XVIII - Promíscuo

14/03/1888 - Quarta-feira

- Bom dia, senhorita!

- Bom dia, senhor!

- O que uma mocinha como você procura por aqui?

- Eu preciso de jornais!

- Ah, sim, sim. Os encontrará na seção de periódicos.

- Na verdade, eu gostaria de uma ajuda, em relação às datas.

- Ah, claro. Algum exemplar em específico?

- O senhor tem algo de mil oitocentos e oitenta e cinco?

- Oitenta e cinco? Acredito que sim. Venha, me acompanhe!

O senhor de bigode branco e cabelos curtos atravessou o balcão e me guiou pelos corredores da biblioteca.

Eu, finalmente, pude tirar um bom dia de folga. Já faz algum tempo que eu queria vir à cidade e voltar à biblioteca, queria saber o que mais eu poderia descobrir sobre aquelas datas.

Chegamos à seção de periódicos.

- Ahm, vejamos. Setenta, oitenta, oitenta e três. Ah! Aqui está... - Ele se agachou, com um pouco de dificuldade, e puxou um bolo de jornais, amarrados por uma fita. - todos os exemplares de oitenta e cinco.

- Q-quantos são?

- Trezentos e vinte e cinco, se minha memória não falha. Não estão ordenados por data, então, se está procurando por uma data específica, recomendo que se organize logo!

Ele colocou todos os exemplares nas minhas mãos e saiu. Eram tantos que pareciam pesados em minhas mãos.

Só pode ser um pesadelo!





[...]





- Prepare alguma coisa, terei convidados no almoço.

- O senhor anda bem sociável ultimamente, não? Planejando tantos eventos e jantares...

- Tsc! Nada disso, idiota. Preciso resolver assuntos da rainha.

Sebastian abaixou o bule e deixou que o chá caísse, devagar, em minha xícara.

- Permita-me perguntar. Do que se trata, Bocchan?

- O senhor Keane e a senhorita Irene abriram um negócio de bebidas recentemente, quatro meses atrás, se lembra?

- Sim, inclusive, me lembro do adorável presente mandado pelo casal. Uma caixa inteira com seus exemplares.

- Que não pude provar.

- Quando chegar aos dezoito anos...

- Aham! Continuando, a rainha suspeita que o eles estejam vendendo e exportando suas bebidas com o "Royal Warrant", selo real.

- Isso é excelente, não? Todos os produtos de sua empresa possuem o selo oficial.

- Seria excelente se fossem os selos oficiais. A rainha suspeita que sejam falsificados, e tenho quase certeza de que realmente sejam.

- Uma acusação um tanto grave. Pretende resolver a questão durante um almoço? É bem brando para seu feitio, Mestre.

- Não exatamente.

Sorri travesso, e Sebastian, logo entendeu.

- Imaginei. Qual será o plano?

- O senhor Keane não é alguém fácil de se desdobrar, já sua esposa, bem, são outros quinhentos.

- Mestre, o que está planejando?

Ele parecia realmente curioso, apesar de sua expressão quase nunca demonstrar. Eu o conhecia bem o suficiente para conhecer seus interesses.

- Não sou muito adepto a esse tipo de abordagem... - Me levantei de minha poltrona, com a xícara em mãos, e fui até a janela. O dia estava bem agradável. - mas você é... - Bebi um pouco, o gosto era cítrico, floral. Earl Grey, meu preferido. - preciso que use sua "persuasão" para convencê-la a falar. E se certifique de que ela realmente vai falar.

Estendi a xícara a ele.

- Ora, ora... - Ele inclinou o bule e serviu mais em minha xícara. - é a primeira vez que o vejo optar por uma abordagem tão, como posso dizer? "Peculiar", acho que é o adequado.

- Estou apenas fazendo testes. Agora, se apresse para preparar o almoço e alguns petiscos. Do jeito que são folgados, acredito que passarão a tarde aqui.

- Yes, my Lord.





[...]





Isso, finalmente!

Olhei para o relógio, eram onze da manhã. Depois de quase quatro horas, eu terminei de organizar os malditos jornais!

Os separei pelos meses de publicação, janeiro, fevereiro e por aí vai.

Finalmente, eu iria conferir os exemplares de dezembro.

Comecei a passar meus dedos pelos papéis velhos, lendo as datas com pressa.

Dia um, dia dois, quatro, seis, oito, nove; continuei passando os exemplares com pressa; dez, doze, quatorze!

- Achei!

- Shh! Silêncio, senhorita, por favor.

- P-perdão.

Empolgada, peguei o jornal e li a manchete principal.

"O Grande incêndio da mansão Phantomhive! Na madrugada de hoje, quatorze de dezembro, um incêndio na mansão Phantomhive levou a vida de todos os seus moradores. Sendo eles, o Conde Vincent Phantomhive, sua esposa Rachel Phantomhive e outros quinze servos que habitavam a mansão. O filho do casal, Ciel Phantomhive, que estaria comemorando seu décimo aniversário hoje, está desaparecido. Seu corpo não foi encontrado.

