XLVIII - Os Símbolos

16/07/1888 - Segunda-Feira

Eu passei quase a madrugada toda investigando, e apesar de não ter sido nada fácil, valeu a pena.

Com o caderno de Tobias, que era realmente maior do que eu imaginei quando folheei as primeiras páginas, consegui anotar e encontrar diversos padrões diferentes. Eu foquei, principalmente, em "marcas".

"Eles...marcaram você?"

A pergunta do Conde ficou na minha cabeça. Os Morettis colocaram um preço na minha orelha, mas ser marcada com ferro quente? Não era algo que eu já tenha visto dentro da máfia...até dar uma olhada nas fotos de Tobias.

Das muitas fotos com associados da máfia que vi, pelo menos vinte deles foram marcados a ferro, todos muito jovens. E nenhum deles chegou a de fato trabalhar para os Morettis, ficaram apenas alguns meses antes de serem...vendidos. Cheguei a conclusão que talvez essas marcações servissem como algum selo de mercadoria, realmente, como alguns fazendeiros fazem com o seu gado. Eu registrei três símbolos diferentes, que se repetiram bastante nas fotos.

Eu chamei o primeiro de "A Flecha", apenas por ser uma flecha envolta pelo que parecia uma gota, eu o vi pelo menos sete vezes no caderno, em homens que pareciam jovens adultos.

O terceiro é " O Carneiro". Um símbolo com espirais no topo, que lembravam chifres de carneiro ou um dragão estilizado, com uma forma pontiaguda no centro inferior. Esse foi o que mais se repetiu, e estava entre jovens de todas as idades, que pareciam variar entre quatorze e vinte e um anos.

E por último, apelidei o terceiro de "As Serpentes", um círculo onde haviam duas formas que lembravam serpentes se envolvendo no que se parecia com um cálice. Eu o vi apenas uma vez no caderno, em um rapaz muito jovem e bonito, magro, com cabelos castanhos claros,  pequenas sardas e olhos da mesma cor. Ele parecia ter uma idade próxima a do Jovem Mestre.

Apesar das idades variarem, todos que tinham as marcas eram jovens demais, e realmente, eles nunca, de fato, se tornaram funcionários dos Morettis.

Todos foram vendidos. E acredito que cada marca representasse um "tipo" de mercadoria diferente...mas não sei quais seriam as "categorias".

- O senhor...tem certeza que está à vontade com isso?

- Não é questão de conforto, Ayuni. - Ele disse, desabotoando sua blusa e afrouxando sua gravata. - É questão de necessidade. Eu preciso saber.

- Mas, sobre ontem...

- Aquilo não vai se repetir. Eu juro. Agora, preciso que me responda. - Ele terminou de desabotoar sua camisa, e então, se virou. - Você já viu isso antes?

Quando o menor se virou, me deparei com suas costas nuas...e uma marca. Um símbolo cicatrizado em sua pele, e pela forma com que se cicatrizou, realmente parecia uma queimadura seca.

Sua forma era de um círculo, com duas formas fluidas que lembravam cobras se envolvendo no que parecia um cálice.

"As Cobras". Ele realmente foi marcado pelos Morettis, não só isso, mas com o símbolo que menos apareceu entre os registros de Tobias.

Minhas suspeitas pareciam fazer cada vez mais sentido.

Engoli em seco, antes de responder.

- Não. Pelo menos, não pessoalmente. - Ele me olhou soslaio, antes de bufar e vestir a camisa. - Mas meu colega já viu!

- Como?

- Aqui, veja. - Eu me aproximei, estendendo o caderno a ele, em paralelo com algumas anotações avulsas que fiz, junto a minhas tentativas de desenhar os símbolos. - São três símbolos diferentes, "A Flecha", "O Carneiro" e "As Cobras". O símbolo do senhor, é exatamente igual ao terceiro...

O Conde pegou o caderno de minhas mãos lentamente, avaliando cada símbolo e mordendo os próprios lábios, como se fizesse seu melhor para conter uma certa angústia dentro de si.

