VAIDADE/ORGULHO
Conhecida como soberba, é associada ao orgulho excessivo, arrogância e vaidade.
O filósofo Santo Tomás de Aquino tratava em separado a questão da vaidade, como sendo também um pecado, mas a Igreja Católica decidiu unir a vaidade à soberba, acreditando que neles havia um mesmo componente de vanglória, devendo ser então estudados e tratados conjuntamente.
Do latim superbia, vanitas.
HISTÓRIA QUATRO
Patrícia Blank era uma modelo famosa, que vivia preocupada com sua aparência. Desde muito pequena, já participava de concursos de beleza infantil e sua mãe a ensinava que a beleza era uma porta para o sucesso e que não se mantinha bela sem sacrifícios.
Ela tinha 23 anos e já se preocupava com linhas de expressão e cirurgias plásticas. A rotina de Patrícia começa cedo, com exercícios e corridas e uma alimentação rigorosa. Não tinha uma folga para sair com amigas e se divertir como qualquer garota na idade dela. Quando surgia a vontade de relaxar, curtir a juventude ou comer um pedaço de bolo, se culpava e aumentava o número de exercícios, até que a tentação passasse. O desejo de ser a mais bela modelo, a mulher mais maravilhosa do mundo era bem maior que tudo, mas nunca estava satisfeita. A jovem de corpo perfeito sempre achava que podia melhorar.
Numa manhã de domingo, após os exercícios excessivos, tomou uma ducha e se aprontou para sua drenagem linfática. Sentia todos os músculos do corpo tremer de exaustão, mas não parava até que não suportasse mais. Passou pelo espelho do banheiro, que era do tamanho ideal para ela se ver por inteiro, e ficou analisando sua imagem refletida. Seu olhar crítico fez uma análise minuciosa em cada parte do seu corpo.
"Merda! Olha esses culotes imensos! E essas celulites! Estou horrorosa! Preciso urgentemente melhorar!" — pensou, desanimada.
Ela estreitou os olhos no abdômen perfeito e apertou com o indicador e o polegar uma camada de músculo, que ela jurava ser gordura localizada, deixando-a em choque. Apertou do outro, com mais força e deu um grito! Correu até o celular, marcando com seu cirurgião plástico, uma lipoaspiração de urgência, pois seu corpo estava fora de forma.
Aos olhos da jovem, ela estava gorda e flácida, faria de tudo para ser a mais bonita! A mais esguia e a única modelo da agência mais famosa da cidade, com a agenda cheia. Muitas vezes usou de subterfúgios para se manter no topo, inclusive ir para cama com fotógrafos e agentes. Esperou ansiosa, enquanto a ligação não completava, quando ouviu a voz da secretária do cirurgião:
[ — Clínica de beleza do doutor Rupert. Em que posso ajudar? ]
A voz doce da secretária irritou Patrícia.
— Andréia! Me passe para o doutor, agora! Preciso falar com ele! — gritou, sem cumprimentar.
[ — Um minuto, dona Patrícia. Já estou passando para a sala dele.]
"Dona Patrícia... odeio essa garota" — pensou, desdenhosa.
Aguardou mais alguns minutos e, ao ouvir a voz grave do médico, falou lamuriosa e de como ela sofria.
— Alô, doutor Rupert? Pelo amor de Deus! Preciso marcar uma cirurgia! Meu corpo está em declínio total! — gritava em desespero. — Como assim, não posso? É claro que preciso! Tem umas estrias gigantescas e gorduras por toda minha cintura! — estava tremendo toda, ao conversar com o cirurgião plástico.
Ele escutava, pacientemente e explicou que ela era linda e seu corpo perfeito, mas no próximo mês atenderia ela, para uma avaliação. Isso a irritou tanto que jogou o celular longe, indo se vestir.
— Seu filho de uma... — deixou a frase incompleta. — Ah! Ódio! Que ódio desse imbecil! — gritava, sentindo as lágrimas. Mas controlou-se, pois iriam surgir rugas em seu belo rosto e isto ela não iria permitir.
Duas horas depois, estava chegando na agência, maquiada e vestida perfeitamente. Estava deslumbrante, fazendo todos virarem o pescoço, para admirá-la e ela sabia que provocava o desejo nos homens e inveja nas mulheres. Patrícia adorava essa sensação de poder! Se sentia uma deusa! Realizou uma sessão de fotos, sempre esnobando os mais jovens e inexperientes.
"São todas tão ridículas! Não chegam aos meus pés, realmente!" — pensava com um olhar desdenhoso.
Algum tempo depois, Patrícia saiu da agência com a sensação que todos a invejavam, mas ela até gostava disto. Ela realmente adorava que eles desejassem ser ela, no final das contas.
Pegou a avenida, em direção à clínica, para provar que precisava de alguns retoques urgentes, para ficar ainda mais bela. Pensando num corpo perfeito e ainda mais jovem, como de uma jovem modelo que havia na agência. Decidiu querer ficar ainda mais bonita e jovem e pagaria o preço que for, para conseguir!
