10. igual a ela

DAMIAN

Damian parou o carro no posto de gasolina em Virgínia — exatamente como estipulado no roteiro de Will — e checou o novo pneu enquanto todos desciam.

Apesar de o estepe estar desregulado e de a lataria prateada estar arranhada, até que a minivan aguentara bem o tranco do acidente e da troca inesperada do pneu, que pelo menos rodara até o posto sem explodir nas três horas silenciosas que levaram para chegar ao estado da Virgínia, apelidada carinhosamente pelos americanos como A Mãe de Todos os Estados.

— Vamos ao banheiro, meus amores? — Lara apertou as meninas contra si, saindo para o calor do posto. Um cheiro delicioso de café e salsichas fritas no palito fizeram Giorgia e Alessia voltarem a atenção para a loja de conveniência. Lara apertou mais forte as filhas. — Vamos, queridas?

— Deixa comigo, sorella. Também preciso ir. — Maria sorriu e deu tapinhas nos traseiros das garotas, que soltaram risinhos infantis enquanto se afastavam. — Quem quer fazer xixi com a titia?

Damian engatou a bomba de combustível na minivan e espiou a vizinha por cima do teto do carro. Lara se espreguiçou, fazendo sua camiseta de Mickey Mouse velha subir um pouco. Ele franziu os lábios, apertando a bomba. Observando a garota e Will — que graças à Maria estava com os óculos de volta ao rosto — comprarem doces e porcarias na loja de conveniência, Damian trocou o peso entre os pés. Lara está sempre cuidando de todos, e eu fui um imbecil com ela.

Ele se sentia péssimo por ter criado aquele clima horrível com Lara, que não abrira a boca nas três horas em que levaram de Maryland a Virgínia. Salvo quando as meninas pediram sua opinião no vestuário de uma das Barbies ou contavam alguma piada, Lara mantivera a expressão imutável, sem dizer uma palavra a ele desde que discutiram sobre o pneu.

O tanque da minivan encheu rápido demais. Lara se afastava do carro, indo em direção ao banheiro quando, sem pensar, Damian pediu:

— Podemos conversar? — Ela ficou em silêncio. Ele recolocou a bomba de gasolina no lugar e coçou a cabeça. — Preciso pôr ar no pneu novo e... e depois trocamos uma palavra?

Os lábios dela estavam crispados e seus olhos verdes miravam um ponto acima da cabeça dele. O som de carros indo e vindo e de caminhoneiros conversando em vozes graves era quase bem-vindo depois da quietude sepulcral daquelas três horas. Lara olhou para ele com aquela expressão de Não faça eu me arrepender estampada no rosto e disse:

— Espero por você na mureta em frente à loja.

Ela não esperou resposta. Ainda com o sobrolho franzido, Lara se sentou perto de um pequeno canteiro de flores e cruzou os braços, observando os carros irem e virem das bombas, ouvindo a conversa rude dos caminhoneiros sem realmente escutar. Enquanto enchia o pneu, Damian pensava no que dizer.

Sinto muito por ter sido um imbecil com você. Gosto de ser imbecil, mas não com você. Terrível. Damian tinha certeza de que Lara o odiaria ainda mais se ouvisse aquilo. Cansado, ele recolocou a mangueira de ar no lugar e deu uma olhadinha para dentro da loja de conveniência. Sentados numa mesinha redonda e suja, a garota e Will recarregavam o videogame portátil e comiam chocolates, as cabeças quase unidas para enxergar melhor a telinha brilhante. Bom. Assim teremos mais tempo.

Damian bateu a porta do carro e se sentou ao lado de Lara na mureta, apertando as mãos umas nas outras. Nenhum dos dois falou, preferindo ouvir os sons de Virgínia.

Alguns pássaros tentavam cantar, mas as buzinas abafavam seu canto. As vozes dos caminhoneiros, trocando informações sobre direções e melhores lugares para parar também não ajudava os pobres pássaros, que passaram zunindo pelo posto, ganhando o céu e sumindo no horizonte. Damian pensou em algo melhor para dizer, mas não conseguiu.

— Sinto muito por ter sido estúpido com você, Lara.

Lara não o olhou, pelo menos não de imediato. Ela observava o movimento das bombas e dos motoristas, compenetrada em tudo, exceto em suas palavras.

Damian suspirou com a ideia de estar treinando para o casamento, pedindo perdão por tudo o tempo todo. Sinto muito por ter sido estúpido com você, querida. Sinto muito por não ser o que você queria, querida. Sinto muito por ter cinco anos de idade, querida.

