XIX - Aroma
15/03/1888 - Quinta-feira
- Ah não. Não, não, não!
Agora as dores de cabeça, abdominais e cansaço faziam sentido.
O sangue no lençol entregava tudo. Levantei minha camisola e olhei minha peça íntima. Mais sangue.
- Merda!
Olhei para todos os lados, sem saber ao certo o que fazer. Os lençóis estavam manchados assim como minhas roupas, eu ainda tinha muito o que arrumar, e eu só tinha trinta minutos até a reunião matinal começar. O que eu faria?!
Droga, não tenho muitas opções. Talvez Mey-Rin saiba o que fazer.
Afastei a cadeira da porta e abri, olhando para os dois lados. A porta do quarto de Finny e Bard estava fechada, como a de Sebastian. Corredor vazio!
Andei apressada até a porta de Mey-Rin.
- Mey-Rin... - Bati na porta, mas não ouvi nada. Fiquei sem resposta! Insisti e bati mais uma vez! - vamos Mey-Rin, acorde!
- A-ahm? Já vai, e-eu já vou!
Suspirei aliviada.
Um minuto depois, ela abriu a porta. Os óculos tortos no rosto, os cabelos bagunçados e a camisola amarrotada.
- B-bom dia. O que vamos comer de...
- Preciso de sua ajuda, vamos!
- Ah? Como assim a...
A puxei pelo braço, trazendo as pressas para meu quarto.
- Ah! A-Amelia? O que houve?! O que v-você tem?
- Isso!
Apontei para o lençol, sujo de sangue.
Ela levantou os óculos e as sobrancelhas, como se já tivesse entendido.
- Ai, deus. V-você está?
- É, estou. Pode me ajudar? Eu não tenho nada aqui para, bem, acho que você sabe.
- Imagina! N-não se preocupa! E-eu acho que sei o que fazer! Me dá só um minutinho, eu vou no meu quarto pegar algumas coisas! Também precisamos fazer algo sobre esses lençóis!
[...]
- Tem certeza de que isso funciona?
Disse roçando minhas pernas umas nas outras, desconfortável com "aquilo" que Mey-Rin me disse para colocar.
- Tenho. Você nunca usou um desses?
- Ahm, não.
- Sério?! Então como você fazia antes, ou, a-ahm, você entendeu!
- E-eu não usava nada. Eu só deixava... - Dei de ombros, não querendo usar a tal palavra. - deixava sangrar.
Tentei dizer o mais baixo que podia. Não acredito, que conversa mais constrangedora!
- Meu deus! Q-quer dizer, desculpa! M-mas olha, não precisa se preocupar, vai funcionar! Já costuro esses tecidos de algodão a um bom tempo, eles sempre ajudam quando a "visita mensal" chega. Se quiser, posso costurar alguns para você... - Ela mordeu um pedaço de seu sanduíche. - o que acha?
- É, talvez seja uma boa ideia.
Tomei os últimos goles do meu café e olhei para o relógio. Cinco minutos para as oito horas, quase hora da reunião.
Bard e Finny já deveriam ter acordado!
[...]
- Ovos cozidos e torradas, acompanhados por um pouco de chá Darfeeling, Mestre.
Bocchan levou a xícara a seus lábios, com o mesmo mau-humor matinal de todas as manhãs.
- Qual a agenda de hoje?
Perguntou entre bocejos.
- Para hoje, o senhor terá de passar a manhã organizando o orçamento para as novas embalagens dos "Bitter Chocolat", este dado deve ser enviado a empresa amanhã; a análise mensal de mercado acaba de chegar, imagino que o senhor queira avaliar, após o almoço; às quatro continuaremos a matéria de história dos capítulos cinco e seis, período napoleônico..
- Hm... - E com sua notável indiferença aos assuntos, deixou a sua xícara sobre o pires e levou uma das torradas a sua boca, deixando alguns farelos em seu queixo. - horas, agora.
Procurei por meu relógio de bolso, o retirando de meu fraque.
- Oito horas e um minuto, Bocchan.
- A reunião deveria estar começando agora, não tenho tempo a perder hoje. Onde aqueles três...
- Chegamos, chefe!
Finnian entrou, empurrando as portas e as batendo contra a parede. Desajeitado, agitado e bruto. Como sempre. Baldroy andava sem pressa alguma, como sempre, pouco se importava com os horários, já Mey-Rin e A...
Ah?
Minha atenção foi tomada no momento em que meu corpo realizou uma tarefa simples, respirar. Demônios não precisam respirar, não é algo que faça parte de suas necessidades, mas, assumindo uma forma humana, este corpo possui algumas exigências irritantes.
Além disso, o olfato extremamente aguçado é um luxo de minha raça, as vezes, uma inconveniência.
E foi quando minhas narinas respiraram o ar da sala, eu o senti. Algo peculiar, um aroma peculiar.
O que é isso?
Um aroma carmesim intricado, misterioso. Era como se conseguisse sentir um gosto metálico em minha língua. Era amargo, mas docemente embriagante?
Assemelhava-se ao sangue.
Ao mesmo tempo era algo doce, não chegava ao ponto de ser enjoativo, era apenas o ponto ideal, a quantidade perfeita para fazer uma boca salivar. Se parecia com paixão, mas definitivamente, não era. As notas doces lembravam o cheiro de uma virgem. Mas, tinha algo de muito diferente.
Não era açucarado e nauseoso, curioso, entediante, previsível. Era bem mais que isso. Amargo, de esperanças escassas. Cheio de aversão, rebeldia, rancor. Parecia cruel e delicioso.
Não se parecia com nada que havia sentido antes. Era conflitante demais, único. O que era? De onde vinha?
- Aham! Sebastian!
Acordei do prazeroso transe ao ouvir a voz de Bocchan, claramente incomodada com minha breve distração.
Todos me olhavam, confusos.
- Perdão, aham... - Alcancei minha prancheta e deslizei os dedos pelas folhas, onde anotei e distribui as tarefas do dia para todos. - Finnian, hoje terá de limpar a fonte do jardim; procurar por possíveis flores de inverno murchas; fazer a compostagem, e por fim; limpar a estufa.
- Pode deixar, senhor Sebastian!
Não vinha de Finnian.
Finnian cheirava a terra molhada, misturado a vinagre branco e rosas. Doce demais, esperançosos demais e com poucas pitadas de amargura, vindas do passado. Não, não era ele.
O cheiro ficou mais presente.
- Ótimo. Baldroy, organize a despensa; faça a manutenção do forno; limpe a prataria chinesa do cristaleiro e faça a lavagem dos legumes e frutas trazidos da última feira.
- Tá, nada demais.
Baldroy não era uma possibilidade. Seu cheiro era amargo demais, tenso, muito impuro. Uma mistura de nicotina, com restos de queimado e pólvora. Sem dúvida alguma, não.
Cada vez mais forte, como se invadisse minhas narinas.
- Mey-Rin, deve trocar os lençóis de todos os quartos; estender as roupas que foram lavadas e deixadas de molho ontem; varrer e tirar toda a poeira da adega, e limpar as estantes da biblioteca.
- Como quiser, senhor Sebastian!
Não, sem dúvida, não. Muito doce e picante, um cheiro de canela misturado à baunilha e margaridas, com muitas curiosidades, sonhos e vontades. O amargor é muito pouco.
Respirei fundo, respirando o máximo que podia daquele aroma, na ilusória esperança de que poderia sentir seu gosto dessa forma, mesmo que fosse inútil.
Senti algo formigar por minha pele, em meus braços, pescoço e costas. Uma onda de energia me percorrendo, como rápidos calafrios invasores.
É isso que os humanos chamam de arrepios?
Não, estava errado, meu corpo não deveria reagir. Há algo de errado.
- Senhorita Amelia...
Fui totalmente invadido. O forte aroma carmesim, o tom embriagante, o ponto ideal do doce, o amargor rebelde, tudo me invadiu como um soco.
Era ela.
- Ahm, sim?
Parece que demorei segundos para continuar, tempo o suficiente para que todos estranhassem, mais uma vez.
- Oh, bem, aham... - Custei a me recompor, minha postura impecável continuava mantida por fora. Mas por dentro, as correntes que controlavam meus instintos se tremeram de forma desobediente, como nunca fizeram antes. - lave os banheiros; troque as velas de todos os candelabros, do segundo andar; varra as escadas da entrada principal, ao lado de fora e; tire as roupas deixadas no varal e as passe, por gentileza.
Ela acenou com a cabeça, sem sequer olhar em meus olhos.
Enquanto isso, eu seguia perplexo por sua figura, usando esses pequenos segundos para tentar guardar seus detalhes.
Um dia se passou desde a "situação" que passamos na biblioteca. Não há via desde aquele momento.
