27. Batman & Robin (pt. II)

WILL

O motel Super 7 era um desses lugares de parada que só existia nos Estados Unidos. Com um estacionamento a céu aberto repleto de carros caindo aos pedaços, motoqueiros bêbados e um diner sujo do outro lado da rua, o motel se apresentava como uma construção de três blocos retangulares de dois andares, onde os quartos ficavam separados um do outro apenas por uma parede fina que nem de longe isolava os ruídos. Era, para todos os efeitos, um típico motel americano.

No segundo andar do motel, não muito afastado do quarto de número 245, Will apoiou os cotovelos no guarda-corpo de metal enferrujado e respirou o ar úmido da noite. O cheiro do cigarro mentolado e da colônia barata dos motoqueiros, que contavam piadas e tomavam cerveja no estacionamento, chegou a Will como uma nuvem enjoativa. Apesar de tudo, ele não se importou.

Estava de banho tomado, bem alimentado e os hematomas em seu rosto começavam a adquirir aquela coloração esverdeada que indica que a pele, em breve, voltará a seu estado normal. Exceto pelo corte no supercílio e no queixo, a recuperação seguia sem complicações. Os socos de Rob Filho, graças a Deus, já não passavam de uma lembrança dolorida.

Will estalou os dedos, ouvindo as vozes alteradas dos motoqueiros contarem outra piadinha politicamente incorreta. Quando o som de uma latinha de cerveja sendo aberta rasgou a noite, Will sentiu os dedos de Maria envolverem seu braço. Ele se virou, os óculos quase escorregando pelo nariz.

— Cara, precisamos trocar uma ideia — disse ela.

Maria usava a blusa azul folgada, uma das preferidas dele, e tinha os cabelos presos numa trança frouxa que escorregava por seus ombros nus. Ela também apoiou os cotovelos no guarda-corpo e deixou o silêncio crescer. A brisa noturna trouxe o som das vozes grosseiras dos motoqueiros e o cheiro de erva doce e balinhas de framboesa, o cheiro de Maria, às narinas de Will.

— Amanhã vamos ver Gerárd, e preciso saber se tudo o que conversamos na festa ainda está de pé.

No casamento, quando Amy e as meninas foram embora do casamento, Maria roubou uma garrafa de champanhe fechada e carregou Will para fora da festa. Reclamando do cunhado, fazendo mil planos para acabar com ele e bebendo como nunca, ela não demorou a achar tudo engraçado. Quando chegaram à praça, Maria já trocava as pernas e dançava uma música italiana que ela mesmo cantarolava. Will, encantado pelo simples fato de estar com Maria, gravitava ao redor dela, juntando-a do chão quando necessário.

Bêbada e rindo de tudo, Maria era a sereia que ao invés de afogar os marinheiros desavisados, proporciona a eles a chance de se maravilhar com o som das gargalhadas mais perfeitas do mundo. Will, apaixonado por ela de corpo, alma, popa e proa, ria junto, mesmo que Maria não fizesse sentido algum no que dizia.

Ela se recusou a ir embora quando terminou a garrafa de champanhe e caiu pela quinta vez na grama da pracinha. "A gente vai chutar a bunda dele amanhã, mas agora eu quero dormir com você, Will", dissera ela, causando um pequeno ataque de nervos no coração apaixonado de Will. Porém, como bom marinheiro, ele obedeceu as ordens de sua sereia de olhos castanhos com manchinhas verdes e sotaque italiano sem hesitar.

Na manhã seguinte, Will acordou debaixo do escorregador da pracinha com uma dor violenta nas costas e Maria enroscada em seu pescoço. Não havia acontecido absolutamente nada entre eles; nenhum beijo sensual e nenhum olhar insinuante que levaria a outros desfechos. Maria apagou como um eletrodoméstico arrancado da tomada, mas para Will, abraçado a ela como se as ondas de um mar fictício pudessem varrê-la para longe, era como se absolutamente tudo tivesse acontecido.

(Na verdade, Will havia dado um beijo na testa de Maria tão logo ela começara a roncar em seu pescoço, mas evitava pensar nisso. Sua cabeça parecia entrar em combustão cada vez que se lembrava do gosto da pele dela, de como fora abraçado com força, do calor do corpo de Maria junto ao seu. Na manhã seguinte, o sorriso preguiçoso dela havia sido o presente de Natal antecipado de Will.)

Quando voltou a si, Maria ria. Sem graça por estar perdido em pensamentos, ele pigarreou.