Damian tinha horror a pedidos de perdão. Em sua — nem tão — vasta experiência com mulheres, o perdão só levava a mais brigas. Irina tinha a habilidade invejável de acreditar que todos os seus pedidos de desculpas eram falsos, um recurso sorrateiro para terminar as discussões. Irina. Preciso resolver isso ainda.

— Você está perdoado — disse ela. Lara olhou para os próprios tênis, All Star brancos, e Damian percebeu que, assim como suas calças, os tênis também tinham pequenas manchinhas de tinta colorida. — Acho que todos ficamos um pouco nervosos, mas não retiro o que eu disse.

Ele franziu o cenho e reordenou os pensamentos. Damian estava com a resposta pronta caso ela duvidasse de seu pedido de perdão. A mudança brusca desestruturou sua linha de raciocínio, e ele disse a primeira coisa que surgiu em sua cabeça:

— O que você quer dizer com isso?

— Quero dizer que o perdoo pela grosseria, mas que não retiro a parte sobre você precisar ouvir as outras pessoas. Às vezes você consegue ser um imbecil, mas lá no fundo sei que é uma boa pessoa.

— Eu sei. — Damian coçou a cabeça, tentando ler nos tênis de Lara a resposta certa. — Eu só... isso tudo é tão novo, eu não...

— Sei que é novo — interrompeu ela. Os olhos verdes de Lara se fixaram nos dele. Damian notou pequenas manchinhas castanhas ao redor de suas íris. — Eu sei que para um cara como você viajar com crianças e outras pessoas é um saco e que adolescentes são um porre, mas eu sei, mais do que tudo, que a sua atitude não ajuda em nada. Aprenda a ouvir. Ninguém quer acabar com você, Damian. Queremos ajudar, si?

Ele ficou em silêncio, incapaz de dizer qualquer palavra. Lara tinha tanta, tanta, tanta razão que Damian preferiu se calar. De repente, ele sentiu vergonha. Vergonha por ter ignorado os conselhos de Lara e, por mais incrível que fosse, por ter gritado com a garota. Sem graça, Damian baixou o rosto e murmurou:

— Eu só queria saber o que fazer.

— Relaxe. — Ele ergueu a cabeça e percebeu que um pequeno sorriso iluminava o rosto e os olhos verdes dela. — Nem sempre as coisas vão sair como você quer, mas elas se ajeitam.

— Como você consegue? — perguntou ele, o cenho franzido. Lara esfregou com a ponta das unhas sem esmalte uma mancha de tinta verde nos jeans, encarando-o com uma expressão confusa. — Ser tão... sei lá. Parece que você sempre sabe o que dizer e o que fazer. Isso é tão... tão raro.

As bochechas dela ficaram vermelhas. Lara sorriu sem graça, puxando o rabo de cavalo por cima do ombro.

— Bem, as coisas também não são assim...

Eles se calaram e ouviram os sons do posto de gasolina. Damian gostava de ficar em silêncio com Lara. O cheiro forte de café, gasolina e gordura das salsichas fritas ainda chegava até eles, mas pela primeira vez na viagem ele não sentiu nada além de paz. Os caminhoneiros gritavam e os carros passavam zunindo pelo posto, porém Damian respirou aliviado, relaxando na mureta.

— Obrigado por me perdoar.

— Bem, não poderíamos ficar com isso entalado até a Flórida, não? — Ela sorriu.

— É, acho que não.

Os dois ficaram em silêncio. Damian teria dito outra coisa, mas foi trazido de volta à realidade barulhenta do posto de gasolina pelo olhar sem graça que Lara tinha no rosto.

Dio mio, Maria...

Acompanhando o olhar dela, Damian riu.

Na frente da loja de conveniência, Maria, ladeada por Alessia e Giorgia, abraçou o pescoço e beijou as bochechas de um Will rígido feito pedra, mas de óculos no rosto. Damian podia jurar que a garota, um pouco afastada dos outros, sorria com o canto dos lábios.

— Às vezes Maria passa um pouquinho dos limites — comentou Lara, franzindo o cenho para a irmã mais nova.

— Não se preocupe — disse Damian, rindo. — Will adoraria se ela passasse muito mais dos limites...

— O que você quer dizer com isso?

Damian não teve tempo de responder. Enquanto observava o olhar confuso de Lara, Maria apareceu com as meninas, algumas mechas selvagens de seu cabelo negro caindo pelos olhos. Ela sorria tão abertamente que parecia uma criança em dia de Halloween, segurando um pacote de M&M's.