- E você tem alguma ideia do que cada um possa significar?

- Eu acredito que seja uma marca de mercadoria. Todos os jovens que foram marcados a ferro por esses símbolos foram vendidos para alguém. Nenhum nunca se manteve na máfia. "A Flecha" é mais presente em jovens adultos, a maioria dos homens que tinham ela pareciam ter seus dezenove a vinte e quatro anos. "O Carneiro"  foi o que mais se repetiu nas fotos, e estava em jovens de todas as idades, que pareciam variar entre uns quatorze a vinte e um anos. E, o do senhor..."A Serpente" só foi vista em um jovem, ou melhor, um garoto.

- Eu quero ver.

- O garoto?

- Sim. - Ele afirmou com peso na voz. - Como ele era?

Eu estendi a mão, pedindo o caderno. Ele entregou sem demora, e então, folheei algumas páginas, até encontrar a foto do garoto.

- Este. - Eu apontei. - Era um garoto jovem e bonito, como o senhor. Ele está meio surrado nas fotos, mas...

Sem aviso algum, o Conde arrancou o caderno da minha mão e jogou para longe!

Eu recuei, assustada, vendo o caderno bater contra a janela do quarto e cair no chão! Quando voltei minha atenção ao Mestre, ele estava com os olhos arregalados e corpo trêmulo. Suas pernas começaram a tremer, e tentando dar passos para trás, ele cambaleou e caiu.

- Senhor?! - Me apressei em me abaixar e segurar seus ombros. - Senhor o que foi? Qual o problema?

Ele balançou a cabeça em negação.

- N-não pode ser...n-não pode ser verdade. Ninguém disse nada, ne-nenhum jornal, ninguém! COMO?!

- Jovem Mestre! - Uma de minhas mãos deixou seu ombro e tocou seu rosto, o fazendo olhar diretamente para mim. - Se queremos mesmo descobrir o que os Morettis estão tramando, o senhor precisa se recompor! Não só agora, como sempre! Acredite em mim...eu sei que é traumático, mas o medo nunca me ajudou em nada na superação de tudo isso. E ele não vai ser mais gentil com o senhor. Me entende?!

Sua respiração diminuiu o ritmo, e aos poucos, sua feição parecia um pouco menos chocada. Ele piscou várias vezes, antes de finalmente se afastar do meu toque.

- E então?

- Ah... - Ele respirou fundo, massageando as têmporas por um instante. - estou agindo feito um covarde, feito todos que julgo.

Franzi meu cenho, com certa preocupação recaindo sobre meu peito. Aquele assunto era realmente algo muito sensível para ele, e não importava o quão crescido parecesse ser, a maldade daquelas pessoas o afetam como se ainda fosse uma pequena criança assustada. E no fim das contas, ele não era um adulto, não importava o quanto tentasse.

Mas, eu sou. E passei pelas mesmas dores que ele passou.

Posso ajudar como não fui ajudada.

- Não tem nada a ver com covardia. - Disse enquanto me levantava e ia até o canto do quarto, pegar o caderno jogado no chão. - Se colocar na frente dos seus traumas todos os dias para enfrentá-los não é algo que um covarde faria. - Peguei o caderno e desamassei suas páginas, voltando para perto do Mestre com ele em mãos. - Ser corajoso não significa não ter medo. Significa ter medo, mas mesmo assim, seguir em frente.

Ele emburrou o rosto.

- Não haja como se tivesse pena de mim. - Ele se levantou, arrumando suas roupas e recompondo a postura de Lorde. - Eu não quero pena, nem a sua, nem de ninguém.

- E quem disse que estou com pena? - Estendi o caderno a ele mais uma vez. - O senhor é corajoso. É tudo que estou tentando dizer, porque, na minha vez...ninguém disse a mim que eu era. Tive de descobrir sozinha.

Pude perceber como suas bochechas queimaram com o elogio. Jovem Mestre desviou o olhar e apenas pegou o caderno nas minhas mãos.

