XVI | O oitavo pecado

[...] Os sete pecados foram, um por um, sendo construídos com base nos defeitos de Deus e qualidades do Diabo. Desde a fúria dos Céus até a procrastinação dos Infernos, os mortais aprenderam a nunca espelhar as demais perversões, de certos que, um oitavo delito seria um mito. Mas, apesar de nunca antes listado, ele existia, sendo cometido pelos mais diversos mortais."

• • •

1 ano depois

Chou Tzuyu se revirou na cama até ter coragem suficiente para se levantar. Ela abre o chuveiro, deixando uma ducha fria cair sobre seu corpo repleto de músculos enrijecidos. Dormir não foi uma opção naquela noite tão tensa e preocupante, principalmente para si. Não era para menos, após um longo ano presa naquela cela imunda, sua amada finalmente iria a julgamento no início daquela manhã que prometia ser longa. Sana manteve sua cabeça erguida perante àqueles que a julgavam, e isso com certeza era o mais admirável em si. Tinham sido meses sombrios para a mais nova, uma cela suja e companhias ruins faziam parte do pacote penitenciária.

Desde aquela tarde, um ano antes, Chou não pôde ter contato com Minatozaki, o que se mostrou difícil na maior parte do tempo. Não poder sentir seu toque, seus beijos, seu cheiro. A distância era cruel demais, mas precisa. Naquele dia, a mais nova atirou três vezes na direção de Dahyun, matando-a no mesmo minuto. Tzuyu deveria, como autoridade maior, pará-la. Mas não, ela não conseguiu. Sua mão tremeu naquele segundo e a pistola travou em seus dedos. Ela abaixou o instrumento e caiu de joelhos, lamentando-se por tudo o que ocorreu. Já Sana soltou a arma após o feito e caminhou pela estrada de terra, sem rumo; Sem chão; Sem nada a perder. Ela tinha muito a perder, ainda que não soubesse quanto. Fora presa duas horas depois, na fronteira com a cidade ao lado, ainda caminhando como um zumbi. Foram 17 km de pura angústia e solidão, até que a realidade cruzou a rua e parou em sua frente, trazendo um par de policiais armados e prontos para levá-la presa. A parte mais difícil foi vê-la daquela forma, entregue às algemas enquanto uma dezena de fotógrafos lhe apontavam os flashes.

Chou foi afastada do cargo, não poderia ter contato direito com o caso de alguém íntimo. A maior parte das notícias ela viu na televisão, já que o caso corria quase que totalmente em segredo de justiça. Tzuyu contratou advogados atrás de advogados, mas poucos realmente lhe davam esperança de uma redenção. Dahyun sabia que uma agente não poderia se livrar de um criminoso daquela forma, todos os policiais têm um juramento. Quando a detetive a matasse, estaria quebrando-o, e desta forma, acabando com sua vida e carreira. A vingança perfeita. Como esperado, a Ira de Sana falou mais alto e ela quebrou seu juramento no minuto que executou Kim à queima roupa. Por mais que o corpo de sua irmã, Choi Yun Jin, tenha sido inteiramente usado como prova, principalmente a cabeça, haviam poucas chances dela ser liberada.

A mais velha desliga a ducha, enrolando-se na toalha. Ainda faltavam duas horas para o julgamento ter início, mas sua advogada favorita provavelmente já trabalhava para lhe conseguir uma visita. Não demorou tanto até Park Jihyo, uma das mais experientes no ramo, ligar dando a tão esperada notícia.

— Foi difícil, vocês terão apenas 10 minutos, Tzuyu. — diz a colega, carinhosamente apelidada de Hyo na época do colégio.

— Eu não sei nem como te agradecer, Hyo, caramba, estou indo para aí.

Chou desliga o celular e apressadamente está dentro de uma roupa social daquelas que costumava usar para o trabalho. Ela prefere pegar um táxi naquela manhã, não teria condições de dirigir caso não conseguissem libertar Sana e ela fosse diretamente encaminhada a uma prisão federal. Ela apostou tudo o que tinha e tudo o que não tinha nisso. Tzuyu chama o primeiro carro que passa e já dentro dele, indica para onde ele deveria a levar. Enquanto isso, na cela solitária, Minatozaki Sana se perguntava se a mais velha ainda pensava nela, porque desde aquela manhã quando conheceu-a na cena do crime de Larissa Ayumi, Minatozaki nunca mais tirou-a de sua cabeça.

