08
Winter's pov:
Minha cabeça dói quando levanto da cama na manhã seguinte. Meu corpo inteiro está cansado após horas alternando entre chorar e dormir mal. Olho para o meu celular sobre a escrivaninha. Ele continua sem novas mensagens desde a tarde passada, não tenho intenção nenhuma de mudar isso, embora meu coração peça isso a cada minuto. Sinto falta de Jimin, sinto tanto que me sufoca e me assusta.
Depois de um rápido banho e de trocar de roupa, vou até a cozinha e faço um café. Sento em uma banqueta perto do balcão e bebo em silêncio, temendo o dia que está à minha espera. Após um tempo, Ningning aparece com uma cara de sono.
— Bom dia — ela diz, sonolenta.
— Que desânimo é esse? — Pergunto.
— Ei, você não foi a única a ter uma noite de sono desagradável. — Ningning senta-se na banqueta do outro lado do balcão. — As vezes eu me pergunto por que decidi cursar programação. Tenho um trabalho para entregar até o final de semana e estou me estressando com isso.
Sorrindo, vou até a cafeteira, sirvo uma xícara e coloco na frente dela.
— Ao menos você pode passar sua manhã no café. Acredito que esse seja um dos pontos altos do seu dia, né? — Comento, obviamente tentando conseguir melhorar o seu humor.
Minha amiga sorri, entendendo.
— Termine o seu café da manhã — diz. — Vamos sair em dez minutos.
Quando chegamos no café, no entanto, sou eu que sinto como se tudo estivesse estranho. Caminho lentamente como se estivesse com alguma limitação física, tento não olhar para o local onde Jimin costuma se sentar, mas é impossível. Respiro fundo, já passei por coisas piores, posso suportar isso.
Vou para o vestiário, coloco meu uniforme e prendo meu cabelo como sempre fiz durante a última semana, mas quando olho no espelho sei que não sou mais a mesma garota, aquela Minjeong morreu nos braços da mulher misteriosa de olhos castanhos. A que me olha de volta é uma garota disposta a se desprender das amarras da vida.
O café está lotado, talvez o fato de ter passado a noite acordando tenha me deixado um pouco lenta, mas o fato é que não consigo atender todo mundo e me atrapalho um pouco. A grande maioria dos clientes não percebem isso ou parecem não se incomodar. Agradeço a cada um deles com um sorriso amigável nos lábios. É estranho, não estou acostumada a me sentir assim, mas me sinto um pouco bem por estar numa atmosfera agradável.
— O que você acha de irmos em uma reunião da minha faculdade no final de semana? — Ningning pergunta chamando minha atenção.
Não quero sair, muito menos se for para alguma festa, embora saiba que seria bom ocupar a mente com outras coisas no momento. Mas de qualquer forma não tenho como argumentar com Ningning, quando ela decide algo só me resta aceitar.
Volto ao trabalho, perdendo-me em lembranças sobre a tarde anterior, fecho os olhos e posso ver ela parada na minha frente, seu olhar preocupado, sua postura imponente e sua beleza.
— E então — começa Ningning, aproximando-se de onde estou —, você não vai me falar mais nada sobre a gata com quem saiu?
Penso em ser sincera com ela, sinto que se eu me abrisse com minha melhor amiga, seria mais fácil de lidar com tudo. Mas não consigo evitar o sentimento de vergonha, não sei como explicar que a mulher por quem estou me apaixonando é minha professora... E não quero Ningning comece a se preocupar com o quanto isso pode afetar a minha vida. No fim das contas vai ser melhor para todo mundo deixar as coisas como estão.
— Não, Ningning, eu não tenho nada para compartilhar.
— Tem certeza? — Ela insiste. — Porque aquela amiga dela veio aqui ontem a tarde e eu tirei até uma foto dela para te mostrar.
Sunghoon se vira para nós segurando algumas notas de wons nas mãos.
