XIV - Gelo
03/03/1888 - Sexta-feira
- De jeito nenhum.
- Mas, Cielzinho, o inverno está quase chegando ao fim e nós mal nos encontramos direito! Eu se quer pude ir ao Baile Funtom! Tem noção de como fiquei chateada por não estar lá com você?!
- Estou ocupado com o trabalho, e que eu saiba você deveria estar estudando em casa, não é?
- Você está sempre atolado com o trabalho e eu estou sempre estudando! Você fala a mesma coisa sempre que venho aqui e...
- S-senhorita Midford, se acalme.
- Não, Anna! Ciel... - Ela deu mais alguns passo a frente e se colocou frente a frente comigo. - nós somos noivos! Faz semanas que não te vejo, semanas que não saímos juntos, e detalhe, você mal me procura! Eu tinha planos com você para este inverno, e não pude realizar nenhum deles! Você está sempre "ocupado" com o trabalho, parece até que o trabalho está noivando com você! A temporada está chegando ao fim e eu não pude fazer praticamente nada do que planejei!
- Sinto muito Lizzy mas o mundo gira por causa do trabalho, e eu não nado contra a corrente. Se contente com essa fato.
- Sua empresa é mais importante que nós?!
Acho melhor não dizer a resposta sincera.
- Não confunda as coisas, minha empresa é obviamente minha responsabilidade.
- Nosso casamento também é! Se você não for a Epping Forest comigo hoje, assumirei que você não me ama e que não quer se casar comigo! Entendeu?! Vamos Anna!
- S-senhorita Midford!
Lizzy saiu correndo, como a criança birrenta que sempre foi, e bateu a porta do escritório. Anna foi logo atrás.
- Ah, tenha santa paciência.
- Senhor, acredito que a escolha mais sábia seja ir a Epping Forest com a senhorita Elizabeth.
- De forma alguma. Tenho coisas mais úteis com as quais gastar meu tempo.
- O senhor não acha que é útil manter seu noivado estável?
- Acredito firmemente que nosso contrato terá fim antes deste bendito casamento acontecer, por tanto, não. Vou apenas enrolar, enquanto posso.
- Um ponto completamente compreensível, mas...
- "Mas" o quê?
- Como acha que a reputação dos homens Phantomhive's ficaria se a alta sociedade soubesse que a jovem noiva apaixonada foi cruelmente deixada de lado pelo grande Conde Phantomhive, tão respeitado e aclamado por todos? Tenho certeza de que seria um tanto desagradável para todos, não? Um prato cheio para a concorrência e mídia.
Maldição! Apesar detestar a ideia, era um fato. Toda a alta sociedade presa pela boa conduta dos herdeiros que carregam o nome de suas famílias. Se algo assim caísse na boca do povo, eu teria uma bela dor de cabeça, em todos os sentidos possíveis.
Talvez isso prejudicasse até mesmo a empresa. Com nobres se negando a fechar parcerias ou atrelar seus nomes a mim.
- Tsc! Que desperdício de tempo! Sebastian, encontre aquelas duas e as traga aqui.
- Yes, my Lord.
[...]
- Como está se sentido?
- Estou ótima! Minha recuperação foi mais rápida do que imaginei.
- Fico feliz que tenha sido rápido! Mas... - Encostei a vassoura na parede e peguei o pano úmido que deixei dentro do bale. - da próxima vez preste mais atenção nas coisas que come, por favor.
- É, hehehe! Eu sei, juro que vou tentar! Mas é mesmo uma pena, eu queria tanto ter dançado com Sebastian. Ah! V-você viu se ele dançou com outra p-pessoa?! Ele dançou com alguém, Amelia?!
Oh, droga.
- Não, não, sem dúvida, ninguém.
- Sério? T-tem certeza?!
- Sim, absoluta! Digo, ele é sempre tão reservado, não é? Você mesma diz. Eu mesma não o vi dançar com ninguém. Ele ficou ao lado do Jovem Mestre o tempo todo, praticamente.
Aquele maldito me arranjou um belo de um problema! Entrei na casa sem intenção nenhuma de me envolver em encrencas, e agora isso! Ele me paga!
Por sorte, acho que só o próprio Sebastian sabe sobre essa dança.
Mey-Rin finalmente se sentiu bem o suficiente para voltar a trabalhar, foi uma ótima notícia, até porque eu não pretendia continuar dividindo tarefas com Sebastian.
Aproveitei o tempo livre que tive, quando terminei de passar as roupas, para ajudar Mey-Rin a varrer as escadas do salão principal.
- E então, Amelia? Está pronta para a primavera? O inverno está finalmente terminando!
- Com certeza! Passou tão rápido, não é? E parece que fica cada vez mais frio.
- Sem dúvida! Estou ansiosa para ver como os jardins irão ficar!
- É mesmo, não é? Será que Finny vai precisar de ajuda para cuidar das...
- Amelia! Mey-Rin!
- Ah?
- A-ah?!
Ambas nos espantamos com o alto e fino grito que veio do alto das escadas. Estava tudo tão tranquilo e quieto, a voz fez eco no salão.
- S-senhorita Elizabeth, está tudo bem?!
Mey-Rin perguntou preocupada, ajeitando os óculos no rosto, que quase caíram com o susto.
- Você e Amelia, troquem de roupa agora! Nós vamos sair!
- Lizzy! O que pensa que está fazendo?!
Foi só então que percebemos o Conde logo atrás da Srta.Elizabeth, ao lado de Anna, sua serva, e de Sebastian.
Todos estavam vestidos com casacos, gorros e roupas de frio.
- Eu quero que todos venham, Ciel! Todos merecem aproveitar o fim do inverno!
- Mas eles tem trabalho a fazer! Você já...
- Oh! Acho que você se esqueceu do que conversamos! Está decidido, você definitivamente não me a...
- S-shiu! Se acalme! Amelia e Mey-Rin, chamem os rapazes e se preparem. Sairemos agora mesmo.
- A-ah, sim senhor! Venha Amelia, vamos!
- E-espere! O que...