- Pode me mostrar o que o senhor viu de tão, ahm...estanho?

Ele respirou fundo antes de responder...

- Eu conheço o garoto da foto.

- O que?!











[...]










- O nome dele é Clan MacMillan. - Jovem Mestre andou pelo escritório, conferindo suas estantes até encontrar um livro específico, grande e de capa azul escura. Depois, ele voltou a sua poltrona e colocou o livro sobre a mesa. - Ele estudava no Weston College, e nós, bem...fomos do mesmo dormitório.

- A melhor e mais cara escola de Londres. Eles só recebem os meninos das famílias mais ricas e...espere um pouco, o senhor chegou a estudar fora de casa?

- Isso não vem muito ao caso. O ponto é que a família de MacMillan é uma dessas famílias. - Ele abriu o livro, folheando algumas páginas até encontrar uma foto do rapaz usando o uniforme da escola, ao lado de seus pais. - A família Millan tem uma linhagem de sucesso e construíram toda a sua fortuna em cima da autoria na construção das mais importantes linhas ferroviárias atuais da Europa. Eles são e sempre foram muito respeitados por todos.

- Como ele pode ter ido parar nas mãos dos Morettis? Ainda mais daquele jeito, sendo mercadoria?

- É isso que me espanta. Quando um rapaz como ele simplesmente some, todos os jornais deveriam noticiar. Todas as pessoas deveriam saber! Isso não faz o menor sentido...

- A família pode estar tentando abafar o caso. Isso acontece bastante entre a alta sociedade.

- No caso dele, acho difícil. A família Millan sempre teve uma certa fama por ser extremamente unida. Quando qualquer parente falece o enterro é praticamente um dos maiores eventos do ano...eles não permitiriam que algo assim passasse em branco, principalmente se tratando do único atual herdeiro de toda a fortuna. Só se eles...

- Não souberem que ele sumiu. Mas...como? - Eu disse, completando o raciocínio. E junto a isso, outro pensamento me veio à mente. Um pensamento perigoso, ousado, mas que ao mesmo tempo fazia todo o sentido. - Senhor...quando queremos separar uma mercadoria de muita qualidade, de outra mediana, o que fazemos?

- Nós separamos por categoria, - Ele disse, fechando o livro em suas mãos e colocando de volta na estante. - óbvio.

- É exatamente isso que os Morettis estão fazendo...eles separam a mercadoria. O senhor e o rapaz Millan, o que vocês tinham em comum...

- Somo dois jovens nobres ricos. Nós...éramos a mercadoria cara.

- E o resto dos rapazes que foram marcados são a mercadoria barata, mas...se é assim porque três símbolos?

Jovem Mestre franziu o cenho enquanto mordia seu dedo, ele parecia estar juntando diversas ideias ao mesmo tempo.

- Estamos falando de homens majoritariamente jovens, muito jovens, divididos em três categorias onde uma é a mercadoria "cara", e todos que são marcados certamente serão vendidos. Estamos falando de compra de pessoas, tráfico humano. Isso quer dizer que, se eles separam jovens em bom estado entre mercadoria rara e mediana...

- Significa que?

O menor entreabriu os lábios, e me encarou como quem acabara de ter uma grande revelação.

- Isso é tráfico sexual.










[...]











- Pobre jovem MacMillan. Ele costumava prestar atenção a todas as minhas aulas no Weston College.

- Esse bando de animais desgraçados. Traficando jovens e os marcando feito gado para determinar seu valor...eu quero que todos morram.

- Ainda precisamos descobrir quem são "todos" antes de derramar o sangue. - Sebastian se inclinou, deixando a bandeja de prata com biscoitos salgados, xícara e bule sobre a mesa. - Não acha.

- Para isso, precisamos achar o Druitt. O que você conseguiu encontrar?

