuei ouvindo aquelas vozes por boa parte do caminho. Então eu encontrei a escada perto do corredor, mas ele estava lá, Jesse. Foi quando as vozes pararam, e eu percebi que era coisa da minha cabeça. — explicou. — Mas ele não era. Ele era real. Eu tentei lutar, mas... eu juro que tentei. — Seth soluçava, tentando se manter firme ainda. — Droga, Jesse. Tudo o que eu precisava fazer era te proteger, e eu não consegui. Da mesma forma que fiz com a Maryan.
— Não diga isso. Você não tinha que me proteger, mas mesmo assim fez isso. Agora presta atenção em mim. — ela virou o rosto dele. — Nós vamos encontrar os outros e sair desse lugar. Chamaremos a polícia e deixaremos esse jogo para trás. Está me ouvindo? — ela forçou um sorriso, tentando amenizar a situação.
— Talvez... talvez eu possa voltar para Gravewood com você. O que acha? — Seth riu, inclinando sua cabeça contra a parede atrás dele. — Acha que sua mãe ia gostar de mim?
— Ela ia amar você, Seth. — Jesse respirou fundo, e depois abraçou ele com força.
Os dois fixaram seus olhos um no outro por cerca de cinco segundos, percebendo que o que haviam construído desde aquela tarde na rua era real. Seth já sabia disso, só não queria acreditar, muito provavelmente porque a sua vida se tornara um banho de sangue nos últimos dias. Quanto à Jesse, era inegável que sentisse o mesmo. Seu tempo estava acabando, e ela finalmente entendeu que o que gostaria de fazer, teria de fazer agora.
Jesse e Seth aproximaram seus lábios, juntando-os em um beijo demorado. A garota colocou sua mão esquerda sobre o ombro dele, sentindo o calor corporal do Hastings se juntar ao seu. E apesar do quão horrível fosse aquela situação, os dois sabiam que ali, naquele exato momento, estavam seguros. E ninguém poderia tirar isso deles.
— Duas vezes em menos de cinco horas. — Seth sorriu depois de abrir os olhos. — Acho que ganhei o dia, Jesse Greene.
— Eu só queria garantir, Seth Hastings. — Jesse afastou seu rosto do dele, voltando a sentir-se calma mais uma vez.
Entretanto, antes que pudesse dizer qualquer outra coisa, a garota sentiu um horrível arrepio tomar o lado direito de seu corpo. Havia uma porta a mais ou menos quatro metros de distância do casal. A estrutura metálica provocou um leve rangido, fazendo com que Jesse virasse seus olhos imediatamente. Logo depois, uma luz se acendeu do lado de dentro.
— Jesse? — Seth sussurrou, ao perceber que a garota estava se levantando à sua frente. — Não está pensando em ir até lá. Está?
— É o que eu preciso fazer. Ainda está com aquela arma? — Jesse o encarou.
— O quê? Jesse, não! Eu vou com você. — Seth tentou ficar em pé, apesar de seu corpo estar consideravelmente fraco.
— Nada disso. Você já fez tudo o que estava ao seu alcance, Seth. Você ganhou o jogo esta noite. É a minha vez de acabar com isso. — a menina puxou o revólver do chão, começando a caminhar até lá. Antes que passasse pela porta, Jesse voltou a olhar para o garoto no chão. — Eu volto logo. — ela assentiu com a cabeça, deixando-o para trás e adentrando de uma vez por todas aquela possível armadilha.
A luz forte causava dor e desconforto aos olhos de Jesse. Apesar disso, agora a menina podia enxergar o sangue em suas mãos e no resto de sua roupa.
— APAREÇA! EU ESTOU AQUI! — ela gritou ao encarar o teto esbranquiçado. Jesse segurava a arma com cautela, apontando-a para os quatro cantos do lugar.
Observando ao redor, ela percebeu que havia outra passagem ainda aberta no lado oposto ao que ela usou para entrar. E um pouco mais para frente, a luz apagada cobria o que pareciam ser algumas correntes na parede.
— EU DISSE QUE ESTOU AQUI, SEU DESGRAÇADO! VENHA ME PEGAR! — Jesse gritou.
