XXXVI - O Armário

25/04/1888 - Quarta-Feira

- C-como?

Quase derrubei a xícara de café quente, de minhas mãos.

- Você me ouviu, - Bard cruzou os braços, olhando torto para os lados e mordiscando o cigarro doce em sua boca, já pela manhã. - desculpa por tudo isso aí. Você errou mas, m-mas eu sei que tinha outro jeito de resolver, tá?!

- A-ahm, tudo bem, Bard. Não tem problema!

Uou. Isso foi bem repentino!

Eu estava preparando a mesa de café da manhã, aproveitando que acabei acordando mais cedo que todos. Trinta minutos depois, Bard levantou e entrou na cozinha sem dizer um pio e, assim que terminei de arrumar a mesa, ele ficou me encarando de braços cruzados, no canto.

Por um bom tempo eu fingi não perceber, isso até ele dizer um "Me desculpa", de repente!

Não era bem o que eu esperava.

- Não mesmo?

- Não mesmo. Está tudo bem.

- Hm, - Seus pés bateram inquietos contra o piso. - eu fiquei sabendo que você e a Mey-Rin se resolveram.

Oh, agora fazia mais sentido.

- Sim, nós conversamos ontem. Estamos bem!

- É, bom saber. - Algo me dizia que a cara emburrada que ele fazia não era verdadeira! - Então, agora você e o Sebastian estão meio que juntos, é? Como que é essa história aí, em?

Juntos?!

- Ah?! E-eu não...

- BOM DIA!

- AH!

- AH!

Nos assustamos com Finny, que simplesmente surgiu da porta da adega, a chutando com seu pé e saindo com duas caixas imensas em suas mãos! A quanto tempo ele estava lá dentro?!

- Finny?! Você já estava acordado?! O que fazia lá embaixo?

- Ah, eu fui lá pegar umas coisas, só!

Naqueles infernais cinco dias, Finny foi o único que não se afastou totalmente. É claro, ele ficou mais distante, mas ainda me tratava bem e me pedia por biscoitos sempre que me encontrava na cozinha.

É fato, ser "um doce" ainda é uma das melhores habilidades dele.

- E que "coisas", hm? O que é esse tanto de caixa aí?!

- Ué, são meus matérias de jardinagem!

- Tudo isso?! Ficou doido, é?! Ainda tá chovendo lá fora e você, com certeza, não vai usar nada disso!

- Ah?! Por que não?! Eu não ligo pra chuva, eu gosto de me molhar!

- Tá tudo encharcado lá fora, garoto! E essas matérias aí são o olho da cara! Se você quebrar tudo de uma vez, o Jovem Mestre acaba com a gente! Vai descontar dos nossos salários!

- Ei, eu que sou o jardineiro! Eu sei o que estou fazendo! Além disso, o chefinho não ia fazer isso com a gente, Bard! Que coisa feia de se falar!

- Você não sabe nada, Finny! Para de drama e leva isso ai de volta!

- Não, não levo não!

- Ah, vai levar sim!

- Bom dia, Amelia!

Estava tão "entretida" com a boba discussão dos dois, que mal havia reparado em Mey-Rin, bem ao meu lado.

- A-ah! Bom dia, Mey-Rin.

- O que tá acontecendo?

- Finny quer fazer jardinagem na chuva.

- Jardinagem na chuva? Por que ele iria...

- Alguém pode me ajudar a resolver esse drama aqui?!

- Ninguém vai me impedir de cuidar das minhas plantinhas! Me solta!

- Suas "plantinhas" estão se embebedando de água lá fora, criatura! Para de drama! Anda, me dá essa caixa aqui!

- Vocês dois, v-vamos parar, por favor? Alguém vai se machucar! B-Bard, por favor, não mexe nas caixas dele!

- Tá brincando, você vai mesmo ficar do lado dele?

- Ha! A Mey-Rin gosta mais de mim!

- Seu fedelho!

É, eu não posso mentir, talvez eu realmente tenha sentido falta de como as coisas costumavam ser caóticas, quando se trata desses três.

Caóticas e felizes.




















[...]



















- Agenda livre?

- Sim, senhor. Devido às constantes chuvas, não há muito a se fazer. Todas as correspondências e assuntos da empresa foram, ao menos, temporariamente solucionados. Não há cartas do palácio ou qualquer pedido direto vindo da rainha.

- Então, posso "fazer nada" o resto do dia?

- Bem, efetivamente dizendo, sim.

- Quer dizer que você não pretende me encher o saco com suas aulas de citação, exercícios de álgebra, práticas de alemão ou latim?

- O senhor está se recuperando de um resfriado, por tanto... - Ele finalizou o nó em minha gravata. - comecemos devagar, sim?

Sebastian estava estranho.

Quando veio me acordar, pedi por mais cinco minutos e ele não hesitou em dá-los a mim; quando trouxe o desjejum me serviu dois generosos pedaços de waffles com mel e um copo leite; por fim, como acabou de fazer, não recheou minha agenda livre com tarefas extracurriculares e didáticas.

Com certeza havia algo errado, tinha certeza absoluta.

Mas, por via das dúvidas...

- Sebastian...

- Sim, Bocchan?

- Pretendo passar o dia na biblioteca.

- Como desejar.

- E, após o almoço, quero que me leve duas fatias de uma torta de ruibarbo.

Doces. Ele nunca me deixa...

- Deseja algum acompanhamento?

Basta, definitivamente há algo de errado com ele!