Senhorita Amelia, uma figura interessante, uma humana interessante.
Uma mulher de poucas aberturas, com uma determinação desconhecida e conhecimentos elevados demais para uma simples serva experiente.
Era imprevisível, sempre optando pelo mais complexo, às vezes a vontade, as vezes se mantendo distante; tendo aversão a meus toques, reagindo de forma imprevisíveis a minhas aproximações; s vezes com convicções e vocabulários que não se encaixavam ao de uma serva.
Uma dama que escolhia os momentos em que desprezaria minha figura, e os que me receberia como um colega. Não era tão simples saber quando estou perto de finalmente descascá-la, ou quando estou distante.
Um colega.
Ela não se deixava levar pelo charme, pela luxúria, pelos sorrisos, por todas as minhas armas e trejeitos que tem funcionado com todas e todos de sua espécie durante anos. Por que ela não cedia?
Não pude decifrá-la até agora, não pude entendê-la, compreender seu comportamento e desvendar seus pensamentos. E agora, este bendito e hipnotizante cheiro, que a tornava mais complexa do que já vinha sendo. Arrisco dizer, mais atraente.
O que a fazia ser diferente?
Agora, não só queria descobrir, como também sentia que precisava.
Humanos, a maioria deles podem ser entediantes e previsíveis, mas ao mesmo tempo, outros podem ser tão intrigantes.
[...]
Limpar entre os azulejos com a escova, varrer o piso, lavar a bancada, esfregar a banheira com uma esponja limpa e depois jogar agua morta, sem contar que preciso trocar as toalhas. Isso tudo no banheiro dos servos.
Quando terminar aqui, é só fazer tudo isso nos banheiros do andar de cima. Que "maravilha".
Que coisa! Ainda tenho que trocar as velas dos candelabros do segundo piso, quando terminar aqui. Nunca parei para pensar quantos candelabros tem lá. Vou varrer o piso, depois resolvo i...
Ai! A-ai, que coisa!
Senti uma dor pontiaguda no ventre, uma pontada! Doía demais!
- Arg!
A dor foi tanta que me apoiei na bancada na pia, passando a mão em meu abdômen. Era sempre assim! Todo maldito mês essas malditas dores apareciam.
Que inferno! Como eu vou continuar trabalhando com esse "período" me atrapalhando?!
[...]
- Bom dia, de novo, Bard.
- Hm? Ah, é você, Amelia... - Ele me encarou de cima a baixo. - você está bem? Tá com uma cara feia.
E ele ainda se pergunta porque Mey-Rin o acha grosso.
- Obrigada por reparar... - Disse enquanto tentava reforçar meu penteado, para parecer menos surrada. - Mey-Rin me disse que você sabe onde estão as velas novas.
- Sei, sim. Você precisa, não é?
- Uhum. Tenho que trocar todas as velas dos candelabros do segundo piso.
- É, eu já fiz isso uma vez. É um saco... - Ele praticamente enfiou a cabeça dentro do fogão, enquanto falava. - credo, isso aqui tá podre. Enfim, tem uma caixa inteira de velas, do lado da porta da adega.
- Obrigada, Bard.
- De nada. Tsc! Tá puro carvão aqui dentro! Cof!
Fui até a porta da adega e logo vi a grande caixa de madeira fechada, ao lado da porta.
Me agachei para pegar e...
Urg! O que é isso?!
Senti algo estranho em minha virilha, como se fosse algo "descendo" por lá. Me arrepiei.
Quando essa tortura vai acabar?!
Tentei ignorar, segurando a caixa com as duas mãos e levantei. Era bem leve, nada demais.
Saí da cozinha e fui a atravessei a sala de jantar, assim como o salão, e então as escadas.
Quantos candelabros tinham no segundo andar? Óbvio que eu nunca parei para pensar nisso, soava específico demais.
- Oi, Amelia!
Mey-Rin passou por mim, com um cesto repleto de lençóis;
Óbvio, Mey-Rin!
- Ah! Mey-Rin, espera!
- Sim?
- Ela largou o corrimão e voltou os dois degraus que desceu, quando me ouviu chamar.
- Você sabe quantos candelabros tem aqui? Eu nunca parei para contar, sinceramente.
- Verdade, não é? O senhor Sebastian te deu a tarefa de trocar os candelabros. Eu fazia muito isso, antes de você chegar!
- Então pode me ajudar, não é?
- Uhum! São doze no lado oeste e, se não me engano, acho que uns quinze no lado leste.
- Quer dizer que são vinte e sete no total?
- Isso! Bom, eu vou colocar esses lençóis pra lavar. Até mais tarde!
Ela acenou e saiu.
É, eu com certeza tinha muito o que fazer.
[...]
- Hm! Que ridículo, horroroso, sem graça.
- Algum motivo para tais resmungos, Jovem Mestre?
- Estas embalagens. São ridículas, o desenho é mal feito, não tem cores e os coelhos são sem graça; Esses incompetentes não sabem fazer produtos para o público infantil. Não é possível que eu tenha que fazer tudo por aqui, francamente.. - Revoltado, Bocchan abriu uma das gavetas de sua escrivaninha, retirando uma folha e um envelope em branco. - pegue minha pasta.
- Qual pasta, senhor?
- Que coisa! A pasta com os registros da Funtom! Preciso saber o nome dos incompetentes que fizeram isso.
- Perdão, Mestre, mas a pasta não deveria estar na primeira gaveta? Junto aos registros dos lucros de Janeiro?
- Não, eu acho que... - Ele levantou uma de suas mãos e levou aos cabelos. - aham, deixei no meu quarto.
Bocchan disse em um tom baixo, quase inaudível, como se quisesse omitir a informação.
- Ora, ora. Trabalhando na cama novamente, Bocchan?
- Pode parar de enrolar e pegar logo essa pasta?
Tanto estresse para um corpo tão frágil e pequeno. Quem diria, não? Jovem Mestre sempre detestava quando comentava sobre seus trabalhos fora de hora.
- Como desejar.
Reverenciei e me retirei.
A manhã vinha se seguindo estranhamente tranquila e...
Mais uma vez, aquele aroma.
Ele havia se enfraquecido mais cedo, uma hora atrás, quando ela deixou o escritório. Mas, parecia estar um pouco mais forte, era sutil, mas não imperceptível.
Por mais que o evitasse, e por menos fundo que exalasse, o aroma continuava a insistir e invadir minhas narinas.
Senti minha boca salivar.
Não, de novo não. Não posso permitir.
Ignorar. Eu deveria ignorá-lo, por mais forte que fosse, por mais tentador que fosse. Deveria fingir que não existia, desprezá-lo. Afinal, é um mísero aroma, posso lidar. Simples, não?
Arrumei o nó em minha gravata, conferi minhas abotoaduras e procurei meu reflexo na janela bem polida. Manter a postura impecável, como sempre.
Fui em direção a ala oeste do salão. Engoli seco ao perceber que o aroma se tornava cada vez mais forte, mas apesar disso, nenhum sinal dela.
Me apressei e em questão de segundos cheguei ao quarto.
Lençóis trocados, como ordenei a Mey-Rin. Tudo parecia em ordem. E então, fui até a mesa de cabeceira e puxei sua segunda gaveta. Lá estava.
Coloquei a pasta embaixo de meu braço, fechando a gaveta.
Preciso conferir as horas.
Alcancei meu relógio de bolso. Oito, não, oito e meia, não. Nove, sim, nove da manhã.
O maldito aroma estava me distraindo.
Suspirei e o devolvi ao bolso de meu fraque. Recomponha-se, Sebastian.
Mantive a pasta embaixo de meu braço, e caminhei até a porta, girando a maçaneta e...
Extremamente forte. Tão forte que fez meu corpo reagir e dar um único passo para trás.
- Com licença... - Senhorita Amelia pedia passagem, com uma caixa em mãos. - preciso passar.
Minha boca salivou novamente, e vi meus olhos presos em sua figura e em todo o aroma que seu corpo exalava. Como se estivesse por todo o redor.
Me vi em transe. Isto, sem dúvida, não deveria acontecer.
Não sei por quanto tempo me mantive de tal forma, mas foi o suficiente para tornar as coisas mais críticas.
A passagem era estreita, e senhorita Amelia não queria esperar. Mesmo com meu corpo bloqueando boa parte da entrada, ela insistiu em tentar.
Ela se encolheu entre o vão que restava, e de costas para mim, atravessou a porta. E assim, suas costas tocaram meu peito.
Mais arrepios, uma sensação de desconforto no estômago, respiração falha por exatos dois segundos.
Arrepios, desconforto no estômago e respiração inconstante? A situação está ficando crítica.
De que diabos tudo isso se tratava?
Não havia outra maneira de me perguntar. Era peculiar demais, característico, questionável, não estava certo.