É uma situação desastrosa! Não se sabe ao certo o que ou quem teria causado o incêndio, só se sabe que até o momento, não há sobreviventes. O Conde Vincent Phantomhive era possuinte das prósperas empresas Funtom, além de possuir uma relação admirável com a amada rainha. Senhor e Senhora Phantomhive eram bons amigos, esposa e marido amáveis, com uma família abençoada. Caso, você leitor, possua alguma informação sobre o paradeiro do jovem filho desaparecido do casal, por favor, contate a Scotland Yard, imediatamente. Que Deus e a Rainha os abençoe, e que descansem em paz."

- Meu deus!

- Senhorita, silêncio!





[...]





- Senhor Keane e senhorita Diaz, a quanto tempo.

- Conde Phantomhive! A quanto tempo não nos encontramos... - Ele estendeu sua mão a mim. - como tem passado?

- Bem, felizmente... - Aceitei seu aperto de mão. - e, senhorita Diaz, é ótimo vê-la novamente.

- Muito obrigada pelo convite, Conde!

- Imagine. Agora, vamos para a sala de jantar. Imagino que estejam com fome.

- Famintos! Não é, querida?

- Uhum!

- Perfeito. Pedi a meus empregados que preparassem um bom banquete.

Fomos à sala de jantar, e assim que entramos, os dois ficaram boquiabertos.

Sebastian estava ao lado da mesa, já montada.

Toalhas brancas, talheres polidos e devidamente arrumados, bandejas com diversas opções de comida para todos os lados.

Nada que não fosse sua obrigação.

- Boa tarde a todos. Imaginam que estejam com fome.

- Ei, eu te conheço! Você não é o mordomo que morreu naquele jantar, ano passado?!

Intrometido maldito! Tinha me esquecido desse detalhe!

- Não sei ao certo do que está falando, senhor.

- M-mas, eu tenho certeza! Irene, queria, você se lembra, não é?

- Amor, você deve estar confuso, só isso!

- De fato, houve um trágico assassinato ano passado, mas não se tratava de Sebastian. Na verdade, ele estava em recesso naquela noite.

Era minha desculpa mais idiota, mas ele precisava acreditar!

Ele olhou para mim, para sua esposa, e depois para Sebastian. Parecia confuso.

Vamos, morda a isca!

- Ahm, se bem que, já faz tanto tempo. Eu, e-eu que estou apenas me confundindo.

Ufa, por pouco!

- Sinto muito por meu noivo, Conde. Às vezes o trabalho o sobrecarrega. Não é, querido?

"Noivo?"

- Oh, não sabia que estavam noivando.

- Sim... - Ela estendeu sua mão a mim, exibindo um anel fino, com uma exagerada esmeralda. - ele me propôs três meses atrás.

- Querida, já te disse, não se exiba tanto! Perdão Conde, mas estamos muito empolgados com a ideia do casório, principalmente Irene.

- É verdade, estou mesmo! Perdão pelo atrevimento.

- De forma alguma, desejo felicidades ao casal. Por tanto, deveríamos comemorar, não? Com um bom e agradável almoço.

- Sem dúvida!

Noivos, não é? Sebastian, acho bom que faça seu trabalho, e que o faça muito bem.





[...]





Agora fazia sentido, por isso alguém tão novo no comando das empresas Funtom.

Eu não fazia ideia, sequer me lembro de ter lido essa notícia em oitenta e cinco. E "desaparecido"?! O Conde ficou desaparecido? Por quanto tempo, e por que?!

Eu precisava saber mais.

Olhei para o relógio, já era uma da tarde. Que se dane! Nem que precise passar a tarde aqui, mas eu vou achar respostas!

Continuei vasculhando os jornais, procurando por alguma coisa! Mais exemplares, de depois do do dia quatorze!

Precisava encontrar alguma notícia de quando ele foi encontrado.

Jornais do dia quinze; notícias sobre os portos. Nada! Jornais do dia dezesseis; notícias sobre a inauguração das feiras em East End. Inútil! Talvez deva pular alguns dias? Jornais do dia vinte; o sucesso do novo Museu Hermitage, na Rússia. Totalmente inútil!

Jornais do dia vinte e cinco; "O filho do Conde e Condessa Phantomhive está vivo, retornando misteriosamente!"

Finalmente! Era isso!





[...]





- Devo dizer, Conde... - Ele espetou um pedaço de carne com seu garfo e colocou na boca. - seus cozinheiros estão de parabéns!

- Sem dúvidas! A comida é uma delícia.

Se dependesse de meu cozinheiro, estaria comendo carne queimada.

- Fico satisfeito que o almoço tenha agradado.

Terminamos de comer a mais de uma hora, e esses esfomeados não querem sair da mesa. Preciso pensar em algo para separá-los, se não ficarei o dia todo os aturando atoa!

- Com certeza. Ei, mordomo... - Sr.Keane estendeu sua taça a Sebastian. - Me sirva um vinho!

- Sim, senhor.

Abusado.

Se bem que, espere, é isso! Ciel, seu gênio!

Eu já sei o que fazer.

- Espere, Sebastian... - Ele parou no mesmo minuto. - senhor Keane, é um apreciador de vinhos?

- Eu? Com certeza!

- Ora, que conveniente. Há algum tempo recebi novos exemplares em minha adega e não tive tempo de dar uma olhada. Que tal me acompanhar? Poderíamos discutir um pouco.

- Oh, o senhor falou com a pessoa certa! Vamos, querida?

- Não sei, Keane. Sabe que não sou chegada a bebida e...

