XV - A Data
05/03/1888 - Segunda-feira
- Ahm, e-eu não sei se é uma boa ideia deixar você fazer tanto esforço, Amelia! Suas mãos ainda estão meio machucadas! E todo aquele frio, a hipotermia e toda a...
- Mey-Rin, já te disse que estou bem! Não precisa se preocupar. - Continuei a passar o esfregão pelo piso. - Inclusive, que horas acha que o Jovem Mestre deve retornar?
- Pelo tempo que ele saiu, deve voltar daqui a pouco! Ele não costuma demorar muito quando vai visitar a senhorita Sullivan.
- Hm... - Olhei para o pequeno relógio, em uma das pequenas mesas decorativas do corredor. - são onze da manhã.
- Sim, sim, eu sei! - Ele pegou seu esfregão e colocou dentro do balde, recolhendo também o pote com cera que havíamos trazido. - O que tem?
- Bom, são onze da manhã e é hora do chá. Sebastian não te encarregou de preparar o chá da manhã? Para quando o Jovem Mestre voltasse e...
- MEU DEUS! E-eu esqueci completamente! - Ela começou a se mexer de um lado para o outro, olhando para todos os cantos, sem saber por onde começar. - Ahhh! O-o que eu faço?
Como sempre, uma desajeitada.
Sinceramente, me sinto cercada de idiotas.
- Já que ele está chegando, desça e monte a mesa. Simples.
- Não é isso! Ele disse que queria a mesa montada para o chá da manhã e o escritório limpo, ANTES que eles voltassem! Ah, eu fui uma tonta, estou morta! Senhor Sebastian vai ficar bravo comigo, de novo!
Escritório?!
- Eu posso te ajudar, se quiser!
- E-em?!
- Sim! Eu posso limpar o escritório enquanto você prepara a mesa. Que tal?
- E-eu não sei, limpar o escritório leva tempo!
- Por isso mesmo! Com nós duas trabalhando, tudo vai ser mais rápido.
- Não sei, Amelia...
Droga...preciso apelar!
- Mey-Rin, eu tenho certeza de que se Sebastian chegar em casa e encontrar as tarefas que te deu feitas, ele ficará bem orgulhoso de você. Não acha?
- Orgulhoso?!
- Isso mesmo. Imagine só, seria um bom jeito de começar a conversar com ele, passar um tempo juntos, falar sobre outros assuntos e...
- E-eu já entendi! Já entendi! Tudo bem, eu aceito a ajuda! - De forma desajeitada, ela alcançou seus bolsos, retirou um molho de chaves e me entregou. - Eu deixei o material de limpeza do lado da porta! É só pegar e usar.
- Entendi.
- Até daqui a pouco!
Ela saiu correndo pelos corredores.
Olhei para as chaves em minhas mãos, ali tinha as chaves do escritório do Mestre.
Eu não tinha tempo a perder!
Corri para o escritório o mais rápido que pude. Atravessando cada corredor e, até tropeçando nos tapetes.
Quando cheguei, os materiais de limpeza estavam realmente ao lado das portas. Eu tentei girar as maçanetas. As duas estavam trancadas.
Comecei a testas chave por chave, sem muito sucesso nas primeiras cinco tentativas.
- Vamos, vamos... - Tentei de novo e de novo. - tem que ser uma dessas!
Trik!
- Isso!
Na décima chave, a tranca da porta fez barulho!
Antes que pudesse esquecer, peguei os produtos de limpeza. O balde, já com água, os panos, os esfregões, e então entrei.
Deus do céu, por onde eu deveria começar?
Eu deveria deixar tudo limpo, mas ao mesmo tempo, tinha muito o que investigar. Não tinha a menor ideia de quando o Conde chegaria. Se estava perto ou longe, se eu teria tempo de investigar todo o lugar.
Era melhor começar a investigar, e rápido.
[...]
Total fracasso.
Estava sentada no chão, com meus materiais de limpeza em volta, me sentindo uma inútil, totalmente derrotada!
Eu revirei o escritório INTEIRO e não encontrei nada! Não é possível! Qual o problema com esse lugar?! Tinha que ter algo, alguma coisa.
Nada debaixo dos tapetes, nada entre os livros da estante, nada na escrivaninha, meu deus, não havia se quer UM piso solto que pudesse investigar!
- Tem que ter alguma coisa, não é possível... - Me levantei, em negação, e fui até a escrivaninha mais uma vez. - precisa ter alguma coisa! - Abri as gavetas, como se alguma informação fosse surgir magicamente, mas nada, não havia nada. Os mesmos relatórios da Funtom, onde não havia nada de interessante. Nenhum desvio de dinheiro, nenhum contato com traficantes, nenhum sinal de trabalho escravo, nada. - Mas que DROGA!