— É evidente que sim — respondeu, encarando os motoqueiros no estacionamento. — Se você quiser... seguir com o plano, estarei com você.

— Quero sim. Amanhã vai ser um dia decisivo, cara — disse ela. — Precisamos entrar na casa, falar com os funcionários e desenterrar algum podre violento dele. Gérard vai tentar parecer o pai de família amoroso que sente falta das filhas, mas duvido que ele não esteja fodendo todas as putanne que aparecem na frente dele.

Ela fez uma pausa. O semblante furioso de Maria deu lugar a uma expressão distante, como se a varanda do outro lado do motel Super 7 pudesse resolver seus problemas com o cunhado. Com a ponta da unha, ela descascou a pintura do guarda-corpo.

— O meu medo é Gérard tentar fazer Lara ficar aqui. Não sei. Se ele pedir, talvez...

Will esperou, mas ela não deu voz ao pensamento. Se ele pedir, você acha que ela fica.

Lara era apaixonada por aquele marido até então sem um rosto definido para Will. Quando ouvia o nome dele sair da boca de Lara, Will imaginava um cara alto, um francês malhado e bonitão que era o sonho de consumo de todo os seres humanos. Quando era Maria quem dizia o nome de Gérard, a imaginação vívida de Will o trazia como um rato esquisito de desenho animado, uma versão humana de Pinky, de Pinky e o Cérebro.

— Enfim, deixa pra lá. — Maria sorriu, estalando os dedos para afastar o pensamento. — Precisamos descobrir algo forte. Se tiver provas, melhor ainda. Você ainda está comigo nessa?

O tom das palavras dela fez com que Will se sentisse como o protagonista num filme de gangues, desses que entram nos guetos para comprar alguns gramas de cocaína de um traficante encapuzado antes de entrar em confronto com a polícia. O olhar de Maria, como o do traficante imaginário, pressionava Will com força. Sem graça, ele assentiu.

— Agora chega aqui — sussurrou ela, olhando para os dois lados antes de se aproximar ainda mais dele. Quando o cotovelo de Maria tocou o dele no guarda-corpo, Will se encolheu um pouquinho. No mesmo tom de quem faz uma fofoca boa, Maria continuou: — Que porra foi aquela entre Damian e Lara no teatro e na hora do jantar? Toda aquela... aquela troca de olhares na hora da pizza...

Will sorriu para os motoqueiros do estacionamento, ajeitando os óculos no nariz.

Depois daquela cena esquisita no saguão do teatro, Damian pedira duas pizzas gigantes para o jantar tão logo chegaram ao Super 7. Reunidos no quarto das moças, apertaram-se no sofá puído, deixando as caixas das pizzas abertas sobre a mesinha de centro e devorando tudo entre risadas e comentários sobre a apresentação do grupo de Amy.

Durante o jantar, Damian não tirou os olhos de Lara nem para pegar outro pedaço de pizza. Lara, por outro lado, sorria sem graça para ele entre uma história e outra de Giorgia ou Maria, tentando ignorar as atenções que recebia. Só que Will havia percebido, tão logo Damian desviava a atenção para responder alguma pergunta da sempre curiosa Alessia, que Lara o observava com o canto dos olhos e as bochechas coradas.

Damian e Lara, pensou ele, sorrindo diante daquele par tão diferente, porém complementar. Naqueles segundos de silêncio, Will gostou da ideia de ver o melhor amigo apaixonado por alguém tão especial quanto Lara.

— Fora isso, ainda temos as garotas chamando Damian de babbo. — Sem saber o que se passava dentro dele, Maria riu com o cenho franzido. — Dio, cada vez que elas chamavam o cara assim, pensei que a cabeça de Lara fosse explodir.

— Damian não faz ideia do que a palavra significa — respondeu Will, repreendendo um sorriso. Maria ergueu os olhos para ele. Sem graça por ter deixado o pensamento escapar, Will pigarreou. — Quando descobrir, acredito que vá surtar. Ou adorar e agir como um papai babão.

Maria apertou o guarda-corpo e semicerrou os olhos, desconfiada.

— Você está sabendo de alguma coisa? — perguntou ela. Will não respondeu, e a expressão inteira de Maria se alterou. — Porca vacca, você está sabendo de alguma coisa!

Saber, Will não sabia, mas depois da festa os sinais não demoraram a surgir. Damian, discreto como um elefante dirigindo um carrinho de golfe, era incapaz de desviar os olhos de Lara por muito tempo ou ficar sentado quando ela entrava no cômodo.