- Não seja por isso. Se preferir, meu mordomo pode lhe mostrar um pouco da mansão, conhecer os jardins e a sala de música. Afinal, a senhorita é esplêndida na ópera, não?

- Ótimo! O que acha, querida? Me parece uma boa ideia.

Só um idiota deixaria sua noiva sozinha com um homem que mal conhece.

- Não sei, querido. Tem certeza?

- A senhorita não precisa se preocupar, está totalmente segura em minha residência, e na companhia de meus servos. Não é, Sebastian?

- Com certeza, meu Mestre. A senhorita terá o mais agradável dos passeios, posso lhe garantir.

- Viu? Correrá tudo bem, querida!

- B-bem, se é assim, acho que tudo bem.

- Muito bom! Agora, Conde, pode me mostrar sua adega?

- Claro.

É mesmo um grande idiota. Sem dúvidas, isso será bem fácil.

Olhei para Sebastian e em seguida, para a porta que dava ao salão. "Você sabe o que fazer", lhe dizia com os olhos.

Ele assentiu, e então tive a certeza de sua resposta.

"Yes, my Lord."





[...]





"Após dez dias de sumiço, o jovem Ciel Phantomhive, herdeiro único de toda a fortuna e legado da família, reapareceu misteriosamente nesta manhã de dia vinte e cinco, com curativos em seu rosto e um peculiar tapa-olho. E tão misteriosa quanto a sua aparição, apenas a total reconstrução da mansão Phantomhive, que parece ter se reerguido do dia para a noite!

O Jovem não quis ter contato com os meios de comunicação. As informações sobre seu sumiço são completamente escassas e, aparentemente, se seguirá dessa forma. E os fatores mais misteriosos, o mesmo retornou na companhia de um homem alto de terno preto. Ninguém sabe ao certo quem seria este. Alguns especulam ser o novo mordomo da residência, mas as informações não foram confirmadas, já que o mordomo da mansão, senhor Tanaka, foi encontrado gravemente ferido, porém vivo, na mansão. Ele se encontra no hospital.

As especulações são muitas a curiosidade é grande, porém, acredita-se que estas serão as únicas informações que a população terá do caso.

O mordomo, o jovem Herdeiro e o homem misterioso se recusam a falar."

"Homem alto, de terno preto", Sebastian?! Então, depois de dez dias de sumiço, o Conde voltou e, com Sebastian?!

E, pelas fotos, também voltou com aquele tapa-olho estranho.

Corri até o balcão, onde o idoso quase cochilava.

- Senhor!

- A-ah! S-sim, sim! O que deseja?

- Poderia me emprestar um lápis e papel?

- Ah, sim. Posso, - Ele ajeitou os óculos no rosto e começou a mexer na bagunça em sua mesa. - me dê alguns minutos, vou encontrar.

Olhei para o relógio, eram duas e meia!





[...]





- Nossos tapetes persas são feitos a mão, um presente de um dos maiores negociantes e exportadores das peças. Produzidos na cidade de Kashan.

- São lindos... - A dama olhou para os próprios pés, que pisavam no extenso tapete, que se seguia até o fim dos corredores. - eu sempre admirei as mercadorias da Ásia.

- De fato, devemos todos admitir que os asiáticos possuem o dom do comércio.

- Acha que podem ultrapassar nós, ingleses?

- Seria falta de patriotismo de minha parte dizer que sim, mas, ignorância dizer que não. E a senhorita, o que acha?

- Não sei ao certo. Desculpe mudar de assunto tão de repente, mas, a mansão possui jardins. Não é?

- É claro. Possuímos jardins de inverno conservados e reservados ao leste da mansão, jardins de verão a oeste e uma bela estufa. Gostaria de conhecê-los?

- S-sim, por favor!

- Permita-me acompanha-la... - Estendi minha mão a ela. - senhorita?

Nos primeiros segundos, ela pareceu hesitante. Mas, com um sorriso convidativo, postura carvalheira e olhares convidativos, a mesma aceitou.

Humanos, sempre tão fáceis de convencer.

- O s-senhor trabalha a muito tempo para o Conde?

- Pode chamar-me de Sebastian, para se sentir mais à vontade, senhorita.

- "Sebastian"... - Ela pronunciou cada letra, como se as saboreassem em sua língua. - não acha inapropriado? Q-quer dizer, não lhe incomoda que outros não íntimos o chamem pelo nome?

- Não é algo que me aflige. Além disso, como poderia me incomodar ao ser chamado por uma companhia agradável, como a senhorita?

Ela desviou o olhar, focando apenas no caminho que traçamos.

Aromas, cheiros. Todos os humanos possuem um.

Senhorita Irene e seu aroma; uma mistura, um cheiro de algo recém-desabrochado, como margaridas, exageradamente doce como esperança, em contraste com o amargo da curiosidade e de algo mais picante, paixão? Com certeza.

Poderia reconhecer este cheiro a quilômetros. O cheiro de uma virgem.

Uma curiosa e inocente virgem, movida pela curiosidade e o almejar de tocar seu marido. Um fedelho crescido que está mais preocupado com vinhos e álcool, do que com os desejos carnais e sonhos com a lua de mel, de sua amada.