— Você perdeu completamente o juízo, Ningning, sair tirando foto de mulher por aí?
— Cale a boca, Sunghoon! Todo mundo tira foto de mulheres bonitas. — Ela revira os olhos, ignorando o fato de que ainda estamos em horário de trabalho. — Não é uma mulher qualquer e não posso fazer nada se você não faz o meu tipo o suficiente para ter uma foto sua em meu celular.
Ele resmunga algo e volta a contar o dinheiro, guardando-o no lugar. Ningning busca a imagem, ignorando o fato de que eu não estou muito interessada em vê-la, e me mostra. Aeri está sentada de perfil, olhando para o celular, com uma camisa azul que eu conheço da última vez que a vi na livraria, ela a deixa com um ar angelical e destaca seus olhos.
— Ontem, ela estava muito pensativa, veio sozinha e nem mesmo um beijo me deu na hora de ir embora.
Olho para Ningning, que ri.
— Estou brincando, gatinha, só queria tirar você do transe, ela apenas me cumprimenta, mas eu vou logo avisando que se aquela deusa quiser me beijar eu lamento muito, mas vou ter que deixar.
— Fala sério! — Diz Sunghoon. — Essa garota não tem um filtro no cérebro?
Ningning pega um pano de prato e arremessa em direção a ele.
— Vai arrumar uma mulher, você está precisando transar, anda muito estressadinho.
Sunghoon segura o pano no ar e aponta para Ningning.
— Se tentar me acertar mais uma vez vou parar de cobrir os seus horários!
Eles continuam brigando pela próxima hora, me fazendo rir mais do que eu achei que seria capaz. Antes de eu ir embora, Ningning insiste que vai dar um jeito de se aproximar de Aeri sob a recriminação de Sunghoon e, assim que saio, me sinto sozinha e triste novamente.
\[...]
Quando chego a Suneung, vou direto para minha sala. A Srta. Hwang, minha professora de inglês, está ligando seu notebook quando me vê e assente com a cabeça. Retribuo o gesto e vou para minha mesa. Nem sequer me dou ao trabalho de registrar as primeiras aulas do dia. Não falo com ninguém além de Yuna e Han. Toda a situação atual está ocupando minha mente mais do que gostaria de admitir.
— O que aconteceu com você ontem depois da aula de matemática? — Pergunta Yuna, quando a aula termina. — Se perdeu quando saiu da administração?
— Pois é, desculpe. Problemas de localização.
— Devia ter me mandado uma mensagem — ela brinca em tom sarcástico. — Apesar de que também acabei me atrasando já que dei uma espiada na turma de redação e descobri que a professora tambem é bem atraente.
— Estou começando a achar que esse é um dos requisitos para dar aula aqui — brinco.
Ela sorri.
— Só por garantia, vou acompanhá-la nessa primeira semana. Se no caminho a gente cruzar com algum professor atraente vai ser uma mera coincidência.
Não quero, mas acabo rindo.
Yuna realmente me acompanha quando vamos para a sala de literatura coreana. Mantenho uma conversa amigável com ela enquanto torço para que, de alguma forma, eu seja capaz de aguentar o resto da tarde sem cair aos prantos.
— Que interessante — ela diz, abrindo um sorrisinho. — Parece que você tinha razão sobre os requisitos para trabalhar na Suneung.
Quando levanto o olhar, vejo Jimin em frente a porta da sua sala, mas ela não está sozinha. Tem uma mulher ao seu lado, que Yuna logo diz se chamar Jeon Somi, a professora de redação que comentou mais cedo. Ela continua falando, mas já não a ouço mais, me prendo as mulheres conversando enquanto nos aproximamos. Tento não notar o quanto elas são lindas juntas. Somi é alta, quase da altura de Jimin, seus olhos se estreitam de forma sensual enquanto ela fala. E Jimin a ouve atentamente, enquanto mexe em alguns papéis que segura nas mãos.