Antes que pudesse questionar, Mey-Rin me puxou pelos braços, correndo pelo salão.
Acho que nunca vi o Conde gaguejar daquela forma, ou ficar nervoso como ficou.
Srta.Elizabeth Ethel Cordelia Midford, a noiva do Conde Phantomhive. Eu pesquisei um pouco sobre ela, assim como fiz com os outros. No fundo, ela não tinha nada de muito especial, apenas uma filha de marqueses um pouco desagradável e malcriada, que era totalmente apaixonada pelo Conde.
Ela sabia ser doce vez ou outra, mas na grande maioria das vezes aparecia na mansão apenas para dar trabalho! Enfeitava os cômodos, deixava sempre uma bagunça ou quebrava alguma coisa, para no fim das contas, ser "mandada embora" pelo próprio esposo.
Não que eu julgue, até porque já bastava Mey-Rin e os meninos quebrando coisas.
Mas hoje parece ser diferente, o Conde parecia diferente. E parece que sobrará para nós, os servos!
[...]
- Patinar, patinar, patinar, patinar!
Finny repetia a palavra "patinar" sem parar, enquanto conduzia a carruagem do lado de fora. Como sempre, ele é o mais animado do passeio.
A neve estava começando a derreter e as folhas das árvores que apareciam, mesmo que tímidas, já pareciam bem coloridas.
Eu mexia e remexia em meus brincos, enquanto ficava pensando no sentido daquele passeio.
Patinar em pleno fim de inverno? O que aquela menina tinha na cabeça? Ou melhor, porque o Conde aceitou?! Se bem que, ele não parecia tão feliz com a ideia quando nos encontramos nas escadas.
Talvez só queira agrada-la, afinal ele não tem muitas escolhas já que vai se casar com ela.
Casar, isso soa tão sério para duas pessoas tão jovens, como eles. Me pergunto como eles, digo, o Conde se sente sobre isso, a Srta.Elizabeth não parece muito preocupada.
Não sei como me sentiria se me forçassem a casar com alguém que mal conheço. Acho que não consigo me imaginar casando, é estranho. Acho que não consigo me imaginar com ninguém, na verdade. Estou confortável da forma que estou, é isso.
- Ei, gente! Estão me ouvindo ai dentro?
Finny nos chamou do lado de fora, graças a deus parou de gritar "patins".
- Sim, Finny! Estamos ouvindo!
- Legal! Nós estamos chegando ao lago de Epping Forest! O senhor Sebastian disse que tem neve demais para continuar a carruagem! Vamos andar!
Ah, era o que faltava.
- Tudo bem, vamos descer! Mey-Rin, acho melhor você acordar o Bard.
- E-eu?! Por que eu?
- Não sei... - Dei de ombros. - acho que ele preferiria que fosse você! Espero vocês lá fora.
Sai da carruagem antes que ela pudesse responder. Logo a frente estavam Sebastian, o Conde, Srta.Elizabeth e sua serva, já do lado de fora de sua carruagem.
- O que houve?
Disse me aproximando deles.
- Muita neve á frente, as carruagens podem atolar se tentarmos passar. Por isso, faremos o resto do caminho a pé.
Srta.Elizabeth não parecia muito contente com o que Sebastian estava dizendo, o Conde parecia não se importar muito.
- Ei! Estamos prontos!
Finny apareceu, acompanhado de Mey-Ri e Bard, que parecia um pouco tonto de sono.
- Ótimo, podemos prosseguir. Felizmente, o lago não está muito longe. Jovem Mestre, gostaria de ser carregado?
- Tsc! N-não diga bobagens! Vamos logo!
É, ele realmente parecia um pouco mais impaciente hoje. Mas mesmo assim, que tipo de pergunta era aquela?!
- Ciel, espere!
- S-senhorita Midford, não corra!
Todos começamos a fazer nosso caminho por Epping Forest. O lugar era repleto de árvores por todos os lados, o caminho era um pouco estreito e a neve não ajudava muito, mas de qualquer forma, o trajeto estava sendo menos difícil que pensei, talvez a neve estivesse menos densa graças ao fim do inverno.
O Conde e Srta.Elizabeth estavam na frente, um pouco distante de nós; Anna e Finny conversavam sobre as compridas árvores do lugar e, surpreendentemente, Bard e Mey-Rin estavam conversando tranquilamente. Isso era, sem dúvidas, um grande avança para os dois.
Escolhi ficar um pouco mais atrás, para poder ter um pouco de silêncio e sossego. Era engraçado poder enxergar todos um pouco mais de longe, pareciam tão tranquilos, alegres. Despreocupados demais para simples servos.
As vezes me parecia que, para eles, o dia-a-dia não era simplesmente trabalho, era como se todos os dias de um servo Phantomhive tivessem algo diferente a proporcionar. Sem dúvida era bem diferente dos lugares que já estive.
E falando em servos, onde...
- A senhorita está ficando para trás.
- AH, a-ah! Q-que susto! Você sente algum prazer em assustar as pessoas?
- Perdão, não foi proposital.
- Bem, eu acreditaria se não acontecesse toda vez!
- Vou tomar nota de sua observação.
- Sei.
E lá se vai meu sossego.
- Então, satisfeita com o passeio?
- Francamente, um pouco repentino.
- Concordo, mas não se frustre, esse evento não estava nos planos de hoje, e muito menos nos do Jovem Mestre.
- Já imaginava.
- Agradar uma dama nos padrões de Senhorita Elizabeth nem sempre é uma tarefa tão simples.
- Não me acostumo com a ideia de que pessoas tão jovens já estejam destinadas a se casar, para mim, soa sempre tão abrupto.
- Bem, é um tanto comum na linhagem Phantomhive, e em muitas outras.
- Acredito que "comum" e "normal" não significam a mesma coisa.
- Uma observação interessante.
- Quanto tempo acha que falta para chegarmos ao lago?
- Talvez trinta minutos.
- Pelo menos poderemos descansar ao chegarmos lá.
- Não pretende patinar?