Pobre alma mal desafortunada, que procura pelo quente, pelo prazer que sabe-se lá quando virá. Uma alma feminina que procura por um verdadeiro homem.

Será uma tarefa simples.





[...]





No papel, eu anotava tudo que achava útil. Os dez dias de desaparecimento, os nomes dos pais do Conde, o incêndio, tudo que pudesse usar mais tarde!

Mas, há algo faltando. O Conde sumiu no dia quatorze, e retornou dia vinte e quatro, mas apenas Sebastian estava com ele. Obviamente, ele foi o primeiro novo servo a chegar na mansão. Mey-Rin e os meninos chegaram depois. Considerando que todos chegaram no ano de oitenta e cinco, eles só teriam uns seis a sete dias até chegarem à mansão, antes do ano novo!

Ele recrutou novos servos muito rápido. Mas, como?!

Comecei a revirar os jornais, mais uma vez. Procurando por mais informações úteis, mas do dia vinte cinco até trinta e um, já não haviam mais notícias sobre o Conde.

- Que droga... - Insisti, revirando todos os jornais de dezembro pela segunda vez. - preciso de mais alguma coisa!

Olhei para o relógio, eram quase quatro horas!

Tentei organizar minha bagunça, separando os jornais com informações úteis, das inúteis! Restaram apenas dois, o jornal de quatorze de dezembro, e o do dia vinte e cinco.

Tinha que ter algo, alguma coisa que eu não estava enxergando. Talvez, o nome daquele que escreveu essas matérias?!

Procurei pelas letras pequenas, nos cantos da manchete!

"Andrew Montagu".





[...]





- As flores de primavera são belas, não?

- Você entende de flores?

- É claro... - Tirei, delicadamente, um lírio, de um dos vasos que havia posto recentemente. - lírios, minhas preferidas... - Entreguei a flor a ela. - e as suas?

Se sentiu desajeitada por alguns instantes ao receber a flor, mas logo tentou se recompor para responder minha pergunta.

- Tulipas, elas são minhas preferidas, eu acho.

Ela encarou, de forma melancólica, os lírios em suas mãos. Algo a afligia.

- Se sentindo bem, senhorita Diaz?

- Nada demais, eu apenas, e-eu não sei se deveria dizer.

- Senhorita... - Me aproximei e, delicadamente, toquei os lírios, tocando propositalmente suas mãos. - o melhor confidente de uma madame, é seu mordomo.

- M-meu mordomo?

- Vamos, o que lhe aflige?

Sorri convidativo. Em um momento ou outro, com tanta fragilidade e inocência, ela iria ceder.

- Keane não fala sobre flores, bem, na verdade, ela não se atenta às coisas que amo. Eu gostaria que ele ao menos tentasse, que falasse um pouco menos sobre nossas bebidas e...

- Sinto lhe interromper, senhorita Diaz, mas se me permite dizer, senhor Keane deveria se interessar desesperadamente por seus gostos, afinal... - Com delicadeza, afastei de seu olho uma das mechas que caiam sobre seus olhos. - não é sempre que se encontra uma mulher tão delicada quanto a senhorita.

Batidas, eu podia ouvir as batidas aceleradas de seu coração, contra seu peito.

- Você é um cavalheiro, Sebastian.

- Nada mais que meu trabalho, senhorita Diaz. Agora, perdão pela intromissão, mas ouvi dizer que a senhorita tem um grande gosto pela música. Estaria interessada em conhecer nossa sala de música?

- O-oh, não. Não se preocupe, não precisa se dar o trabalho.

- Ora, de forma alguma. Uma vez tão majestosa quanto a sua deveria ser admirada, ao som de um bom violino. Não acha?

Batimentos mais acelerados, rosto quente, bochechas avermelhadas em contraste com a pele pálida e olhos claros.

A humana cedia, cada vez mais.

- S-se não for lhe incomodar ou dar trabalho, eu gostaria de conhecer.

- Esplêndido. Me acompanhe, por favor. Temos instrumentos de alta qualidade, afinados com perfeição e...

- Sebastian?

- Sim, senhorita Diaz?

Com timidez, ela se aproximou um pouco mais, entrelaçando seu braço ao meu.

- Me chame de Irene. Está bem?

Uma alma cada vez mais desesperada por um contato verdadeiro, o contato de algo ou alguém que a compreenda.

Que miséria.

- Senhorita Diaz, é inapropriado. Eu não posso...

- Por favor, Sebastian... - Disse apertando meu braço. - me chame pelo nome.

- Oh, Deus. Se me pedir com estes olhos, não terei como negar. B-bem, podemos prosseguir, senhorita Irene?

Ela sorriu, satisfeita e com os olhos brilhando em esperanças e satisfação.

- Sim!

Como os humanos são previsíveis.





[...]





- Senhor!

- A-ah! Você de novo, senhorita? Achei que já havia ido embora! São quase cinco horas da tarde, sabe que a biblioteca fecha às seis, certo?

- Eu sei, e sinto muito por estar te perturbando, mas preciso de ajuda! O senhor tem um telefone que possa usar?

- Um telefone? Ahm, apenas nos fundos da biblioteca, em meu escritório, mas não sei se deveria...

- Por favor senhor, não vou demorar sequer cinco minutos, eu prometo!

- Ah, se acalma minha jovem! Tudo bem, eu a deixo usar, mas seja breve. Posso me envolver em problemas por isso.

