01

Winter's pov:

Lembro que vim a Seul pela primeira vez aos 18 anos para assistir a um evento fotográfico. Meu trem parou e, apesar de Ningning, minha melhor amiga, ter planejado me encontrar no estação, ela precisou atender a uma emergência familiar. Então ela me mandou uma mensagem com orientações de como pegar o AirTrain, depois o metrô e depois como caminhar até a sua casa, onde nos encontraríamos.

Soava simples, mas isso foi antes de eu entender que Seul era muito maior que minha ingenuidade. Não era apenas a quantidade de pessoas e de placas, era o barulho. Mesmo acostumada com a agitação de Icheon, senti-me um pouco perdida pelas ruas da cidade.

E mesmo que hoje seja ridiculamente fácil me localizar em Seul, lembro daquele sentimento de completa desorientação enquanto pego minha mala na esteira e caminho até a saída da estação. Fico me perguntando que tipo de situação inesperada me aguarda agora que estou de volta. Algo me diz que a vida não vai facilitar as coisas para mim.

Enquanto caminho com uma lentidão quase absurda não posso deixar de pensar que aceitar a proposta da minha mãe foi uma das melhores escolhas que já fiz. E, como fazer boas escolhas não tem sido um dos meus pontos fortes, isso abre as portas para um novo leque de possibilidades.

Icheon, era o nosso lar, mas eu já vinha planejando me mudar há algum tempo. O apoio da minha mãe apenas acelerou os meus planos. Ela já vinha ficando muito tempo no trabalho nos últimos dois meses desde que assumiu um cargo de fisioterapeuta no hospital. E, para ser honesta, a ideia de permanecer na cidade não me pareceu tão tentadora quanto deveria. Minha mãe respeitou a minha decisão de me arriscar em Seul enquanto tento ingressar em uma faculdade nacional.

Afinal, ela sempre disse que uma das melhores formas de se apreciar a vida é criando o seu próprio caminho.

Enquanto olho em volta a procura do carro da minha amiga, vejo uma mulher puxando sua bagagem e saindo da estação. Ela apoia a mala na parede e pega o celular no bolso do blazer. É estranho chamá-la de mulher, porque ela parece ser apenas alguns anos mais velha do que eu. Mas a postura que demonstra não me dá abertura para chamá-la de outra forma.

Essa mulher também esteve no meu voo, e a notei de imediato. Como não o faria? Não é sempre que vejo uma pessoa bonita, mas ela é incrível — até demais. Pelo menos é o que penso antes de ela passar os dedos pelos fios castanho-escuros e eles caem de volta perfeitamente.

Sinto meu rosto esquentar.

Na viagem a Seul, ela sentou do outro lado do corredor. Quando fui ao banheiro, notei que ela estava vendo um artbook de Seul, e um óculos de armação fina pendia perfeitamente em seu nariz.

Ela me viu observando, e quando ergueu o olhar para encarar meus olhos, abriu um largo sorriso. O que fez eu me sentir muito pequena. Então desviei meu olhar e segui caminho. Seus olhos eram intensamente castanhos e cheios de interesse. Por um segundo, pensei que estive diante de um portal para um mundo diferente.

Quando saí do banheiro, meu coração se apertou no peito, porque eu sabia que teria de passar por ela novamente. Mantive o olhar baixo até chegar a meu assento. Suspirei, e depois minha cabeça involuntariamente se virou para ela. Malditos olhos por quererem olhar de novo na sua direção. Ela sorriu novamente e balançou a cabeça para mim. Eu não retribuí o sorriso porque estava muito nervosa.

Foi a última vez que a vi. Bem, até agora.

Agora, nós estamos do lado de fora do aeroporto. E passo os olhos por ela por um momento.

Tentando parecer calma, viro a cabeça na direção dela para fazer parecer que estou procurando por minha amiga, para ver se ela já chegou. Na realidade, estou apenas tentando dar mais uma espiada na mulher encostada na parede do lado de fora do aeroporto.