- Bem, não. Achei que apenas o Conde e Senhorita Elizabeth patinariam.
- Bem, a senhorita Elizabeth trouxe patins para todos, por tanto... - Ele ergueu ambas as sobrancelhas. - acredito que será uma atividade recreativa para todos nós.
- Ela ficaria ofendida caso eu recusasse?
- Quer uma resposta sincera?
- É óbvio.
- Não recuse.
- Oh, deus.
- Qual o problema? Não sabe patinar?
- Sei, mas já faz muito tempo.
- Não precisa se envergonhar, caso caia. Afinal Mey-Rin e Finnian fazem o mesmo todos os dias, e sem se acanharem.
- C-cof, cof! - Acabei tossindo na tentativa de evitar que uma risada me escapasse depois de ouvir o que ele disse. Não queria e nem deveria ter achado engraçado. - Não diga algo assim!
- Ah vamos, não estou mentindo. Estou?
Ele sorria, com o olhar relaxado. Parecia satisfeito em me ver desajeitada, ele sabia que estava me contento. Irritante!
- Deixe isso para lá. Podemos só...
Dei um pulo!
Primeiro surpresa; depois algo frio, bem legado; então o impacto no peito.
U-uma bola de neve?!
Olhei para frente, Baldroy estava com outra bola em mãos, em posição de arremeço. Foi ele?!
- HAHAHA! V-você tinha que ver sua cara, Amelia! Foi tão...
De repente ele caiu um chão, uma bola maior o atingiu com força. Foi jogada por Finny!
- GUERRA DE BOLAS DE NEVE!
- FINNY! NÃO...
Ele atirou mais uma bola, dessa vez em Mey-Rin.
- EI, EI! ME DEIXE LEVANTAR!
Baldroy levantou, e já começou a formar mais uma...
- AI!
Me surpreendi de novo quando fui atingida mais uma vez, dessa vez no braço.
- Vamos Amelia! Vem brincar com a gente!
- Finnian, eu não posso! N-nós não...
- Ah, deixa de besteira! - Bard já formava mais de uma bola, agitado. - Tá com medo, por acaso?!
- Bard, eu não...
- Vem logo Amelia! Eu não quero ficar apanhando desses dois sozinha!
- Vocês três, agora... - Sebastian disse com sua voz firme, a ponto de fazer com que os três praticamente parassem de se mexer. - parem com a brincadeira, devemos nos atentar ao Jovem Mestre e...
De repente uma bola de neve acertou seu ROSTO!
Qualquer um dos três que tenha feito isso, com certeza estava muito encrencado! Só pode ter perdido a...
- O que foi, Sebastian? Tem medo de uma pequena brincadeira?
Jovem Mestre?!
Ele sorria, enquanto formava mais uma bola em mãos.
O que estava acontecendo?!
Sebastian limpou a neve do rosto, e não parecia nem um pouco afetado com a brincadeira.
- Bem, se é assim, então que seja. De que lado gostaria que ficasse, Jovem Mestre?
- Pode ficar bem ai, eu quero te acertar de novo!
- GUERRA DE BOLA DE NEVE!
Bard gritou, dessa vez!
Todos começaram a atirar bolas uns nos outros e rir. Mey-Rin e Anna haviam se escondido, não queriam ser acertadas; senhorita Elizabeth e o Conde se esconderam em um arbusto, enquanto jogavam bolas em todos; Finnian não parava de juntar bolas exageradamente grandes para jogar em todos; Bard estava o tempo todo tentando acertar Sebastian, que desviava perfeitamente de todas.
Droga! O que eu deveria fazer?!
- EI, AMELIA! DESVIE!
Olhei para Finny, que estava prestes a arremessar uma bola GIGANTE! Muito maior que eu! Com a força dele e o tamanho daquilo, eu poderia voar longe!
- FINNIAN, NÃO!
Ele não me ouviu, e jogou a bola do mesmo jeito. Estava morta!
Se quer gritei! Minha primeira reação foi fechar os olhos, já preparada para o impacto que viria em seguida.
C-chão?!
Meu corpo estava sobre algo gelado, fofo, provavelmente a neve. Eu n-não fui atingida?!
Abri meus olhos, lentamente.
- Ah?!
- Seria um acidente e tanto... - Sebastian deixou de olhar para mim, mirando Finny. - Finnian, o que te disse sobre os limites?
- Q-que eles não devem ser ultrapassados! Sinto muito senhor Sebastian, e Amelia! Foi sem querer!
- Ora, ora, quanta irresponsabilidade.
O corpo de Sebastian estava em cima de mim. Nossos corpos não estavam próximos o suficiente para nossos peitos se tocarem, já que as mãos de Sebastian, apoiadas na neve, nos distanciavam.
Ele continuava olhando para o lado, falando com Finny. Enquanto isso, eu me sentia cada vez mais nervosa
Eu não sabia quais as partes do seu corpo estavam muito longe, quais estavam muito perto. Me causava agonia! Eu não sabia para onde olhar ou o que fazer! Eu precisava levantar, não queria ser tocada, suas pernas estavam muito próximas das minhas, suas coxas tocavam as minhas, minha respiração ameaçava falhar e acelerar, eu não queria que ele chegasse mais perto, queria distância! Eu, e-eu...
- Saia!
Me levantei repentinamente e empurrei seu peito, o que só piorou as coisas.
No mesmo momento em que tentei empurra-lo, seu rosto se virou para mim, mais uma vez, os deixando próximos demais. Era como se eu corpo não tivesse sentido o mínimo impacto de meu empurrão, e eu o fiz com força, tenho certeza.
Parece que tudo em volta havia ficado em silêncio.
Todos pararam para nos olhar. Merda!
- Está se sentindo bem, senhorita Amelia?
Ele perguntou com toda a naturalidade possível, como se aquela situação não fosse constrangedora o bastante.
- Eu, eu...
- Imagino que esteja um pouco desorientada... - Ele se levantou, e aos poucos fui reparando na gritante diferença de tamanho entre nós dois, enquanto eu continuava no chão. Ele estendeu sua mão para mim. - vamos, está frio.