- O que deu em você hoje? Está tramando o quê?

- Perdão?

- Ora, vamos, eu não sou nenhum idiota. Cinco minutos a mais de sono, waffles com mel no café da manhã, nenhuma aula para encher 0 dia e nenhum protesto contra doces no meio da tarde? Você está esquisito, ou melhor, bizarro.

- Não entendo, Bocchan. Deseja que eu monte algumas aulas de literatura ou física para que o senhor passe a tarde...

- Não! Não, idiota! Não é disso que estou falando. - Massageei minhas têmporas. - Eu acho anormal da sua parte.

- Bem, como disse, o senhor está em processo de recuperação de um resfriado e baixa imunidade corporal. Por tanto passar por qualquer estresse, neste momento, afetará negativamente o...

- Você fez alguma coisa que eu não esteja sabendo?

- Não estou compreendendo seu ponto, Bocchan. Eu

- O que fez... - Inclinei meu rosto em sua direção, o encarando com meus olhos bicolores, realmente curioso. - ontem? Hm? Alguma coisa aconteceu, certo?

Havia algo faltando, tinha absoluta certeza. Conhecia Sebastian com a palma de minha mão e com meu total olho direito!

Em todo esse contrato, minha melhor decisão foi estabelecer a regra do "não mentir".

- Sim, senhor.

- E o que aconteceu?

- Ora, - Ele sorriu. - o senhor parece muito curioso sobre mim, Bocchan.

Estava, mas apenas porque me soava extremamente incomum.

- Não confunda as coisas. Se estou perguntando, você tem que responder.

- Certamente. - Ele se levantou, sorridente. - Estive na companhia da senhorita Amelia, durante a noite passada.

"Durante a noite"?!

Soava n-nojento!

- Oh, - Cruzei meus braços, disfarçando minha mínima surpresa. - então vocês se resolveram?

- Não havia exatamente "algo" a ser resolvido, apenas "esclarecido".

- "Resolvido" e "esclarecido" não são coisas muito distantes.

- Garanto que tudo está dentro dos conformes.

- Quem diria que eu ainda veria você se envolvendo "dessa forma" com uma serva...uma humana. E ainda por cima, se metendo em "confusões humanas". O que deu em você, recentemente? Está entediado, por acaso? Não te dou trabalho o suficiente? Porque, pelo que me lembre... - Sorri, sarcástico. - por um tempo você parecia ser uma das últimas pessoas, ou melhor, "coisa" que queria ela por aqui.

- Situações podem mudar repentinamente e por diversos fatores, quando menos esperamos, Bocchan. Às vezes, pode ser por um simples pensamento, - Ele se levantou e caminhou até meu armário, abrindo a terceira gaveta. - um acontecimento qualquer, como uma mão amiga ou um incidente, - Da gaveta, ele retirou um de meus tapa-olhos, um de couro preto padrão. - e às vezes, até mesmo por um cheiro. - Voltando a mim, ele se ajoelhou, levando o objeto a meu rosto. - Talvez, quando o senhor for mais velho, compreenda.

- Tsc! Diz como se eu ainda tivesse muito para viver. E, mesmo que tivesse, não faria essas nojeiras que você, com certeza, tem feito.

- Foi por isso que disse "talvez". - Ele deu um firme nó no laço do objeto, atrás de minha cabeça. - Agora, gostaria de ler os jornais ou ir diretamente à biblioteca?

Amelia, você deveria ter seguido meu conselho.

E, ainda não entendo porque tomaria uma decisão tão idiota.

Mas, independente disso, você está por conta própria, sempre esteve.

Eu apenas tentei alertar.

Eu realmente tentei. E não sei ao certo porque me preocupei...

- Me dê esses jornais. Quero ver o que estão dizendo sobre o estado das estradas de lama em East End.











[...]











- Mey-Rin, pode me passar o pano úmido?

- Sim! - Ela o tirou do balde, o torcendo e estendendo a mim. - Aqui!

- Obrigada.

Com os livros fora da estante, passei o pano, retirando a sujeira e a poeira.

Limpar as estantes da biblioteca era uma tarefa constante, já que elas sujavam consideravelmente rápido. E, como fazíamos antes, resolvemos dividir essa tarefa.

Senti certa falta de fazer isso.

- A chuva diminuiu, você viu?

- Sim, eu notei. Talvez finalmente pare nos próximos dias.

- Tomara, eu não aguento mais esse céu nublado. Parece até o inverno.

- Deve acabar logo. No café da manhã, o Bard disse que amanhã mesmo poderia acabar.

- Ele disse?

- Disse. Você não ouviu?

- E-eu me distraí conversando com o Finny!

- Oh, verdade.

Voltando às nossas tarefas, Mey-Rin continuou a varrer o chão, enquanto eu limpava atentamente entre os cantos da estante.

Depois daqui eu deveria passar as roupas do Jovem Mestre e tentar costurar as bermudas de Finny. Mesmo que eu não seja a melhor em trabalhar com agulha e linha, deveria ao menos tentar.

- Ei, Amelia.

- Hm?

- Tem uma coisa que eu fiquei pensando e queria te perguntar.

Aquilo não me soava bem.

- Me perguntar? - Recolhi o pano e me abaixei para o colocar no mesmo balde com água, tirando um pouco da sujeira e torcendo. - Perguntar o que?