Seu coração parecia querer pular para fora a cada palavra que ela dizia, mas a menina continuava esperando que aquele maluco aparecesse. Repentinamente, Jesse enxergou a porta do lado oposto sendo empurrada. Seus dedos apertaram o gatilho com mais força, esperando qualquer coisa.
— Jesse? — Millye esboçou um sorriso, soltou suas mãos da porta de ferro e correu até ela. — JESSE! MEU DEUS!
— Millye? Minha nossa, você está viva! Graças a Deus! — Jesse soltou a arma no chão, abraçando a menina com força.
— Também estou aqui... surpreendentemente. — Zoe suspirou, se aproximando das outras duas.
— Como vocês duas chegaram até aqui? — Jesse perguntou, eufórica. — E onde estão as outras duas?
— Nós não sabemos. Só enxergamos a luz e começamos a correr até aqui. Claire, Jenny e Josh simplesmente desapareceram. — Millye explicou.
— É pior do que eu pensava. Okay, nós vamos encontrá-los e depois acabar com isso de uma vez por todas. Lembram-se do recado que dizia que o jogo deveria acabar exatamente onde o daqueles adolescentes, no passado, acabou? Então... eu acho que foi exatamente nessa sala. Esperem aqui, vou buscar o Seth. — Jesse juntou a arma novamente, aproximando-se da porta.
Porém, antes que a menina alcançasse a saída, aquela estrutura pesada encaixou-se na parede, fechando a passagem. Jesse enxergou Seth correndo até o vidro da porta no mesmo instante, e grudando suas mãos sobre ele.
— JESSE! JESSE! — Seth gritou do outro lado, enquanto tentava quebrar a estrutura de alguma maneira.
— Não... NÃO! — Jesse tentou puxar a maçaneta, mas estava emperrada. — DROGA!
As outras duas tentaram correr para a saída oposta, mas estava trancada também. Zoe e Millye voltaram para o centro do lugar e Jesse fez o mesmo, ao perceber que Seth ainda estava preso do lado de fora e ela não conseguiria abrir a porta. E então as três puderam ouvir um barulho irritante vindo de um pequeno alto-falante no canto da parede — algo que lembrava um daqueles filmes antigos com bonecos assassinos. Jesse, Millye e Zoe olharam para todos os lados, esperando saber o que de fato iria acontecer. Finalmente, o convidado especial resolveu falar.
— Ora, ora, ora! Eu gostaria de apostar que são as três últimas jogadoras em pé. Estão prontas para o xeque-mate? — disse a voz grossa que saía da pequena caixa, provocando um arrepio em qualquer um que ouvisse-a.
— Por que ainda se esconde atrás disso? Você disse que iríamos jogar. Nós viemos até aqui, e agora exigimos saber a verdade. — exclamou Jesse, enquanto apontava a arma para os quatro lados da saleta estreita.
— APARECE LOGO, SEU DOENTE DESGRAÇADO! — gritou Zoe, com os nervos à flor da pele. — Ou você está... — ela fez uma pausa, sorrindo de forma irônica. — com medo?
— Se querem tanto saber, terão a chance. Afinal, um jogo não é um jogo sem uma história. Sinto muito que seus amigos tenham tido os papéis cortados do espetáculo antes da melhor parte! E ainda me surpreende que nenhum de vocês tenha percebido o que estava tão... claro. — ele soltou uma gargalhada depois da última fala.
— Isso é a porra da vida real! Não pode fingir que somos marionetes feitas para um jogo de tabuleiro que você criou de repente. Isso é bizarro! — a portadora do revólver esgueirou os olhos até a parede coberta pela penumbra, podendo enxergar alguma movimentação.
— Mas é muito mais divertido quando a transformamos em um jogo. Não acha, Jesse? Aliás, foi muito divertido assisti-la tentanto lutar a todo custo, quando o seu maior pesadelo estava sempre lá: na sua frente. — ele suspirou. — Você queria terminar o jogo, não queria? Então eu vou terminar o jogo. E fazer o que já devia ter feito há muito tempo. Mas você me impediu.
— O quê? — Jesse perguntou, confusa. — Eu? Como é que...