— A zietta Mimi ganhou M&M's do Sr. Greene, mamma! — anunciou Alessia, os olhinhos brilhando.

— Um saco muito grande, mamma! — complementou Giorgia, abrindo os braços magricelas para ilustrar o tamanho do pacote.

Lara sorriu para as filhas, mas o olhar que lançou à irmã mais nova não foi muito agradável. O olhar cansado e ligeiramente repreensivo de Lara era o mesmo que a mãe de Damian costumava usar quando ele e a irmã comiam a sobremesa antes do jantar.

— E posso saber por quê?

— Porque encontrei os óculos dele embaixo do banco — respondeu Maria com um sorriso, rasgando o lacre da embalagem e enfiando um punhado de chocolates na boca. As meninas puxaram sua blusa folgada e ela riu, descendo o saco para Giorgia e Alessia. — Vocês vão querer?

— Não, obrigado. — Damian se ergueu quando Will voltou sozinho. Ele cerrou a mandíbula ao ver os cabelos negros da garota entrarem na loja. — Já volto.

— Lembre-se do que conversamos, sim? — pediu Lara.

Ela sorriu como quem diz Vá com calma enquanto as garotas e Maria se acabavam nos chocolates. Will, ajustando os óculos no rosto, observava Maria enquanto ela atirava os M&M's para cima, engolindo-os no ar e arrancando risadinhas das garotas. Damian assentiu e sorriu para Lara antes de se afastar.

Ele entrou na loja de conveniência e foi recebido pelo cheiro envolvente de café forte e hambúrgueres novos. Dois caminhoneiros ocupavam uma mesinha minúscula no canto e riam alto, devorando salsichas, hambúrgueres e copos de milkshakes com rapidez. Damian viu, entre as gôndolas abarrotadas de salgadinhos e chocolates, a cabeleira negra dela parar em frente a uma geladeira.

Você precisa ir com calma, porra. Ele se aproximou devagar. Ela lia o rótulo de uma bebida vermelha. As unhas pintadas de preto da garota começavam a descascar nas pontas, e seus dedos finos seguravam a garrafa como uma garra. Damian engoliu em seco antes de perguntar:

— Tudo certo?

Amy virou a cabeça devagar. Seus olhos azuis se fixaram nos dele, e ela o avaliou de cima a baixo, como se ele fosse uma mercadoria, e ela, um comprador em potencial sem muito interesse. Por que você tem todos os trejeitos de Diane, garota?

— Já estou voltando ao carro — anunciou Amy numa voz sem expressão. Os caminhoneiros riram outra vez. O som da máquina de café fez o estômago de Damian se retorcer. Ela esperou, olhando para ele com um misto de irritação e desinteresse. — Mais alguma coisa?

Ele ia retrucar, mas não o fez. Damian respirou e se acalmou, contando até três. Cara, você precisa ser mais como a Lara.

Lara não discutiria com uma adolescente gótica e arrogante porque ela era madura o suficiente para não bater boca com crianças. Porque Lara sempre sabia o que fazer. Damian quis que Lara estivesse ali com ele. Lara com certeza saberia o que dizer. Que merda.

— Eu sinto muito se fui estúpido.

Amy franziu o cenho e fechou a geladeira. Uma risada baixa e desaforada escapou de seus lábios pálidos no exato momento em que Damian começou a ficar nervoso.

— Estúpido? Você foi um imbecil. — Ela colocou uma mecha de cabelo negro para trás da orelha e esperou por uma resposta que não veio. — O que foi? O gato comeu sua língua, cara?

Era a primeira vez que Damian olhava de verdade para Amy. O rosto dela era pálido e meio pontudo, com as sobrancelhas espessas e o nariz arrebitado. Ela usava uma daquelas gargantilhas de plástico preto no pescoço fino e uma maquiagem pesada que realçava o azul de seus olhos.

Apesar do cabelo pintado e das roupas negras — MORTE AO SISTEMA, dizia sua camiseta rasgada —, Damian se sentiu na presença de Diane naquela loja de conveniência imunda perdida em algum lugar da Virgínia. Como isso pode acontecer se Diane está morta, porra?

Ele foi assaltado pela falta de Diane de uma maneira tão brusca que quis se trancar no carro, ouvir a música deles e chorar até aquele vazio ser preenchido.

— Você é igual a ela.

Não era a melhor coisa a ser dita, mas escapou. Apesar de o estilo das duas serem opostos, os trejeitos da garota eram a pintura vívida dos de Diane.