- Obrigada, muito obrigada!

- Não há de que, só pare de gritar! Vamos, atravesse o balcão e me acompanhe.

Ele disse enquanto tirava um molho de chaves do bolso.





[...]





- Nossa... - Ela soltou meu braço e caminhou pelo salão, maravilhada pelos instrumentos. - isto, tudo é tão belo. Esse violino, estas partituras.

- Feito de ébano puro e polido nos mínimos detalhes.

- Deve ter sido uma fortuna. Eu posso?

- A vontade.

Ela pegou o instrumento, deslizando seus dedos pelo instrumento.

- Sempre amei tocar violino, mas Keane diz que mulheres não deveriam perder tempo tocando instrumentos, então, eu o larguei.

- Tenho certeza de que ainda toca lindamente.

- Haha, quem me dera. Sinto falta de tocar, como antes.

- Não vejo motivos para esperar... - Peguei o arco do violino, deixado ao lado das partituras, e a entreguei. - pode tocar para mim, Irene?

- A-ah? A-agora? Não, não, Sebastian. Eu já não toco como antes, estou sem prática, sem toque, eu...

- Irene... - Uma aproximação mais avançada. Levei meus dedos ao seu queixo e inclinei sua face, aproximando nossos corpos lentamente, colocando seu rosto próximo ao meu. - tenho certeza de que, quaisquer que forem as melodias que escolha tocar, serão belas, assim como você.

Palpitações, voz trêmula, rosto ruborizado, total permissão ao toque.

Ela estava entregue, pobrezinha.

Me afastei, precisava me certificar de que ela mesma se hipnotizaria, se atrairia como um imãn e viria até mim.

- Que tal tocar a Sonata numero cinco, em fá maior?

- V-você acha que consigo?

- Eu tenho certeza.





[...]





O escritório era pequeno, antigo e um pouco bagunçado. Paredes brancas, mas amareladas pela velhice, com manchas de umidade aqui e ali. O piso rangia conforme o senhor andava de um lado para o outro, mexendo em suas coisas enquanto falava comigo.

Pilhas de documentos amarelados e empoeirados acumulados pelas pequenas e tortas estantes.

- Bom, aí está. Se precisar de algo, me chame.

- Muito obrigada, senhor! E p-perdão por incomodá-lo tanto, novamente. Juro que seria breve!

- Está bem, está bem. Eu já entendi... - Ele abriu a porta de seu escritório e tirou a chave da maçaneta. - estarei aqui fora.

Ele saiu.

Abri o caderno e comecei a procurar pela letra "T".

"Thomas Watson"; "Timothy Williams"; "Todd Murphy"; "The Daily Telegraph"! Encontrei!

Liguei para a central telefônica de Londres, esperando que alguém atendesse.

- Vamos, vamos! Atende!

- Central Telefônica de Londres! Como posso lhe ajudar?

- Perfeito! Q-quer dizer, aham! - Limpei minha garganta, ainda agitada e quase me engasgando. - Boa tarde, eu gostaria de ligar para uma empresa.

- Ah, uma chamada comercial? É claro! Para qual empresa deseja ligar?

- O jornal "The Daily Telegraph"!

- Oh, a senhorita é jornalista?

- Ahm, não exatamente. Mas enfim, pode fazer isso?

- É claro, aguarde um momento, por favor.

O telefone ficou mudo, e eu continuei na linha, esperando ouvir a voz de alguém.

Um minuto se passou, dois minutos se passaram...

- The Daily Telegraph, como posso ajudar?

Finalmente! Consegui!

- Olá, boa tarde! E-eu preciso falar com um de seus jornalistas.

- Do que se trataria?

- Dois artigos publicados em oitenta e cinco, por Andrew Montagu! Ele trabalha para vocês, certo?

- Andrew Montagu? Perdão senhorita, mas ele não escreve para nossos jornais hoje em dia.

- O que? Como assim?

- Ele se demitiu dois anos atrás.

- Não tem algum contato? Alguém com quem eu possa falar? O endereço dele ou algo assim?

- Sinto muito, senhorita, não há nada que eu possa fazer.

- Como não? Ele deve ter um meio para contato, ele é um jornalista e...

- Senhorita, o senhor Montagu não está mais em Londres. Não posso fazer nada para ajudá-la, justamente por isso.

- N-não está mais em Londres? Como assim?

- Ele viajou para a África, para fazer suas próprias pesquisas. Eu sinto muito, senhorita.

Mas que merda!

- Não, tudo bem. Obrigada por seus serviços.

- Não á de quê.

Desliguei o telefone.

Eu não poderia sair de mãos abanando.

Desliguei o telefone e sai do escritório.

- Senhor?

- Sim, - Ele dizia com um cachimbo na boca, enquanto escrevia algo sobre o balcão. - o que foi desta vez?!

- O quanto me cobraria por levar aqueles jornais?

- O que?! Está louca? Não posso lhe vender os exemplares da biblioteca, é algo público e...

- Trezentos euros pelos jornais!

Nunca fiquei tão satisfeita por receber um salário.

- Senhorita?! Que absurdo! Eu não vou...

- Setecentos.

Droga! Teria que apelar.

- S-setecentos?!