O efeito que estava causando em meu corpo, era perigoso.
Quando retornei do "transe", olhei para trás. Ela estava trocando as velas dos candelabros, assim como pedi.
Fechei a porta atrás de mim, e sai. Tinha algo errado, não poderia permitir que tudo se seguisse desta forma. Eu não poderia continuar agindo e reagindo, como tenho feito.
Preciso descobrir o que está causando esse aroma, o que está havendo com ela.
Não posso deixar que isso chegue "ao ponto".
[...]
- Sabe que horas são, Mey-Rin?
- Devem ser umas onze da manhã.
- Quase hora do almoço. Podemos comer Pastie, mais tarde. O que acha?
- É claro! Podemos. E, me conta... - Ela olhou para os dois lados, confirmando se estávamos sozinhas. - como anda "aquilo"?
Entendi.
- Mais para menos. É um pouco desconfortável e, bem, dói.
- Não se preocupe, é bom sinal. Ouvi dizer que, quando dói, é sinal de fertilidade.
- Ah, entendi.
Não acho que isso faça sentido, mas, tudo bem.
Um silêncio agradável se instalou e enquanto Mey-Rin dobrava as roupas limpas em seu colo, eu seguia varrendo as escadas principais.
Trocar todos os candelabros não foi uma tarefa fácil, considerando que alguns lugares eram altos demais para que eu alcançasse. Sem falar sobre, bem, Sebastian. Ele estava muito mais estranho que o normal. Eu...
Urg! Não, que seja! Não quero perder tempo pensando sobre isso, agora.
- Amelia, eu te emprestei minha escova de cabelo ontem? E-eu não consigo achar em lugar nenhum
- Talvez esteja, a-ai! Ai, n-não, outra vez! Que coisa... - Aquela dor insuportável, mais uma vez! - dói!
- Ah! Pobrezinha... - Ela correu e tirou a vassoura de minhas mãos. - eu vou preparar um ótimo chá para você, no almoço! Vai ajudar com essas dores.
Era incômodo, as dores abdominais, a sensação de algo "úmido" na virilha, o constrangimento. Inferno! Mal podia esperar para que acabasse logo.
Além de tudo isso, estava com uma estranha sensação, uma sensação incômoda. A sensação de estar sendo observada.
Mas, provavelmente é só mais um maldito sintoma.
[...]
- Prontinho! Chá de gengibre. Ele vai te ajudar bastante!
- Obrigada, Mey-Rin.
O almoço foi bom, tirando a parte que Bard resmungava constantemente.
- Bard... - Coloquei minha xícara no pires e devolvi a mesa. - não sei se esse é o jeito certo de limpar o piso.
- Pode deixar, eu sei de cor como fazer isso!
O chão da cozinha estava cheio de água e sabão, tudo por causa de uma mancha de gordura.
Óbvio que estava errado, mas tentar avisá-lo seria inútil.
- O que vocês duas vão fazer agora?
- Eu vou varrer a adega. E você, Amelia?
- Vou terminar de varrer a entrega, depois vou tirar as roupas do varal e passar.
- Tsc! Deram sorte, pegaram tarefas tranquilas!
- "Tranquilas"?! Já viu como é difícil limpar a adega? É escuro lá dentro! E Amelia? Você já trocou os candelabros do segundo andar? Demora muito!
- Além disso... - Bebi um pouco do chá quente. - não foi você quem disse "não é nada demais" quando Sebastian te deu as tarefas?
- Claro, hm! Não ia dar esse gosto pra ele... - Ele se ajoelhou no chão e começou a esfregar o piso com toda a sua força, usando uma escova velha. - eu fiquei muito tempo limpando o fogão, e ainda tive que fazer o almoço do Mestre. Quer dizer... - Ele continuou esfregando. - ele é muito mandão! Fica com a parte mais fácil e...
- B-Baldroy, para!
- Não! Eu me estressei, Mey-Rin. E não me vem com toda aquela coisa de "senhor Sebastian", defendendo ele! Vai dizer que você não fica cansada de subir e descer escadas pra lá e pra cá, com...
- Bard, por favor, é melhor parar.
Pedi, genuinamente.
- Ah, Amelia! Até você?! Por que vocês duas...
- Aham... - Sebastian tossiu, provavelmente de propósito, atrás de Bard. - bem, eu espero que todo esse sábado e água no piso tenha uma boa razão. Correto, Baldroy?
Nós avisamos. Ele tinha entrado poucos segundos antes de Bard começar a reclamar.
- Hm... - Bard se levantou, afrontoso e com o peito estufado. Não parecia preocupado, como nós. - pode apostar, tem!
Ele encarava Sebastian com um olhar mortal, e Sebastian, como sempre, parecia indiferente às provocações.
Eu e Mey-Rin nos entreolhamos.
Olhei para ela, e então para a porta da cozinha, levantando as sobrancelhas, tentando dizer "é melhor sairmos".
Felizmente, ela não demorou a entender.
- E-eu e Amelia temos muitas coisas, d-digo, tarefas pra fazer! N-nossa, olha só a hora... - Ela agarrou meu braço, e levantou. - vamos, Amelia?
- Sim, sim. Vamos.
Me levantei e andei apressada, já que Mey-Rin me puxava com pressa.
Enquanto isso, Bard e Sebastian pareciam...
- AH! U-UOU!
Não deveria ter andado com tanta pressa no piso molhado. Acabei escorregando!
Tentei me equilibrar de novo, mas tudo estava escorregadio.
- AMELIA!
Bard tentou ajudar, no mesmo segundo! Mas só piorou as coisas, quando ele escorregou junto a mim!
Ele tentou se equilibrar por nós dois e se agarrou na gravata de Sebastian, a puxando!
Resultado, nós três paramos no chão!
- Meu deus! V-vocês estão bem?!
[...]
Aquela sensação estranha continuava me incomodando, a sensação de algo "molhado" entre as minhas pernas. Estava ficando insuportável!
Olhei para a pilha de roupas que havia acabado de passar, mais de vinte peças! Só faltavam duas roupas para acabar, e então, eu poderia ir ao banheiro ver que diabos estava acontecendo!
Passei a blusa de algodão de Finny e uma bermuda do Jovem Mestre, fiz o mais rápido que podia.
Doce, coloquei no cesto junto às outras peças, e corri para o banheiro dia servos!
- Finalmente!
Entrei e tranquei a porta atrás de mim.
Me sentei no vaso e comecei a levantar os tecidos de meu vestido, até ver minhas roupas íntimas.
- Ah não, não, não... - Vi manchas de sangue seco entre minhas coxas. O tecido da peça estava manchado de sangue. - que droga. E agora?!
Abaixei a peça para olhar melhor. Era pior que eu pensava, provavelmente tinha vazado!
O pano, que Mey-Rin me disse para colocar, estava totalmente manchado.
Que nojo. Eu preciso de um banho.
Toc, toc!
- Ah!
- Amelia? É você aí dentro?
Era só que me faltava.
- Mey-Rin?
- Tudo bem ai?
Me vesti e abaixei minha saia, indo até a porta e a destrancados.
- Não é nada demais, estou bem.
- Tem certeza? Bard disse que te viu sair correndo da cozinha pra cá. Tem algo a ver com "aquilo"?
- Ahm, não é...
- Sabe que pode me contar né? Não precisa sentir vergonha!
Não importa o quanto eu negasse, ela ia insistir até o final. Às vezes, eles me cansam!
- Na verdade, você pode fazer algo por mim?
- O que precisar!
- Pode ferver uma água para mim? Eu definitivamente preciso de um banho, entende?
- A-ah sim! Entendi! Espera só um segundo, eu já volto!
Mey-Rin foi e voltou à cozinha algumas vezes. Demorou um pouco, mas no fim, conseguimos encher a banheira.
Eu estava ansiosa, me sentindo desconfortável e suja, eu queria muito um banho.
- Pronto, acho que isso é o suficiente.
- Obrigada, Mey-Rin.
- Imagina. Se precisar de qualquer coisa, pode me chamar!
- Obrigada.
- Bom, vou te deixar a só. Aproveite o banho!
Ela saiu, e eu tranquei a porta.
Olhei para a banheira, aliviada, e então comecei a me despir.
Primeiro o avental, depois o vestido, as meias, os sapatos, o espartilho e, por último, minhas peças íntimas.
Fui até o espelho e me encarei por alguns segundos. Desfiz meu penteado, relutante. E então, deixando minhas roupas e grampos na bancada da pia, fui até a banheira.
O vapor crescia por todo o banheiro e o piso parecia mais molhado.
Comecei com os dedos dos pés. Era quente, mas não ao ponto de incomodar. Então, entrei por inteiro, sentindo todo o meu corpo relaxar e a tensão ir embora.
Ah, finalmente.
[...]