— Porque eu me apaixonei por você. — a voz parou de falar através do aparelho, e sem que as garotas percebessem, o mascarado se mostrou diante daquelas correntes na parede.
— Você disse que... você... não. Não, não, não. Não pode ser. — Greene finalmente havia entendido. Ela entendeu o que esteve tão claro durante esse tempo todo, mas ninguém foi capaz de dizer. Talvez Josh teria sido. — Seth?
Seu estômago se embrulhou em um rápido choque de realidade. Achou que fosse desmaiar ali mesmo. Naquele instante o assassino retirou a sua máscara escura, revelando seu verdadeiro rosto. E se ainda restavam dúvidas às três meninas, agora elas haviam sido respondidas: Seth Hastings era o verdadeiro maníaco de Rainwood.
— Isso não pode ser verdade! Seth, eu... — Millye também não sabia o que dizer. — Como você pôde?
— Ah, Millye... eu esperei tanto que perguntasse por isso. — ele sorriu. — E confesso que achei que você ou Josh teriam descoberto antes, mas o Evans está impossibilitado de dizer qualquer coisa agora. — Seth apontou para a direção das correntes.
O rapaz caminhou até lá e ligou o interruptor que iluminava a parede. Aprisionados às correntes, Claire, Jenny e Josh haviam sido pendurados enquanto seus braços e pernas foram amarrados e separados em quatro cantos. Suas bocas foram cobertas por uma mordaça, e os três ainda estavam desacordados.
— Eles... eles estão... mortos? — Zoe se enfureceu, inclinando-se sobre os joelhos que desabaram naquele chão frio. — Eu sabia. Sabia que não deveria ter confiado em você. Seu filho de uma...
— Opa, opa, opa. — Seth esticou o braço, impedindo que a menina se aproximasse mais. — Não estão mortos ainda. Eu queria que vocês assistissem seus amigos sendo torturados.
— Então qual era o seu grande plano depois disso? Ia nos matar também? E em seguida esconderia nossos corpos debaixo dessa mansão assombrada? — Zoe cruzou os braços, voltando para perto das outras.
— É uma boa ideia. Quando percebi que seria mais difícil acabar com cada um durante o Halloween, eu pensei na melhor opção: atraí-los para cá. E não é um ótimo cenário? Eu teria acabado com eles antes, mas você me impediu. Por que diabos correu atrás de mim, Jesse? — Seth apontou a faca para ela. — Então... tive que fazer alguns leves ajustes. Trouxe eles para esta sala e esperei que viessem. Eu terminaria de esquartejá-los, depois mataria cada uma de vocês e iria atrás do babaca do Jaremy. — ele explicou.
— Espera. Você viu o Jaremy? Onde... onde ele está? — Millye perguntou.
— Ele fugiu. Mas eu vou encontrá-lo, pode ficar tranquila. — Seth voltou a rir.
— Eu não entendo, Seth. Qual é o grande ponto? Por que acabaria com a sua própria vida só por... por diversão? — Jesse segurou o choro, respirando com dificuldade enquanto ainda segurava a arma. — Como pôde matar a sua própria irmã?
— Matar a minha irmã? Eu não matei a minha irmã, Jesse! — Seth ameaçou atacá-la, mas conteve suas mãos debaixo do casaco. — Mas alguém fez isso. E então, quando eu percebi que estava sozinho, a ficha finalmente caiu. Alguém nessa cidade tirou de mim a única pessoa que me entendia. O meu mundo. Sabe, é que... os meus pais eram pessoas horríveis, não me surpreendo que tenham saído da cidade justo nesta semana. Mas a Maryan, ela era a melhor pessoa desse mundo desgraçado. E então, se foi. Ela foi assassinada. Como acha que eu me senti, Jesse? — Seth gesticulava com a faca na mão, ainda pressionando seu ferimento. O ferimento que ele mesmo fez.
— Isso não é motivo pra matar pessoas inocentes, Hastings. Adolescentes não se tornam monstros só porque algo de ruim aconteceu. — Jesse rebateu.