A de cabelos médios — a essa altura, as madeixas já haviam crescido um bom tanto — veste seu terno e aguarda pelo momento que poderia mudar sua vida. Um policial vem até sua cela e bate a chave contra o metal, chamando sua atenção.

— Você tem uma visita. — diz ele.

— Visita?

— A sua garota está aí.

— Tzu... Tzuyu?

— Eu não sei, ela é chique, cheirosa e bonita. Reconhece?

— É a minha Tzuyu.

Sana sorri, virando de costas para as algemas serem colocadas em si. O policial a guia por um longo corredor de presas lhe enviando beijos e xingamentos, até entrar em contato com outra parte do presídio que não via desde que entrou nele. Uma pequena sala estava reservada para a rápida conversa, e quando Minatozaki pisou dentro dela, sentiu um peso cair sobre si, apertando-a e beijando sua face freneticamente. Tzuyu.

— Senti tanto a sua falta, meu amor. — a mais velha chorava enquanto levava sua mão delicadamente ao rosto da menor — Eu vou tirar você daqui, está me ouvindo?

— Tzuyu, você não pode me prometer isso. Eu matei alguém.

— Matou alguém que matou sua irmã, você é humana, você se descontrolou...

— Ei, só não quero que se prenda a alguém que pode nunca estar com você. — interrompe Sana, libertando uma lágrima que tentava segurar — Está bem?

— Eu já estou presa a você, sua desgraçada e você sempre, sempre, sempre vai estar comigo. E sabe por quê?

— Por que eu amo você?

— Você me ama mesmo?

— Eu amo, Tzuyu, eu queria te dizer isso em outras circunstâncias. — ela olha o cenário caótico e nojento da penitenciária — E em um restaurante cinco estrelas, de preferência.

— Eu não me importo com isso... — Tzuyu beija suas mãos como se fosse a última vez que o faria — Só saiba que eu também te amo, independente do que acontecer. Eu nunca vou te deixar, Sana.

— É a primeira vez que você me chama pelo meu nome.

— Vá se acostumando, quero te chamar por ele até ficarmos velhinhas.

Elas caem no riso e permanecem em silêncio por um tempo, apenas segurando as mãos uma da outra como se aquele pequeno momento fosse eterno.

O tempo passa voando e o homem que fazia a guarda da porta anuncia o fim da visita, levando a mais nova como se estivessem indo até a guilhotina. Tzuyu corre até a sala onde o julgamento aconteceria e permanece na primeira fileira, sendo a primeira e última pessoa que Sana veria. Lá estava a garota que ela amava, prestes a ser liberta ou condenada para sempre.

— Damos início ao julgamento de Minatozaki Sana. — diz a juíza.

• • •

Quatro horas se prosseguiram, entre intervalos e provas contra e a favor de Sana. Por último, Park apresentaria a defesa final, o último passo antes do veredito. Assim que foi autorizada, a mulher caminha até o centro da sala, convicta que daria seu melhor.

— Esta mulher — Park aponta para Minatozaki, sentada ao lado da juíza — é uma policial, ela fez seu juramento tal como seus colegas e ela o quebrou. Mas quantos afinal não o quebram? Quantos não saem impunes pelas coisas ruins que fazem? Todos os anos, homens e mulheres são assassinados pela violência policial, valendo ressaltar que são pessoas inocentes. Sana nunca teria puxado aquele gatilho perante uma pessoa inocente, não da forma como fez. Aquela jovem, Kim Dahyun, tirou a vida de seis pessoas inocentes e ela sim merecia um julgamento como este, mas não houve tempo. Uma destas pessoas inocentes era Choi Yun Jin, a única família de Sana, sua irmã caçula. Nossa réu, acima de tudo, é humana. Quando ela soube que era a cabeça de sua irmã naquela caixa, sua primeira atitude foi atirar contra a pessoa que fez tamanha atrocidade. Quantos aqui não teriam essa mesma atitude visto que a única coisa que vocês têm fosse brutalmente arrancada de suas mãos? É cruel, Minatozaki cometeu um erro. No seu lugar deveriam estar policiais, que assim como Sana, fizeram um juramento e o quebraram por poder. Todos os dias, seus rostos estão na televisão, e quem dá a mínima? Vidas negras, vidas LGBTs, vidas indígenas. Até quando as pessoas inocentes vão continuar pagando no lugar dos verdadeiros assassinos do sistema? Esta mulher, ela matou alguém, mas não, ela não é a primeira. Ela não será a última, mas é a ela quem vocês devem punir? Ou é àqueles que realmente estão provocando o caos na sociedade? Termino aqui minha defesa.