- A-ahm, você sabe... - Ela olhou para os lados, como se conferisse se estávamos mesmo a sós. - c-como você e o senhor Sebastian começaram a, b-bem, v-você entendeu, né?!

A vergonha chegou a mim como um soco! Por que eles parecem tão curiosos sobre isso?!

Merda!

- Mey-Rin, e-eu não sei se esse assunto é uma boa ideia. S-sabe, depois de toda aquela situação que passamos e...

- N-não, não! Eu não vou me chatear, juro! Eu só quero saber porque, o-olha, o senhor Sebastian sempre foi quieto. Na verdade, muito quieto! Nenhum de nós o viu acompanhado de qualquer pessoa antes de você, sabe? Isso me deixou muito curiosa!

Suspirei, hesitante em seguir com aquela conversa.

- Quer mesmo falar sobre isso?

- É claro que quero. Não precisa se preocupar comigo, até porque... - Ela se aproximou, ficando a meu lado e chegando seu rosto mais perto de meu ouvido, sussurrando. - eu contei a Bard! Contei a ele sobre aquilo que você me disse!

- É sério?! Você fez?!

- E-eu ainda não sei se isso, q-quer dizer, se nós dois vamos dar certo ou algo assim, m-mas acho que não custa tentar! Não acha?!

Então, foi provavelmente por isso que ele se desculpou!

Sem dúvida, não é algo ruim! Mey-Rin merece alguém que realmente a admire, e sem dúvida, se ela não fosse até ele, Bard demoraria mais que meses para dizer qualquer coisa a ela.

É, isso é bom.

- Sim, acho! Tenho certeza de que vai dar certo.

- T-tomara! Nós não conversamos muito desde ontem a noite, mas acho que pode ser bom.

- Fico feliz por vocês, Mey-Rin. Ele deve estar tão empolgado quanto você.

- Você acha?!

Torci o pano úmido.

- Com certeza!

- Mas, agora que você já sabe, me fale sobre você e o senhor Sebastian. Por favor! Eu juro que não contarei a ninguém, se for o caso!

Quanta persistência!

- Não é nada demais, acredite.

- É claro que é! Eu nunca vi ele nesse tipo de situação! Vamos, você precisa me contar o que fez!

- E-eu não fiz nada, e-ele só me...

Me interrompia ao perceber que poderia falar alguma besteira.

- "Ele só te" o que?

Ela não desistiria de jeito nenhum! Que coisa!

Me senti nervosa, com ainda mais vergonha.

Tentei respirar fundo.

- Não sei ao certo por onde começar. O q-que você quer saber?

- O que você tiver pra contar! Vamos lá, como começou? Quem deu o primeiro passo?

- Como começou?

"A senhorita fala demais."

"Lábios, língua. Lábios quentes, uma língua úmida."

"Sebastian havia me beijado."

- É! Você não se lembra?

- S-sim, eu me lembro. Foi, f-foi no... - Me embolava em minhas palavras, com a vívida lembrança daquele momento em minha mente. Senti meu corpo formigar. - no último baile em que fomos.

- O do senhor Walker?! Que foi preso?!

Assenti com minha cabeça, em silêncio.

- Nossa! - E realmente, Mey-Rin não parecia chateada ou decepcionada, apenas curiosa e, até que bem surpresa. - Ele te b-beijou?!

- Mey-Rin!

- Desculpa! É que eu estou curiosa! M-mas vamos, me diga, e-ele te beijou?!

- Urg... - Coloquei minhas mãos no rosto, suspirando e tentando esconder a vergonha. - sim.

- AH! QUE INCRÍVEL! E...

- Ah! Mey-Rin, pare de gritar! Ficou louca?!

Me sentia cada vez mais nervosa, como se as paredes tivessem ouvidos!

E às vezes, parece que elas realmente têm.

- Perdão, perdão! É que e-eu nunca imaginei que o veria dessa forma, entende?

- Tem certeza de que saber dessas coisas não te chateia?

- Pode confiar em mim. Eu já te disse, desde o princípio, eu já tinha a certeza de que nada aconteceria entre nós. O que me chama a atenção é realmente vê-lo com alguém, pela primeira vez em três anos trabalhando aqui!

Isso é balela. Eu o vi com a senhorita Irene na biblioteca. É claro que ele já havia se interessado por outras pessoas antes. É dramático demais pensar que não.

Se bem que...

"As notícias disseram que a senhorita Irene foi presa! Sem falar dos crimes que cometeu, ela subornava e seduzia vários homens em troca de vantagens! Um escândalo!"

Estranho.

- O que quer dizer com isso de "nunca o viu com ninguém"?

- Ah, é que ele sempre rejeitou qualquer aproximação, sabe? Em bailes, ele nunca dançava com ninguém, e "pretendentes" nunca foi algo que faltou! Eu já o vi rejeitar damas que o abordavam por diversas vezes, era algo mais comum em bailes, mas ocorria até mesmo em jantares que o Jovem Mestre ia ou marcava por aqui! Uma vez a própria madame Red o cortejou, ela era irmã da Condessa Phantomhive, a mãe do Jovem Mestre! Ele a rejeitou e rejeitou diversas ofertas de trabalho que ela fez. A certo ponto, acho até que ele tinha certa aversão a ela. Mas enfim, ele sempre foi muito fechado e sempre falou apenas de trabalho o tempo todo, isso quanto não estava em completo silêncio. Por isso estou curiosa!

- Entendi...

- O que foi?

- Não, nada.