BANK!
Bati a gaveta com toda a minha força, a fechando com ódio.
Ela não se fechou.
- Hm?
Encarei a gaveta aberta. Tentei fecha-la novamente, não deu certo. Ela "bateu" e voltou, como se fosse uma mola.
Eu a quebrei?!
Resolvi abri-la mais uma vez, tentando entender o que tinha feito de errado.
Era muito mais que isso.
O fundo, de madeira, da gaveta estava empenado, para cima. E tenho certeza de que não estava assim das primeiras vezes que a abri para limpar.
Resolvi tirar todas as pastas, envelopes e folhas soltas, para enxergar melhor. Já vazia, a empurrei um pouco mais para frente, para enxergar melhor.
- Mas que... - E então, notei uma fresta estreita, entre a madeira e o fundo. Tinha algo ali. - não pode ser. - Abri a gaveta de baixo, e dela retirei uma tesoura. - Precisa funcionar.
Coloquei a tesoura sobre a fresta e empurrei a madeira empenada ainda mais para cima.
O fundo cedeu, se movendo por completo e saindo do lugar. Era falso, um fundo falso.
Meu deus! Merda, eu sabia! Eu consegui! CARAMBA!
- Não acredito... - Olhei para os lados, como se quisesse confirmar que estava mesmo sozinha. Não poderia deixar que ninguém me encontrasse assim. - merda, é arriscado demais. - Me levantei o mais rápido que pude e, como não se trancam portas nessa mansão, corri até a pequena mesa de cabeceira, abandonada no canto do cômodo, e a empurrei até a porta. - Perfeito!
Eu não poderia deixar que aquilo durasse muito tempo. Mey-Rin poderia sentir minha falta, o Conde poderia chegar a qualquer momento, eu poderia ser facilmente descoberta, e tudo poderia acabar em questão de segundos.
Não poderia deixar que algo assim acontecesse.
Corri de volta para a escrivaninha, quase me jogando no chão.
Desencaixei a gaveta do moveu e a coloquei em meu colo, finalmente arrancando, por completo, o fundo falso.
- Uau... - Não havia quase nada ali, mas o pouco que havia, me parecia valioso. Um envelope aberto, velho, com pedaços rasgados, e alguns, até mesmo queimados. - meu deus.
Eu precisava pensar rápido, não poderia levar aquilo comigo para qualquer outro lugar, seria totalmente arriscado, inconsequente.
Eu precisaria absorver o máximo de informações que conseguisse, ali e no exato momento. Afinal, eu não sabia quando a próxima oportunidade viria.
Com muito cuidado, retirei um pano limpo do bolso de meu uniforme, para não deixar qualquer marca, e com ele peguei o envelope. Era velho, sensível, sujo.
Parecia leve, provavelmente tinham poucas coisas lá dentro.
Com cuidado, fui empurrando, o que quer que estivesse dentro do envelope, para fora dele.
Pouco a pouco, começaram a e revelar. A tinta fraca, já sumindo em alguns pontos, o cheiro de velho, a poeira subindo cada vez mais, e aos poucos, foi se revelando uma...
- Uma lista de nomes?
Sussurrei para mim mesma. Nomes em baixo de nomes. Alguns já rabiscados, outros intactos, alguns com pontos de interrogação ao lado. Que diabos seria aquilo?
Era difícil ler o que estava escrito, tanto pela caligrafia, quando pela tinta falha.
Ainda com o papel em mãos, me arrastei sobre meus joelhos para mais perto das janelas, tentando usar a luz para enxergar melhor.
E realmente, algumas coisas ficaram mais fáceis de ser lidas. Agora sim! Eu poderia ler com mais exatidão.
Era uma lista extensa, com muitos, muitos nomes e rabiscos.
"Barão Kelvin, x"; "Viscount Druitt, ?"; "Grimsby Keane, x"; "Senhor Chlaus"; "Barão Diedrich, x"; "Aristocrata Lau, x"; "Senhor Pitt, x"; Azzurro Vanel, x".
Espera, "Azzurro Vanel"?! Eu sei quem ele é! Azzurro era de uma máfia rival! De vez em quando ele, ilicitamente, fazia negócios com a máfia Morretti e contratava um de nossos assassinos!
Ele morreu um ano atrás, assim como seus parceiros. Ninguém sabe o que aconteceu, e desde aquele dia, nunca mais se ouviu da máfia Ferro.
Que diabos o nome dele faz aqui?! Quem são essas outras pessoas?! E por que todos esses nomes com "x" e "?" ? O que isso quer dizer?
E tinha mais o que ser lido.
Logo abaixo de todos esse nomes, uma data. Uma data circulada várias vezes, tantas vezes a ponto que, alguns pedaços daquele papel estavam rasgados, e manchados com excesso de tinta.