— Bom, talvez eu esteja me tornando um. Mas... "pessoas inocentes", Jesse? Você não sabe nem metade do que acontecia naquela escola. Maryan era a garota mais doce e gentil desse lugar, mas nunca conseguiu saber disso. E sabe por quê? Porque essa merda de cidade horrível a fazia pensar o contrário. Eu precisava me vingar de algum jeito! E se eu não conseguiria encontrar qual deles fez isso, então por que não acabar com todos de uma vez? — ele sorriu. — Sabe... eu acho que no fundo, sempre tive essa vontade. E acredite, depois que você faz a primeira vítima, não consegue mais parar! — Seth arregalou seus olhos, esfregando o sangue das suas mãos sobre seus lábios. — Mas então... você estragou os meus planos, Jesse.
— Eu? Seth, eu acreditei em você! Eu confiei em você, porra! E enquanto isso, você... você arrastava os corpos dos nossos amigos. — Jesse respondeu, tentando evitar encará-lo nos olhos.
— Quando desceu daquele ônibus, Jesse Greene, eu percebi que alguma coisa em mim ainda era capaz de... de sentir. Isso porque depois da morte de Maryan, eu não conseguia sentir mais nada. Mas você me fez enxergar que eu tinha uma chance. — Seth se aproximou dela, acariciando seu cabelo. — Mas eu sabia que você estava na minha cola, e uma hora ou outra iria descobrir quem era o culpado. É por isso que está aqui hoje. Droga, eu pareço um monstro agora, né? Talvez eu seja um. Talvez eu seja como qualquer outro nessa cidade, um monstro hipócrita que não se importa com ninguém. Mas a Maryan não era. A MARYAN NÃO ERA! — ele gritou, batendo com as mãos na própria cabeça. — Ela não merecia isso.
— Mas e quanto à Riley? Por que atacou ela se ela não tinha nada a ver com a Maryan e com as pessoas que a fizeram mal? — Jesse retrucou.
— Riley era só mais uma vadia que achou ter vencido um jogo doentio. Trazer à tona a história de Jacob Woods foi a única maneira de manter vocês presos àquele mistério, enquanto eu agia por trás. — ele respondeu. — Além disso, não seria tão ruim continuar o trabalho de Jacob Woods. Seria? Talvez ele fosse como eu. Aposto que Jacob era só mais uma vítima dessa cidade horrível.
— Seth, se... se você procurava justiça pela Maryan, por que não fez isso do jeito certo? Ninguém precisava ter morrido. Nós somos seus amigos. Você não estava sozinho! — Millye tentou explicar, amedrontada.
— Amigos, Millye? Quem precisa de amigos? Ainda não percebeu, né? Amizades não existem. Amor não existe, é tudo parte de uma invenção idiota, e eu descobri isso da pior forma. Estamos todos presos em uma enorme máquina. E somos só... pequenos bonecos que giram no meio dessas engrenagens, até que uma delas pare de funcionar para sempre. — ele abaixou a cabeça. — E eu juro, Maryan sempre tentou escapar dessa enorme máquina antes que fosse tarde. Mas... ela se foi. E parte de mim se arrepende de ter escolhido esse caminho. Mas que opção eu tinha? O departamento de polícia não faria nada por ela. E convenhamos que matar é muito mais divertido. Agora, chega. É hora de acabar com isso. — Seth puxou uma arma de trás de suas costas.
— De onde tirou isso? — Millye perguntou. — Essa arma era do Jaremy.
— Claro que era. Eu tirei ela daquele desgraçado antes que ele saísse daqui. Já chega de papo, Millye. Deixe-me pensar... — Seth apontou a arma para as três garotas, uma de cada vez. — Que tal começarmos por você? — ele encarou a Zoe. — Hora de deixar o tabuleiro, princesinha.
— Isso é o que você pensa. — Zoe movimentou seu braço rapidamente, agarrando a arma da mão de Jesse e puxando o gatilho no mesmo momento. — HOJE NÃO, HASTINGS! — a garota gritou.
Entretanto, de nada adiantou. Zoe foi parar no chão antes mesmo que aquela bala saísse do revólver. E ele ainda estava em sua mão.