Tento impedir um sentimento amargo de se formar em meu peito, mas ele é mais rápido e logo estou completamente incomodada com a interação à minha frente.
— Minjeong, você está me ouvindo? — Yuna estala os dedos na frente dos meu rosto enquanto me olha em busca de algo errado. — Aconteceu alguma coisa?
— Não foi nada, eu só estava pensando em algumas coisas. — Respondo, ainda olhando para Jimin. Queria que ela não fosse tão bonita, mesmo agora. É difícil disfarçar minha atração por ela.
Yuna cruza os braços na frente do corpo, ainda olhando para mim.
— Tem certeza de que está tudo bem? — Insiste.
— Tenho.
— Então vai aceitar meu convite e ir até ao café depois da aula?
Por cima do seu ombro, eu vejo Jimin se despedir de Somi que desaparece pelo corredor. Quando ela vira para entrar na sua sala, seus olhos encontram os meus e sinto meu coração errar uma batida. Jimin arqueia uma sobrancelha, parecendo interessada no que estou conversando com Yuna, mas logo desiste e entra na sala.
— Acho que hoje não vai dar, Yuna — respondo pro fim. — Marquei de sair com uma amiga depois do cursinho — Percebo que ela franze a testa e imediatamente me sinto mal. — Talvez numa próxima? — Abro um sorriso gentil e a cutuco no braço.
Ela sorri e assente.
— Combinado!
Quando entro na sala, evito olhar na direção de Jimin e vou direto para o meu lugar.
— Vão para os seus lugares. — Ao ouvir sua voz sinto um aperto no peito. Já estou me arrependendo de não ter desistido dessa aula. Não sei porque achei que ia conseguir lidar com essa situação. — Certo, pessoal — ela diz, sorrindo. — Vocês se saíram bem no teste de ontem. Imagino que estão felizes por saber que vamos conseguir cumprir com o cronograma de aulas. Então vamos dar início aos nossos trabalhos.
Observo Jimin pegar uma caneta para quadro branco. Ela senta-se na beira de sua mesa, parecendo completamente relaxada. As mangas de sua camisa social preta estão dobradas até os cotovelos, e seus cabelos estão presos em um rabo de cavalo que deixa alguns fios soltos.
Ela é tão bonita, assim fica impossível desviar os olhos. E apesar de querer reprimir essa minha paixão por ela, percebo que o que acontece é o completo oposto, mesmo sem a gente se falar.
Grande parte dos alunos provavelmente nunca percebeu como ela é brilhante. Para eles, Jimin deve ser apenas mais uma dos tantos professores atraentes e qualificados da instituição. Mas eu estou encantada pela forma como ela encontra maneiras diversas de nos ensinar.
— Muito bem, pessoal — Jimin diz, se afastando da mesa. — Literatura coreana é uma matéria muito importante, mas imagino que para muitos uma das consideradas mais difíceis. As obras literárias possuem muita subjetividade e nem sempre é simples e fácil entender o que os autores querem dizer nos versos e frases de seus textos.
— Uma ótima forma de lidar com isso é pensar nessa disciplina e relacioná-la à história — Diz Yuna. — Como se fosse um trabalho complementar.
— Exatamente — Jimin sorri. — Essas duas matérias andam sempre juntas, afinal as escolas e períodos literários acontecem em um determinado espaço temporal dentro da história.
— Então podemos afirmar que a literatura se relaciona com o tempo de forma bastante íntima — Digo em voz baixa.
— Como assim? — Pergunta uma garota no fundo da sala.
Jimin sorri e dá um passo para trás, até a frente da sua mesa. Ela se senta de novo com as pernas estendidas e cruzadas nos tornozelos.
— Você poderia explicar melhor, Kim? — Ela usa o meu sobrenome, e, por algum motivo, isso faz meu coração acelerar.