"Quatorze do doze de mil oitocentos e oitenta e cinco."
Mil oitocentos e oitenta e cinco, de novo! Tenho certeza absoluta de que esse ano não pode ser só uma coincidência estranha!
Mas dessa vez, tem algo novo, esse "quatorze do doze", é quatorze de dezembro.
Ou seja, quatorze de dezembro, de mil oitocentos e oitenta e cinco.
O que isso quer dizer?
- AMELIA! O SENHOR SEBASTIAN E JOVEM MESTRE VOLTARAM! VEM!
Mey-Rin gritou, pela distância, do andar de baixo!
Merda, merda, merda!
- J-JÁ ESTOU INDO! JÁ VAI!
[...]
Pesquisar. O trabalho de uma assassina, ou melhor, uma assassina como eu, não se limita apenas a matar. Eu estudo, aprendo, descubro tudo que posso, arranco pelas raízes e exponho o que quer que deva ser exposto.
Mas com Ciel Phantomhive, essa tarefa era muito mais difícil. Totalmente diferente das coisas com as quais estive antes.
Eu nunca tive tão pouco progresso e nem tantas dúvidas em um trabalho em tão pouco tempo, como tem acontecido.
É como se minhas ultimas últimas vítimas fossem pequenas plantas, com no mínimo três fracas raízes no solo. Fáceis de se arrancar, fáceis de se encontrar e de destruir.
Mas não o Conde, não Ciel Phantomhive.
Era como se ele fosse uma forte árvore, com raízes grossas e profundas, que iam muito além da superfície do solo, cheias de histórias, segredos, quase impossíveis de serem arrancadas, destruídas. Mas, para o azar dessa "árvore", eu sou insistente, persistente, um machado muito bem afiado.
E por isso, com o dia chegando ao fim, eu usei meu tempo livre para vir a biblioteca na tentativa de descobrir algo sobre aqueles nomes, aquelas datas.
Parecia uma opção idiota, mas uma biblioteca com mil setecentos e quarenta exemplares precisava ter algo, algum segredo, qualquer coisa que pudesse usar. Aquelas estantes que iam do chão ao teto tinham que ter algo para mim.
Eram quase oito da noite, eu teria tempo para, pelo menos, começar por algum lugar, já que agora eu teria um norte para seguir.
"Azzurro Vanel", nome marcado com um "x", morto no ano passado, em oitenta e sete. Além da data quatorze de dezembro, de oitenta e cinco.
O que eu poderia conseguir com isso?
Antes de qualquer coisa, eu precisava entender o motivo pelo qual aquele ano se repetia tantas vezes. E principalmente, por que aquela data em específico?
Tudo bem, preciso me organizar.
Na biblioteca da mansão Phantomhive, os livros são separados em muitas categorias. Sendo bem cirúrgica e descartando, no mínimo, trinta categorias, sobravam duas que seriam realmente uteis.
Sessão de referências; nela contém dicionários, enciclopédias e glossários. Talvez isso pudesse me dar alguma pista. Não posso descartas a probabilidade de algum significado simbólico nessa data. Não posso descartar nenhuma ideia.
Outra opção, a sessão de periódicos; alguns jornais com noticias cruciais, revistas, periódicos acadêmicos e publicações regulares. O Conde paga por entregas desses periódicos mensalmente, e pelo tamanho da sessão, já deve colecionar a bons anos.
Vou escolher a mais óbvia, sessão de periódicos.
Já revirei ela algumas poucas vezes, procurando qualquer informação útil, mas não encontrei nada das primeiras vezes. Talvez agora, mais informada, eu consiga alguma coisa.
Andei até a sessão de periódicos. Os jornais, perfeitamente dobrados e empilhados, as revistas organizadas por cor e data de lançamento, os acadêmicos separados por data e cor. Um livro de capa...
Um livro de capa vermelha?
O livro, que destoava totalmente da sessão, chamou minha atenção. Tanto o Conde quanto Sebastian eram sistemáticos, organizados, perfeccionistas. Sabendo disso, nenhum livro deveria estar fora de sua devida sessão, é o tipo de coisa que enfurece o Mestre. Já ouvi muitas histórias de Mey-Rin, dizendo das broncas que Bard já levou por largas as revistas pela biblioteca, ou colocar qualquer livro fora de seu lugar, alfabeticamente escolhido.
Fiquei na ponta dos pés, me inclinei e estiquei meus braços para alcançá-lo.
- Arg! Porcaria... - Não era o suficiente. Olhei para os lados, procurando pela escada móvel. - aha! Te achei.
Fui até ela, a passos apressados. Agarrei em seus degraus e a arrastei até a sessão, parando bem ao lado do livro que queria alcançar.
Subi. Um degraus, dois, três, quatro, ela parecia meio bamba.