Além disso, enquanto Maria fazia a maquiagem de Amy no posto, Will vira Damian comprar um saquinho de biscoitos decorados com a bandeira da Itália e dá-lo de presente à Lara. Por estar longe, Will não saberia dizer qual dos dois estava mais sem graça, se quem dava ou quem recebia os biscoitos.

— Ei! — Maria o empurrou pelo braço. Will ajeitou os óculos. — Me. Conta!

— Eu não... não sei de nada — respondeu ele, pigarreando. — Damian é muito fechado sobre essas questões.

— Qual é! — Ela soltou uma risada sarcástica e ergueu as sobrancelhas. — Os caras sempre comentam esse tipo de coisa.

— A sua afirmação é uma péssima generalização. Hoje em dia...

— Corta essa, cara! — Maria riu, fincando os cotovelos no guarda-corpo. — Damian olhava para Lara como se quisesse arrancar as roupas dela e transar no saguão do teatro.

— Você é uma pessoa meio... meio gráfica — comentou Will, ajeitando os óculos para esconder o embaraço.

— Você não comentaria com ele se tivesse rolado algo com una bella ragazza?

As orelhas de Will esquentaram. Ele e Damian não possuíam o costume medonho de se gabar de conquistas amorosas porque, no fundo, nunca precisaram disso. Will era apaixonado demais por Maria para falar sobre o tópico e Damian, noivo de Irina há tanto tempo, não tocava no nome dela se não fosse para reclamar ou rir das ideias globalizadas da noiva. E daquele maldito ar polonês, pensou Will, rindo com o canto dos lábios.

— Não vale mentir, hein? — brincou ela. — Comentaria ou não?

— Dificilmente — respondeu ele. — Minha vida amorosa não é tão... movimentada.

— Conta outra! A Anne do Marketing te dá o maior mole! — Maria riu, fazendo com que uma mecha de cabelo caísse por seu rosto. Enfiando-a para trás da orelha, ela continuou: — Pensei até que vocês saíam, cara...

Will piscou, surpreso por Maria tocar no nome de Anne.

De maneira resumida, Anne do Marketing era uma morena deslumbrante de 1,70 m de altura, olhos verdes, sorrisos delicados, inteligência afiada, personalidade encantadora e com todo o potencial para estampar a capa da Vanity Fair. Queridinha da agência, dos homens, das mulheres e de todo o prédio, Anne era a profissional e o ser humano que todos gostariam de ser. Ela era o tipo de pessoa que reciclava o próprio lixo, mas que não se gabava sobre o fato e nem tentava convencer os outros a fazer o mesmo. Anne era esse tipo de pessoa.

Olhando de esguelha para Maria, que agora se dependurava no guarda-corpo como uma adolescente num show de rock, Will sorriu sem vontade. Era uma pena, mas Anne do Marketing não era a mulher que chamava sua atenção. Se fosse a moça das cópias, entretanto...

— Anne? — perguntou ele, sem saber o que deveria dizer.

— Você não percebeu?! — Maria riu, fincando os cotovelos no guarda-corpo. O cheiro de cigarro mentolado invadiu os pulmões de Will, e mais latas de cerveja foram abertas. — Cara, só falta ela se jogar em cima do seu colo e esfregar a calcinha no seu nariz!

— Você é uma pessoa muito gráfica — disse ele, franzindo o cenho para a cena que se desenhava com cores vívidas em sua mente. Maria riu outra vez. Antes que o silêncio ficasse bizarro demais, Will completou: — Não estou interessado em Anne.

Va bene, mas você precisa admitir que ela tem uns peitões...

Os dois se olharam antes de caírem na gargalhada. Em meio à crise de riso nada mais importava; o cheiro de cigarro mentolado, as piadinhas sujas, as latinhas sendo abertas e as risadas bêbadas dos motoqueiros não passavam de figuração medíocre onde Maria era a atriz principal.

Quando recobraram o controle, a barriga de Will doía. Com o sorrisinho ainda preso aos lábios, Maria o empurrou com o ombro. Como se partilhassem um segredo sujo, ela se inclinou no guarda-corpo e disse:

— Ei, você deveria rir mais. — Ela soltou uma risada gostosa de ouvir. — Você fica uma graça quando ri, sabia? Vai ver é por isso que a Anne está tão na sua, garanhão.

— Vou tentar me lembrar disso no futuro — disse ele, sem graça.