Aceitei o gesto, ainda tonta. Segurei sua mão e me levantei.
Não sabia o que dizer, para onde olhar ou o que fazer.
- Acho que devemos continuar nosso trajeto, e sem bolas de neve. Correto, Jovem Mestre?
[...]
Eu odeio toques.
Que segurem minha mão, ou um braço em volta de meu ombro, um abraço curto, dependendo de quem seja eu não me importarei.
Mas aquilo, um contato físico como aquele? Aquilo me causa pânico.
Eu fui idiota. Deveria ter me contido, não deveria ter gritado e muito menos o empurrado, mas eu não consigo. Não consigo suportar que se aproximem dessa forma. Não consigo suportar o vislumbre de memórias que essas aproximações e toques me trazem.
Eu simplesmente odeio.
- Amelia... - Me assustei, brevemente, quando senti Mey-Rin tocar meu ombro. - tem certeza de que está bem?
- A-ah, sim. Olha, sinto muito por "aquilo" com Sebastian, foi realmente um acidente e eu...
- N-não, não! Se acalme! Foi apenas um acidente, ele estava tentando ajudar.
Sua resposta me tirou um suspiro de alivio. Ainda bem que Mey-Rin era assim, tão cega por ele a ponto de justificar qualquer atitude que fosse.
- Agora, amarre logo seus patins e esqueça um pouco o que aconteceu! Vamos nos divertir!
- C-claro!
Dei os últimos nós nos patins e me levantei do tronco, onde estávamos sentadas.
Nunca havia visitado Epping Forest antes, muito menos seu lago.
Era lindo, mesmo que congelado.
Graças ao inverno o lago virou uma grande extensão de gelo, brilhante e cristalino.
Graças ao fim do inverno o sol aparecia vez ou outra para refletir no gelo. As árvores ainda cobertas por neve, o rodeavam por todos os lados.
Todos pareciam super animados quando chegaram, já tirando seus sapatos e calçando os patins dados por Srta.Elizabeth.
Me levantei do tronco, lentamente, tentando me equilibrar.
Mey-Rin me deu sua mão. E assim, andamos juntas até chegarmos no gelo.
- UOU! A-Amelia! Me segure.
- C-calma! Estou te segurando!
- AH! A-acho que vou cair!
- Haha! Não, você não vai! Tente ficar em pé sozinha!
- O QUE?! De forma alguma! Continue segurando minha mão!
- Não pode ficar de mãos dadas comigo para sempre, Mey-Rin!
- Eu p-posso sim! Não me solte.
Olhei em volta e, por acaso, Baldroy estava a alguns centímetros de Mey-Rin, de costas, brincando com Finnian.
Tive uma ideia.
- Confie em si mesma, Mey-Rin!
- O QUE?!
A soltei e dei um leve empurrão em seu peito. Ela se desiquilibrou um pouco, mas foi longe o suficiente para alcançar Baldroy.
- AHHH! BARD, B-BARD ME AJUDE!
- Ah?! MEY-RIN?!
Ela chegava mais perto, toda desengonçada, e com tempo o suficiente para que ele a agarrasse em seus braços. Isso!
- V-você tá bem?!
- A-ah, s-sim! Estou! Amelia, sua louca... - Ainda se apoiando nos braços de Bard, ela se virou para me olhar. - por que fez isso?!
- Precisava testar seus conhecimentos.
- Pois não deveria!
- Bom, veja pelo lado bom, agora você tem alguém para te ajudar! Não é, Bard?!
- Q-que?!
Ele olhou para mim, com os olhos arregalados, provavelmente não entendeu de primeira.
Então pisquei para ele, que pareceu acordar na hora.
- A-ah, sim, sim. Claro! A-ahm, Mey-Rin, se importa se te fizer companhia? Sabe, para que não caia?
Isso, isso!
- Ahm, a-acho que tudo bem. Mas e Amelia? Acho que...
- Estou ótima! Patino perfeitamente bem sozinha. Aproveitem.
"Perfeitamente" é uma palavra forte, mas ainda assim, com certeza melhor que Mey-Rin.
Bard e ela começaram a patinar, ficando distantes.
Ótimo. Agora, preciso tentar sozinha.
Estendi meu pé para trás, dobrando o joelho, empurrando e pegando impulso. Sim, era isso!
Para frente e para trás, um de cada vez e com cuidado. Me senti confiante para seguir, indo um pouco mais rápido.
Srta.Elizabeth dava rodopios com seus patins, enquanto continuava de mãos dadas com o Conde, que não parecia tão "habilidoso" quanto ela, mas ao menos, ele parecia estar tentando.
Vez ou outra Srta.Elizabeth girava o Conde para lá e cá, o que o deixava um pouco nervoso, talvez com medo de cair. Era engraçado vê-lo descontrair, se comportando de acordo com sua real idade, deixando pelo menos um pouco, de se comportar como um velho adulto.
Era interessante, intrigante e até conflitante para mim, vê-lo dessa forma.
Em meu trabalho, qual "Ciel Phantomhive" eu matarei? Esse garoto de doze anos que patina de mãos dadas com uma garotinha; ou o Conde que matou todos aqueles membros, aquelas setenta pessoas, aqueles mais de vinte assassino, que tem empregados fortes como soldados e que parece esconder muito mais do que aparenta.
Que coração minha faça apunhalaria?
Que seja, preciso pensar em outra coisa, pelo menos por enquanto.
Era impressão minha ou Sebastian não estava no gelo?
Comecei a olhar para todos os lados, mas não o via em lugar nenhum.
A não ser na margem?
- Ah?
Ele estava parado, na margem do rio, apenas nos observando.
Resolvi ir até lá.
- O que faz aqui?
- Bom, eu que lhe pergunto, senhorita. Cansou-se de patinar?
- Não. Mas me diga, estou confusa, não foi você quem disse que senhorita Elizabeth se sentiria ofendida, caso não aceitássemos patinar?