"Eu posso lhe jurar, teria feito tudo de outra forma, da forma correta. Sempre procurei ser educado com as damas, sempre procurei por ser um cavalheiro. Se pudesse compreender como é. Não quero que pense coisas ruins ao ouvir isso, mas, já conheci muitas damas ao longo da minha vida e não acho que nenhuma delas me causou o que a senhorita tem me causado. Uma mulher inteligente, culta, astuta e talentosa, é isso que qualquer homem deseja, não é?"

Não. Eu não posso divagar nas mentiras que Sebastian disse, ou tomá-las como verdade. Eu...

Na verdade, por que eu pensaria em algo assim, afinal? Me deixar "levar"?!

De novo, que estranho.












[...]













Começar com a abertura de Rainha me soava ideal. Movi minha dama duas casas à frente.

Jovem Mestre não demorou em espelhar meu movimento usando seu rei.

"Agenda livre. Xadrez, agora. Me acompanha?"

Foi tudo que Jovem Mestre disse ao me encontrar no corredor. Estava em meu horário de almoço, por isso não vi problema. Então, fomos a sala de negociações, onde havia uma mesa ideal para as jogatinas de xadrez.

E, como era de se esperar, para um menino de doze anos, Jovem Mestre era perfeitamente capaz e habilidoso nas jogadas. Já passamos por dois empates seguidos.

Acho que nunca encontrei um oponente a altura, antes. Toby e os outros colegas de trabalho com que morei, sempre foram muito idiotas e impacientes para sequer tentar o xadrez.

Notando a abertura, levei meu cavalo à "F3", preparando o desenvolvimento da sua torre.

- Então, - Ele moveu seu cavalo para "C6", mirando o centro do tabuleiro. - ouvi uma gritaria pela manhã, vinda da cozinha. Assumo então que as coisas voltaram ao normal. Estou certo?

- Sim, senhor, - Optei por confiar em minha estratégia. Avancei com a rainha. - está tudo resolvido.

- Tudo? - Questionou levando sua Rainha para "D6". Parecia controlar o centro do tabuleiro. Ele queria preparar o desenvolvimento de alguma peça? - Não sei se "tudo" seria a palavra certa.

Por que não seria?

- O que quer dizer, - Avancei com meu Rei, abrindo espaço. Se ele pretende o que estou pensando, vou desenvolver meu bispo! - Mestre?

- Bem, - Movendo seu Bispo até "G4", o vi mirando minha casa "F7". Uma ameaça potencial. - você e Sebastian, não acabou. Não é?

Gelei e, por instantes, me perdi da partida, esquecendo meu próximo movimento.

- Nós, bem... - Tentando recompor as ideias, movi meu cavalo a "G5" e bloqueei a linha de visão do Bispo. - ele contou ao senhor?

- Sebastian não tem permissão de esconder, qualquer coisa que seja, de mim. Se eu perguntar sobre algo, ele deve me responder, independente do que seja. Mas, admito que desta vez... - Ele trocou os Bispos na casa "G5". Perdi o direito de trocar de lado do rei. Droga. - eu, de fato, procurei por saber, o fiz dizer.

- Entendi...

Movi minha Rainha para a casa "D2", controlando uma boa diagonal.

- Sabe que está cometendo um erro, - Usando sua Rainha, Jovem Mestre fez arriscou em "F6", ameaçando meu peão em "G7". - não sabe?

Respirei fundo.

- Senhor, - Preferi não capturar a Rainha. Movi meu cavalo para "E7", forçando a Rainha a recuar para "E3". - acho que estou disposta a correr o risco.

- Por que se dispor a isso? - Ele moveu seu Bispo estrategicamente, controlando o centro do tabuleiro, ameaçando minha Rainha. Merda, estava perdendo meu foco. - Por que se permitiria correr esse risco?

Não sabia como me mover, qual o próximo movimento poderia escolher. E, não era apenas isso que não sabia...

Não sabia como responder sua pergunta.

Me mantive em silêncio e, sob pressão, levei meu Bispo a uma casa mais segura.

- Correr riscos sem uma razão que realmente valha a pena é inútil. - Sem perceber, o permiti desencadear uma combinação. Só me dei conta quando suas mãos se moveram pelo tabuleiro. - Pessoas inteligentes abrem mão de, o que quer que estejam impedindo, se este "algo" oferecer um risco desnecessário.

Ele moveu sua Rainha para uma casa onde poderia atacar meu Bispo e ameaçar meu Rei. Tentei proteger meu Bispo, movendo um Peão;

- Você é inteligente, por isso me conte, estou curioso...- Jovem Mestre, com um Cavalo arriscado, estava agora apoiado por sua Rainha. O ataque era mais nocivo a mim. - o que te levaria a correr um risco, se envolvendo com Sebastian? Que vantagem isso te trás?

O que eu faria? Que peça deveria mover? O que deveria dizer?

- Nem sempre nos relacionamos com pessoas por vantagens e desvantagens, senhor.

Tentei mover minha Rainha para uma posição defensiva.

- Então, está me dizendo que escolheu correr o risco dessa relação por pura e espontânea vontade? - Ele capturou minha Rainha, com seu Cavalo! Ele estava na vantagem. - É isso?

Eu não sabia. Genuinamente, não sabia.

"Eu quero, por um instante ou por algumas horas, ser tola."

O quão tola eu venho sendo, agindo desta forma? Estando com ele?