Cabelos molhados, presos; roupas trocadas e roupas íntimas limpas. Me senti aliviada, mas o que diabos eu faria com as roupas sujas?!
Já estava a alguns minutos sentada na cama, encarando aquelas roupas manchadas de sangue, sujas!
Droga! Eu não poderia levá-las à área de serviços, todos iriam ver! Que inferno, não aguento mais me preocupar com isso, passei o dia inteiro assim.
Olhei para o relógio de minha cômoda, cinco e meia. Já havia terminado todas as minhas tarefas. Talvez, eu pudesse deixar isso um pouco de lado, e me preocupar com coisas mais úteis?
Tempo livre! Eu poderia voltar às minhas pesquisas. Ir à biblioteca procurar mais jornais na seção de periódicos e, talvez e quem sabe, achar algo que complete as informações que já tenho. É, me parece uma boa ideia.
Decidido.
- Bom... - Peguei minhas roupas sujas e, já dobradas, e as escondi em minhas gavetas. Não gosto de guardar roupas sujas, mas no momento, não há muitas opções. - eu cuido disso mais tarde.
[...]
- O que você tem?
- Perdão, Mestre?
- Estamos estudando história, eu errei três questões e você não usou a régua, só disse "faça novamente"; além disso, você está encarando o chão a cinco minutos, sem piscar. Por acaso esqueceu como fingir ser um humano?
- Nada de errado, Mestre. Estou apenas pensando sobre as tarefas de hoje. Por favor, mantenha a atenção em seus exercícios.
- Hm, sei.
Perdendo o interesse, tão rápido quanto o criou, ele voltou aos exercícios do livro.
As coisas estavam, certamente, se tornando mais complicadas. Aquele aroma havia me empesteado, nas duas vezes em que ela tocou meu corpo. E pior, não só a mim, mas agora parece estar pela casa inteira, por cada canto em que ela tenha passado.
E não importa o quanto ele estivesse presente, meu corpo simplesmente não sentia náuseas com o seu excesso, muito pelo contrário. Parecia sempre querer mais, e isso estava, de forma humilhante, me tirando dos eixos. Preocupantemente, não sei por quanto tempo conseguirei ignora-lo.
Não posso deixar que as coisas fujam do controle, não posso deixar que meu corpo tome as rédeas e chegue ao seu limite.
- Toma... - Jovem Mestre estendeu seu livro a mim. - terminei.
Tome o livro para avaliar suas respostas.
- Excelente, todas as questões foram devidamente respondidas... - Me vi em um sorriso genuíno e realmente satisfeito por ver o resultado de minhas aulas e grande insistência na matéria. - pode me responder, oralmente, qual foi o objetivo do "bloqueio continental"?
- Uma tentativa inútil de proibir o comércio entre os países europeus e o Reino Unido, bloqueando de forma porca o comércio marítimo e terrestre.
- Perfeito, Bocchan. E qual país fez parte do importante ponto de virada do bloqueio?
- Rússia. Os franceses imbecis não suportaram o inverno rigoroso, e a resistência russa.
Ele parecia indignado ao responder as perguntas. Estudar história com Bocchan nunca foi algo fácil, afinal ele sempre foi um grande questionador dos livros e dos fatos apresentados. Era um tanto insistente, e às vezes, irritante.
- Vejo que está totalmente ciente da matéria, senhor. Podemos seguir adiante com os próximos capítulos.
- Já basta... - Bocchan fechou o livro e se jogou contra sua poltrona, massageando suas têmporas com seus pequenos dedos. - estou ficando com fome. Desça e comece a preparar o jantar, estou farto de estudar.
Seria gratificante marcar suas mãos com a régua, nesse exato momento. Minha paciência vem se esvaindo a algumas horas, tenho notado.
- Não acha que está cedo, senhor?
- São seis em ponto, já é o suficiente. Agora vá, se adiante.
Fedelho mimado.
- Como quiser, Jovem Mestre.
Reverenciei e me retirei do escritório, pronto para enfrentar, ainda mais, aquele...
Hm?
Surpreendentemente, o aroma havia enfraquecido pelo corredor, ainda presente, mas suportável. Suspirei, um pouco mais tranquilo. Otimista de que de fato, era tudo algo passageiro.
Agora, o jantar.
Desci as escadas, ainda pensando no que prepararia. Talvez um "Roast Beef"? Ou quem sabe uma nova receita chinesa?
Deveria conferir o livro de receitas e decidir logo, afinal Baldroy, com certeza, não o fez.
As coisas têm estado mais tensas desde a caçada proposta por Bocchan, ele tem sido mais bruto que de costume. Humanos, alguns são mais animalescos que outros, mais ignorantes. Por algum motivo a raça norte-americana tem este padrão.
E pensando em "raças", não sou capaz de me convencer que a senhorita Amelia seja uma legítima inglesa. Talvez, seus pais fossem mestiços? Talvez, vindos do Oriente Médio. Não sei ao certo, nenhum dos documentos que investiguei sobre a mesma expõe este tipo de informação. E, ela segue se dizendo inglesa.
Imprevisível, interessante e misterioso. Já faz um certo tempo desde a última vez que um humano me atiçou tal curiosidade, quando conheci Bocchan.
Mas era algo diferente, curiosidades diferentes. Há algo a mais sobre esta humana, algo que, não posso dizer ao certo o que é, mas certamente vai além do complexo de sua imprevisibilidade.
Quando foi que me vi tão curioso sobre ela?
Entre devaneios e pensamentos avulsos, cheguei à cozinha.
- Baldroy?
- Hm? Ah, você.
Uma pedra seria mais receptiva.
- O jantar. Está...
Doce e amargurado, a quantidade ideal, perfeita. Desta vez quase pude senti em minha língua.
De novo, não.
Tão forte, tão arrebatador quanto antes, senti o aroma misterioso invadir minhas narinas.
Ela estava perto.
Calor, temperatura corporal elevada. Senti meu peitoral esquentar, meus braços queimarem sobre o tecido do fraque e meu pescoço se sentir sufocado pela gravata. Meu corpo estava quente.
As mesmas sensações peculiares e, para mim novas, de mais cedo vieram acompanhando o calor, com tudo; formigamentos se espalhando por todo o meu corpo e, novamente, os calafrios. Meu corpo estava arrepiado, mais uma vez.
Era grave, as reações estavam se acumulando, e meu corpo respondendo a cada estímulo, mesmo que não devesse. Eu não poderia permitir que acontecesse, eu devia me controlar.
Mas, era cada vez mais difícil.
Quase que instintivamente, vi meu corpo sendo traidor e pedindo por mais, minhas narinas respirando fundo, exalando ao máximo que podiam.
A bomba, que me bombeava o falso sangue humano, batia mais rápido. Meu "coração".
Meu controle está se esvaindo aos poucos, minha razão se confundindo. Minhas vontades, tomando o controle.
- Então, você vai ficar parado ou vai...
- Prepare um peixe à milanesa com batatas assadas para o Jovem Mestre.
- Ah?! Você não disse nada sobre o cardápio hoje mais cedo! Além disso, eu estou ocupado com as...
- Faça.
O respondi, firme. Por segundos, senti perder minimamente o controle de minha voz.
Bardroy ficou quieto me encarando como um cão assustado. Um cão covarde e assustado. E honestamente, não fiz ou farei questão de me corrigir.
Era o suficiente, estava excedendo os limites, minha razão, o controle de meu corpo e próprios extintos. Era a hora de descobrir uma maneira de acabar com isso, uma forma de cessar.
Eu precisava de uma resposta, mesmo que isso significasse ser desprezado por ela, uma humana, mais uma vez. E eu não me importo, não me importo com uma mísera humana interessante. Apenas precisava retomar o controle do ambiente a minha volta, de mim mesmo.
Caminhei lentamente pela cozinha, examinando meticulosamente por onde o aroma parecia mais forte. A cada inspiração, as sensações inconvenientes e rebeldes se tornavam mais fortes.
Passos, passos e mais passos, estava cada vez mais próximo.
O corredor para o quarto dos servos, era algo por lá.
O que ela faria por lá, tão cedo?
Continuei a andar, exalando cada vez mais. Mais formigamentos, mais arrepios, a bomba em meu peito batendo cada vez mais forte, a temperatura corporal subindo de forma incômoda.
Afrouxei a gravata em meu pescoço, procurando por mais ar, meu corpo pedia por mais. Eu precisava acabar com isso.
O quarto de senhorita Amelia. Em frente a aquela porta, onde o aroma me conduziu. Não soava como uma boa ideia.
A temperatura corporal seguia subindo, em meus braços e costas, era como se o tecido do fraque queimasse.
Não me importa o conceito de ideias boas e ruins agora.
Toc, toc.