- Perdão, mas nunca disse isso. Apenas lhe dei o conselho sincero, dizendo que não deveria recusar.
- Ah? Se não significava exatamente isso, então o que significava?
Perguntei, já de ombros cruzados.
- Significava que seria uma decepção não poder presencia-la patinando no gelo.
Que diabos?!
- Está tentando me irritar?
- Eu? De forma alguma. Apenas acho que seria mais divertidos para todos nós se patinasse.
- Ora, então você admite ter o hábito de ficar observando os outros?
- A senhorita não tem o costume de estudar as coisas que lhe intrigam? De observa-las?
Está começando a me irritar.
- Deixarei você e seus estranhos hábitos em paz. Até mais tarde.
Talvez explorar um pouco a área do lago seria uma ideia melhor.
[...]
- Hahaha! Ciel olhe, olhe! Vê como eu giro?
- Sim Lizzy, estou vendo.
Ela parou de girar e respirou um pouco, recuperando seu fôlego.
- Ciel... - Ela olhou para todos os lados, como se procurasse por algo. - quer fazer uma coisa?
- Ah?
- Vem! Vou te mostrar!
Ela começou a me puxar pelo braço, patinando e me arrastando para algum lugar.
Sempre fui péssimo patinando, sempre perdi o equilíbrio e tive péssimos tombos, e por isso sempre detestei patinar.
E por isso, quando Lizzy começou a patinar e me arrastar, não consegui impedir. Inferno! O que ela queria?!
- Vai ser legal! Você vai gostar, tenho certeza!
- Lizzy, vamos voltar. Não deveríamos estar indo longe.
- Ah, vamos! Você não gosta de um pouco de aventura?
Começamos a nos afastar, o suficiente para que não visse Sebastian ou qualquer um dos outros.
Á aquele ponto, já patinávamos a alguns minutos, sem parar. Não estava gostando disso.
- Pronto, é aqui!
Ela continuou me puxando pelo braço, até chegarmos a um tronco, que foi parcialmente congelado pelo lago.
- Vem! Vamos nos sentar.
- Ahm, eu não sei se isso é seguro.
- Vem logo!
Ela me puxou, mais uma vez, me forçando a sentar ao seu lado.
- Ah, é tão bom. Não é?
- Do que está falando?
- Eu e você, só nós dois. Sem Sebastian ou Anna, ou qualquer servo. Privacidade, entende?
- Não deveríamos estar sozinhos, você sabe disso. Não estamos casados, ainda.
- Não importa... - Ela colocou sua mão sobre a minha. O que ela queria?! - o que importa é que estamos juntos, de qualquer forma. Não concorda?
Não estou gostando do rumo que as coisas estão tomando.
- A-ahm, eu, eu acho que devemos...
- Ciel, eu te trouxe aqui porque, b-bem, tem algo que eu gostaria de te pedir.
Engoli seco.
- O que, Lizzy?
Suas duas mãos tocaram as minhas, entrelaçados nossos dedos, seu corpo começou a se aproximar, chegando cada vez mais perto. Perto demais.
Que diabos?!
- Ciel, me beije?
- Ah?!
Mesmo sendo péssimo em me manter em pé nos patins eu insisti, me levantei e mesmo sem equilíbrio, tentei me afastar.
- Perdeu sua noção?! Você sabe que não devemos fazer isso!
- M-mas, Ciel! Só nos casaremos daqui a anos! Eu preciso saber, e-eu quero saber qual a sensação de te beijar!
- Ah, e você acha que é assim que se mata uma curiosidade?! Por deus, leia um livro!
- Por que?! Por que você e age dessa forma... - Ela se levantou, agressivamente. - por que você age como se me odiasse?! Como se não quisesse estar perto de mim?! Eu fiz tudo isso por esse momento e você nem liga!
- Espera um pouco, quer dizer que você girou todo o dia de hoje em torno disso? Um beijo?! Você tirou a mim e meus empregados de casa, mudou toda a minha rotina e meu trabalho por causa de um beijo?! Ficou completamente louca?!
- Eu fiz isso porque te amo, Ciel! Meu deus... - Ela começou a bater seus pés no gelo, com força e raiva. - você não vê?!
- A única coisa que vejo é que está agindo como uma criança! Como se precisa de tudo que quer, na hora que quer, e faz com que todos se mobilizem para que isso aconteça! Mas Lizzy, para a sua infelicidade, não é assim que o mundo funciona!
- Você está sendo um grosso! Pare com isso... - Ela continuou batendo os pés no gelo. - você mal se importa comigo! Você só se importa com essa empresa... - Ela bateu, mais uma vez. - essa bendita empresa, boba e estúpida!
"Empresa boba e estúpida". Em momentos assim, eu gostaria de falar muito mais, falar absolutamente tudo que penso. Mas seria idiotice, seria uma péssima ideia.
- Isso já é o suficiente, você já teve tudo que queria... - Agarrei seu braço. - agora, vamos embora.
- NÃO... - Ela começou a bater seus pés repetidas vezes, dessa vez frenética. - NÃO, NÃO, NÃO! EU NÃO VOU! NÃO ERA ASSIM QUE AS COISAS DEVERIAM SER! NÃO É ASSIM QUE NÓS DEVERIAMOS SER!
- Lizzy! Para de fazer birra! Vamos em...
Um barulho estrondoso apareceu, algo se rachando, a gravidade me puxando para baixo, e uma sensação fria, tão fria que me causava dor.
O gelo sobre nós, ele havia se rachado.
- MEU DEUS! CIEL! CIEL!
[...]
Já estava longe da margem do rio, explorando os lagos congelados da floresta.
Sinceramente, nunca trabalhei com pessoas tão estranhas. Deixando todo o trabalho para trás para patinar no gelo? Que tipo de patrão e servos são eles?!
A sensação é realmente de que nenhum dia era comum sendo servo Phantomhive, parecia que algo sempre estava prestes a acontecer. Um convidado esquisito, um acontecimento estranho, uma situação vergonhosa ou inusitada, e quase sempre, um mordomo bizarro.