Parecia o suficiente para alcança-lo. Já longe do chão, estiquei meu braço mais uma vez. Estava tão perto, tão perto...
- Peguei!
Agarrei o livro, satisfeita. Desci as escadas, com cuidado, e quando cheguei ao chão, pude dar atenção ao livro.
Uma capa vermelha de couro envelhecido, intricado em padrão arabesco dourado, esculpido com minúcia no couro. Não tinha nenhum nome na capa.
- Retrato de Dorian Gray.
- AH!
Dei um pulo e quase me desiquilibrei ao ouvir a voz atrás de mim. Estava tão concentrada e vidrada nos meus próprios pensamentos que não reparei no, provável, som de passos se aproximando.
- Te assustei?
- Jovem Mestre? O que o senhor...
- Eu venho aqui no meu tempo livre, achei que já tivesse percebido.
E em questão de segundos me lembrei das, diversas vezes, em que vi o Conde com um livro em mãos, ou dos momentos em que o encontrei indo a biblioteca, enquanto estava trabalhando.
- Sim, claro. Eu notei.
- E então, - Ele estendeu o braço e, gentilmente, tirou o livro de minhas mãos. - você tem mesmo um gosto por leitura, não? "O Retrato de Dorian Gray"... - Ele disse, avaliando o livro, o abrindo e passando o dedo pelas páginas, devagar. - já leu, por acaso?
- Para ser franca, senhor, sou sim uma leitora frequente, mas não conheço o livro do qual o senhor está falando.
- Não o conhece? Hm, um tanto incomum para alguém que se diz leitor, se é que a senhorita de fato, é uma. Que tal... - Ele caminhou até uma das prateleiras, direcionou seus olhos para um livro de capa verde e o pegou. - um livro sobre a história de um estudante de direito que se une a uma trupe teatral?
Ele estava me testando...jogando comigo?
"Estudante de direito que se une a uma trupe teatral", eu já ouvi isso antes ou melhor, eu já li isso antes!
- "Le Capitaine Fracasse", estou correta?
Um sorriso curioso se fez presente em seu rosto.
- É, está... - Ele me entregou o livro de capa vermelha e devolveu o o outro em mãos a seu lugar na estante. Sem mais palavras, ele caminhou por mais prateleiras, deslizando seus dedos por cada livro que passava, até parar. Ele parou mais uma vez, seus joviais dedos pálidos puxarem mais um exemplar, capa roxa desta vez. - o que acha de um condenado que foi preso por roubar um pedaço de pão para alimentar sua família?
É, ele definitivamente estava jogando comigo. Mas, por que?
- Acho que se refere a "Les Misérables", senhor.
Não brinque comigo, pivete. Já li mais livros que tempo que tem de vida.
Ele não esboçou nenhuma reação desta vez.
- Sabe... - Ele guardou o livro na estante, mais uma vez. - me pergunto, por que uma serva teria tanto interesse em leitura? Poderia me dizer?
- Acredito que conhecimento em excesso nunca fez mal a qualquer um.
- É um ótimo ponto, com certeza.
Ele caminhou até mim mais uma vez.
- Isso me faz lembrar de uma frase de "O Poeta à Mesa do Café da Manhã". Sabe a qual me refiro?
- Acredito que sim, senhor.
- "A mente que se abre para uma nova ideia jamais voltará ao seu tamanho original."
- "A mente que se abre para uma nova ideia jamais voltará ao seu tamanho original." - Ele ergueu uma sobrancelha, me olhando de cima a baixo. Parecia minimamente curioso. - Então você é mesmo uma leitora voraz? Admito ter duvidado, por algum tempo.
- Pude notar o senhor me testando.
Disse passivamente.
- Eu gosto de comprovar os fatos, mas fico satisfeito em saber, encontrar um dos meus.
- Fico honrada em saber que temos algo em comum, senhor.
- Se quer realmente ter a certeza disso, leia Dorian Gray. E assim, quem sabe... - Ele caminhou até a estante de romances, e de lá retirou um livro cinza, de titulo bem aparente. "Le Tour du Monde en Quatre-vingts Jours", era o nome. - o livro te cative, como me cativou.
Sem mais palavras, ele colocou seu livro em baixo do braço e saiu da biblioteca. Me deixando só, com o livro de capa vermelha e couro envelhecido em mãos.
Ler Dorian Gray? "Te cativar como me cativou".
Quem sabe esta não pudesse ser uma pequena chance de conhecer mais de Ciel Phantomhive, de me aproximar de sua pessoa. Seria mesmo possível?
Independente disso, ainda devo admitir que seus gostos para leitura não são ruins.
Na verdade, se assemelham aos meus.
[...]
- Legumes assados.
- Legumes cozidos.
- Assados.
- Cozidos.