- Ninguém precisa saber que os vendeu para mim. Temos um trato?

- E-eu não deveria lhe...

- Setecentos e cinquenta!

Ele olhou para os dois lados, como se conferisse se havia mais alguém no lugar.

- Tsc! Tudo bem! Mas não quero ver a senhorita por aqui, por um bom tempo! Entendeu?!

- Não precisa se preocupar... - Tirei o dinheiro de minha bolsa e o entreguei, apressada. - foi um prazer fazer negócios com o senhor!

Olhei para o relógio, eram quase seis horas.

Era hora de pegar minhas coisas e voltar à mansão!





[...]





- E então? O que achou?

- Bravo, não tive dúvidas quando a vi com o violino em mãos. Deveria voltar a tocar com frequência.

- V-você acha? Eu não sei se Keane concordaria...

- Não limite suas felicidades pela opinião de terceiros, é uma dama espetacular demais para isso.

- Sebastian...

- Sim, senhorita Irene?

- Você é tão inteligente, tão culto. O que faz sendo um mordomo?

- Conhecimento não é uma questão monetária, senhorita. Os mais brutos e ignorantes podem ser os mais ricos, e os geniais, os mais miseráveis. Infelizmente, não nasci em um berço de ouro para fazer bom uso de tudo que sai, mas estou satisfeito levando uma vida honesta e simples, como mordomo.

- Uma vida honesta... - Ela colocou o violino sobre seu colo e se sentou ao meu lado, no sofá. - eu gostaria que Keane quisesse levar uma vida como essa, mais simples e honesta.

Ora, ora. Estamos chegando a algum lugar.

- O que quer dizer, senhorita?

- Eu, e-eu não posso contar! O colocaria em sérios problemas, caso dissesse!

- Irene... - Ela se atentou e olhou diretamente em meus olhos, quando claramente a chamei apenas por seu nome. - se algo pesa em sua consciência, deve expor e desabafar, caso contrário, poderá se decepcionar com o resultado.

- Sebastian... - Desta vez, ela avançou, pondo as mãos sobre as minhas, aproximando seu corpo. A mãos trêmulas e suadas, os lábios secos e entreabertos, as sobrancelhas levantadas em suplicação, o peito subindo e descendo palpitante, os olhos inocentes e esperançosos. Ela estava totalmente entregue. - você foi uma companhia maravilhosa nas últimas horas. É um homem tão culto, inteligente, cavalheiro e carinhoso.

- Aquece meu coração ouvir elogios de alguém como você, Irene.

Seu corpo se arrepiava e sua respiração falhava ao ouvir meu nome sair de minha boca.

Completamente entregue a mim, de pés e joelhos juntos; suplicando por aproximação e por afirmações de paixão. Esperançosa de que de mim, poderia conseguir o que nunca conseguiu de seu noivo.

Submissa, digna de pena.

Esses são os humanos.

- Senhorita Irene... - Coloquei minha mão em sua bochecha, a dando leves carícias. Seu rosto caía para o lado em resposta. - posso lava-la a um lugar?

- S-sim, claro.

- Venha comigo.

Segurei sua mão, a guiando para fora do salão.

Seria arriscado permitir que algo ocorresse ali. Seria mais prudente um local mais privado, onde não seríamos vistos.





[...]





- Mey-Rin? Está aí?

- Amelia? Amelia! Você chegou... - Ela largou os talheres que estava limpando na mesa, e veio até mim. - por que demorou tanto?

- A estrada estava horrível! Houve um acidente entre três carruagens. Fiquei o dia todo na rua, esperando que as coisas melhorassem.

- Meu Deus! Alguém saiu machucado?

- Não, por sorte.

- Ah, menos mal!

- E então, onde estão Bard e Finny?

- Ah, na estufa! Estão trocando alguns vasos de lugar.

- Entendi. E você?

- Ah, estava pensando em preparar um chá com sanduíches. Aceita?

- Talvez mais tarde. Onde está o Jovem Mestre?

- Acho que está no escritório! Tem visitas, hoje.

- Visitas?

- Sim! Um casal veio visitá-lo para almoçar. No fim, passaram a tarde toda aqui! Precisa falar com ele?

- Não, só queria saber. Bom, eu vou à biblioteca, queria procurar algumas coisas.

- Tudo bem. Ah, e Amelia, t-tem mais uma coisa...

- Hm?

- Sobre aquela noite, a-aquele treinamento.

- Oh, sim.

- Olha, eu não queria te assustar. Eu sinto muito se...

- Vamos conversar sobre isso mais tarde. Está bem?

- Ah, s-sim. Acho que pode ser.

Ela pareceu desanimar aos poucos, mas não estava com tempo para essas conversas! Precisava conferir a biblioteca mais uma vez. Ver se encontraria algo útil para me ajudar.

Ainda com minha bolsa em mãos, sai da cozinha e subi as escadas com pressa e corri para a ala leste, em direção a biblioteca.

Quando cheguei, larguei a bolsa na primeira poltrona que vi, e comecei a correr pelos corredores e prateleiras.

Droga! Onde ficava a estante de periódicos?! Eu me esqueci!

Comecei a andar apressada, e um pouco perdida entre as estantes.

Era ao lado da seção de literatura inglesa? Ou duas sessões depois dos clássicos? Que me lembre, era algo perto da sessão acadêmica ou...