Ela sorriu como se fosse a coisa mais normal do mundo elogiar o sorriso de alguém e chamar essa mesma pessoa de garanhão na frase seguinte. Maria suspirou e, olhando para as luzes noturnas de Miami como se fossem suas velhas conhecidas, disse:

— Isso tudo é louco, não é? Muito louco. — Maria riu, dando de ombros. — Você é meio que meu chefe, mas a gente passou por tanta coisa nesses dias que às vezes parece que somos muito mais. Acho que é por isso que eu fico triste, sabe? Não queria que isso acabasse.

— Isso o quê? — perguntou ele, ansioso.

— Nós. — Ela riu e o encarou. A mecha selvagem de cabelo caiu por seu rosto, e aquele cheiro de erva doce e balinhas de framboesa atingiu Will com a força de um soco. — Formamos uma boa dupla. Socando Rob Filho, tirando as tatuagens da sua cara, enchendo a cara, fazendo planos para acabar com Gérard e ajudando Amy. É. Somos, tipo, Batman e Robin chutando a bunda dos caras malvados. Mas admito que no início achei que você não gostasse de mim, cara.

— O quê? — perguntou ele, virando o rosto. — De onde você tirou isso?

— Sei lá. Você sempre parecia meio... ansioso para se livrar de mim.

Aquela falta de traquejo social ainda o mataria. Carly, sua última namorada, havia dito o mesmo quando engataram um relacionamento. "Sabe, no início achei que você não gostasse de mim, Will. Se Jenna não tivesse me contado que era você quem deixava aqueles biscoitos de gengibre na minha mesa, eu nunca teria imaginado", dissera ela, rindo enquanto Will abria um vinho. Ele e aquela mania de não conseguir demonstrar os próprios sentimentos.

E o problema é que não acontecia apenas nos relacionamentos amorosos. Will não se sentia confortável com colegas de trabalho, ligações telefônicas e muito menos festas de final de ano. Todo tipo de relacionamento parecia trabalhoso e impossível, um fardo a ser administrado com a atenção e paciência de um monge budista.

(O que era ruim no cotidiano, piorava durantes as festividades. A ansiedade era tanta no final de ano, que todo Natal ele enviava uma gravata estampada ao oftalmologista que o atendia, mas era incapaz de demonstrar, de dizer o quanto o Dr. Yul era competente, apertar sua mão ou perguntar sobre sua família.)

Will fazia de tudo para ver Maria feliz, mesmo sabendo que corria o risco de parecer um apaixonado psicótico como os protagonistas daqueles romances eróticos medonhos. O que o fazia dormir à noite — e o que o separava, em certa medida, dos caras assustadores — era a consciência de que se um dia recebesse um "não" de Maria, tentaria esquecê-la por bem ou por mal.

Quando o silêncio e os pensamentos ameaçaram esmagá-lo, Will disse:

— Sinto muito. Não tenho facilidade para... conversar. Sei que às vezes pareço distante e desinteressado, mas eu... eu adoro você, Maria. De verdade.

— Eu sei. — Ela riu. — Me acostumei com o seu jeitão. E não queria me afastar de você.

Depois de um breve silêncio onde a existência inteira de Will pareceu pegar fogo, ele sorriu e ajeitou os óculos.

— Fique tranquila porque não vai acabar — disse ele. Sem graça debaixo do olhar confuso dela, completou: — Você e eu. Nós. Não vai acabar. Sempre... existirão caras malvados por aí.

— Espero que eles existam aos montes em Nova York. — Ela riu. — E já sei quem vai ser o primeiro alvo quando voltarmos.

— Quem? — perguntou ele, confuso.

— Um cara bizarro que anda rondando o prédio — disse ela, fazendo uma careta. — Sério, ele vive de boné e fazendo entregas lá em casa fora do horário comercial. Até comentei com Lara, mas ela disse que eu estava sendo paranoica.

Will ficou rígido, as mãos suando. Merda, o horário comercial me entregou. Como ficava na agência o dia inteiro, Will só conseguia realizar as entregas dos vales da Casa do Waffle e da revista preferida de Maria quando terminava o expediente. Como não havia pensado nisso?

— E o que ele... entrega? — perguntou ele.

— Uns vales da Casa do Waffle, uma revista que eu adoro. Sei lá, cara — disse Maria, apertando os olhos para um inimigo invisível. — Tudo é muito suspeito. E se ele for um tarado querendo se aproveitar das meninas?

E o maior medo de Will se concretizava: ser visto como o tarado maluco e molestador de crianças. Ele engoliu em seco.

— Hm, talvez não. Talvez ele só... só queira fazer o bem.