- Deus! Por que você tem que ser tão insistente? Já viu com seus próprios olhos. Jovem Mestre os prefere assados e temperados.
- Oh, não se chateia senhorita Amelia, mas cozinho para o Jovem Mestre a tempo o suficiente para saber quais as suas preferências.
- Não é o que parece.
Sussurrei
- Saiba que posso te ouvir, certo?
Urg! Ele é irritante!
- Tsc! Não estou mentindo, de qualquer forma... - Continuei a secar as louças que Sebastian me entregava. - o que custa mudarmos um pouco a receita? Se quer fazê-lo comer legumes, não deve servi-los cru, é óbvio que ele não vai gostar.
Eram quase dez da noite. Baldroy estava ocupado ajudando Finnian e Mey-Rin a limpar a estufa. Finny havia cometido um "pequeno" acidente, quebrando o telhado da estufa ao tentar empilhar alguns vasos nos braços.
Francamente, haja habilidade para causar desastres!
E no fim, eu obviamente, fui obrigada a ajudar Sebastian a lavar e secar o que restava da louça do jantar. Por que sempre nós dois?
- Os temperos dominarão o gosto dos legumes... - Ele dizia enquanto lavava habilmente uma taça de cristal, com suas mãos enluvadas. Esquisito! Por que não tirar as luvas? - estragará a ideia do prato.
- Do que adianta manter a ideia do prato se o Mestre não vai come-lo?
Ele parou de lavar por alguns segundos, como se tivesse parado para compreender melhor meu ponto.
- O que sugere então?
- Um trato. Que me deixe preparar o prato de amanhã, do meu jeito, com legumes temperados e assados!
- Arriscado demais para meu gosto. Não posso permitir que comprometa os pratos do jantar.
- Não irei comprometer. Mas, caso o faça, você é capaz de resolver, não? Já que , como você sempre diz... - Ele me entregou a taça, e com o pano, comecei a seca-la com delicadeza. Era fina demais. - "que mordomo Phantomhive eu seria se não pudesse fazer algo assim"?
- Sinto que está propondo algum tipo de disputa.
- Não. Estou apenas argumentando.
Não estávamos brigando, apenas debatendo sobre um assunto. Já era um grande avanço, pelo menos para mim, era.
Depois do acidente do lago, as coisas seguiram consideravelmente tranquilas entre mim e Sebastian. Ele me agradeceu pelo que fiz, disse que minha atitude foi "exemplar".
Apesar de não saber o real motivo por eu ter salvo seu Mestre.
O importante é, o progresso tem sido positivo, e sua companhia não tem sido tão desagradável quanto costuma ser.
Temos gostos um pouco parecidos. Algumas conversas e debates sobre culinária são interessante, musicas preferidas tocadas no piano, animais, mais especificamente, ele fala sobre os gatos e eu apenas ouço.
Essas conversas são raras e rasas. Acontecem em poucos momentos, quando estamos realizando o mesmo serviço ou no mesmo lugar. No cotidiano a troca é apenas um "Bom dia.", "Boa noite.", "Não esqueça de limpar o salão.", "Ajude Mey-Rin.", ou coisas assim.
É um progresso a passos lentos, mas com certeza é menos insuportável que antes. E de pouco em pouco, vou me acostumando com seu jeito.
Mas isso não significa que eu tenha me esquecido sobre todas os mistérios e dúvidas sobre sua pessoa. Não, eu não iria e não irei. Ainda quero desvendar sua pessoa, quero desvendar e Sebastian Michaelis como fiz com os outros servos.
Mas assim como seu Mestre, ele não era fácil de desvendar.
- Se for capaz de impressionar os convidados e, fazer com que o Mestre coma os legumes do menu de amanhã, adaptarei minha forma de cozinhar.
- Espera, fala sério?
- A senhorita queria um trato, por tanto, - Ele me entregou dois talheres, molhados com sabão e agua. - temos um trato?
Mais uma tarefa, ou melhor, uma prova de minha utilidade. Preciso preparar um bom menu com legumes temperados, amanhã!
Eu não poderia recusar a oportunidade de vê-lo perder para mim, muito menos, de mostrar ao Conde minhas habilidades como uma serva de confiança.
Era perfeito!
- Temos.
Segurei os talheres molhados e os "balancei", como se fosse um aperto de mão entre nos.
O sorriso do mordomo pareceu se alargar.
[...]
Ascendi a vela e a coloquei na mesa de cabeceira, ao lado de minha cama; dobrei meu uniforme e abotoei minha camisola; me sentei em frente a escrivaninha e soltei meus cabelos, penteando mecha por mecha, desfazendo seus nós e embaraços, e depois de penteados, os separei e comecei a trança-los, os prendendo de novo. Perfeito!