- Senhorita Amelia... - Bati, no aguardo de uma resposta, mas tudo que recebi foi silêncio. - a senhorita está se sentindo bem?
Bati novamente, porém, sem resposta alguma. Talvez estivesse dormindo, talvez me ignorando. Mas, eu não havia tempo a perder.
Farejei novamente, nenhum outro aroma próximo, o de Baldroy, Mey-Rin ou Finnian. Estava sozinho.
Ainda atento, coloquei minha mão sobre a maçaneta, e então girei.
Estava destrancada, conforme as regras da casa.
Parei por alguns segundos, me perguntando se seria realmente o ideal. O aroma seria concentrado lá dentro, meu corpo e instintos a poucos fios de fugir de meu controle, cedendo.
Mas, de qualquer forma, se não fosse capaz de cessa-lo, a tortura continuaria.
Que seja.
Abri a porta por completo, e adentrei.
Totalmente dominado, embriagante. O quarto estava concentrado com o mesmo cheiro metálico, intrincado e enigmático. O amargo, as notas doces, o rancor, a rebeldia.
Deus, parecia vindo dos céus, como um tipo de armadilha.
E apesar de tanta presença, não havia ninguém.
Era um quarto simples, o quarto de Tanaka com alguns móveis a mais. Uma penteadeira com gavetas e espelho, cama simples acompanhada de uma mesa de cabeceira, com candelabro , e um armário, com malas vazias ao lado. E apesar de tudo, vazios.
Se ela não estava por aqui, de onde vinha?
Ainda persistente, e ignorando as reações exageradas de meu corpo, continuei a procura, dessa vez com mais pressa. Estou ficando farto.
Abusei de minhas habilidades sobre humanas, olhando cada canto com rapidez.
Nada em sua cama, nada em sua penteadeira ou gavetas, nada em sua mesa de cabeceira.
Seu armário.
O abri, sem a delicadeza que deveria. Cada vez mais forte, cada vez mais presente. Deslizava os cabides para os lados, vestido por vestido, os de seda, algodão, renda, Chiffon. Não havia nada.
As gavetas.
Era invasivo, arriscado, ela poderia entrar a qualquer momento, afinal seria difícil distinguir, seu aroma dominou toda a casa. Mas, eu estava perto demais para relutar.
Gaveta por gaveta, sapatos, chapéus, meias, luvas, roupas in...
Sangue.
Uma peça íntima, branca com pequenas rendas e detalhes delicados de algodão. Totalmente manchada por sangue.
O tom metálico e carmesim que venho sentindo, como suspeitava. Sangue.
Agora tudo parecia se encaixar de forma tão clara e óbvia, que me senti um tolo. Um tolo por não me recordar do fardo mais simples que o as humanas carregam. O sangue da fertilidade, "menstruus".
Algo tão simples, mas tão conflitante.
Este era o cheiro de sangue, mas o resto, o resto era a questão. Todos os outros pontos do aroma não vinham deste sangue; o tom virginal, o amargo, a falta de esperança e o delicioso remorso, nada disso vinha do sangue.
Era apenas sangue. Por tanto, o fato era ainda mais preocupante.
Este é simplesmente o aroma que ela exala, este é de fato o odor de senhorita Amelia. Eles fazem parte dela, e provavelmente ganharam mais vida quando seu corpo entrou neste período de fertilidade.
Quase de forma hipnótica, como se não estivesse no controle de minhas próprias ações, me vi pegando a peça, e a trazendo para perto de meu nariz.
A inalei, inalei como se fosse o último resquício de ar que me restasse, como se precisasse dele para viver. Apertei o tecido, com receio de rasgá-lo em minhas mãos, tentando me controlar para que não acontecesse.
O calor se perpetuou, o sangue de meu corpo se concentrou em um único ponto, a respiração se tornou irregular, as pupilas se dilatarem, meus pensamentos se tornarem turvos e minhas vontades, questionáveis.
Eu, tragicamente e de forma humilhante, perdi o controle.
[...]
Revirei todo a sessão de periódicos, mas não encontrei nada! Perda de tempo!
- Você gosta mesmo de passar tempo aqui, não é?
Ah, e Mey-Rin estava aqui. Ela insistiu em ficar me perseguindo o dia todo!
- Eu gosto de ler... - caminhei até ela e me sentei na poltrona ao lado da sua. - você, não?
- Hm, não tanto quanto você. Parece que, tudo que você sabe, vem desses livros. Você deve ter lido muitos pra saber tantas coisas, não é?
- Sabe, eu nunca parei para pensar em quantos eu li ao longo da minha vida.
E realmente, nunca parei. Acho que, desde o momento em que aprendi, passei a andar sempre com um livro em mãos, ao lado da cama, em baixo do travesseiro. Foram tantos, durante tanto tempo, que não sei a conta ao certo.
- Eu custei aprender a ler, acho que se não fosse pelo senhor Sebastian, eu não teria feito questão de aprender. Ainda bem que eu o conheci.
Ela disse, em um tom macio, enquanto cutucava as próprias unhas. Provavelmente pensando e sonhando acordada, com ele.
Sebastian. Mesmo que não quisesse, uma vez ou outra ele apareceu em meus pensamentos, hoje.
As coisas seguiram estranhas, depois de pegá-lo na biblioteca com a noiva daquele homem. Fiquei preocupada, pensando no quanto aquilo poderia me comprometer, ele poderia me cobrar, me perseguir como fez poucos meses atrás. E então, eu acabaria dando vários passos para trás, perdendo tudo que tentei construir com um grão de paciência, a mínima que tentei ter com ele.
Mas, isso não aconteceu. Ele agiu como se nada tivesse acontecido, e segue assim até agora. Eu, sinceramente, espero que ele continue me evitando, apesar de não achar que essa seria a melhor opção para nós dois. Sebastian era um homem inteligente, ele sabia que essa não seria a melhor escolha.
Mas, acima de tudo, eu senti algo a mais, raiva.
E eu sabia muito bem o motivo.
Eu fui idiota, idiota em imaginar que em poucos momentos ele poderia ser uma companhia agradável, que o convívio com ele poderia ser mais fácil. Depois do dia em que o vi tocar o piano, em que me convidou para acompanhá-lo, eu achei que tudo fosse promissor, com um rumo melhor. Eu fui uma besta em, nas profundezas da minha imaginação, cogitar que ele não fosse tão ruim quanto eu pensei.
E por isso eu senti raiva.
E quando o vi, cortejando uma mulher comprometida, totalmente à parte e inconsciente do homem podre que ele é. Um homem egocêntrico, intrometido, podre! Um completo hipócrita que se autointitula cavalheiro, nobre e cortês, e por trás das cortinas, é totalmente o contrário.
Ele me enoja, e me enoja imaginar que fui otimista em relação ao seu caráter. Ele simplesmente não tem.
[...]
Perturbado, desequilibrado, humilhado, fora de controle. Em minha mente, nenhum outro pensamento, não havia nada, apenas escuridão.
Meu braço esquerdo movendo-se copiosamente em impulsos selvagens e descontrolados.
Tortuoso. Unhas negras e ponta dos dedos se avermelhando enquanto apertava e rasgava os lençóis. Os movimentos repetitivos se seguiram, mais agressivos, lascivos. Senti pulsar, ainda mais, em minha mão.
Suor, calor, fervura, tudo parecia quente, queimando. Eu havia desistido do fraque, da gravata, das luvas, dos botões da calça. Derrotados e jogados no piso de madeira, no canto de meu quarto.
E de repente, contra minha vontade, pensamentos insólitos, sujos e humilhantes. Sua imagem se perpetuava como um parasita em minha cabeça. Seu pescoço fino, que implorava por mordidas, lábios voluptuosos que poderiam gritar meu nome, uma cintura tão fina e frágil, parecia tão fácil de se quebrar. Cada vez mais rápido, os espasmos pioravam. Não posso parar. Uma humana, uma mísera humana. Uma afronta, um ultraje, digno de indignação.
- Maldita, miserável.
Rugi, rangendo os dentes, como um animal irritado. Caninos mordendo a ponta de meus lábios, arrancando sangue, que minha língua recolhia em bel prazer do sabor metálico.
Malícia, sujeira, imaginação. A cena, totalmente suja em meu imaginário; seu corpo contra a parede, esmagado pelo meu, o pescoço dominado por minhas mãos, a passagem de ar cada vez menor, os lábios rosados e inchados, o fio de saliva escorrendo contra a boca aberta, pedindo por ar. Enquanto os seios fartos sobem e descem, ofegantes, se perdendo em prazer. Humilhada, cada vez mais desconcertada conforme meus dedos se moveriam em sua intimidade. Olhos castanhos encarando meus olhares carmesins. Minhas presas contra seu pescoço. Balbuciando palavras que não conseguiria completar, que se transformariam em gemidos pidões.