- Crystal Palace, do dia vinte de julho à vinte e três haverá uma grande feira de artes e cultura que terá início na parte da noite. O senhor Druitt marcou sua presença. - De forma hábil, ele elevou o bule na direção da xícara, colocando o cheiroso chá de Earl Grey na mesma, sem derramar uma gota. - O evento terá uma duração de três dias, mas, no que consta, ele apenas marcou presença para o dia vinte.

- Crystal Palace já é bem movimentado por si só, e no primeiro dia de evento vai ser tanto quanto...é ideal.

- O senhor ainda pretende prosseguir com a ideia de "se esconder na multidão"?

- Acho que tenho uma ideia melhor...faça nossa inscrição formal e arranje uma barraca para o evento. Acho que a Funtom vai participar de mais uma feira no Crystal Palace. E me lembre de ir ao telefone mais tarde, preciso falar com Lau. Se vamos envolver a empresa, preciso contar com a parceria comercial dele.

Sebastian deu um leve sorriso de canto e ergueu uma única sobrancelha, como se tivesse alguma de suas críticas irritantes a ser feita.

- O senhor está realmente disposto a envolver a empresa em assuntos particulares relacionados a sua função de "Cão de Guarda"?

- Hah, não é como se já não tivesse antes. Além do mais, - Coloquei meus dedos sobre a alça da xícara e a levei para perto de meu rosto, inspirando seu aroma e soprando fracamente ante de tomar os primeiros goles. - estou disposto a usar todos os meus recurso para alcançar esses desgraçados, "Morettis".











[...]











- Atende...atende, imbecil!

O telefone chamou, chamou e chamou, mas Lau não me atendeu.

- Chefe, desculpa incomodar, mas...já terminou por aí?

- Sim, Bard... - Coloquei o telefone de volta no eixo. - já terminei.

Caminhei pela cozinha, avaliando cada canto. Era um lugar que raramente entrava, então, me despertou curiosidade. Não era nenhuma surpresa que o lugar estivesse limpo e arrumado.

- Tem certeza de que não precisa de mais nada, chefe?

- Não, Bard. Está tudo certo. Pode encerrar seu dia por hoje, tudo me parece em ordem por aqui. - Caminhando até a bancada da pia, dei uma rápida olhada pelo pequeno basculante de vidro que havia um pouco acima da estantes de temperos secos, sais e açúcares. Era possível ver os jardins, como também, alguém sentado em um dos bancos de pedra. - Quem está lá fora?

- Ah, é só a Amelia senhor. Foi um dia cheio, deve ter saído pra respirar um pouco, sabe?

- Entendo...boa noite, Bard. Não esqueça de trancar tudo quando terminar.

- Com certeza, chefe!









[...]












- É uma noite bonita.

A voz cortou meus pensamentos, e então, deixei de olhar para as estrelas e me virei.

- Jovem Mestre?

- Se incomoda?

Ele disse, olhando para o canto vazio ao meu lado.

- Ah...n-não. Não, de forma alguma.

O menor se acomodou ao meu lado, calmamente, descansando as mãos no banco e relaxando os ombros enquanto erguia sua cabeça.

- Gosto mais das noites nessa época do ano. Nenhuma nuvem no céu, estrelas aparentes e tempo agradável.

- Bem, estamos no verão...

- É. Sempre foi minha época do ano preferida.

- Jura?

- Odeio as crises de asma que vem com o inverno.

- Faz sentido...gosto mais da primavera, as árvores ficam mais bonitas e chove menos.

- Gosto da chuva.

Nos encaramos por um segundo, e então, dei um leve sorriso a ele, antes de voltar a olhar para cima.

- Por que...o senhor está aqui?

- Eu é quem te pergunto. - Ele contestou, trocando de postura no banco. - Veio aqui para ficar encarando o céu, ou está pensando em alguma coisa?

- Acho que... - Havia certo devaneio em minha voz, como se parte de mim não estivesse naquela conversa. - os dois.

- Entendi.

Houve um silêncio, que durou pelo menos um minuto, até que eu voltei minha atenção total a ele.

- Não vai me perguntar sobre o que estou pensando?

Ele deu de ombros.