Minha respiração se acelera. Ela me vê. Deslocando meus pés pela calçada, cantarolo sozinha, tentando parecer calma mas não conseguindo. Seguro meu celular na frente do rosto.

— Com licença — uma voz me chama.

Baixo o celular. Olho para a mulher incrível, confusa.

Seu sorriso desaparece e uma expressão de desculpas invade seu rosto.

— Ai, foi mal. É que eu vi que você estava olhando para o livro que eu...

— O artbook de Seul.

Um dedo roça seu lábio superior, e ela se aproxima.

— É... o artbook. Foi mal, não quis ser indelicada vindo aqui — desculpa-se, sua voz é grave. Eu realmente não preciso de um pedido de desculpas. Estou feliz por descobrir que há outras pessoas no mundo que gostam disso.

— Não. Você não está sendo indelicada. Eu... eu não estava fazendo nada demais. Só fiquei surpresa por ver que você tinha um exemplar em mãos.

— Você também gosta de arte gráfica?

Sinto um nó na garganta. Fico mais ereta.

— Sim.

— Humm, isso é bem interessante. — Ela sorri de novo e noto como o tempo parece estar quente, embora estejamos no início do outono. — Está visitando ou veio para ficar? — Pergunta.

Eu pisco.

— Hã?

Ela ri e assente uma vez.

— Você está visitando a cidade ou vai ficar por um tempo?

— Ah — respondo, olhando para ela por tempo demais. — Estou me mudando. Para cá. Estou me mudando para cá. Sou nova na cidade.

Ela ergue uma sobrancelha, interessada na informação.

— Ah, é? Bem. — Ela puxa a alça da mala com a mão direita, chegando mais para perto de mim. Um sorriso surge em seu rosto, e ela me estende a mão esquerda. — Bem-vinda a Seul.

Olho para sua mão e, em seguida, para seu rosto. Aceito seu cumprimento com certa relutância.

— Obrigada.

Ela suspira de leve, mas seu sorriso se mantém.

— Tudo bem, então. Foi um prazer conhecer você. — Recolhendo a mão, ela começa a se afastar em direção ao carro parado junto ao meio-fio.

Pigarreio, sentindo meu coração acelerar.

— Você mora na cidade?! — grito para a mulher, que já está desaparecendo na plataforma. Ela olha para trás, para mim.

— Como você sabe?

Dou de ombros.

— Só deduzi isso.

Ela estreita os olhos.

— Eu te conheço?

Franzo o nariz e balanço a cabeça negativamente. Fico me perguntando se ela nota o quanto estou nervosa. Espero que não.

Ela fica em silêncio por alguns instantes antes de dizer:

— Você deveria visitar a livraria em Apgujeong. Eles tem ótimas edições para interessados no mundo do design gráfico — Inclino a cabeça, olhando para ela. Ela ri. — Eu estou sempre por lá.

— Mesmo? — Pergunto a mim mesma em voz alta. Eu não tenho certeza se estou falando com ela, comigo mesma, ou com esse maldito coração acelerado.

— Sim. Você devia ir. Acho que vai gostar. — Ela começa a abrir possivelmente o sorriso mais gentil do mundo.

Ela levanta a mão para mim e sorri quando se despede. Então fecha a porta do carro e segue seu caminho.

Fico em silêncio, vendo o carro partir. Não desvio o olhar até que ele vire a esquina do estacionamento e fique distante. Só então baixo os olhos para o celular vibrando em minha mão e vejo o nome da minha na tela.

Assim que atendo, percebo sua voz se enchendo de uma preocupação desnecessária, mas muito familiar. Ela ainda se sente incomodada por eu estar fazendo essa mudança sozinha, mas faço o possível para que entenda que vou ficar bem.

— Você sabe que sempre apoiei suas escolhas, Minjeong — minha mãe diz, suspirando do outro lado da linha. — Mas se você precisar de qualquer coisa, me avise, está bem?

— Vou ficar bem, mãe — garanto ao telefone. — Prometo que irei manter contato.

— Está bem. E onde você está agora?