As vezes, me pego pensando sobre as poucas coisas que sei sobre Sebastian. Um viajante que conheceu o mundo e acabou aqui? E como um mordomo? Qual a lógica?!
"Pessoas que viajam o mundo são chamadas de aventureiras, exploradoras. Me pergunto se ele já foi assim, um aventureiro destemido.", foi o que escrevi sobre ele em meu caderno.
Tudo nele era estranho. Sua força, suas habilidades, seu comportamento, seus olhos, até mesmo algo como, não sei bem, sua "aura". Aquela escuridão que parece se formar em volta dele quando está descontente. A vi poucas vezes, mas tinha quase certeza de que aquilo não poderia ser algo comum.
Essa mansão, esses servos, esse Conde e seu mordomo, a algo de diferente, ou melhor, de muito errado com...
- CIEL! CIEL!
Perdi totalmente o foco quando tive a certeza de ter ouvindo gritos finos vindos de algum lugar, gritos desesperados! E, com uma voz familiar.
Eu estava ficando louca?!
- CIEL!
Não! Eu definitivamente não estava! Eram os gritos de senhorita Elizabeth!
Comecei a patinar, dessa vez o mais rápido que podia, praticamente correndo!
- SENHORITA ELIZABETH?! ONDE A SENHORITA ESTÁ?!
- A-AMELIA?! AMELIA, NOS AJUDE!
Norte, os gritos vinham do norte!
Continuei, o mais rápido possível! Conforme patinava, comecei a vê-la de longe! E quanto mais perto ficava, mas estranhas as coisas ficavam.
Algo estava muito errado. Um rombo no gelo, um buraco no meio do lago, com algo se agitando lá dentro!
Onde estava o Conde?!
- AMELIA! POR DEUS, NOS AJUDE!
Ela estava chorando desesperada, e quanto mais perto chegava, mais preocupada ficava!
- O QUE HOUVE?!
- CIEL, AMELIA! CIEL ESTÁ LÁ DENTRO! E-ELE VAI MORRER! ELE NÃO SABE NADAR! ME AJUDE!
- DROGA!
Com certeza, era a pior das hipóteses! QUE INFERNO!
Quando cheguei perto o suficiente, freei com toda a força que tinha. Aparentemente eu não tinha muito tempo! O Conde parecia ter ficado tão desorientado que acabou se pondo de baixo do gelo, sem enxergar aonde o buraco estava, para sair!
- AMELIA! O QUE EU FAÇO?! O-O QUE?!
Comecei a tirar minhas luvas, arrancando meu casaco sem se importar com os botões se arrebentando, e jogando o gorro longe.
- CHAME TODOS, AGORA MESMO! VÁ ATRÁS DELES!
Sem mais palavras, pulei dentro do lago e me lancei ao fundo.
Com os olhos abertos e todo o corpo em choque com o frio, eu olhei para todos os lados do escuro e gelado lago. Aonde ele estava?!
Nadei e nadei, mesmo todos os lados parecendo praticamente iguais!
Era difícil me mover, era como se a agua fria fosse dez vezes mais densa, que exigisse muito mais de meu corpo. Meus pulmões começaram a pedir por ar, todo o meu corpo sentiu a falta do oxigênio, enquanto eu sentia meus músculos praticamente congelarem com o frio!
Eu não sabia por mais quanto tempo aguentaria. Aguentar mais um pouco, era isso que eu precisava!
Finalmente! O encontrei?!
Um pouco distante, pude ver seis corpos, já sem forças, afundando lentamente.
Eu estava ficando completamente sem ar e precisava de forças para ir até ele e levar nós dois de volta à superfície.
Quanto mais demoraria para decidir, mais o ar se esvaía e mais ele se afundaria.
Que droga!
Usei minhas últimas forças para nadar o mais rápido que pude até o corpo do Conde!
Nadei mais, mais, mais! Eu não aguentaria mais que isso!
Nadei o suficiente para alcançar seu braço. O agarrei, seu corpo parecia muito mais pesado do que deveria! Tentei o puxar com o máximo de força que podia, o trazendo para perto de mim! Consegui!
Eu não tinha muito tempo, precisava chegar à superfície. Precisava nadar por nós dois!
Meu corpo estava começando a me trair.
Minhas pernas começaram enfraquecer, senti meu coração bater forte no peito, bater a ponto de doer; meus pulmões imploravam por ar. A agua parecia mais densa, minhas pernas cada vez mais pesadas e aos poucos, pareciam parar de me obedecer.
VAMOS AYUNI! NADE!
Ignorei o enfraquecimento, persistindo e nadando para cima. Eu precisava aguentar!
Cada vez mais perto, cada vez mais fraca, a luz estava cada vez mais próxima, meus braços já não queriam mais se mover, eu conseguia ver a superfície, meus olhos estavam pesando, meu corpo estava desistindo, eu estava tão perto!
E-eu, eu precisava, eu tinha que...
- AH! AH, A-ah!
Eu consegui.
Me apoiei nas beiradas do gelo quebradiço, com o corpo do Conde nos braços.
Nos arrastei para longe dali, e o deitei no chão. Meu corpo continuava respirando desesperado, recebendo mais ar do que realmente poderia suportar, mas eu não tinha tempo para isso, eu precisava acorda-lo.
Ele estava branco como um fantasma e não parecia respirar!
- Merda, merda, merda! O que eu faço?!
Precisava dar um jeito de tirar a água de seu corpo! Precisava pensar rápido!
Coloquei minhas duas mãos em seu peito e estiquei os braços, comecei a comprimir seu peito com meu peso! Precisava funcionar! Tinha que dar certo!
Uma, duas, três, por deus, dez e nada! Ele continuava sem respirar!
- INFERNO!
Eu não teria outra opção.
Tampei seu nariz, enchi meus pulmões de ar, abri sua boca e soprei, tentando fazer no tempo certo, parando e voltando. Precisava funcionar! Tinha que funcionar! Se não...
- COF, COF, COF! A-ARG!
Graças a deus!