- Não é da minha conta. Sabe, nós nem sempre queremos sair falando do que pensamos para os outros, eu pelo menos, raramente quero. Mas, se você quiser contar...

- Ah, - Respirei fundo, trocando de postura no banco. - são os outros, Mey-Rin, Finnian e Bard. As coisas são...diferentes agora. Sempre que eles me chamam, sempre que precisam da minha ajuda e falam "Amelia", eu me sinto esquisita. Agora que fui descoberta por vocês, essa mentira parece pesar muito mais quando a mantenho só para eles. Eu, e-eu não sei. Não me parece certo.

- Então conte a verdade.

- Contar...o senhor acha?

- Ninguém a proibiu de contar, se quiser dizer a verdade a eles vá em frente e diga logo.

- Honestamente, eu... - Abracei meus próprios braços lentamente, apertando os dedos contra minha pele, como se isso pudesse reduzir minha angústia. - acho que tenho medo de como eles podem reagir. Já dei muita pouca importância para eles, mas...já faz um bom tempo que as coisas não são mais assim. Sinto que tenho algo aqui, algo que não quero perder.

- De longe, não sou a melhor pessoa para te aconselhar sobre mentiras...eu conto muitas delas. Mas, sabemos o que aconteceu quando tentou esconder algo de Mey-Rin, de todos. Se ela pode te perdoar, se eles te recebem de braços abertos mesmo depois disso, não acho que possa haver qualquer rejeição.

Tenho quase certeza de que pareci visivelmente incomodada quando ele mencionou a noite em que Mey-Rin descobriu sobre mim e Sebastian.

- Isso é diferente, não é só um mísero caso...é uma mentira muito maior.

- Ayuni, eu entendo de pequenas e grandes mentiras, e posso te garantir que, quando elas finalmente vêm à tona, o tamanho não importa, no fim, todas têm o mesmo impacto, o mesmo tamanho. Todas fazem mal.

- Huh...se fazem tão mal, por que o senhor diz "contar" tantas?

- Porque não tenho escolha. Porque é confortável. Porque é fácil. - Jovem Mestre se levantou, ficando frente a frente comigo. - Mentir é muito mais fácil do que contar a verdade. Se você prefere o caminho mais fácil, continue sendo a Amelia, para eles. Se não, vá em frente e diga a verdade.

Nos encaramos por um breve momento, antes do menor olhar para as janelas da mansão.

- Está ficando tarde. Amanhã continuaremos conversando sobre a investigação, consegui encontrar uma forma de chegarmos até o Visconde Druitt, até lá, descanse também. - Ele colocou a mão em meu ombro por um breve momento. - Você fez um bom trabalho hoje. Até amanhã, Ayuni.

O menor andou pelo gramado, até ouvir seus passos contra as pequenas escadas de pedra e a porta dos fundos se fechando...me deixando a sós com as palavras que havia jogado no ar, com uma decisão que cabia apenas a mim ser tomada.

A angústia de pensar no que poderia dar errado.

O medo em imaginar o que eu poderia perder se dissesse a verdade.

Eles me rejeitariam? Me veriam como ameaça? Eu precisava escolher entre seguir pelo caminho mais fácil, ou o mais difícil.

Ayuni El-Din ou Amelia Watson. Uma das duas precisava ir embora...

Eu me levantei do banco em um pulo e sai correndo pelos jardins.

- Jovem Mestre, espere!











[...]











- Vejamos...Mey-Rin, preciso que recolha as roupas do varal e as passe, limpe a sala de jantar e coloque as cortinas do quarto de hóspedes da ala leste para lavar. Baldroy, hoje é dia de limpeza da prataria, tenha certeza de que todos os bules de chá estão livres de qualquer sujeira, depois, asse o pernil que compramos. Finnian ficará responsável por cuidar das plantas da estufa, cortar a grama e podar as roseiras. Senhorita Amelia, lave o piso da ala oeste do segundo andar, faça uma limpeza geral na adega e trate de varrer as escadarias da entrada principal. Todos de acordo?