Os caminhoneiros riram mais uma vez, mastigando seus hambúrgueres como homens das cavernas, e a televisão mostrou uma perseguição de carros. Amy não sorriu, apenas o encarou profundamente antes de se interessar pelas próprias botas de combate.

— Eu só... — começou ele.

— Tudo bem — interrompeu ela, levantando o rosto e olhando para todos os cantos, menos para ele. — Vou até o caixa.

Damian grunhiu e pegou um saco de Doritos de uma gôndola. Ele lançou um sorrisinho irritado aos caminhoneiros, que tocaram seus bonés em resposta, e se encaminhou para o caixa. Que coisa idiota para dizer.

Amy pegou chicletes e dois bolinhos do balcão, seu nariz arrebitado erguido para a atendente. Damian esperou atrás dela, percebendo que até a parte de trás da cabeça da garota, também, era igual à de Diane.

— Seis e setenta e cinco — disse a moça do caixa, mascando um chiclete de uva sem fechar a boca.

Amy vasculhou os bolsos das calças skinny. Uma nota de cinco libras esterlinas escapou de seu bolso traseiro e ela praguejou baixinho naquele sotaque de Edimburgo que deixava todos os palavrões coloridos. A moça mascou o chiclete mais alto e encarou a garota com olhos mortos.

— Eu pago — disse ele, puxando a carteira.

— Não precisa, eu... — Amy ficou vermelha quando trocou um olhar com a moça do caixa, que mirava os dólares na carteira e a garota gótica como se estivesse numa partida de ping-pong. — Não quero que você pague.

— Tudo bem. Você paga a próxima.

Os dois saíram em silêncio da loja de conveniência. Damian entregou as compras de Amy. Os dedos dos dois se tocaram e ela se retraiu, enfiando outra mecha de cabelo para trás das orelhas. Permaneceram envolvidos naquele silêncio estranho, esperando o outro dizer alguma coisa. Qualquer coisa. Ele olhou para a minivan e viu Maria e os outros acenando do lado de fora.

— Valeu, cara — murmurou Amy, afastando-se com passos rápidos.

Uma buzina de caminhão soou e Damian ficou parado, a sacola nas mãos e cheio de palavras entaladas na garganta.

— Sem problemas, garota — disse ele.

Mas ela já estava longe demais para ouvir.

---

Quando pegaram a estrada mais uma vez, o clima dentro da minivan era silencioso. Damian se sentia melhor por ter pedido perdão à Lara, mas o que o incomodava, de verdade, era a garota. Pelo retrovisor, viu que ela olhava para fora, apesar de o videogame portátil estar carregado e funcionando perfeitamente.

— Isto é de alguma de vocês? — perguntou Will, erguendo uma cartela branca no ar.

As mãozinhas ávidas de Alessia surrupiaram a cartela antes que Damian pudesse enxergar melhor o que era. Lara repreendeu a filha, que surda às reclamações da mãe, sorria de orelha a orelha para Giorgia.

— São tatuagens das Princesas! — exclamou Alessia. — Podemos ficar com elas, mamma, por favor?

— Não vai fazer falta? — Lara se virou para encarar Will com aquela expressão de Não vai mesmo fazer falta? cravada em seu rosto. — Porque se fizer, nós...

— Não. Provavelmente deve ser de uma das escoteiras que mamãe leva para passear aos domingos — respondeu Will. — Elas perdem cada coisa esquisita no carro. Da última vez encontrei um aparelho ortodôntico e um par de meias coloridas.

Lara sorriu.

— Como se diz, meninas?

— O senhor pode brincar com a gente depois? — perguntou Giogia, ajoelhando-se no banco e olhando para Will.

Através do espelho retrovisor, Damian viu o amigo se encolher um pouquinho.

Will tinha medo de crianças desde que seus dois sobrinhos, filhos de Anna, esconderam pedacinhos de camarões em seu prato, causando uma ida de emergência ao hospital na noite de Ação de Graças. Nem todo o anti-histaminíco do mundo fora suficiente para que Will superasse a desconfiança e o receio que o dominavam quando crianças entravam em cena.

— Meninas! — interveio Lara, antes que Will respondesse. — Não incomodem o Sr. Greene. Ele já foi muito legal em dar as tatuagens a vocês.

— Apenas Will está ótimo, Lara — pediu ele, a voz implicando uma ajeitada nervosa dos óculos.

— Não se preocupem, garotas. — Maria riu e apoiou as costas na porta do carro. — Eu brinco com vocês quando fizermos a próxima parada, si?