— Hoje sim, Zoe. — Seth gargalhou, girando o gatilho da arma ao redor de seu dedo indicador, depois de ter atirado na garota.
— NÃO, NÃO! ZOE, NÃO! — Millye correu até a menina no chão. — FICA COMIGO, ZOE! — ela continuava dizendo, repetidas vezes. — Precisa ficar acordada, Zoe. Precisa ficar aqui!
Enquanto Millye se comovia com a garota baleada, Jesse ainda estava parada no centro da sala. Era hora de encerrar o jogo de uma vez por todas. Seth voltou a encará-la, carregando a arma mais uma vez.
— Zoe seria a próxima de qualquer maneira. Nunca iria escapar. Mas agora... vamos prosseguir. — ele segurou o revólver com as duas mãos. — Xeque-mate, Greene. Espero que tenha gostado da manchete que conseguiu.
O menino fixou seus olhos naquela garota como se fosse seu único objetivo desde o início. No chão, Millye estava tão perplexa quanto a própria Jesse, e nada poderia fazer a tempo. Sabendo que estava na mira daquela arma, Jesse respirou fundo antes de fechar os olhos. Acabou. Não havia mais pelo que lutar. A jovem nunca poderia ter imaginado que a pessoa em quem mais confiava iria tirar a máscara na última noite, mas ali estava ela, sob a mira daquela arma e esperando que algo acontecesse. E então aconteceu. Um segundo barulho de tiro pôde ser ouvido por eles. Havia um corpo no chão.
Millye soltou a arma, voltando a respirar normalmente depois disso. A garota havia juntado o revólver de Jesse, aquele que Zoe deixou cair quando tentou atacar o Seth. Em um único momento, superando todos os fantasmas que lhe perseguiram naquela noite, Millye Campbell salvou a vida de Jesse Greene, ao atirar no peito de Seth Hastings.
— Millye... — Jesse abriu os olhos devagar, entendendo o que havia acontecido. — MILLYE! — Jesse correu até ela, abraçando-a com força.
As duas garotas ficaram na mesma posição durante os seguintes trinta segundos. Millye segurava o corpo de Jesse com força, enquanto aqueles três ainda estavam amarrados no canto da sala. Ao redor delas, o chão branco se transformou num verdadeiro banho de sangue que contava com os dois supostos corpos estirados ao lado delas.
Por sorte, depois de alguns minutos o departamento de polícia invadiu a casa abandonada. Junto da oficial Katy e o resto dos policiais, estava Jaremy Fitzgerald, o único a escapar da mansão antes do fim da noite. Jaremy conseguiu caminhar até a delegacia, mesmo com uma facada profunda na barriga, e buscar ajuda.
O jogo doentio de Seth Hastings havia finalmente chegado ao fim, e Millye e Jesse eram definitivamente as sobreviventes daquele massacre. As garotas foram levadas para o lado de fora em seguida, enquanto os policiais terminavam de averiguar a cena do crime. Josh, Jenny e Claire acordaram depois de um tempo, e foram colocados dentro da ambulância imediatamente. Quanto ao real culpado do crime, ele não morreu. Os policiais perceberam que o tiro não havia de fato atingido seu coração, e de alguma maneira, Seth continuava vivo. Entretanto, não havia mais o que temer. Ele seria levado para a penitenciária naquela mesma noite, onde pereceria durante o restante de seus dias de vida até que a morte o alcançasse. Só assim Jesse Greene e as outras vítimas teriam paz.
Lado externo da mansão Wady, quase 05:00 horas da manhã.
As próximas horas haviam sido de total alívio para aqueles sobreviventes. Os policiais montaram uma rápida área de trabalho no lugar para que pudessem conduzir os últimos feridos até o hospital em segurança. Enquanto isso, Millye e Jesse se sentavam na traseira da ambulância, cobertas por uma manta fina.
— É bom te ver, esquentadinha! Não achou que eu fosse voltar. Né? — Jaremy sorriu, ao aproximar-se da garota de óculos perto da ambulância.
— Você é um babaca. Sabia? — Millye se levantou rápido, encarando ele com uma expressão séria.