Ainda com sono, Mey-Rin e os rapazes responderam, tentando parecer animados. Nenhum de nós dormiu muito bem na noite passada, graças à chuva que começou no meio da madrugada, trazendo raio e trovões.

Mas, o meu problema não era exatamente o sono.

Minhas pernas tremiam, eu suava frio enquanto minha respiração falhava com o nervosismo que tentava controlar.

- Ótimo, - Sebastian guardou sua prancheta embaixo de seu braço. - dito isso, podem sair e iniciar seus...

- Sebastian, espere. - Jovem Mestre interrompeu, de sua mesa. Senti uma gota de suor escorrer por minha têmpora. - Antes temos algo a fazer.

- O que foi, chefinho?

Finnian perguntou curioso, enquanto Mey-Rin e Bard se olhavam confusos.

Senti meu estômago embrulhar.

- Antes de continuarmos, acredito que Amelia tenha algo muito importante para dizer a todos aqui. Amelia, dê alguns passos à frente?

- A-Amelia? Aconteceu alguma coisa?

- Não, Mey-Rin, - Eu disse, tentando me manter firme, dando a ela um sorriso de falsa tranquilidade. - está tudo bem.

Hesitante, dei alguns passos à frente. Notei por visão periférica que Sebastian observou cada um de meus movimentos.

Ficando próxima a mesa do menor, olhei para ele por um segundo, que assentiu com a cabeça discretamente, eu respondi da mesma forma, até voltar a encarar os outros.

- Mey-Rin, Baldroy, Finnian. Eu...e-eu, bem, vocês são muito importantes para mim e, e t-tem algo que eu preciso dizer a todos vocês. - Eu parei por um segundo, prestando atenção na reação de cada um deles. Todos pareciam curiosos e...minimamente preocupados. Eu engoli em seco e respirei fundo. Quanto mais eu demorasse, pior seria. - O m-meu, o meu nome não é Amelia. Eu não sou inglesa, muito menos uma empregada comum. - Eu apenas balançava minha cabeça levemente em negação enquanto apertava meus próprios dedos, como um tique ansioso. - Foi tudo uma mentira. Eu inventei tudo isso porque precisava me infiltrar aqui para...p-para matar o Conde. Foram ordens de cima, eu queria melhorar minha vida, foi tudo por necessidade! Eles tiraram tudo de mim e eu senti que esse era o único jeito de resolver. Mas, graças a vocês, graças a tudo que eu vi e vivi aqui, eu...eu desisti. Eu resolvi que iria dar um jeito de fugir dos meus chefes, resolvi que daria um jeito de ficar aqui, mas eu fui descoberta. - Olhei rapidamente para o Conde e voltei a eles. - Jovem Mestre me ouviu e resolveu me acolher, mesmo sabendo das coisas que planejei...e não me pareceu justo esconder tudo isso de vocês. - Dei alguns passos na direção deles, olhando profundamente para cada um deles. - Baldryo, Mey-Rin, Finnian...vocês viraram meus amigos, minha "família", como vocês sempre dizem, não é? E eu sinto que não podia mais esconder isso de vocês...me desculpem, por ter escondido tanto, por ter mentido durante tanto tempo. É isso.

O suor escorria por minha testa enquanto observava a reação de cada um deles. Finnian estava parado, com os olhos arregalados, Baldroy cobria sua boca e desviava o olhar, ele também parecia trêmulo, enquanto Mey-Rin era a única que parecia completamente neutra.

Minha mente estava a mil. Ninguém diria nada?! Ninguém faria nada?! O que poderia...

Mey-Rin se moveu.

Ela começou a dar passos lentos em minha direção, até ficar frente a frente comigo.

Ela tirou seus óculos, e me deparei com seus olhos extremamente belos e hipnóticos me encarando profundamente.

- Tudo isso...é mesmo verdade?

Eu assenti com a cabeça, franzindo o cenho, angustiada.