"Eu te odeio. Eu odeio sua voz, odeio sua arrogância, suas inteligência, suas palavras sarcásticas, suas mãos, seu rosto, sua boca, tudo. Eu, e-eu odeio tanto q-que, que às vezes, não sou capaz de pensar em qualquer outra coisa."

Se não consigo manter a distância, se não consigo o afastar...

Eu realmente o odeio?

Sinto que o que tenho feito não condiz nenhum pouco com o que "acho" ter pensado sobre ele.

- O senhor quer que seja absolutamente honesta?

- É óbvio.

- Eu não sei.

Movendo seu Bispo e sua Torre, Jovem Mestre ia em direção a meu Rei.

Não pude encontrar uma defesa sólida para combater o ataque.

- Sabe, eu já disse a você... - Ele ergueu as pequenas mãos até o tabuleiro, preparando sua próxima jogada. - eu sou arrogante como qualquer outro, mas não ao ponto de achar que posso salvar ou ajudar qualquer um, e ser vangloriado por isso. Eu não posso te ajudar, muito menos te impedir de fazer qualquer coisa. Afinal, não cabe a mim. Mas, há algo que posso dizer. Sentimentos matam e corroem. Eles são lentos e chegam sem que você perceba, eles deformam seus pensamentos e corroem sua inteligência. Te fazem tomar decisões idiotas. - O menor pôs seus dedos em sua torre. - Muitos dos meus inimigos caíram dessa forma. Eles deixaram que os sentimentos os corroessem e por fim... - Com um último avanço, sua Torre alcançou um xeque-mate. Eu fui derrotada. - morreram.

Sentimentos?

"Me via fixa nos olhos de Sebastian."

"Seus ombros largos que me cobriam."

"Senti todo o meu corpo se desconcertar com seu toque."

"Queria o contato com sua pele, o contato com a carne."

"Sua língua parecia saber exatamente o que fazer."

"Seu toque não me alarmou"

"Sua voz soava suave."

Sebastian, Sebastian, Sebastian, Sebastian.

Não pode ser. Eu...




















[...]














- Vejamos, - Deitada, li algumas rasuras de meu diário e dos pequenos recortes de jornal que guardei. - mil oitocentos e oitenta e cinco, quatorze de dezembro e...

"Então, está me dizendo que escolheu correr o risco dessa relação por pura e espontânea vontade? É isso?"

Urg...preciso me concentrar!

Balancei a cabeça e tentei voltar ao foco.

Eu ainda preciso de uma data. Toby não quis ajudar, mas, talvez, caso eu tente contato com algum dos investigadores Moretti eu consiga a data do massacre e...

"Senhorita Amelia..."

Não! N-não. Eu preciso me concentrar.

Tudo bem. O ponto é, nada bate. Os detalhes dessa investigação não fazem sentido, pelo menos não com a história que me contaram.

O ocultismo, a coincidência entre os anos e datas, os surtos noturnos do conde, a falta de informações sobre o massacre, nada bate. Eu já não sei mais em que crer.

Não sei mais se os Moretti's me disseram a verdade. Há alguma peça faltando. Algo que não posso seguir sem, mas não sei o quê.
E essa é a pior parte.

Undertaker...aquele desgraça com certeza sabe de alguma coisa! Mas, ele simplesmente sumiu nas últimas semanas!

Ele seria muito util.

- Merda. Não vou chegar a lugar nenhum, de novo. - Irritada, guardei meus recortes e fechei meu diário. - Preciso de beber um...

- SEBASTIAN!

Me levantei em um pulo assim que ouvi o grito! Reconheci a voz no mesmo minuto!

- Jovem Mestre?! - Guardei tudo em meu baú o mais rápido que consegui! Tranquei, guardei e sai correndo em direção ao corredor! - Senhor! Por que você...

GATOS?!

O corredor estava infestado deles! Brancos, pretos, cinza, malhados. TODOS os tipos possíveis! Eram miados e mais miados, ao mesmo tempo!

Jovem Mestre estava com uma cara...péssima. Nojo, espanto e bastante raiva! Ele levantava uma das pernas cada vez que qualquer um dos gatos tentava chegar perto!

Isso definitivamente não era bom!

- SEBASTIAN! AQUELE DESGRAÇADO FEZ DE NOVO!

- D-de novo?!

- SEBASTIAN, APAREÇA AGORA! É UMA ORDEM, SEU IMBECIL!

- Estou bem aqui, senhor.

- AH! - Ouvi a voz logo atrás de mim. Virei de costas e logo o vi. - Você precisa parar com isso.

- PODE ME EXPLICAR O QUE É ISSO?!

- Bocchan, eu posso explicar. Eles...

- VOCÊ, A-AH...ATCHU! VOCÊ SABE MUITO BEM QUE, Q-QUE...ATCHU!

O Jovem Mestre é alérgico!

- ATCHU! URG! DESGRAÇA! EU VOU FICAR ASSIM A NOITE TODA!

Olhei para Sebastian mais uma vez e, honestamente, ele parecia um pouco mais preocupados em olhar os gatos, do que com a alergia do Jovem Mestre.

- Bocchan, posso lhe preparar um chá medicinal, se desejar.

- CHÁ UMA OVA! A-ATCHU! - Ele passou a manga de seu casaco no nariz. Hm! Olhando melhor, era até um pouco engraçado! - Eu quero TODOS esse gatos fora daqui, AGORA.

- Mas, senhor...

- AGORA, SEBASTIAN! E AMELIA...

- S-sim, senhor?!