— Esperando Ningning na estação de trem. — Digo. E como sei que ela vai manter essa ligação por muito mais tempo do que eu quero, acrescento: — Mais tarde eu ligo, tá?

— Tudo bem. Faça isso.

Depois que desligo, ainda preciso esperar por mais algum tempo até avistar o carro da minha melhor amiga parar no meu fio. Ningning salta e depois de um cumprimento caloroso, ela me ajuda a guardar minha mala e seguimos caminho. Olho através da janela do carro, observando as ruas da nova cidade que devo chamar de lar: Seul.

Tantas coisas aconteceram nos últimos meses. Minha mãe foi transferida para outra hospital por conta do trabalho e, eu decidi seguir meus sonhos. Precisei deixar alguns amigos para trás e ressignificar minha vida. Bom, tive tempo suficiente para me programar, mas ainda é meio difícil aceitar que agora tenho que recomeçar do zero em outra cidade.

Não é como se eu tivesse muitas opções agora.

— Winter, eu sei que mudanças são difíceis em qualquer aspecto — diz Ningning ao volante. — Mas tenho certeza de que você vai adorar Seul.

Respiro fundo antes de dizer:

— Eu não teria tanta certeza disso.

Ao me virar para ela, vejo um sorriso travesso se formar em seus lábios. Seu cabelo louro está preso em um coque no alto da cabeça, e ela ainda tem a mesma expressão despreocupada de que me lembro.

Nós nos conhecemos desde a infância, e ela com certeza fez questão de manter nossa amizade mesmo depois que os pais se mudaram para Seul. Ning Yizhuo é uma pessoa de espírito livre. No entanto, fora desse papel, ela também é uma pessoa muito boa. Sempre disposta a estender a mão quando algum amigo precisa.

Além disso, ela é uma das únicas almas em quem eu confio para guardar meus segredos. É a garota que permite que eu saia da minha redoma protetora para ser um pouco livre também.

Ao dobrar à direita pela última vez e chegar ao bairro onde mora, me recosto na janela do carro e sou inundada pelas lembranças de mais cedo. Sorrio. Não comentei nada com Ningning, mas tenho certeza que ela adoraria saber daquele momento estranho e perturbador.

A rua da minha nova moradia não é muito grande; tem cerca de oito casas germinadas em cada lado. Os gramados estão bem cuidados, as calçadas limpas e um pequeno parque se estende no final da rua. Já passei algumas férias com Ningning, então, ao ver a casa dela eu a reconheço imediatamente. É praticamente do mesmo tamanho da casa que eu tinha em Icheon e o jardim da frente está perfeitamente cuidado.

Ningning estaciona o carro em frente a garagem. Fico olhando ela sair do carro, então estico o braço até o banco do passageiro e pego minha bolsa.

Quando saio do carro, fico olhando para a rua.

— Já faz muito tempo — Ela comenta, antes de passar um braço por meu ombro.

— Eu sei. Senti saudade deste lugar. Senti falta de tudo aqui.

— E esse lugar sentiu saudade de você também, mas a gente entende você ter demorado para se mudar. Suas prioridades eram outras, mas estou muito feliz de saber que vou ter minha melhor amiga por perto outra vez.

— Prometo que vou ser a melhor das companhias. Ainda tenho que lidar com minha mãe se sentindo trocada, então não posso passar uma má impressão.

— Ah? Então, ela ainda não superou que eu fui a grande escolhida?

Dou uma risada.

— Você conhece minha mãe e sua super proteção.

— Quer sabe de uma coisa? Vou provar para ela como sou uma excelente anfitriã. — Ningning tem uma energia tão positiva e um coração tão sincero. — Agora deixe-me pegar sua mala. — Ela diz, seguindo até o porta malas do carro.

Entrando no hall, fico surpresa quando vejo um retrato enorme de um dos melhores cafés do centro comercial de Seul emoldurada e pendurado na parede.