— Em 15 minutos traremos o veredito. — anuncia a juíza, se retirando da cadeira.

Park dá uma piscadela para Tzuyu, que parecia ter sua aflição aumentada a cada segundo. Foi uma jogada brilhante, mas ao mesmo tempo, ela ainda temia. Sana quis puxar aquele gatilho e tal escolha poderia a condenar para o resto de sua vida.

Os minutos passaram como horas, mas pouco a pouco, o júri estava de volta, entregando a juíza sua decisão. A mulher abre o papel, chamando a atenção de cada uma das pessoas naquela sala. Jeon Soyeon, Nicha Yontararak (Minnie), Son Seung-wan (Wendy), Choi Yeonjun: estavam todos lá, dando força as duas colegas de trabalho. A expectativa só se aliviou quando a mulher finalmente moveu os lábios para dizer.

— O júri decidiu pela absolvição da réu de todos os crimes. — anuncia — Todas as acusações serão removidas e ela poderá voltar ao seu cargo após um período de tratamento psicológico e retreinamento. Declaro esta sessão encerrada.

Há uma pequena comemoração pela parte da platéia e no instante que Sana é liberta, ela corre até os braços da mulher amada, aliviando toda a saudades em um beijo molhado e cheio de sentimentos.

E bem, já que estamos falando sobre sentimentos, o amor é com certeza o mais conhecido deles. A inexplicável vontade de estar com alguém, de ter a maciez de sua pele e sentir seu cheiro, ou compartilhar de todos os momentos mais inusitados. Se houvesse um oitavo pecado, o amor seria um forte candidato. Quando amamos alguém, nossas pupilas se dilatam e nossos corações mudam o ritmo, de forma que deixamos de ser até nós mesmos. Quantas loucuras são cometidas em nome do amor todos os anos?

Deus, quando expulsou Lúcifer dos céus, ele pensou que o mesmo voltaria, lhe trazendo juras de amor. Isso não aconteceu, porque havia o Orgulho.

O criador levantou sua fúria naquele instante e seu inimigo não deu um passo sequer, irritando-o ainda mais. A Preguiça e a Ira sempre estiveram lá.

Até mesmo durante o banquete de almas, onde a Gula passou a ter espaço entre os anjos e demônios, Deus sempre quis estar acima. Avarento, mesquinho, interesseiro.

O Diabo, entretanto, invejava a forma como o pai governava e espelhou teu Inferno aos Céus, vivendo da Luxúria e imundice dos mundos.

Assim, os sete pecados foram conversados e impostos, mas apesar do ódio entre Deus e o Diabo sempre existir nos livros, ninguém nunca ousou colocar o amor entre um dos maiores pecados, já que ele cerca os outros sete.

Assim como Deus, Tzuyu amou o Diabo, mesmo com todos os seus defeitos e pecados. Sana, certa que nunca teria uma chance, recebeu a mesma de bandeja, sorrindo ao novo mundo que se abriu para ela.

No final, o maior pecado delas foi o amor. E ninguém seria condenado desta vez.

Fim

Esse final é lindo demais, meu Deus. Agradeço a todos que leram e a apoiaram Seven. Minha Segunda adaptação aqui e confesso q meu carinho por ela e Intocável é especial.

Vejo vocês nas próximas histórias (⁠^⁠^⁠).

Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top