Fui até meu armário e abri a primeira gaveta, e de baixo de minhas roupas intimas, estava bem escondida a chave de meu baú.
A peguei, fechei a gaveta e voltei a escrivaninha; abri a terceira gaveta, onde estava meu baú.
Eu finalmente teria tempo para escrever sobre as coisas que encontrei no escritório e...
- Amelia? Amelia, está acordada?
Uma voz familiar chamou do outro lado da porta.
Me levantei e fui até a porta, girando sua maçaneta e a abrindo.
- Mey-Rin?
Ela ainda estava de uniforme. O que ela fazia de pé? Já era ora de se recolher, todos estavam dormindo.
- Preciso que venha comigo.
- Aconteceu alguma...
- Amelia... - Ela segurou meu braço, com força. Acho nunca a vi tão sério quanto naquele momento. - troque de roupa e venha comigo. São ordens do Jovem Mestre.
Isso não me cheira bem.
[...]
Degrau por degrau, e a cada vez ficava mais frio e húmido, estávamos indo para a adega.
Eu acompanhava Mey-Rin, que andava com uma lamparina em suas mãos, iluminando as escadas.
Não estava gostando da forma com que as coisas estavam se seguindo. Desde que saímos do quarto, ela não disse uma palavra. Aquilo me soava nossivo, ameaçador. Eu estaria pronta para lutar se precisasse lutar com ela, óbvio. A questão é, por que eu faria isso?
"São ordens do Jovem Mestre.", essa frase ficou na minha cabeça. Eu precisava descobrir do que ela estava falando.
- Mey-Rin, por que estamos indo para a adega?
- É o único jeito de chegarmos lá em cima.
- "Lá em cima"? Aonde?
- No telhado.
- Telhado?!
Parei de andar no mesmo estante, ela reparou. Deveria atuar como a serva confusa, a pobre e confusa Amelia, assustada. Mas, me vi alerta de qualquer forma. Que diabos faríamos no telhado? Quais os riscos de ser algum tipo de execução? Eu fui descoberta?
- O que vamos fazer no telhado?
- Ah, - Ela soltou um suspiro tenso. - o Jovem Mestre ordenou que te contasse só quando chegássemos lá, mas, olha...não acho que faça diferença te contar lá, ou aqui. - Ela colocou a lamparina no chão e segurou minhas mãos. - Você já deve ter percebido, mas nós não somos servos comuns.
Jura?
- O-onde você quer chegar?
- Eu não gosto de falar do meu passado, assim como Bard ou Finny. Todos passamos por coisas bem difíceis antes de chegarmos aqui. A questão, é que não fomos contratados por cozinharmos bem, limparmos bem ou qualquer coisa do tipo.
Isso já era óbvio, desde o começo.
- Então, e-eu estou confusa. O que vocês são?
Fiz minha melhor expressão de preocupação.
- Antes de servos, somos todos protetores do Jovem Mestre. Estamos aqui, antes de qualquer coisa, para protege-lo de possíveis inimigos e seguir suas ordens, sejam elas quais forem. Estamos preparados para qualquer ataque, qualquer invasão. Somos não só servos, somos praticamente soldados do Mestre.
Que surpresa.
- Soldados?!
- S-shiu! Fala baixo! O-olha, a questão é que, estou te contando isso porque, logo depois que você salvou o Jovem Mestre, ele me chamou pra conversar e ficou decidido que você deveria ser uma serva Phantomhive...por "completo".
- "Por completo"?
- Quer saber que, você deve saber o que somos, quem somos, e deveria se tornar um de nós.
"Um de nós"?
- O que isso significa?
- Significa que, pra continuar aqui e ser uma serva Phantomhive, você precisa ser treinada. Saber usar armas de fogo, lutar, defesa pessoal, habilidades furtivas e resumo, absolutamente tudo. E eu fui a escolhida para treinar você. Você precisa saber se proteger e proteger o Mestre.
COMO É?!
- Mey-Rin, m-mas...
- Eu sei, pode parecer um pouco assustador, mas eu sei que você pode se dar bem! A senhorita Elizabeth me contou como você mergulhou no lago para salvar o Mestre, como você foi corajosa! Você é jovem, tem um corpo saudável e, de novo, é corajosa! Além disso, o Jovem Mestre comentou sobre o seu currículo, que você aprendeu algumas coisas básicas sobre defesa depois de ter trabalhado no hospício de Londres. Eu tenho certeza de que com tempo e um bom treinamento, você pode aprender muita coisa!
O que eu devo fazer sobre isso?! Vamos Ayuni, pense rápido! Atue!
Merda, eu nunca cogitei uma situação dessas!
Atue, atue, atue!
- Eu não sei o que dizer. Q-quer dizer, eu nunca imaginei que você soubesse fazer esse tipo de coisa. Você sabe atirar?!