— Eu também posso brincar. — A resposta de Will foi tão imediata que Damian viu pelo retrovisor as sobrancelhas de Maria se franzirem. Cara, não soe tão desesperado. Will estava vermelho da cor dos próprios cabelos. — Se vocês ainda me quiserem na brincadeira, é evidente.

— É claro que queremos — afirmou Giorgia, rindo. Alessia assentiu vigorosamente. — Vai ser o máximo!

— E como dizemos quando as pessoas são legais com a gente, queridas? — Lara sorriu, mas não se virou para trás desta vez, quase como se soubesse que as filhas dariam a resposta certa.

Grazie mille, Sr. Greene! — Ambas as vozinhas ressoaram pelo carro.

Damian apoiou uma das mãos na porta do carro, sentindo uma súbita alegria que não combinava com o maldito reflexo de olhos cansados e barba por fazer que via no retrovisor. Lara sorria ao seu lado, mirando a longa estrada que se abria em frente, uma música folk tocava num volume muito baixo no rádio e tudo ia bem.

Pelo menos até agora. Depois de dois engarrafamentos, uma quase morte e um pneu furado, eles estavam bem, por mais incrível que aquilo parecesse. Eles estavam bem. Em breve estariam na Flórida e Damian se veria livre daquela garota insuportável que era uma cópia de Diane em todos os sentidos.

Ele apertou o volante e deu olhadela pelo retrovisor. A garota jogava com Will, mas Damian sabia que ela estava esquisita. Ele sabia que ela era, essencialmente, esquisita, entretanto Amy estava esquisita de um modo diferente. Eu não deveria ter dito aquilo, ele pensou, concluindo que dizer a sua recém-descoberta filha que ela se parece com a mãe morta não é muito promissor.

Mas foda-se, certo? Damian não se relacionaria com a garota, então por que se preocupar? Não se importaria em pagar o que quer que fosse de pensão à avó, afinal era, querendo ou não, pai de Amy. Ele apoiou o braço esquerdo na porta do carro. Pagaria uma boa pensão e nunca mais olharia para aquela cópia de Diane. Estava decidido.

Ele suspirou e quase sorriu com aquela resolução tão inteligente que levara tanto tempo para surgir. Nada o abalaria. Estavam na Virgínia, no início da viagem, e ele tentaria ser positivo e relaxado como Lara. Nada o abalaria. Nada.

A tela multimídia do carro piscou, indicando uma ligação. Damian abaixou os olhos para o painel, assim como Lara, e sentiu os ombros se retesaram quando viu de quem era a ligação. Ai, caralho, lá se vai minha vibe budista.

O visor piscava com o pequeno ícone do celular vibrando ao lado da identificação. I. Berliv. Damian apertou o volante, olhando fixo para frente e ignorando o nome da noiva no painel. Lara franziu o cenho.

— Você não vai atender?

— Não, eu... — O toquezinho polifônico continuou, e apesar de o ar-condicionado estar numa temperatura baixa, Damian suava. Atrapalhado, ele apertou o botão para ignorar a chamada. — Eu retorno a ligação mais tarde.

Ele imaginou Irina furiosa, apertando o celular nas mãos e ficando com as orelhas vermelhas de raiva. Damian teria rido se estivesse junto a ela, mas como estava distante, permaneceu receoso. Irina odiava ser ignorada. De todas as merdas que ele poderia fazer, ignorar a noiva estaria no topo da lista de atos imperdoáveis. Vou me incomodar pra cacete quando voltar. Ele suspirou e aumentou um pouco o volume do rádio.

— Sobraram alguns sanduíches. Alguém vai querer? — Lara ofereceu, remexendo na sacola que trazia a seus pés.

Maria, as garotas e Will aceitaram, e logo o carro ficou tomado pelo cheiro de pão e presunto. Pelo retrovisor, Damian recebeu um olhar penetrante de Will. Ele desviou o rosto antes que se sentisse mais culpado e percebeu que Lara lhe estendia um sanduíche.

— Guardei um para você.

— Valeu, Lara.

Ele sorriu de volta e pegou a embalagem de papel filme, tentando driblar os próprios pensamentos. Apesar dos esforços, foi inútil. Damian enxergava o rosto furioso de Irina em cada placa e casinha mal acabada da Virgínia, em cada carro cheio de adolescentes que passava por eles na estrada.

Preciso voltar para casa, pensou ele, apertando o volante e mastigando o sanduíche como se fosse uma barra de ferro. Preciso voltar e resolver essa merda com Irina o mais rápido possível.  

Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top