- Jovem Mestre! Meu deus... - Me levantei e corri até as roupas que larguei no chão. Meu casaco, luvas e gorro. - venha, vista isso!
Coloquei o casaco em volta de seu corpo, ele continuava tossindo. Coloquei minhas luvas em suas mãos e meu gorro em sua cabeça.
- Pronto! Venha! Se esquente!
- COF,COF! D-droga, cof!
- Tudo bem! Eles já estão vindo!
Envolvi seu corpo em meus braços, impedindo que o casaco se abrisse e seu corpo ficasse exposto ao frio.
- Senhor, tire o seu tapa-olho! Não fará...
- N-NÃO! COF! E-eu não, eu n-não vou.
Seus olhos ameaçavam se fechar aos poucos.
- Não durma Mestre, aguente mais um pouco! Tudo ficará bem!
Seu corpo não parava de tremer.
- CIEL! CIEL! OH MEU DEUS!
Os berros me fizeram olhar para cima. Todos vinham correndo em nossa direção. Pareciam desesperados.
Sebastian ultrapassou todos, correndo extremamente rápido! Ele se quer estava usando patins para correr daquele jeito. Era rápido como um animal.
- Jovem Mestre... - Sebastian se aproximou rápido, envolvendo o Conde em seus braços e se levantando. - o senhor está congelando.
- AMELIA! V-VOCÊ ESTÁ BEM?!
- E-estou, Mey-Rin!
- OLHE SÓ PRA VOCÊ! ESTÁ BRANCA, E S-SUAS MÃOS! MEU DEUS!
Olhei para minhas mãos. Estavam secas, congeladas, as pontas de meus dedos sangravam.
Foi só ai que percebi a ardência que todo o frio estava causando no meu corpo.
Era realmente doloroso.
[...]
- Pronto, sopa quente. Vai te fazer bem.
- Obrigada, Bard.
- Olha, me impressionei, viu? Não sei como você não pegou uma hipotermia.
- Me pergunto o mesmo. Será que tem algo a ver com adrenalina?
- Olha, não tenho ideia. Só sei que você e o Mestre deram um baita susto na gente!
- Essa ideia de patinar no gelo em pleno fim de inverno, eu deveria ter dito alguma coisa...
- Não pensa assim! O importante é que você e o Jovem Mestre estão bem. Você foi muito corajosa. Sabe disso, né?
- Bom, a quem serviríamos se o Jovem Mestre não estivesse mais aqui, não é?
- Hehe, é verdade. Mas de qualquer forma, você foi incrível.
- Obrigada, Bard. Vocês também foram incríveis cuidando de mim, uma segunda vez, haha. Estou devendo em dobro agora.
- Que nada, aqui todos somos família. Se um cair, todo mundo ajuda a levantar! Bem, agora eu vou terminar de arrumar a cozinha, essa adrenalina toda me deixou bem cansado... - Ele se levantou da cadeira, retirando a bandeja de cima da cama. - boa noite, Amelia.
- Boa noite, Bard.
Ele saiu do quarto, me deixando só.
"Família". Que ridículo.
Obvio, eu poderia ter poupado meu tempo. Poderia ter evitado correr o risco. Eu poderia não ter pulado e o deixado se afogar.
Mas, assim, tudo seria em vão.
É muito cedo, eu não sei de praticamente nada, ainda. Tenho muitas poucas informações e nenhum podre, até agora. Se eu o deixasse morrer, eu voltaria aos Moretti's de mãos vazias. E, sendo uma morte acidental, não teria sido por minhas mãos, e os Moretti's não levariam o crédito.
Eu perderia dez vezes mais se tivesse o deixado se afpgar.
Toc, toc!
Será que Bard esqueceu algo?
- Entre!
A maçaneta girou lentamente, e conforme foi se abrindo, eu saiba que não se tratar de Bard.
- Não deveria estar cuidando do Jovem Mestre?
- Certamente, mas ele ordenou que lhe devolvesse isto... - Ele estava com algumas roupas dobradas em suas mãos. Caminhou até minha cômoda e as colocou ali. - acredito que estas roupas lhe pertençam.
Meu casaco, minhas luvas e meu gorro.
- Obrigada... - Toquei as roupas, estavam secas e quentes. - com as secou? Está frio e escuro lá fora.
- Uma pequena técnica secreta.
- Secreta, é? Entendi... - Desdobrei meu casaco afim de vesti-lo, mesmo que seus botões estivessem estragados. - ah?
Os botões estavam costurados.
- Oh, já ia me esquecendo. Tomei a liberdade de fazer alguns pequenos ajustes. Servos da mansão não podem vestir trapos. Espero que não lhe incomode.
- Obrigada... - O coloquei em volta de meu corpo, fechando botão por botão. - como ele está, o Jovem Mestre?
- Estável, felizmente. Consegui ajustar sua temperatura corporal. Ele está repousando, no momento.
- Fico feliz em saber que ele esteja bem.
Um silêncio ensurdecedor se fez presente, como se algo faltasse naquela conversa, ou simplesmente, não havia mais o que ser dito.
- Bom, descanse e recupere-se. Foi um longo e conturbado dia.
- Sim, com certeza.
Sebastian reverenciou e foi até a porta, a empurrando lentamente mais uma vez. E assim eu...
- Senhorita Amelia...
Sua voz cortou o ambiente como uma faca, o silêncio que, aparentemente, os dois pretendiam manter, se quebrou.
- Hm?
Ele parou, ao lado do rodapé da porta, e então me olhou soslaio.
- Parabéns pelo trabalho de hoje. A senhorita é de fato, uma serva exemplar.
"Exemplar", esta foi a palavra que saiu de sua boca. Da boca de Sebastian Michaelis.
Era um reconhecimento genuíno? Era um tanto estranho, para ele.
Ele realmente disse isso a mim?
[...]
- Aqui está, chá de gengibre. - Sebastian ajoelhou, deixando a bandeja em meu alcance. - Estimulará sua circulação sanguínea, senhor.
Ainda um pouco trêmulo, peguei a xícara e logo a levei para a minha boca, sem assoprar.