— Quê? Tá falando sério? Eu não acre... — Jaremy estranhou a reação dela.
— Não. Nem um pouco. — Millye agarrou os ombros espessos do rapaz e grudou sua boca na dele.
— Por essa eu não esperava. — Jaremy riu, e em seguida puxou-a mais para perto, pousando suas mãos sobre a cintura dela.
— É... srta. Campbell? — uma das policiais se aproximou. — A garota na maca quer falar com você. Ela não parece muito bem, ainda estamos esperando os paramédicos chegarem.
— Zoe! — Millye seguiu a oficial até lá, deixando Jaremy e os outros para trás.
Ao se aproximar, a de óculos avistou a menina deitada sobre um cobertor. Seu peito tinha o profundo ferimento causado pela bala, mas ela parecia bem o suficiente para dizer alguma coisa.
— Millye, eu... — Zoe soluçou, com dificuldade.
— Você não precisa dizer nada. Vai ficar tudo bem. Vamos viver vidas normais, lembra? — Millye acariciou o cabelo dela.
— Eu precisava me desculpar. Você... você salvou a minha vida. Mais de uma vez. — Zoe tentou sorrir. — Eu sei que seremos almas gêmeas que não deram certo, em algum lugar dessa história. Você merece alguém melhor. Mas eu queria que ficasse com isso. — ela retirou um pequeno colar de seu pescoço, ainda manchado com sangue.
— O que é isso? — Millye agarrou o objeto.
— Era da minha mãe. Quando meus pais se foram, eu... só tinha isso para me lembrar dela. Segurava com força quando sentia medo. Quero que aceite como um pedido de desculpas, Millye. Use-o sempre que estiver sozinha. — Zoe ainda respirava ofegante, enquanto segurava a mão da outra com força.
— Zoe, eu... eu não sei o que dizer. Obrigada. Obrigada por tudo. — os olhos de Millye encheram-se de lágrimas no mesmo momento.
E de repente, Millye percebeu algo de errado. Zoe soluçou uma última vez, e em seguida inclinou sua cabeça para o lado esquerdo. Lentamente, a garota parou de tentar. Ela simplesmente descansou e tudo havia ficado calmo mais uma vez.
— Zoe... ZOE! — Millye sacudiu o corpo da outra. — POR FAVOR, ALGUÉM AJUDA! SOCORRO!
Alguns oficiais se locomoveram até o local rapidamente, mas já era bem claro que ninguém poderia fazer nada. Naquela noite, Zoe Marra foi a última vítima de Seth Hastings.
Quanto aos demais sobreviventes, sua vida precisava continuar. O amanhecer alaranjado abraçou parte da floresta naquele momento, enquanto as luzes das viaturas ainda circulavam pelo perímetro. Claire e Jenny não soltaram suas mãos nem por um segundo durante todo o trajeto. Estavam finalmente a salvo daquele pesadelo. Haviam conseguido.
Sentada na traseira da segunda ambulância, Jesse observava o triste nascer do sol que se formava na colina.
— Como se sente? — Josh sentou-se ao lado dela, estendendo sua mão sobre o pescoço da garota. — Então... você continua sendo a Final Girl. Pelo menos uma delas. — ele sorriu.
— Pois é. Eu acho que me sinto... burra. Poderia ter percebido isso antes. — Jesse escorou a cabeça no peito do garoto.
— Relaxa. Talvez fosse assim que devia ser. Esse sempre foi o final do filme, do jogo, ou... eu sei lá. Estamos aqui, Jesse. Somos sobreviventes. — Josh respirou fundo, voltando a olhar para a paisagem junto da garota. Apesar disso, ele não conseguia tirar os olhos de Millye, do outro lado, sendo abraçada por Jaremy. Algo lhe incomodava.
— É. — Jesse encarou ele mais uma vez. — Somos sobreviventes.
Cafeteria Summer Coffee, 07 de novembro de 2018 — Exatamente uma semana depois dos últimos assassinatos.
A vida daqueles adolescentes tinha de continuar, e continuou. Os próximos dias ainda pareciam estranhos. Afinal, era até esquisito continuar vivendo na mesma cidade em que seus amigos foram brutalmente assassinados. Apesar disso, eles sabiam que iriam superar algum dia. O grupo se encontrou na cafeteria quando receberam um convite anônimo. Poderia ser de qualquer um dos seis.