Gostaria de quebrá-la, quebrar seu comportamento insolente, sua rebeldia e resistência em relação a minha pessoa. Colocar-me entre suas pernas, e assistir orgulhoso a vergonha se espalhar por seu rosto, enquanto a tomaria para mim. Transformando suas respostas intelectuais e mal criadas em gemidos, em meu nome. Apenas meu nome.
Posso imaginar. "Sebastian!", "Sebastian!". Vejo minha cabeça recriar sua doce voz suplicante.
Ela se esconderia, colocando os próprios braços no rosto, envergonhada. Criaturinha rebelde.
Eu abriria sua pernas e iria o mais fundo que podia, a ponto de tocar sua alma, e com minha mão livre, penduraria suas duas mãos contra a cabeceira, a fazendo olhar no fundo de meus olhos, com sua feição mais submissa e em êxtase possível, mostrando a ela quem realmente venceu.
Cada vez mais grosseiro contra minha própria mão. Os lençóis se tornavam, cada vez mais, trapos.
Aquela humana, aquela maldita...
Espasmos mais fortes, músculos se contraindo, mais sangue de meus lábios, minha coluna se levantando contra o colchão e minhas, outras unhas, se afundando ainda mais, finalmente rasgando o colchão.
Atingi um duro e rígido orgasmo, e aos poucos, meus pensamentos retornavam ao habitual, o corpo voltava ao meu controle e o senso do ridículo, da humilhação, retornava como uma facada.
Minha mão, suja e molhada com o sêmen, a prova cabal do que havia acontecido. Tontura, algo como uma baixa de pressão por todo o corpo. E talvez, o pior de tudo, quando meus olhos encontraram meu próprio membro. Rígido, intacto, como se não fosse o suficiente. Pronto para uma segunda, quarta, talvez quinta, tentativa.
Talvez, não tivesse retomado totalmente o controle.
Senti meus músculos tencionarem e uma onda de choque me correr o corpo, meu sangue fervia e senti meus olhos se iluminarem em um vermelho ainda mais vibrante contra a escuridão do quarto. Mas, não se tratava de excitação.
Era o mais puro e singelo ódio, raiva.
Assassinei minha própria dignidade e escondi seu corpo como um verdadeiro assassino.
Eu havia me tocado, me masturbando-se diante do efeito de uma humana. Uma humana fraca e frágil, comparada a mim. Uma humano que poderia quebrar em questão de segundos, com a unha do pé, com um único dedo da mão.
Nunca havia feito tal ato, de tal forma. Com tanta agressividade, tanta sujeira e podridão.
Poucas, minúsculas foram as vezes em que me peguei afogando-me no meio de minhas pernas para buscar qualquer entretenimento. Poderia contar nos dedos.
Com seus desejos sempre tão controlados, às vezes se afogava entre pernas quaisquer em busca de um pouco de prazer, nunca, em toda a eternidade, com um desespero tão carnal, como agora.
Uma humana, uma humana, uma humana, uma miserável, pequena...
Senti metade da cama se entortar quando, em uma descarga de raiva nociva, cotovelei a cabeceira da cama, rachando, também, um pouco da parede.
Muito, muito descontrole. Do princípio ao fim, do princípio da manhã até o presente momento.
Era novo, totalmente inédito. Odioso, humilhante, hediondo. E tinha muito mais que poderia descrever.
E, para minha indignação, era também, peculiarmente, emocionante e devastador.
Soava impossível, antinatural. Era inexplicável, em anos de existência.
Senhorita Amelia, que diabos você fez?
[...]
- Se sente bem para treinar? Acha mesmo?
- Eu estou bem, tenho certeza. Me sinto muito melhor depois daquele banho.
- Ufa, que bom! Não podemos perder tempo atrasando os treinos. Precisamos ser constantes.
- Concordo.
- Inclusive, tem uma coisa que vamos precisar hoje... - Ela colocou a lamparina sobre a mesa da cozinha, e a acendeu. - pode ir ao meu quarto, pegar a mochila em cima da cama?
- Sim, posso!
Saí da cozinha e fui até o corredor dos quartos, logo ao lado. Eram dez da noite, e teríamos mais uma noite de treinamento.
É um pouco estranho ela mencionar uma mochila, nunca usamos nenhum material nos nossos treinamentos, além da faca.
Andei pelos corredores, a primeira porta era de Baldroy e Finnian, a segunda era minha, e a terceira pertencia a ela.
A quarta era de Sebastian.
Adentrei o quarto de Mey-Rin, fechando a porta atrás de mim. Olhando em volta, era um pouco bagunçado, com algumas roupas no chão e gavetas dos armários entreabertas, mas nada demais.
Olhei para a cama de lençóis amarrotados, onde estava sua mochila.
Fui até ela e a puxei pelas alças.
- Arg! Que peso.
Era bem pesada, e estava totalmente cheia. Me pergunto o que ela quis guardar aí dentro!
Fui até a porta e girei a maçaneta, a abrindo.
- Receio que devemos conversar... - Em um puxão repentino, Sebastian abriu a porta e andou em minha direção, eu instintivamente andei para trás. Ele aproveitou a passagem para entrar e trancar a porta! - sobre a biblioteca. Não acha?
O inevitável aconteceu. Eu mantive minhas esperanças e acreditei que ele seguiria fingindo que nada aconteceu, mas era óbvio, vindo dele, que as coisas não ficariam da forma que eu gostaria.
- Não temos nada para conversar. Agora, se me der licença, eu tenho que...
- Antes de qualquer coisa, preciso que me ouça. Senhorita Amelia, a mulher que...
- Pode parar. Me escute você... - Eu coloquei meu dedo indicador sobre seu peito. - pouco me importa o que estava acontecendo na biblioteca, e se é de sua preocupação, eu não pretendo contar para ninguém. Não pretendo porque, novamente, não me importo com o que faz de sua vida, não pretendo me intrometer nela e, sinceramente, será um prazer caso me deixe fora dela.
Sua expressão mudou. Ele parecia mais sério, amargo, impaciente.
- Interessante dizer isso, afinal, a senhorita parecia tão interessada em se aproximar de mim nos últimos dias... - Ele começou a andar em minha direção, como fez antes. - aceitou meu convite a tocar piano, não tem recusado minha companhia, ficou ao meu lado no dia de caça, quando poderia ter defendido Baldroy e dividido um cavalo com ele, ou Finnian quem sabe, você me...
- Pare agora. - O empurrei, com força, e apesar de seu corpo mal se mexer com minha força, ele parou. - "Aceitar sua companhia"? Quem você pensa que é?! O que você quer insinuar com tudo isso?! Não me venha com essa! Eu tentei ter uma boa convivência com você, tentei tornar nossa relação mais agradável, sim eu tentei! Mas não ouse me dizer que fiz isso porque tenho qualquer tipo de interesse em você, que se assemelha com aquela mulher! E honestamente, eu tenho vergonha de ter sequer cogitado que você poderia ser uma companhia agradável. Agora, com licença! Eu tenho mais o quê fazer.
O ignorei, e antes que pudesse dizer qualquer coisa, sai e bati a porta. O deixando sozinho.
Idiota, eu fui idiota. Ele é um idiota.
Nós dois somos.
[...]
- Tem certeza de que aqui é o lugar ideal?
Hoje, Mey-Rin decidiu treinar em um campo aberto, afastado da mansão e a luz de lamparinas. Era um pouco difícil de enxergar, além de frio. Mas, ainda assim, soava melhor do que no telhado da mansão.
- Acho que é um pouco tarde pra pensarmos nisso! - Ela entrou em posição de ataque. - Vamos, eu estou te esperando!
Quatro passos.
Primeiro, manter o foco e olhos no oponente.
Segundo, manter a distância e nunca estar perto demais.
Terceiro, respirar fundo.
Agora, contar até quatro.
Um.
Posicionei bem meus pés, mantendo a posição de impulso para correr.
Dois.
Apertei bem a faca contra meu punho. Estávamos a trinta passos de distância.
Três.
Respirei fundo e lentamente, ingerindo o máximo de ar que podia, o permitindo sair por minha boca logo em seguida.
Quatro!
Corri em direção a Mey-Rin, na melhor velocidade que podia. Mantive a faca bem firme contra minha mão esquerda.
Tracei minha rota em poucos segundos. Seu objetivo seria me desarmar, o meu, acerta-la.
Precisava de imprevisibilidade, um ponto falso!
Seu abdômen.
Segui correndo, traçando uma rota em linha reta até ela, mantendo meu torno inclinado para a frente!
Cada vez mais perto!
Passei a levantar meu braço, levando a faca para cima!
Apenas dez passos de distância!
Ela aguardava por meu ataque, sem alarde ou movimentos bruscos.
Quatro passos!