Sebastian?!

Demorei a entender e interpretar a cena, não parecia real!

A mulher pressionada contra a estante, seu corpo colado ao de Sebastian, as cinturas tomadas com certa possessão e força, por ele. A boca entreaberta e rendida; as mãos em volta dos ombros largos; o peito subindo e descendo, ofegante; os cabelos bagunçados no que, provavelmente, já foi um penteado.

Que diabos era aquilo?!

Ela pulou nos braços de Sebastian quando me viu, abrindo bem os olhos, espantada, tentando arrumar sua postura, como se "nada" estivesse acontecendo.

- A-ahm, eu, e-eu... - Ela olhou para mim, olhou para Sebastian, sua expressão era de total desespero e nervosismo. - eu preciso ir! Adeus!

Ela empurrou Sebastian e saiu correndo.

Ele me encarou. Não foi com afeição desinteressada de sempre, o sorriso sarcástico com ar de superioridade, ou a expressão sombria, que vi poucas vezes.

Era algo diferente, algo que dizia "Você não deveria ter visto isso".

Virei as costas e fui embora, antes que ele tivesse a oportunidade de falar qualquer coisa.

Tinha acabado de, provavelmente, me meter em uma confusão. E isso era o que eu menos desejava!

Eu não sabia ao certo o que pensar sobre aquilo. Não era de minha conta, mas não me parecia certo, em nenhum sentido.

Me parecia até mesmo, a-até mesmo nojento.





[...]





- Que inferno... - Me joguei em minha poltrona, exausto. - esse tal Keane é um completo imbecil. Nunca vi alguém falar tantas idiotices, uma atrás da outra. Acho bom que tenha valido a pena, entendeu?

Sebastian começou a recolher a louça em minha mesa e os por na bandeja. Quis comer alguma coisa depois de passar uma tarde toda distraindo aquele idiota!

- Suas suspeitas estavam corretas, Bocchan... - Ele recolheu a xícara e os garfos. - senhorita Irene se mostrou bem frustrada com seu casório ao longo da tarde.

- E...

- E ela mencionou, de certa forma, atividades ilícitas da parte de seu marido. Mais tarde, consegui convencê-la" inconscientemente a falar". Senhor Keane tem falsificado os selos reais e usado desse fator para aumentar suas vendas e exportar suas bebidas para outros países, além disso, sua noiva admitiu saber que o mesmo tem feito uso de trabalho escravo na produção de seus produtos.

- Trabalho escravo? Especifique.

- Negros africanos.

- Entendo. Definitivamente temos um problema... - Abri uma de minhas gavetas e peguei uma folha em branco, junto a minha caneta tinteiro. - escreverei para a rainha, e então, ela poderá tomar suas próprias providências e escolher o que fará com os dois. Além disso, quero saber quem está fazendo a exportação dessas bebidas, o dono do navio e etc. Além disso, pegue a caixa de bebidas que nos deram e as jogue fora, não pretendo provar estas porcarias. Nem hoje, nem aos dezoito anos. Entendeu?

- Completamente. Precisa de mais alguma coisa, Mestre?

Eu já sabia qual seria a resposta, mas preferi arriscar a tentativa.

- Quero uma xícara de leite com mel.

- Yes, my Lord.

Ah?

Olhei para o relógio, eram dez da noite. Sebastian insiste em não me deixar comer ou beber qualquer coisa doce depois das oito.

Tem algo de errado.

- Ei, volte.

O chamei, quando estava com as mãos na maçaneta.

- Mais alguma coisa, senhor?

- Tem algo que não está me contando, por acaso?

Um silêncio de segundos, que se pareceram com um minuto, tomou conta do escritório.

Sebastian raramente demorava a me responder. Raramente.

- Nada que seja útil, senhor.

- Útil? Então me conte o inútil.

- Bocchan...

- Não enrole, ande logo, fale.

Ele voltou até minha mesa, olhando no fundo de meus olhos.

De noite, meu escritório sempre ficava mal iluminado, considerando que tinham apenas dois abajures para iluminar.

Essa escuridão fazia com que os olhos de Sebastian parecessem brilhar.

Para a maioria das pessoas era algo que assustava, e na grande maioria das vezes ele podia controlar isso, fazia por pura diversão, porque gostava de assustar os outros.

Mas, ele sabia que isso não funcionava comigo. Então, por que estava fazendo?

Será que, desta vez, era involuntário?

- Ela viu.

- "Ela" quem?

- Senhorita Amelia.

Se antes estava curioso, agora estava realmente interessado.

Por que algo assim o preocuparia?

- Interessante. Mas, francamente, pouco me importa. O prejudicado é você, e não eu.

- E se ela disser algo aos outros servos?

- Sabe que eles não vão acreditar.

- Não podemos ter certeza.

- Sebastian, estamos falando de Mey-Rin, Baldroy e Finnian. Está pondo muitas expectativas em cima deles. Além disso, para de querer jogar desculpas idiotas para cima de mim, sabe que isso me irrita.

- "Desculpas"?

- Ah, por favor... - Revirei os olhos, já me irritando. A situação me parecia tão óbvia. - não sei exatamente o que é "isso" que você tem, mas você claramente tem uma cisma Amelia. Tem algo nela que te interessa. Não tem?