- Se eu sei? Ha! Você vai ver. Agora, por favor, acredite em mim. Você precisa saber lutar, se defender e defender os seus se quiser ficar aqui. Você entende?
Perder uma parte de minha noite com Mey-Rin, com certeza, não seria vantajoso. Eu sei lutar, sei usar armas de fogo, armas brancas. Não preciso desse tipo de coisa! Mas ao mesmo tempo, eu não poderia recusar.
Eu odeio treinamentos, ou melhor, odeio ser treinada. Mas, infelizmente, eu estava de mãos atadas.
- Sim, acho que entendo.
- Ah, que bom! Eu tenho certeza de que você será perfeita! Agora vamos - Ela de abaixou para pegar a lamparina. - temos muito o que aprender!
Mas que merda!
[...]
- Meu deus. Não imaginei que fosse tão alto!
Minha reação foi singela.
Quando chegamos a adega, Mey-Rin me revelou uma porta trancada, quase imperceptível, no meio daquele porão escuro e húmido. Ela o destrancou e nós subimos um longo, muito longo, lance de escadas até aqui.
Quantas outras portas secretas essa mansão poderia ter?
- É, mas você se acostuma!
- Mey-Rin, por que uma porta na adega?
- Uma porta externa seria muito mais perigoso, seria de fácil acesso para invasores! Por isso, a entrada para o telhado fica do lado de dentro da mansão, em um lugar que só nós, e agora você, conhecemos.
- Entendi... - Me inclinei para olhar um pouco mais para baixo, era realmente alto! - nossa.
- Não precisa se assustar, estou aqui com você! Agora, sobre o treinamento, você entende alguma coisa sobre alto defesa?
Eu, sim. Amelia, pouco, quase nada.
- Acho que não, eu sabia algumas coisas quando trabalhava no hospício, mas faz tanto tempo.
- Ótimo! Significa que você tem, pelo menos, uma base! Já dá pra começar por ai! É importante saber se defender. Afinal, ninguém pode defender o outro, se não sabe se defender.
Isso só pode ser brincadeira.
- Vou te perguntar uma coisa... - De repente, ela puxou uma faca de baixo de seu vestido! - o que você faria se alguém estivesse apontando uma faca para você?
Tsc! Esse vai ser o mesmo treinamento que tive anos atrás. Vou responder de acordo com o que me ensinaram.
Simples, não?
- Eu o ataco.
- O que? Não, não!
Ah? Como não?!
- Escuta, o objetivo da alto defesa é evita, ao máximo, que você se machuque. Brigar vai ser sempre a última opção!
- Então, o que preciso fazer?
A pergunta foi verdadeira! Que diabos eu tenho que fazer, se não atacar?!
- Quatro passos. Manter o foco, é importante que você saiba o que acontece a sua volta, mas seus olhos tem que estar no seu oponente, e só nele; manter distante e esperar o ataque, nunca fique perto demais, isso dá vantagem pra um ataque rápido e imprevisível vindo dele, e você terá menos tempo pra se mover, além disso se você não se mexer, o seu oponente com certeza vai; desarme, quando ele te atacar, a coisa mais importante a ser feita é o desarme, arrancar a arma da mão dele; imobilizar, com a arma fora do caminho, você precisa garantir que seu oponente não vá mais conseguir te atacar, você precisa ter certeza de que ele não pode mais se mover ou chegar perto. Esses são os quatros passos da alto defesa. Você entendeu?
É, isso é, com certeza, diferente do eu aprendi.
- Ahm, acho que sim.
- Acho que vai ser melhor se eu puder te mostrar... - Ela segurou minha mão e pôs a faca sobre ela. O que ela estava pensando?! - tente me esfaquear.
QUE?!
- O que?! N-não! Está louca, Mey-Rin?!
- Eu prometo, vou ficar bem. Agora, vamos fazer como te ensinei... - Ela começou a dar passos para trás, ficando a alguns metros de mim. - segundo ponto, distância. Qual era o primeiro?
- M-manter o foco?
- Exatamente, por isso... - Ela tirou os óculos do rosto e os deixou no chão. - não tire os olhos dos meus.
E mais uma vez, depois de muito tempo, pude olha-la em seus olhos. Aqueles olhos castanhos e profundos, olhos de coruja.
Tsc! Não importa o modelo de treinamento, eu vou conseguir.
Mantive meus olhos fixos nos dela.
- Muito bom, agora coloque um pé na frente e o outro atrás, dobrando seus joelhos e inclinando um pouco sua coluna. Você precisa estar nessa posição, quando tiver que correr.
Obedeci, mesmo já conhecendo a posição.
- Isso, agora... - Ela assumiu a mesma posição que eu. - tentei me atacar, e a qualquer momento, sem avisar.