Imprevisibilidade!
Pulei o mais alto que podia, mantendo minha mão levantada!
Mey-Rin pareceu surpresa de repente, mudando totalmente a posição de seu corpo, dando passos para trás!
Conforme voltava ao chão, via a mão de Mey-Rin se levantar para alcançar meu punho. Ela tentaria me desarmar!
Hoje não.
Em um passo calculado e arriscado, joguei a faca para a minha mão direita e então...
CONSEGUI! PEGUEI!
Levei meu punho direito para baixo com violência!
Meu pés chegaram ao chão, poucos metros à frente, de costas para Mey-Rin.
Dobrei o joelho no mesmo momento, amortecendo melhor o impacto!
- Mey-Rin! Deu certo! - Passei a comemorar, ainda recuperando meu fôlego, de costas para ela. - Eu consegui mesmo!
- Sim! Eu vi! Você foi incrível! Conseguiu desviar da defesa!
- Eu não achei que meu plano fosse... - Quando olhei para trás, vi Mey-Rin pressionando o próprio braço com força. - Mey-Rin?! - Olhei para minha faca, havia sangue, muito sangue. Merda! Não deveria ter acertado com tanta força! Joguei a mesma no chão, indo em direção a Mey-Rin. - você está bem?!
- A-ah, tá tudo bem! Não foi nada, nada mesmo.
- Vamos, me deixe ver seu braço! - Tirei sua mão do caminho para poder ver o corte. - Que coisa! Precisamos cuidar disso agora!
- Estou dizendo, não foi nada! - Ela deu de ombros, mantendo um sorriso orgulhoso no rosto. Como se o corte não tivesse importância. - Eu mal sinto dor, q-quer dizer, só um pouquinho.
A manga de seu vestido estava rasgada. O corte seguia sangrando, com gotas pingando por seu cotovelo, manchando o tecido de sua manga. Era extenso, talvez, com uns doze centímetros.
Merda Ayuni, merda!
- Vamos descer. Temos que tratar do corte antes que...
- Eu já disse, não precisa se preocupar! - Com uma tranquilidade estranha, Mey-Rin se afastou, indo até a bolsa que havia trazido. Ela mexeu e remexeu entre as coisas que havia trazido. - Eu já sabia que em alguma hora isso aconteceria, por isso eu trouxe ataduras! - Sorridente, ela tirou de sua mochila uma caixa de ataduras e uma pequena garrafa de vidro, com água. - Quando terminarmos por aqui, eu vou cuidar da ferida. Mas durante um combate, não existe tempo pra esse tipo de coisa, entende? Por isso, - Ela abriu a garrafa de vidro, despejando a água sobre toda a ferida e o sangue, que escorreu e sumiu aos poucos. - o ideal é tentar estancar o sangramento. - Com a ferida limpa, ela pegou uma das ataduras, rasgou com os próprios dentes e amarrou com força o pedaço que escolheu, sobre a ferida. - Viu só? Nova em folha!
- Ahm, você tem certeza de que...
- Não podemos parar agora, você evoluiu e tem lidado muito bem com seus erros, além disso, você finalmente acertou. - Com a ferida estancada, ela andou até mim, se abaixou e alcançou a faca no chão. - Agora, é sua vez de se defender. Se conseguir me derrubar de primeira, vou entender que você finalmente entendeu o treinamento de desarme e a defesa. - Ela estendeu sua mão a mim. - Fechado?
Esse maldito treinamento tira muito de mim. Estou seguindo com a corrente, perdendo horas de sono e sendo derrubada de todas as formas possíveis por Mey-Rin.
Por muito tempo, errar foi algo agonizante para mim. Meu peito acelerava, minhas mãos tremiam e tudo em mim se comprimia em frustração. Mas, depois de horas, horas e mais horas errando repetidamente, uma em seguida da outra, não só aqui, mas no dia a dia dentro da mansão, parece que a situação se "necrosou", e tem se tornado mais fácil de se lidar. Admito, foi uma surpresa para mim.
Mey-Rin não era uma má "treinadora", ela sabia exatamente o que estava fazendo, é bem menos pior do que ele era.
Que se dane, quero acabar logo com isso.
- Fechado. - Apertei sua mão. - Quantos passos de distância?
- Trinta, - Ela limpou a faca em seu avental, o manchando de sangue. - como acabamos de fazer.
- Entendido.
Nos afastamos, a trinta passos de distância. Agora, a imprevisibilidade vinha totalmente de Mey-Rin. Defender é tão difícil quanto atacar, aquele que ataca tem o controle de como a situação pode caminhar, ele determina o ataque e a rota. A parte mais difícil cabe a quem vai se defender, aquele que se defende precisa encontrar, no exato momento do ataque, uma forma de se defender, em combate essa pessoa pode determinar aquele que morre e aquele que vive, que perde e que ganha.
Eu não gosto de perder.
Parada, aguardei pelo momento em que Mey-Rin começaria a correr. Ela contaria, ou só esperaria sem pensar? Se fosse contar, contaria até quanto? Qual rota ela traçaria, onde escolheria me acertar?
Ela começou a correr!
Rápido Ayuni, pense, pense! Tenho poucos segundos!
Faca na mão direita, mesmo sendo destra! Uma corrida diagonal para a mesma direção do próprio braço, corpo inclinado e joelhos dobrados...
MEU BRAÇO! Ela tentaria acertar meu braço direito!
Mal pisquei, e Mey-Rin já estava no ar. Assim como eu, ela havia pulado, levando sua mão direita ao ar, segurando a faca!
DESVIAR!
Pensei o mais rápido que pude e desviei, correndo e a deixando para trás! Foi no tempo exato em que ela levou sua mão para baixo com violência!
Por pouco!
- ARG! - Mey-Rin foi mais rápida, aproveitando a vantagem do pulo rápido e de minha corrida, rápida como um gato, ela usou seu braço esquerdo para enforcar meu pescoço, mirando a faca na mesma direção! -H-HM! COF, COF!
- Vamos, Amelia! - Ela apertou mais meu pescoço. - Você acha que o inimigo vai esperar?! Ele não vai! Você precisa pensar em...
- ARG! AHHHH! - Com toda a força que pude, agarrei o braço de Mey-Rin e inclinei torso para baixo, a jogando no chão! Aproveitando a vantagem e o quanto ela parecia zonza, me joguei em cima da mesma. Agarrei seus dois punhos com minhas mãos. - Que tal agora?!
- B-bom! Cof, cof! Mas, você esqueceu de uma coisa!
- Ah?!
- Você não imobilizou minhas pernas!
Em um impulso, ela dobrou suas pernas o mais rápido que pôde e chutou minha barriga!
- ARG! DROGA!
Dessa vez, eu é quem foi para o chão. A dor me desorientou por segundos e mal consegui ter forças para levantar!
Merda, merda, merda!
Em um piscar de olhos, Mey-Rin já corria em minha direção, com a faca levantada em mãos.
Sem problemas, eu também sei jogar sujo!
Só um pouco mais perto.
Ela continuava correndo, talvez estivesse a cinco passos.
Um pouquinho mais!
Três passos.
AGORA!
Tentei chutar sua barriga, assim como fez comigo!
NÃO!
No exato momento do chute, ela virou o corpo de lado, fazendo com que o chute só atingisse sua perna, a afastando.
Ao menos, isso me deu o tempo que precisava para levantar!
Agora, estávamos a, talvez, dez passos de distância, recuperando nossos fôlegos. Ela sorria como uma criança empolgada!
Tenho a sensação de que estava fazendo o mesmo. Estava?!
- Cansada, Amelia?! - Ela flexionou os ombros, ainda com a respiração ofegante. - Se estiver, tem tempo de desistir!
- Desistir?! - Estalei meu pescoço e meus dedos, já impaciente com esse joguinho! - De jeito nenhum!
- É isso que eu gosto de ouvir! - Ela correu em minha direção, mais uma vez! - Mas, não significa que você vai ganhar!
Ela levantou a faca mais uma vez.
Já chega dessa merda!
- Quer saber?! - Em um impulso, talvez, inconsequente, corri em sua direção. - Vamos descobrir agora!
Ela pareceu sorrir ainda mais.
Seguimos correndo na mesma direção, a faca no alto de suas mãos, prontas para me acertar. Cada vez mais perto, cada vez mais arriscado, estávamos muito perto...
- Q-que?!
- Eu d-disse, - Finalmente estávamos cara a cara. E no mesmo segundo que Mey-Rin havia tentado me acertar, tive tempo de agarrar seu braço. Ou melhor, meus dois braços faziam o árduo trabalho de segurar os seus! Estávamos totalmente cara a cara, com nossos braços e mãos trêmulas, um tentando vencer a força do outro. - eu disse que não ia desistir!