— Conta outra! — Ela riu. — Esse cara deve ter algum motivo, mas ele vai se ferrar porque já planejei tudo. Ele não tem um padrão fixo, mas sempre aparece à noite, quando o trânsito é menos intenso. A única vez que consegui ver o cara, ele sumiu na esquina, e isso diz muita coisa.

— Diz? — perguntou ele, aturdido.

— Claro, cara! Tem uma Casa do Waffle naquela esquina — respondeu Maria. — O cara pode ser funcionário de lá, ou alguém importante da franquia. Pensa só. Ele sempre deixa quatro vales de 25 paus a cada quinze dias. São oito vales por mês, o que totaliza duzentos paus em comida, mais o valor da revista. Duas por mês, a oito paus cada, é dezesseis paus a mais na conta. São 216 paus por mês, quase 2600 por ano. E considerando que isso acontece há uns três anos, vira uma fortuna de... uns 7800 paus até hoje. Esse cara está gastando com a gente por algum motivo.

Ele nunca havia parado para calcular os gastos. E nunca havia pensado que Maria tivesse facilidade com cálculos. Will ficou em silêncio, as sobrancelhas franzidas.

— O que foi? — perguntou ela.

— Você calculou tudo isso... de cabeça?

— É claro. Sempre gostei de matemática.

Havia algum jeito de tornar aquela mulher ainda mais fascinante? Difícil. Will ajeitou os óculos.

— Hm, certo. Veremos isso na volta. Não se preocupe — assegurou ele, olhando de esguelha para ela e pensando em como mudar de assunto. — Nova York vai estar cheia de caras maus. Todos aqueles filmes de super-heróis não podem estar errados. Hollywood não seria capaz de nos enganar assim.

— É, acho que sim. — Maria riu e se espreguiçou. — Bem, vou indo lá, cara. Amanhã o dia vai ser cheio e quero estar bem descansada para encontrar aquele testa di cazzo. Buonanotte.

— Maria.

Ela já tinha a mão na maçaneta do quarto quando ele a chamou. Na luz do luar do segundo andar daquele motel caindo aos pedaços, Maria o encarava, esperando pelas próximas palavras de Will com a expressão curiosa de sempre.

Ele apertou o guarda-corpo enferrujado com força, sentindo as palavras se desfazerem em sua boca como fumaça.

Damian sempre perguntava o porquê de Will nunca convidar Maria para um café, almoço ou jantar. "O máximo que pode acontecer é ela não querer, cara", dizia ele, mas não era tão simples. Will sempre cumprimentava Maria quando passava pelo balcão de cópias da agência, mas chamá-la para sair era um passo que ele nunca estaria pronto para dar.

Will sabia que não era o tipo de Maria. Ela se envolvia com caras audaciosos que sabiam como falar com as mulheres, caras excitantes e perigosos com histórias e atitudes interessantes. Calvin Carter, um dos diretores de arte da agência que vivia flertando com Maria no balcão de cópias, parecia ser um desses caras. Sempre com uma risadinha sacana ali, um convitezinho sem pretensão ali. Era apenas questão de tempo para que Maria decidisse dar uma chance a ele. Caras como Carter sempre levavam vantagem. A vida nem sempre era justa.

Caras que organizavam os discos por ordem alfabética, que não saíam nas noites de sábado e que escolhiam dormir na casa dos pais ou no sofá do melhor amigo para não ficarem sozinhos em casa — mesmo tendo um apartamento razoável numa boa parte da cidade —, não faziam o tipo de Maria. Não faziam o tipo de mulher nenhuma, na verdade.

Então, naquele motel barato em Miami, Will perdeu a coragem de chamar Maria para sair, de dizer que Anne do Marketing, com sua perfeição toda, não chegava aos pés da moça das cópias. Corado e sem saber o que dizer, ele ajeitou os óculos, sentindo o remendo feito com Band-Aids da Hello Kitty roçar na pele de seu nariz.

— Será um prazer chutar a bunda dos caras malvados com você, Maria.

Ela riu. O coração enlouquecido de Will sorriu de volta.

— Pode apostar que sim, cara.

Maria piscou e sumiu pela porta.

Sozinho entre o som de risadas grosseiras e latas de cerveja sendo abertas, Will apoiou os cotovelos no guarda-corpo. O cheiro de erva doce e balinhas de framboesa deu lugar ao odor viciado de cigarros mentolados, suor e cerveja. Will suspirou.

Pelo menos podia se orgulhar de ser o Robin de Maria.

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