Olhei para a faca, senti meu coração acelerar, e minha respiração se tornar mais profunda. Tensão.
Esperei, esperei e esperei mais. Se passaram segundos, mas para mim, era como se fossem minutos.
Mey-Rin seguia estática, olhando para mim com aqueles olhos, sem mover um músculo.
Eu não queria machuca-la, ou melhor, aquele não era o momento certo para machuca-la, não era o que eu planejava.
Mas, faz parte do treinamento. Eu preciso encontrar um jeito de acerta-la, mas sem feri-la. Talvez um pequeno, mínimo corte, fosse o suficiente? Nem muito profundo e nem muito raso. Era isso! O melhor seria a atar pelos lados. Eu faria um corte em seu braço e isso seria o suficiente.
Ela continuava parada.
Acho melhor contar até cinco.
Um, pernas separadas e prontas para correr; dois, respiração controlada e mãos firmes; três, rota calculada, já sabia exatamente aonde pisaria; quatro, olhos nos olhos.
Cinco, avançar!
Em um rápido impulso corri até ela, trocando as pernas e dando passos longos, correndo o mais rápido que posso!
Ela mal se movia! O que estava fazendo?!
Comecei a desviar de seu centro e andar para o lado, indo em direção a seu braço.
Estava chegando perto, já sabia aonde iria acertar; cada vez mais perto, levantei o braço que carregava a faca e firmei meu punho; estava MUITO perto, e ela continuava sem se mover.
Eu ia conseguir! Estava perto de mais para que ela pudesse recuar! Ia acertar! Eu ia...
Senti meus pés fora do chão.
ELA ME DEU UMA RASTEIRA?!
Era como se tudo estivesse lento, de repente. Vi brevemente os pés de Mey-Rin dando uma rasteira nos meus, e tão rápido quanto, sua mão esquerda agarrou meu punho, a outra agarrou minha cintura e me empurrou para baixo.
Ela me jogou no chão, e imobilizou minha mão, que segurava a faca. Seu corpo foi para cima do meu, fazendo peso em meu quadril. Com sua mão livre, ela cruzou meus braços e os bateu no chão. Com o impacto, minha mão soltou a faca.
- Viu? Imobilizar e desarmar.
Desgraçada! C-como ela fez?! Q-quer dizer, como ela conseguiu me, como eu não previ isso e...
Isso vai ser MUITO PIOR do que eu pensei!
Eu odeio treinamentos, odeio que me treinem, odeio que me toquem, odeio errar. Isso não vai dar certo.
*
- QUADRO DE CURIOSIADES -
Bem vindos ao "Quadro de Curiosidades", onde eu compartilho curiosidades sobre os personagens centrais da fanfic e, também, respondo algumas perguntas sobre os personagens!
Se você quer aparecer por aqui, tem alguma pergunta e deseja que ela seja respondida por mim, aqui nas notas finais, basta colocar o emoji "📖" e em seguida, sua pergunta!
E, desta vez, eu resolvi responder uma pergunta de uma querida leitora(o) @LIINYUNAII !!
A pergunta é: "Em quem você se inspirou para criar a Ayuni?"? E, hoje, eu estou aqui para responder essa pergunta!
Eu tive diversas inspirações para criar a Ayuni, mas o correto seria dizer que, sem dúvida, a minha maior inspiração foram as minhas próprias raízes. Pra quem não sabe, eu (a autora) sou de descendência árabe libanesa, e essa cultura é algo bem forte no lado materno da minha vida. Eu fui criada no meio da cultura árabe e quanto mais eu crescia, mais eu admirava.
Mas, eu nunca conheci muitas histórias com personagens femininas e árabes. E eu sempre achei as mulheres árabes EXTREMAMENTE lindas! Eu mesma sempre amei meus próprios traços árabes e sempre me perguntei como isso era tão pouco admirado pelas pessoas. Além disso, eu queria me sentir cativada pela minha protagonista, por isso, a forma que eu encontrei de fazer isso, foi criar uma personagem árabe, com cultura e muita personalidade! Enfim, é isso! Minha cultura foi minha principal inspiração.
Ah, outra coisa bem legal: Especificamente, na criação do cabelo da Ayuni, minha mãe foi minha maior inspiração. Quando ela era nova, ela tinha um cabelo IMENSO, lindo, extremamente preto e cheio. Algo de natureza bem árabe. Mas, mesmo tendo um cabelo muito bonito, ela INSISTIA em deixar ele SEMPRE preso. As pessoas nunca viam ela de cabelo solto e, sinceramente, quando eu era criança, me lembro muito pouco de ver ela com os cabelos soltos. KKKK!
Enfim, espero que tenha gostado da resposta!
*
Não esqueça de deixar seu voto "⭐️" e comentário!
Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top