Chegando lá, a recepção luxuosa estava praticamente vazia, se não fosse pela única presença feminina ali. Uma bela mulher com cabelos castanhos escuros e muito lisos, que caiam como uma cascata em tom de avelã. Seu olhar era esverdeado como esmeraldas e seu corpo era esguio e muito bem-vestido, elegantemente e com movimentos refinados.
A modelo ficou estática, olhando na direção daquela mulher, sem conseguir reagir, de imediato. Levou alguns minutos para reagir e se sentar na poltrona de couro e cruzar as pernas bem em frente a outra mulher, que nem se deu trabalho de olhar em sua direção. Fez pose de famosa, ignorando a outra, como sempre fazia, pois assim provocava a curiosidade das pessoas que estivessem no mesmo ambiente que ela.
Nada. A bela mulher nem moveu um músculo do rosto em direção dela.
"Quem essa sirigaita pensa que é? Sou Patrícia Blank! A modelo número um da agência Models Angelus!" — bufou, pensando irritada.
— Sei quem é você. — a mulher falou, sem tirar os olhos da revista em suas mãos.
Não levantou os olhos, enquanto falava mansamente, deixando Patrícia ainda mais irritada, pois o que ela mais gostava era de causar inveja nas outras mulheres e esta nem se dava ao trabalho de olhar na sua direção.
Deu uma boa olhada na estranha, tentando fazer uma comparação entre elas.
— E deve estar encantada comigo, não? — disse com desdém.
A mulher misteriosa largou a revista displicentemente, levantando-se elegantemente da poltrona, indo na direção de Patrícia, que a encarava surpresa com aquela ação inesperada.
— Acho que você não iria gostar da minha resposta... — sorriu.
— E você, quem é? Posso saber? — falou presunçosa.
— Por que tens medo de ficar feia, Patrícia? — disse, de braços cruzados.
— Eu, feia? Nasci linda, querida! Mas nem que eu quisesse, conseguiria! — riu, debochada.
— Não entendi bem. Desculpa, mas poderia repetir? — sentou ao lado da modelo.
— Eu disse que, feia, eu não conseguiria ficar, nem que desejasse isto! — usou um tom de voz arrogante. — Entendeu ou preciso desenhar? — Patrícia falava alto, pausada e ofensivamente.
— Ah, sim... Compreendi muito bem. — a estranha a encarava, com olhos de admiração.
Era orgulhosa demais para aceitar que a mulher ao seu lado era tão linda quanto ela. Desejava ser a única mulher mais bela do mundo e não iria economizar para conseguir. Estava pensando até em algum tipo de técnica para mudar a cor de seus olhos. Atualmente, não percebeu que a mulher deslizou o dorso da mão no seu rosto, tocando com as pontas dos dedos macios, delicadamente, nos seus lábios e se aproximando ainda mais da modelo, beijando a maçã do rosto desta. Patrícia, sem conseguir reagir, encostou o corpo na poltrona, surpreendida com aquele gesto inesperado de alguém que nunca vira.
A mulher sorriu misteriosamente, erguendo o corpo, ficando ereta.
— Você é tão presunçosa, Patrícia... Tão vaidosa que esqueceu de ser realmente feliz. Não percebeu as pessoas, a sua volta, perdeu os amigos, os amores se foram e a única coisa que realmente importa é você! O mundo gira em torno de Patrícia Blank! — deu um suspiro longo. — Você será exatamente como és por dentro, Patrícia! Será por fora como és por dentro! Levantou-se, indo na direção da porta, saindo da clínica, deixando a jovem modelo atordoada e com um formigamento quente em todo o seu rosto.
A última imagem que teve da bela mulher misteriosa era a estranha sensação de ver uma coroa em sua cabeça, mas sabia que poderia ser o cansaço.
Nisto, Andréia, a recepcionista, veio para chamá-la, soltando um grito de horror, saindo da recepção correndo. Patrícia virou-se para a parede de espelho atrás de si, para saber o motivo daquela reação e, ao ver seu rosto, caiu de joelhos, gritando, fora de si. Ela viu seu rosto enrugado, como se tivesse 90 anos, e seus cabelos sedosos e macios, ricamente cuidados, estavam ralos e esbranquiçados. Seus gritos eram de terror e desespero, sem entender o que lhe acontecera. Olhou suas mãos trêmulas e estas eram como garras, cheias de veias arroxeadas e manchas no dorso.
— Mas o que está... O que me aconteceu?... Eu... — sua voz era esganiçada, longe daquela, onde todos reconheciam pelo tom autoritário.
Olhou-se novamente, aos berros aterrorizantes, e seu corpo, outrora esguio e perfeito, agora estava curvado, com seios flácidos e abdômen protuberante, denotados sobre o vestido leve e justo.
A recepcionista, agora acompanhada do médico e um enfermeiro, assustaram-se, sem entender o que realmente estava acontecendo ali. Os três se entreolharam, aturdidos. No chão, a bela modelo Patrícia Blank se encontrava encolhida e quase sem vida.
Tudo aquilo que mais amava no mundo, seu belo e jovem corpo, era apenas uma caricatura da sua alma envelhecida e pobre.
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