- Certifique-se de que não sobrará UM GATO nessa casa! Quero todos BEM LONGE DAQUI! E tratem de resolver isso agora! ENTENDERAM?!

É, ele definitivamente não quer ouvir um "não" como resposta.

- S-sim, senhor!

- Sebastian, você entendeu?!

- Yes, my lord.

- Ótimo! Agora, para fora com esses bichos. AGORA!























[...]























- Então...você literalmente guardava gatos no seu armário? É isso?

- Aquilo foi satisfatório para a senhorita, não foi?

- Te ver levando uma bronca? Óbvio. Foi o ápice do meu dia.

- Oh, então eu tive a ver com o ápice do seu dia?

Arqueei uma sobrancelha.

- Você adora levar as coisas pro outro lado, não é?

- Eu sou um homem de perspectivas.

- Hm! Sei!

- Mal humorada?

- Digamos que eu não planejava usar parte da minha noite carregando gatos pela floresta.

- Não tem porque se irritar com criaturas tão adoráveis.

- Não estou exatamente irritada com os gatos. - Balancei a cabeça e fiz menção de cuspir quando senti pelos grudando nos meus lábios! - Pff! Pff! Ai, p-pelos! Digamos que estou mais irritada com aquele que resolveu esconder doze gatos dentro de um armário!

- Meow!

Um dos gatos em meu colo miou.

Não era tão fácil carregar seis gatos! Apesar de que, para ele parecia bem fácil. Na verdade, ele parecia até feliz em fazer isso.

- Não imaginei que eles fossem fugir.

- A quanto tempo você faz isso? Uma semana? Duas?

- Dois meses.

- Dois meses?! - Fiquei boquiaberta. - Pode, pelo amor de deus, explicar o motivo por você estar a dois meses escondendo gatos no seu próprio armário?! E como diabos ninguém descobriu.

- Além de adoráveis, eles também são criaturas muito quietas. E, as chuvas tem sido muito fortes nos últimos meses. Não poderia deixar que esses pequenos ficassem molhados e com frio.

Pelo amor de deus.

- Entendi. - Olhei para meus braços, já um pouco cansados de tentar carregar tantos dos pequenos bichinhos. Um deles me encarou, entortando a cabeça para o lado. - Então, eu vou fingir que me conformo com toda essa sua loucura e perguntar de uma vez...tem alguma ideia de onde vamos deixá-los?

- Conheço um lago, não muito longe de onde estamos. Tem salgueiros bem altos e muitos peixes. Baldroy gosta de pescar por lá.

- Ele não me parece alguém muito paciente para pescas.

- E acha que ele já voltou com algum peixe, alguma vez?

Acabei por rir. Era realmente engraçado pensar em Bard tentando pescar. Ele com certeza quebraria a vara, ou viraria o barco...enfim, algo desastroso!

- Honestamente, eu duvido.

Ele olhou para mim e sorriu.

- Provavelmente vamos caminhar por mais vinte minutos. Não quer ajudar para carregá-los?

- Você só está perguntando porque quer muito segurá-los, não é?

- Talvez.

- Então, você realmente quer carregar doze gatos?!

- Achou que estava brincando?

- Bem, eu estava!

- Eu não. Posso?

- Você é completamente louco.


























[...]


















- É aqui?

Disse, com certa dificuldade para andar entre a grama alta e o chão um pouco íngreme.

- Sim.

- Nossa, - Dei uma boa olhada em volta. Todos os salgueiros cheios, com suas folhas tão longas que encostavam a beira do lago, que era realmente repleto de peixes. A luz estava bem forte, então a água parecia transparente. - é um lugar bonito.

- O que posso dizer? - Ele afagou um dos gatos em seu colo. - Estes pequeninos tem bom gosto.

Sorri, o vendo completamente concentrado em afagar os gatos em seus braços. Ainda era estranho ver o quanto ele genuinamente gosta dos bichinhos!

- Então, a maioria deles fica por aqui?

- Exato.

- Posso assumir que você vem aqui com bastante frequência, então?

- Minhas funções não me permitem vir o tanto quanto gostaria, mas eventualmente e com algumas visitas, eles acabaram aprendendo alguns caminhos até a mansão.

- Você com certeza ensinou.

- Está fazendo acusações que não pode provar.

- Eu estou é afirmando!

Ele olhou em volta, até ir até o salgueiro mais próximo, onde os próprios gatos fizeram o trabalho de sair de seus braços e costas, pulando diretamente na árvore, a escalando.

- É sempre uma pena deixá-los aqui.

- Eles vão voltar para te visitar, - Andei em sua direção. Ele continuava encarando a árvore. - aparentemente, eles são seus amiguinhos.

Encostei minhas costas no tronco mais próximo e descansei.

Ele continuou olhando para cima, como se nem estivesse ali. Ele ergueu seu braço e, assim, um dos pequenos gatos começou a brincar com seus dedos.

Enquanto isso, eu o olhava.

As oportunidades que tive para avaliar Sebastian meticulosamente eram pequenas. Na verdade, na maioria das vezes eu não fazia muita questão.

Mas, agora, me senti um pouco mais curiosa sobre...

As mãos sempre enluvadas, a mesma postura impecável que se mantinha ali desde o dia que o vi pela primeira vez, os cabelos tão escuros que pareciam se misturar com o céu, os olhos cuja cor nunca entendi direito e...tudo, todo o resto que o compõe.