- N-não conta com isso por muito tempo! - O braço de Mey-Rin tremia, e de perto, a faca parecia tão afiada quanto quando estava em minhas mãos. - em algum momento seus braços vão se cansar de me segurar! Sabe disso!
Ela estava me provocando.
E, apesar de ser uma provocação, não era uma mentira. Meus músculos já pareciam queimar por dentro e tudo em mim tremia, cedendo aos poucos a fraqueza.
Precisava pensar em algo, algo que pudesse me tirar dessa "bala engatilhada" em que me meti! A qualquer momento, eu poderia perder o controle a...
"ELA ME DEU UMA RASTEIRA?!"
Espera, o primeiro treinamento! Minha primeira falha. ERA ISSO!
- E-ei, Mey-Rin!
Nossos braços se mantiveram na constante luta por poder.
- O que?!
- V-você se e-esqueceu de uma coisa!
- Eu, é?! O q-que!
- VOCÊ NÃO PODE PRENDER MINHAS PERNAS! - Dei uma rasteira em seus dois pés, larguei sua mão livre e a empurrei para trás. - E AGORA, NEM MEUS BRAÇOS!
Totalmente sem equilíbrio, Mey-Rin perdeu a força em seus braços! Aproveitei a oportunidade e arranquei a faca de sua mão.
- ARG!
Ela caiu, batendo seu corpo com força contra o concreto frio.
- E agora, - Enquanto a mesma ainda estava no chão, cruzei suas pernas e pisei em cima das mesmas com força, a impedindo de se mover. Me inclinei e pressionei meu braço sobre seu peito, apontando a faca para seu rosto. - quer dizer que eu venci. Não?
- Ha! - Ela sorria, mesmo com a faca diante do seu rosto! - É, você venceu!
- Ah, - Soltei um suspiro aliviado, jogando a faca no chão e estendendo minha mão a Mey-Rin. - Tem certeza de que está bem?
- Absoluta! - Disse enquanto agarrou minha mão, se levantando e arrumando seu vestido. - Parabéns Amelia, você provou que entendeu o treinamento! Agora, podemos passar para a próxima fase!
- P-próxima?!
- Sim! Por que?
Eu não achei que esse treinamento se estenderia por mais tempo. Que desgraça!
- Não, não é nada. Q-qual a próxima fase?
- Não é tão simples, mas acho que com um pouco de prática você consegue! - Mey-Rin andou pelo gramado úmido, alcançando uma das lamparinas que havíamos trazido. - Vamos entrar lá!
A poucos metros de nós haviam arbustos grandes e cheios, árvores altas com seus galhos tortos, um caminho muito mais íngreme e uma grama mais alta.
- A floresta?!
- Vem logo! - Ela me puxou pelo braço, literalmente me arrastando para segui-la. - Em algumas ocasiões, pode ser que você e seu inimigo tenham alguma vantagem semelhante. - Ela seguiu andando e me puxando, adentrando o grande matagal e terreno íngreme da floresta. - Por exemplo, os dois podem estar gravemente feridos, desarmados, armados ou em um ambiente que não seja muito propício.
- Mey-Rin, meu braço!
- Oh, estou te machucando?
- Não! Mas...
- Ah, ótimo! Então vamos continuar. Como eu andava dizendo, você e seu inimigo podem acabar em uma dessas situações, e em momentos assim não é exatamente o mais forte quem ganha, mas sim, o mais esperto! - Depois de bons minutos apressados andando no meio de tantos troncos, arbustos e sons estranhos, ela parou! - Entende o que quero dizer?
- Sim! Mas, o que vir até aqui tem a ver com isso?
- "Ambiente não propício"! Hoje, vamos imaginar uma situação de desvantagem pra ambos os lados, ou seja, você e seu inimigo. E nessa situação, ambos estarão em um ambiente não propício!
- E isso quer dizer?
- Quer dizer... - Ela abriu a lamparina e soprou o fogo! - que você e seu inimigo estarão na escuridão.
AI, MERDA!
[...]
T-tudo bem, eu consigo, eu consigo.
Porra, é muito escuro! Que inferno! Quais eram as regras que Mey-Rin disse?!
Segui andando pela escuridão, sentindo a agonia em cada músculo, com meus olhos agitados, procurando por qualquer resquício de visibilidade.
Vamos, vamos, concentre-se! Quais eram as regras?!
Primeiro, m-manter a calma! Segundo, usar a escuridão a meu favor. Merda! Como eu faço isso?!
T-terceiro, era...
- TE PEGUEI!
- AHHH! - De repente, senti algo fazer um grande peso contra as minhas costas. Acabei por perder o equilíbrio e cair no chão. - Urg! Mey-Rin!
- Amelia! - De repente, uma luz surgiu. Meu isqueiro estava em suas mãos. Ela me obrigou a entregar, antes de começarmos. - por que não seguiu a regra seis?! Você facilitou muito pro inimigo!
- Ah, - Suspirei cansada, massageando minhas têmporas, frustrada! - Mey-Rin, acho melhor voltarmos. Eu, e-eu estou cansada. - Me levantei do gramado, tentando limpar meu vestido. - Não vamos render se continuarmos assim.
- Tem certeza disso? Você parecia tão animada antes e...
- Sim, eu tenho. Continuamos depois, tudo bem?
- Oh, - Ela pareceu desanimada com a minha decisão. - tudo bem. Vamos voltar e descansar!
Medo idiota, escuridão idiota.
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OI GENTE! Meu deus, esse capitulo ficou gigantesco (10k de palavras). (':
Espero que capítulos muito grandes não incomode vocês, até porque, vai ser algo muito comum nessa fic! Em fim, muitas coisas aconteceram nesse capítulo, não é? Que tal um rápido passeio de mãos dadas pelas explicações?
Primeiro, acho que todos entenderam que nossa protagonista está menstruada! Se é ruim no século 21, imagina pra ela, lá no 19? Uma merda! Antigamente era muito mais difícil manter a higiene, tomar banho era algo de luxo até para os nobres e não era um costume diário. Era ruim para todos, mas sem dúvida, difícil para as mulheres. Aquelas "almofadinhas" que a Mey-Rin deu a Ayuni, para por nas roupas intimas, eram tipo tecidos, que as mulheres costuravam e colocavam nas roupas intimas pra não manchar tanto assim. É uma ideia parecida com a do absorvente que temos hoje. Deu pra ver que ao longo do capitulo nossa protagonista enfrenta problemas clássicos como "Se mexeu muito? Vasou!", "Dor? Cólica!". Sem dúvida, uma grande merda.
Agora, vamos falar do SAFADO do Sebastian? Aposto que ele deixou muita gente em choque nesse capitulo. Vamos esclarecer algumas coisas
O Sebastian é um demônio e junto a isso, vem uma vasta quantidade de poderes e habilidades que eu pretendo explorar ao longo da história. Uma das habilidades do Sebastian é o olfato aguçado, muito mais potente do que o olfato humano. O Sebastian pode não só sentir o cheiro em si do indivíduo, mas a carga de hormônios e "sentimentos" que eles podem acompanhar, sabe? Por exemplo: Ele poderia reconhecer o cheiro de um >assassino<, e só por isso desvendar que ele é de fato um assassino.
PORÉM, pra que ele consiga decifrar muito mais que o aroma/cheiro, os hormônios sentimentos precisam ser MUITO fortes. O que é o caso da nossa protagonista.
A menstruação é um período em que os hormônios e todo o aroma de Ayuni ficam mais fortes e vividos para o Sebastian, resultando em toda a merda que a gente viu. É como se eles estivessem "fracos/adormecidos", e por isso, Sebastian nunca reparou. Até mesmo pelo fato de que durante todo o inicio de nossa história eles vivem uma certa "inimizade", por isso, Sebastian nunca se deu ao trabalho de prestar a devida atenção ao lado mais interessante dela. Ele só gostava de perturbar e infernizar pelo bel prazer de vê-la com raiva dele. Fazer o quê? Não é novidade nenhuma que o Sebastian gosta de encher o saco dos outros por diversão (principalmente do Ciel KKKKK).
"Ah, mas vai embora quando a menstruação acabar"? Não! Esse é de fato o cheiro de Ayuni, ele só ficou mais vivido e perceptível graças a menstruação. Agora, o Sebastian tá na roça. KKKKKKK
E o fato do banho não ser uma coisa muito comum, e das roupas ficarem impregnadas por certos cheiros, contribuem pra que ele fique cada vez mais doido!
Ah! Ultima coisa! Espero que todos tenham reparado na evolução de Ayuni em relação a sua "aversão aos próprios erros"! Ainda virá muito mais que isso!
Bom, é isso! Essas foram as explicações de hoje! E ai, o que acharam do capitulo? Não esqueça de deixar seu voto "⭐️" e comentário!
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