— Quem foi que chamou? Usar mensagens anônimas não é uma coisa tão divertida assim, depois da última semana. — Josh cumprimentou os outros cinco, ao se sentar na cadeira ao redor da mesa.
— Não foi você, Evans? — Claire perguntou, enquanto tomava seu capuccino. — Achamos que a mensagem era sua.
— Se não foi o Josh e também não foi nenhum de nós, então... quem foi? — Jenny falou.
— Fui eu. — a oficial Katy aproximou-se da mesa deles. — É bom vê-los aqui, crianças.
— Katy? O que aconteceu? — Jesse exclamou.
— Bem, a verdade é que eu vim até aqui pela manhã buscar um delicioso suco de maracujá com morango. Quando observei a bancada, percebi uma caixa que continha destinatário familiar. Olhei mais de perto e enxerguei o nome de vocês seis. — ela cruzou os braços.
— Nós? Quem faria algo assim? E aliás, que jeito inusitado de se deixar um recado. — Josh apoiou seus braços sobre a mesa.
— Pois é, garoto. Então perguntei ao atendente e ele disse que alguém havia deixado isso aqui hoje mais cedo, e que precisava entregar a vocês quando voltassem a frequentar a cafeteria. Então, como eu represento a lei neste lugar, tirei a caixa de lá e chamei cada um de vocês. — ela sorriu. — Ah, o convite anônimo foi pra manter o suspense. Espero que tenham gostado.
— Bom, então... nos mostre a caixa. Onde está? — Jesse questionou.
— Bem aqui. — Katy a colocou sobre a mesa. — Agora, se me dão licença, devo voltar ao trabalho. Se precisarem de ajuda, sabem para quem ligar.
A mulher se distanciou deles e foi embora em seguida. Logo depois, os seis ao redor da mesa se perguntavam o que havia naquela pequena caixa. Jesse foi a primeira a tocar a embalagem, retirando o laço e levantando a superfície. Mas antes que terminasse, Millye a interrompeu.
— Espera! Estamos realmente prontos pra isso? E se... e se for algo ruim? — ela suspirou pesadamente.
— Abre isso logo, Jesse. — Jaremy se pronunciou. — Não há o que temer. Seth está preso.
— Então tudo bem. — Jesse arrancou a parte de cima de uma vez por todas, revelando o conteúdo.
Na mesma hora, um cheiro horrível veio à tona. Havia sangue dentro daquele pacote, e um objeto cortante estava misturado da tintura avermelhada. Jesse afastou seu rosto ao enxergar aquilo.
— Ai, meu Deus. — Claire se levantou, observando mais de perto. — Pessoal, isso é... minha nossa. É sangue de verdade. E uma faca.
— Espera. Isso é um bilhete? — Josh retirou o objeto de cima, podendo enxergar um pedaço velho de papel. — Alguém quer ter a honra? — o garoto se esforçava para enxergar as letras minúsculas no papel.
— Me dá isso aqui. — Claire tomou o papel ensanguentado das mãos do outro, iniciando a leitura em seguida.
"— É uma honra que essa mensagem tenha chegado até vocês. Eu realmente sinto muito por terem passado pelo o que Seth Hastings fez. Porque ele fez um trabalho horrível. No fim das contas, o jogo acabou antes mesmo de começar. Mas fiquem tranquilos: eu estou aqui. Sim, eu matei Maryan Hastings, e o jogo não teria parado se Seth não tivesse enlouquecido e feito tudo aquilo. Bem-vindos de volta, jogadores. Não tentem chamar a oficial Katy, não busquem ajuda, não desviem o olhar para mais ninguém nessa cafeteria. Apenas sigam as regras. As minhas regras. Nos veremos em breve. Estão prontos para jogar de novo?"
- Um velho amigo
— Sem chance. — Claire se levantou novamente. — Eu vou até a delegacia agora!