Eu cruzava com esse mesmo mordomo todos os dias, desde que cheguei a mansão, eu o desprezei e tive a completa certeza de que ele era a encarnação de todos os tipos de pessoa que mais detestava. Os orgulhosos, os prepotentes, os egocêntricos e narcisistas. Eu tinha a absoluta certeza de que ele representava tudo isso.

Mas, agora, eu já não sei direito.

Eu sinto que não sei explicá-lo.

Alguma coisa mudou.

E, eu tenho medo do que mudou.

- Encarar não é muito adequado, para uma dama. - Ele me olhou, soslaio. - Tem algo a dizer?

- Eu? Nada.

- Duvido que não seja nada.

- E por que? Não posso simplesmente encarar?

- Seria decepcionante se fosse tão previsível assim.

- Sinto te decepcionar, então.

Nossos rostos estavam se aproximando.

- Sinto muito, mas ainda não acredito.

- ...

Um gritante silêncio se fez entre nós.

- Odeio quando você está certo.

Ele sorriu.

- Estou ciente disso. - Ele se virou um pouco mais em minha direção, me encarando fixamente. - Ciente de que a senhorita me odeia tanto que..."não consegue pensar em outra coisa". - Sua mão foi a meu queixo. - Certo?

"Eu te odeio. Eu odeio sua voz, odeio sua arrogância, suas inteligência, suas palavras sarcásticas, suas mãos, seu rosto, sua boca, tudo. Eu, e-eu odeio tanto que, que às vezes, não sou capaz de pensar em qualquer outra coisa."

Impossível esquecer que disse isso. Acho que, entre todas as mentiras que contei desde que cheguei aqui, essa foi uma das poucas verdades que disse.

Eu não sei se eu realmente aceito que isso seja uma verdade.

- Não sei se eu deveria responder essa pergunta.

- Tem medo de dizer a verdade?

- Nem eu sei a verdade. E, eu duvido que você mesmo saiba.


Eu fui sincera.


Eu mal sabia o que vinha se passando em minha própria cabeça. Tudo era confuso, nada mais tinha rumo. Eu me sentia totalmente perdida desde tudo que descobri na investigação, desde que percebi que eu realmente me importava com essas pessoas, que desconfiei de meus próprio chefes, desde que me entreguei e fui tola com Sebastian por uma noite.

E, tenho a sensação de que não fui "tola". Acho que...eu só fiz o que de fato queria fazer, me fazendo de idiota para não me sentir culpada.

Tudo que consigo sentir agora é medo. Medo do que eu mesma sinto, medo do que tem acontecido dentro de mim, do que pode acontecer com essas pessoas, pessoas com as quais passei a me importar.

Medo do que sinto por ele, agora. Medo porque não consigo acreditar que ele sinta qualquer outra coisa, também.

Estava na hora de voltar para casa.

- Bom, - Afastei sua mão do meu rosto. - já fizemos o que tínhamos que fazer. Vamos embora.














[...]













- Uma xícara de chocolate quente, - Ele pôs a bandeja em minha frente. - para compensar.

Chocolate quente, acompanhado por dois biscoitos de sal.

Ele insistiu muito, MUITO para que eu aceitasse esse "agrado".

- Obrigada.

Sorrindo, ele deu as costas e foi até a pia, ligando a torneira e mexendo em algumas louças que foram deixadas lá.

Dei a primeira golada.

Que droga. Era delicioso!

Antes eu me sentia realmente irritada em como ele era bom em tudo que fazia. E, sinceramente, vez ou outra ainda é irritante.

Mas, quando ele não se exibe e apenas...faz, não é tão ruim. Só me deixa curiosa.

Bebi mais um pouco, comendo os biscoitos, enquanto o assistia mover seus braços de um lado para o outro, cuidando da louça.

Não sei por quanto tempo encarei. E, inclusive, acabei reparando em algo...













[...]













Estávamos andando devagar, até o corredor de nossos quartos.

- Você deveria fazer chocolate quente mais vezes.

- Então, quer dizer que a senhorita realmente gostou?

- Não se empolgue muito. Meus legumes assados ainda são melhores do que os seus.

- Estou com meus pés no chão.

- Olha só, - Dei uma leve cotovelada em seu ombro. - alguém está aprendendo a controlar seu orgulho.

Finalmente chegamos à porta do meu quarto. Me encostei na parede, bem ao lado da mesma.

- Ora, ora. Sinto que estou recebendo muitos elogios hoje.

- Não foram elogios! Foram...observações.

- Oh, é mesmo?

- É mesmo.

- Vou tomar o hábito de anotar suas observações. Elas parecem muito úteis.

- Com certeza são.

- Mas, não se empolgue muito. Tenho medo de inflar o orgulho da senhorita.

- Ora, seu...

- Hm! - Ele riu, contido. - Estou apenas brincando.

- Acho que nunca te vi brincar de verdade.

- Parece que muitas coisas novas estão acontecendo hoje.

- É, pois é... - Sorri, ainda pensando na chuva de meteoros e em como a noite pode ser boa, na companhia dele. - olha, não que eu costume sair carregando gatos por aí com frequência, mas, não foi tão ruim assim.

- Sem problemas. Naturalmente eu iria sozinho, mas acho que Bocchan assumiu que uma boa companhia viria a calhar.

- Oh, Sebastian Michaelis disse que eu sou uma boa companhia?

Ele sorriu.

- Nunca diria o oposto.

Senti meu corpo arrepiar.