- É verdade, Mey-Rin. - Jovem Mestre disse, se intrometendo. - Posso garantir.

Ela começou a balançar a cabeça em negação a algo. Eu fechei meus olhos, esperando a pior das reações quando...

Um toque?


Abri meus olhos, e então, percebi que Mey-Rin estava me abraçando com força.

- Mey...M-Mey-Rin?

- Eu não sei seu nome...mas eu sei q-que voce odeia comidas doces, sei que você gosta de pimenta, que vermelho é sua cor preferida, que você odiava cometer erros e t-tinha medo de escuro. Sei que você já me contou segredos íntimos e que foi minha primeira melhor amiga. Isso tudo...isso tudo foi mesmo verdade?

Eu senti as lágrimas se formando em meus olhos, mas fiz meu melhor para contê-las.

- Foi...eu juro, juro do f-fundo do meu coração que foi.

Senti ela me apertar com mais força.

- Então nada mudou! S-se o Jovem Mestre concordou, se essas coisas são verdade e se você ainda está aqui, então você continua sendo uma Phantomhive. Continua sendo a minha melhor amiga. Eu não tenho nada pra perdoar.

- É verdade que... - Finny disse, com a voz trêmula, dando alguns passos à frente. - é verdade que você gosta de tulipas? E que v-voce gostava de comer biscoitos comigo?

- Sim Finny, é verdade. Eu adoro dividir biscoitos salgados com você...

Ele sorriu, se aproximando e se juntando ao abraço.

- Porra...vocês são um bando de malucos. - Bard disse, andando em nossa direção e se juntando ao abraço de maneira bruta. - Todos nós.

No abraço apertado, eu me senti livre para sentir o conforto e o carinho que cada um deles tinha a me oferecer. Eu fui aceita...eles ainda me querem aqui.

Eu não os perdi...

Não pude evitar as lágrimas que escorreram pelo meu rosto.

- Ei... - Mey-Rin me olhou nos olhos, enquanto falava com uma voz doce. - não vai nem contar seu nome pra gente?

- Hah... - Eu sorri, genuinamente feliz. - é Ayuni, Ayuni El-Din.

- É muito legal te conhecer...de novo, Ayuni.

- É um nome muito bonito. - Finny disse. - Eu gostei!

- Obrigada...obrigada mesmo.

Eles riram comigo, choraram comigo.

Jovem Mestre tinha razão, dizer a verdade não é o caminho mais simples, mas, acho que sem dúvida...é o mais gratificante.

Olhando soslaio, eu percebi em Sebastian no canto do escritório, ele encarava a cena com um olhar enigmático. Ele me encarava.

Por alguns segundos, meu peito apertou e um frio me subiu da barriga à garganta.

Me perguntei o que se passou em sua cabeça.






*

Oi gente! Então...ÚLTIMO CAPÍTULO DO ANOOO!

Eu achei que conseguiria terminar Serva Infernal no fim desse ano, mas...quem diria né? A vida de vestibulanda tem dessas.

Eu só quero dizer a voces que sou muito grata pela pequena "comunidade" de fãs que SF está ganhando. Vocês são todos maravilhosos e muito carinhosos! Eu amo essa fanfic e sempre que eu leio os comentários de vocês, eu me sinto motivada a continuar. Serva Infernal significa muito pra mim, significa meu crescimento e minha evolução na escrita.

Ayuni El-Din agradece muito a todo o carinho que voces tem por ela, assim como eu agradeço por todo o amor que recebi de voces esse ano!

Muito obrigada pela presença! Faltam oficialmente 14 capítulos para o fim de Serva Infernal, e eu não poderia ser mais grata por meu público.

Um maravilhoso natal e ano novo pra todos vocês! Com muito amor, Jc! ❤️

*

McMillan: McMillan era mais um jovem rico, estudante do Weston College e um dos principais colegas que Ciel Phantomhive fez em seus tempos como infiltrado/estudante!

*

Não se esqueça de deixar seu comentário e seu voto "⭐️"! Feliz natal e feliz ano novo!

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