Ah, sim, estou descobrindo que a professora Yu me fascina de uma maneira totalmente diferente.
— Bom... — Digo, retomando o raciocínio. — Em outras palavras, eu quero dizer que os autores foram sendo influenciados por algo que aconteceu na época em que viveram e isso os levou a escrever determinada obra.
— Esse é um ponto bem importante — diz Jimin. — Ter essa informação vai ajudar muito na hora de fazer o Exame Nacional, que possui um traço forte de contextualização e interdisciplinaridade entre as matérias.
Alguns alunos erguem as mãos.
— Professora Yu, fale sobre outros pontos que podem ser úteis para nós — Pede Han, causando um pequeno alvoroço de concordância na sala.
Jimim levanta as mãos, em rendição, fazendo a turma cair em risadas.
— Muito bem. Então, vamos fazer o seguinte. A gente faz uma troca. Se eu apresentar alguns desses pontos e a melhor forma de trabalhar com eles, todo mundo tem de concordar em ler todos os livros exigidos pelo exame que irão prestar. E quando digo ler é ler a obra inteira mesmo! Nada de checar apenas os resumos ou sinopses de uma obra literária, ok?
— Mas é muita leitura! — reclama um garoto do outro lado da sala.
Jimin da uma risada baixa.
— Bom, não há, em hipótese alguma, como estudar literatura sem ler bastante. Mas posso auxiliar vocês a organizar um cronograma de estudo individual adequado.
Ninguém faz objeções. Eu até gostaria de fazer uma, mas para isso precisaria levantar a mão e falar. Então, fico quieta.
— Nenhuma objeção? Ótimo. Vou abordar alguns pontos interessantes. Lembrem-se, gosto de debater sobre todos os temas. Então anotem tudo e estejam preparados para a próxima aula.
Jimin vai até o quadro branco disposto na frente da sala. Balança os braços e alonga o pescoço para a direita e para a esquerda, tentando relaxar. Quando começa a escrever, não é como os professores que fazem isso de forma metódica; é mais como alguém que tem total domínio sobre o assunto.
Observo enquanto ela puxa as mangas do camisa social que parecem atrapalhá-la. O tecido tem um caimento perfeito, revelando o contorno de seu corpo. Ela parece tão diferente de quando a vi na estação, mas ao mesmo tempo parece tão igual.
Estou olhando para as costas dela, e para sua silhueta, quando ela vira para pegar o livro sobre a mesa. Sinto o rosto corar enquanto desvio o olhar, envergonhada por estar prestando tanta atenção em seu corpo.
Como é que ela espera que passemos a ser apenas amigas se ela continua fazendo coisas assim?
— Pronto — ela diz calmamente minutos depois. — Então, o que eu quero de vocês é que pesquisem o edital do vestibular que vão prestar... — Ela vai até sua mesa, pega as provas que fizemos e começa a entregá-las para nós —, e comecem a colocar a leitura em dia. Como disse, não vou ser rigorosa com vocês, então estarei a disposição para auxiliá-los. Mas espero comprometimento. — Ela coloca minha prova na minha mesa e sorri. É o mesmo sorriso amável de que me lembro. — A aprovação de vocês no exame nacional depende disso. Então, façam cada minuto valer a pena.
A aula é encerrada e todos se apressam a sair da sala.
Recolho meu material e quando levanto a cabeça, vejo os olhos de Jimin em mim. Ela ainda está lá. Jimin não é apenas a professora Yu, ela ainda é a mesma. E eu ainda estou em sua mente, da mesma forma que ela está na minha.
Eu nem sei o que isso representa para nós; nossa troca de olhares. No entanto, não me importo. É o suficiente por agora. Acho que o melhor nome para definir o que sinto nesse momento é esperança. Eu realmente amo a esperança em seus olhos.
Levanto-me da cadeira e pego minha mochila, então saio da sala. E quando já estou fora de seu campo de visão, sorrio.
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