- Boa noite, Sebastian. - Fui até a maçaneta e a segurei, então, me virei para lhe dar meu último olhar amigável. - Até amanhã.

- Boa noite, senhorita Amelia.

Ele reverenciou e começou a andar, mas...eu não entrei. Eu continuei a encará-lo. Ele andava a passos lentos, até seu quarto, no fim do corredor.

Passo por passo, eu ouvia o som de seus sapatos batendo contra a madeira com muita atenção, ele era silencioso, até em sua forma de andar.

Cada vez mais perto de sua porta, mais perto do fim daquela noite, me deixando sozinha com uma confusão de pensamentos e sentimentos tão estranhos que às vezes soavam até assustadores.

O que aquilo significava? Eu sempre odiei perguntas sem respostas, sempre odiei a não compreensão dos meus sentimentos, do que ronda por minha própria cabeça! Como cheguei a esse ponto? Como...

- Sebastian!

Chamei, por pura impulso.

Ele parou no mesmo instante.

Por que diabos eu fiz isso?!

Engoli em seco quando ele virou sua cabeça lentamente em minha direção.

Não sabia o que fazer. Mal sabia o por que gritei seu nome, ou o que se passava na minha cabeça quando resolvi fazer isso.

Improvisando completamente e, sem qualquer planejamento, simplesmente caminhei em sua direção enquanto olhava para o chão, evitando a tortura que seria encara-lo nos olhos enquanto andava.

Finalmente, fiquei frente a ele e engoli em seco quando seu corpo se virou completamente em minha direção e quando encontrei seus olhos mais uma vez. Ele já olhava para baixo, para mim.

- Sim?

Engoli em seco.

- Pelos. Seu fraque está cheio de pelos. - E realmente, eu não estava mentindo. Havia reparado quando estávamos na cozinha. Tinham pelos até nas suas costas. Ignorando o nervosismo, levantei as mãos e bati de leve no peito do fraque, tentando tirar os pelos. - Você deveria lavá-lo.

Levantei a cabeça e, inevitavelmente, cruzei com o olhar vermelho mais uma vez. Continuei com minhas mãos em seu peito, sem saber ao certo o que fazer.

Ele ficou quieto, estático, como se esperasse algo.

Eu, e-eu...

Preciso dormir. Preciso focar no trabalho.

- Bom, - Tirei as mãos de seu peito e me afastei. - boa noite.

Urg! Que vergonha!

Eu queria morrer.

Óbvio que ele sabia do pelo no fraque! Por que diabos eu avisaria?! Que assunto mais idio...


- Espere.


Parei em um impulso, pois, assim que dei meu primeiro passo para sair, sua mão agarrou meu punho.


- Não faça isso, por favor.


Sem força bruta, ele me puxou de volta para perto!

Meu peito foi a mil, mas tentei me manter firme.

- Não fazer o quê?

- Se restringir. - Ele agarrou minha cintura e me puxou, deixando nossos corpos um contra o outro. Ainda segurando meu punho com sua outra mão. - Está colocando seu orgulho acima daquilo que realmente deseja.

Seus dedos correram a minha bochecha e acariciaram.

- Como pode ter tanta certeza de que desejo alguma coisa?

- Às vezes supor pode ser arriscado, porém, - Nossos peitos se tocavam, podia sentir meu coração bater como se fosse rasgar meu peito. Senti a mesma respiração quente tocar minha pele mais uma vez. Seu rosto, meu rosto, bastava que nos mexêssemos só mais uma vez. - não vejo a ideia de correr riscos como algo negativo.

Um beijo.

Assim como na noite anterior, nossas bocas se tocaram mais uma vez.

Mas, havia algo diferente. Era menos sedento, menos desesperado. Era macio, muito mais doce e suave do que costumava ser. Tão confortável que soava como uma massagem.

Algo, sem duvida alguma, estava completamente diferente.

Nossos corpos se aprofundaram mais no beijo, mas não de forma bruta, era como afundar a cabeça em um travesseiro macio.

Prazeroso e confortável.

Com os pés destrambelhados, nos movemos. Meu corpo foi colocado contra a parede.

Tudo parecia tão diferente, não se parecia com as outras vezes.


Era doce, delicado, macio. Me fazia sentir bem.


Eu, e-eu não me importaria de continuar ali, por mais tempo.

Mas, eu não deveria.

Separei nossos lábios.

- Está ficando tarde...

- Está com pressa?

- Temos trabalho a fazer pela manhã.

- De fato. - Com a voz mais macia, suas mãos tocaram minha bochecha, mais uma vez. Acariciando. Ele simplesmente aceitou. - Como desejar.

Afastei nossos corpos. Tudo ainda parecia quente e me sentia ofegante. Respirei fundo e olhei em seus olhos, mais uma vez.

Eram hipnóticos.

- Boa noite, de novo.

Brinquei.

- Boa noite, - Ele inclinou seu rosto uma última vez. - senhorita Amelia.

E me deu um pequeno selinho.

Eu sei que não recuei simplesmente porque não deveríamos continuar. Não foram pelas regras. Não foi pelo trabalho.

Eu recuei por medo.

Eu realmente tenho medo do que possa ter mudado. Medo de que a mudança tenha sido dentro de mim. Que eu tenha passado a enxergá-lo de outra forma. Que eu tenha usado a "estupidez" como uma desculpa para seguir com isso.

Medo de que meus sentimentos por Sebastian tenham se tornado algo...diferente.















*

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