A família de Ningning abriu as portas do Coffee Bar alguns anos atrás, quando decidiram se estabelecer na capital. Expandir a rede de cafés pela cidade, mesmo com capacitação para isso, está sendo um enorme desafio para eles, mas é pelos negócios que o coração da família Ning bate e, além disso — talvez o fator mais importante para eles —, foi aqui que prosperaram.

Durante minhas visitas, passei bastante tempo nesse café, sentada no canto enquanto lia algum livro ou compartilhando de momentos inusitados com Ningning.

— Sua família está fazendo um ótimo trabalho, Ningning — comento, ainda olhando para o quadro.

Ela percebe que eu estou observando a foto, e vejo um sorriso se formar em seu rosto.

— Agora que você vai morar em Seul, talvez possa nos ajudar quando estiver livre do seu cursinho. Sempre temos uma vaga cativa na equipe para você.

— Você não precisa fazer isso por mim.

— Eu sei, mas quero, e você sabe que meus pais não aceitariam que fosse de outra maneira. Tenho auxiliado nos negócios quando não estou ocupada com a faculdade. Além disso, tenho a sensação de que vai ser bom para você ter uma renda extra enquanto se forma. Então, se você quiser, pode trabalhar com a gente.

— Talvez eu aceite essa oferta.

— É para aceitar. — Ningning faz uma pausa e coloca as mãos nos meus ombros. — Agora vamos. Deixe eu acompanhar você até o seu quarto.

Estendo a mão para ela, dizendo que eu posso levar minha mala, mas ela recusa.

— Está tudo bem. Preciso te conquistar com todas as armas que tenho a disposição — brinca.

Sorrio antes de acompanhá-la pelo corredor. Algumas caixas que enviei com antecedência estão empilhadas por ali.

Passo a maior parte do dia organizando as coisas no meu quarto. Assim que esvazio minha mala, começo a pegar as caixas no corredor. Esvazio quase todas, faço a cama, então percebo que os móveis do meu quarto estão fazendo sombras nas paredes. Olho pela janela e vejo que o sol está se pondo.

Definitivamente perdi a noção do tempo.

Vou até a cozinha onde encontro Ningning se servindo de uma fatia de bolo enquanto vê alguma coisa no celular. Sento numa das quatro banquetas altas ao redor do balcão, que também serve como mesa de jantar.

— O outono esse ano está sendo bem agradável — Ela comenta, olhando para a janela.

— Então, Seul tem uma coisa boa — respondo, me servindo do suco sobre o balcão.

— Uma coisa boa? — Ela pisca para mim ao se inclinar por cima do balcão, pegando seu copo e a levando a boca. — Tenho certeza de que logo você vai encontrar várias outras coisas boas.

— Ah, Ningning, por favor — respondo com o tom mais indiferente possível. — Estou ficando tentada a apostar com você.

— Quem diria que você gosta de brincar com o perigo, hein?

— Verdade... — Engulo em seco. — Acho melhor não entrar nessa.

— Mas quem pode saber? Eu posso estar errada e sua estadia aqui ser tão ruim que vai preferir ir morar com sua mãe — Ela brinca. — Mas, quando começar a trabalhar no café, vai ter ótimos motivos para querer permanecer em Seul.

— Do que você está falando?

— Logo você vai entender isso. — Diz, lançando-me uma piscadela.

Reviro os olhos.

— Está bem, garota misteriosa. — Digo, terminado de beber meu suco. — Agora, se me dá licença, vou me deitar.

— Tudo bem, você deve estar cansada da viagem. Se precisar de alguma coisa é só me chamar.

Sorrio e me retiro para o meu quarto.

Então pego um pijama e me jogo na minha cama. Quando fecho os olhos, não permito que minha mente fique divagando sobre minha vida, ou no que o futuro me reserva. Eu me dou o tempo de que tanto preciso. Eu me deito, fecho os olhos e adormeço.

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E , galera!

Seguinte, a exemplo do que foi com Start Over, essa fanfic também é uma nova versão de uma das minhas primeiras histórias por aqui.

Espero que curtam e até breve.

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