— Ficou doida? — Jaremy puxou o braço dela. — Você viu o que ele disse. Se tentarmos pedir ajuda, morreremos. Já passamos por isso antes, Claire. Você sabe que ele não está brincando.
— Eu não... não consigo acreditar que isso é realmente verdade. — Millye falou em voz baixa. — Se Seth está preso, quem mandou isso?
— Pessoal, relaxem! Talvez seja só algum fã maluco querendo atenção. Hello! Somos famosos na cidade agora. — Jenny sorriu, voltando a beber seu refrigerante.
— Mas se for realmente verdade, então há outro assassino na cidade. E ele já estava aqui antes mesmo do Seth resolver realizar um massacre. — Josh falou, observando todos eles. — Jesse, o que acha?
[Música: Can't Pretend - Tom Odell]
— Parem! — Jesse tomou o pedaço de papel das mãos de Claire, voltando a olhar para cada um na mesa. — Jenny está certa. Não há outro assassino na cidade.
— O que quer dizer com isso? — Jaremy instigou a fala anterior da menina, esperando que ela lhe explicasse.
— Seth está preso. Não sabemos quem enviou isso, e não saberemos tão cedo. Mas eu estou certa de que não quero entrar nisso de novo. — Jesse sussurrou.
— Então vamos simplesmente ignorar a mensagem? — Josh perguntou.
— Exato. A partir de hoje, nenhum de nós encontrou este bilhete. — Jesse explicou, enquanto amassava o papel. — Nos encontramos na Summer Coffee nesta manhã e conversamos sobre... sobre como nossas vidas têm andado depois do incidente com Seth. — ela terminou.
— Isso. Nunca vimos este pedaço de papel. Nunca ouvimos falar sobre qualquer mensagem. Eu duvido que Katy mencione algo com o restante dos policiais, então... estamos seguros por enquanto. — Millye complementou. — Alguém não está de acordo?
— Eu! Estão brincando, né? Temos um problema enorme aqui. — Claire arregalou seus olhos, buscando naqueles rostos por qualquer um que não julgasse-a como maluca. — Não podemos esconder isso.
— Não temos outra escolha, Claire. — Jenny segurou a mão dela, voltando a olhar para o restante em seguida. — Então... este será o nosso segredo. Ninguém precisa saber.
— Espera. E quanto à faca? — Josh perguntou, olhando para o metal ensanguentado na caixa.
— Eu dou um jeito nisso. — Jaremy apanhou o objeto, envolvendo-o no embrulho para que não sujasse suas mãos.
— Isso acaba por aqui. Mais uma vez: alguém não concorda com isso? — Jesse repetiu.
Dessa vez, ninguém interferiu. Claire havia aceitado que talvez aquela fosse de fato a melhor escolha. Ninguém gostaria de viver aquele pesadelo mais uma vez. E naquele momento, em questão, todos concordaram que jogar a sujeira para debaixo do tapete seria a melhor decisão.
— Ótimo. — Jesse estampou um sorriso em seu rosto, depois que o clima pesado havia se acabado. — Então nos vemos na escola. — ela se levantou, deixando os outros para trás.
Assunto encerrado. Nenhuma daquelas seis pessoas sabia exatamente o que estava por vir, mas uma coisa era certa: por mais que tentassem, nunca iriam esquecer aquilo. E apesar de terem sido obrigados a deixar para trás aquele último cartão, ainda restava uma dúvida pairando sobre o ar. Uma única pergunta que não queria calar, porque até agora não havia sido respondida: quem matou Maryan Hastings? Segundo a mensagem anônima, havia alguém na cidade antes de Seth. E essa pessoa muito provavelmente foi responsável pela primeira morte. Entretanto, sua identidade era ainda uma incógnita. Havia sido alguém do passado, que voltou por vingança? Alguém que queria fama e reconhecimento com tudo isso, e se aproveitou do momento? Talvez, assim como Seth, essa pessoa estivesse bem perto de cada um deles o tempo todo.
Bem, por enquanto nada se sabia. Com um pouco de sorte, a teoria de Jenny estava certa e aquela carta era de algum fã maluco. Ou talvez, eles ainda estivessem presos naquele imersivo pesadelo que não estava nem perto de acabar.
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