- Bocchan, mencionei apenas para que o senhor ficasse sabendo, e para alertar da possibilidade dos boatos entre os outros servos. Não possuo nenhum interesse afetivo nela, nem mesmo se quisesse. Como já lhe disse antes, não compartilho do mesmo sentimento que os humanos.

Não estava duvidando de sua afirmação, mas talvez, questionando algumas de suas vertentes.

Quer dizer, seria burrice de sua parte perder tanto tempo com uma mera humana, "atoa". A valsa, as implicâncias no trabalho, as conversas que ele mesmo a envolvia, os questionamentos a todos os seus métodos.

Eu conhecia Sebastian, ele não era insistente e se cansava dessas brincadeiras idiotas facilmente.

Acho que aquilo já deixou de ser diversão a um certo tempo.

- Será que não?

- Absolutamente não.

- Nosso contrato não tolera mentiras, Sebastian.

Sebastian ficou em silêncio. Não disse mais uma palavra sequer.

Foi o que pensei.

Não acho que isso seja uma confirmação, se fosse, ela não hesitaria em admitir, afinal, seria contra nosso contrato se o fizesse.

Aquele silêncio era uma afirmação de que, nem mesmo ele sabia o que estava acontecendo.

Amelia Watson, você tornou as coisas muito mais interessantes por aqui!

- Saia daqui e vá pegar meu leite com mel.





[...]





- Fico feliz que tenha vindo.

- É claro que eu vim... - Fechei as portas que davam no telhado. - eu disse que poderíamos conversar mais tarde. Não disse?

- É, disse.

Mey-Rin estava quieta, sentada na beira do telhado, olhando para baixo. Me aproximei e me sentei ao seu lado.

Eu sabia que, uma hora ou outra, essa conversa aconteceria.

- O-olha, eu vou ser direta! Eu não sei direito o que eu fiz, n-não sei se te machuquei, mas eu quero pedir desculpas... - Ela agarrou minhas mãos com força. - me desculpa se te assustei, me desculpa se foi demais pra você, mas as coisas não podem continuar assim.

Ah? Eu não esperava essa última parte.

- O que quer dizer?

- Amelia... - Ela tirou os óculos e os deixou de lado. - eu já percebi, você não gosta de errar. A cada tombo, a cada passo que você errava, eu via seu rosto se retrair, o jeito como você se frustrava. Você não gosta de errar, não é?

Àquilo, a-aquilo me pegou de surpresa.

"Errar" não era uma opção, onde fui treinada, errar era sinônimo de um nariz sangrando, um soco, um xingamento após o outro.

E eu sei, que mesmo depois de tudo aquilo, eu levei essa "mania" comigo.

Eu tinha medo de errar, medo do que poderia acontecer em seguida.

Mas agora, agora eu odeio, e odeio a mim mesma quando erro.

Como cheguei a esse ponto?

- Mey-Rin, eu, e-eu não... - Eu estava procurando palavras, mas se quer sabia o que iria dizer. - eu não sei. Desculpa, eu não faço ideia

- Tudo bem, não precisa dizer... - Ela passou o braço em volta de meu ombro. - errar é humano, e você não deveria se cobrar por isso.

- Mas, errar não é bom. É fraqueza.

- Claro que não! Você não precisa errar várias vezes pra acertar uma receita?

- Sim! Mas, bem, n-não necessa...

- Você não precisa cair várias vezes do cavalo, até conseguir montar?

- É, precisa. Mas errar não...

- Amelia! Não tem "mas". Pra ser forte, você precisa errar. E se você errar, ninguém vai te culpar, eu não vou te culpar.

- Não sei Mey-Rin, n-não estou acostumada com esse tipo de coisa.

- Que tal dar uma chance? Tente acertar alguns ataques, sem cobranças. Apenas tente, e caso você erre, é só tentar mais uma vez. Pode ser?

Me mantive quieta, para mim, a cobrança sempre fez parte dos treinamentos. Evitar os erros ao máximo, se cobrar e tentar até as mãos sangrarem. Aprender na base da dor, pressão e medo.

Foi assim que aprendi, assim que me ensinaram.

- Amelia, por favor. Confie em mim.

Eu não podia desistir do treinamento, mesmo que quisesse. Não poderia brigar, bater o pé no chão e ir embora.

Eu teria que ficar, e teria que ouvir Mey-Rin.

Tudo bem, eu posso tentar.





[...]





"Hoje foi um dia estranho. Eu gostaria de começar falando sobre a investigação mas, algo...bem estranho aconteceu.

Vi Sebastian cortejando, ou melhor, agarra do uma visita. Foi nojento de se ver. Claro, eu não me importo nenhum pouco com o que ele faz ou deixa de fazer em sua rotina. Minha única preocupação é que ele venha e me encher por conta deste assunto. Espero mesmo que isso não aconteça.

Quanto as informações que descobri, são todas impressionantes! Não são com toda a exatidão o que preciso, mas com certeza serão uteis! Compreender o incêndio, os dez dias de sumiço do Conde e a forma como ele e Sebastian já estavam juntos desde tudo que ocorreu...é misterioso e interessante.

Eu tenho muito mais para estudar. Muito mais para entender e descobrir. Hoje fazem quarenta e sete dias que habito a mansão Phantomhive"

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