Picante, um pouco de gosto de limão, amadeirado, quente. Tudo que meu maldito corpo, quase congelado, queria.
Maldita Lizzy e seus planos imbecis!
- E então, Bocchan? Qual será a decisão final?
- Cof, cof! O f-fato é inegável, cof!
- Tem certeza de que não deseja tratar deste assunto depois?
- Besteira, - Tomei mais um gole, e apertei os cobertores com mais força em meu corpo. - estou perfeitamente bem, a-atchin!
- Não sei se "perfeitamente bem" seria a definição ideal.
- Tsc! Em f-fim, o fato é inegável, foi uma atitude bem arriscada se j-jogar naquele buraco. Atchin! O frio, a profundida, tudo c-colaborava para que ela não se arriscasse, m-mas fez da mesma forma. Agora me pergunto o motivo pelo qual ela faria isso. Cof, cof! Não faz t-tanto sentindo, quanto faria se fossem qualquer um dos outros.
- Avaliando meticulosamente, Mestre; Mey-Rin foi tirada das ruas, salva da gangue Qing Bang e acolhida; Finnian foi salvo dos laboratórios; e Baldroy se salvou de sucumbir a fome e ao canibalismo. Todos possuem um fator "x" que ela não possui.
- Todos foram salvos da morre e são completamente devotos, d-dariam suas vidas por mim sem pensar duas vezes, enquanto ela...
- Arriscou sua vida sem ganhar nada em troca. É estranhamente incomum presenciar um ser humano se por em risco, sem moeda de troca alguma. O que o senhor pretende fazer sobre isso?
- Não temos muitas opções. Ainda que seja estranho, e-ela fez o que esperamos do padrão de servos Phantomhives, arriscou a própria vida. Já sabemos a que tipo de situação isso nos leva. Cof! Malditos espirros!
- Então, o senhor quer dizer que...
- Quero que ela seja treinada. Se ela fará parte desta casa, terá que realmente fazer parte por completo, assim como todos os outros. Quero uma serva Phantomhive completa. Se formos atacados, o que pode acontecer a qualquer momento, não podemos nos dar um luxo de ter um servo despreparado em combate. Ela precisa aprender. Atchin!
- E o senhor acha que ela seria capaz de suportar?
- Não importa, se não for capaz terá de vir a ser. Agora será o momento ideal, ser leal aos Phantomhive's significa ser capaz de usar uma arma de fogo, sabendo para quem e para onde deve ser apontada, e precisamos saber se ela é capaz de fazer isso.
- Então, está decidido?
- Sim. Chame Mey-Rin, agora.
- Como quiser, Bocchan.
Sebastian se levantou, voltando a discrepância de altura entre nós dois. Ele caminhava lento, despreocupado.
Até que me lembrei do principal motivo pelo qual o chamei.
Como pude ser idiota a ponto de esquecer?
- Sebastian.
Ele parou no mesmo segundo.
- Sim, Bocchan?
- Volte aqui.
Ele se virou e caminhou para perto da cama e próximo a mim, novamente. Deixando a bandeja na cômoda de cabeceira, pondo seus braços atrás das costas.
- Chegue mais perto. - Percebi a quase imperceptível curiosidade em seu olhar, mas ele fez sem questionar. Seu corpo se inclinou para um pouco mais perto do meu. - Mais perto.
Ele se inclinou um pouco mais, com seu rosto a alguns centímetros do meu.
Slap!
O forte estalo ecoou no quarto, os fios de cabelo do demônio se bagunçaram quando sua cara se virou para o lado.
Eu bati em sua maldita cara!
- Você sabia.
- Perdão, Mestre?
Ele disse com toda a naturalidade possível, e com sua bochecha ainda vermelha.
- Você sabia que eu estava em perigo, mas deixou que as coisas acontecessem. Não foi?
Ele se manteve quieto, em silêncio.
A situação era óbvia.
Sebastian sempre soube quando eu estava em apuros ou não. Independente da distância, de me enxergar ou não, de me ouvir ou não. Nunca importava, ele sempre sabia.
Assim como em todas as outras, ele sabia que estava correndo perigo, mas desta vez, não veio atrás de mim no mesmo segundo. Por isso, a única explicação que vejo seria...
- Foi proposital. Você quis testá-la, queria saber se ela seria realmente capaz. Você conhece nossos cheiros, meu cheiro. Você sabia aonde eu estava, o que estava acontecendo e quem estava comigo. Foi por isso que você não fez nada, não é?
Clap, clap.
Sebastian bateu palmas lentas. Desgraçado!
- Esplêndido como sempre, Mestre.
- Seu demônio maldito. Cof, cof!
- Veja bem, - Seu rosto passou a se virar lentamente, e no mesmo lento ritmo seus olhos encontravam os meus, brilhando em vermelho no quarto quase escuro, e com seu sorriso nojento, perverso, de alguém que com certeza se divertiu com aquela idiotice. - agora temos as respostas que tanto procurávamos, não? Ela é realmente o tipo de serva que os Phantomhive's exigem. Arriscando-se e colocando a própria vida, de forma inconsequente, em risco pelo senhor.
Slap!
Bati mais uma vez, com mais força.
- Seu maldito desmiolado. Você usou minha vida para testar uma mísera serva! Por acaso anda passando por algum processo de retardo? Esqueceu de nosso contrato?
- De forma alguma, jamais colocaria a vida de meu Mestre em risco. Garanto ao senhor, eu sabia exatamente o que estava fazendo, não poderia afirmar com mais segurança.
Primeira regra de nosso contrato, sem mentiras.
Ele não poderia quebrá-las, sabia que não ganharia nada com isso, sabia que não ganharia nada com minha morte, seja ela acidental ou pelas mãos de terceiros.
- Sabe que não pode mentir, não sabe?
- É a primeira regra de nosso contrato, Bocchan.
Minha morte só seria benéfica se fossem por suas mãos, tanto eu quanto ele sempre soubemos disso.
Ele estava mesmo falando a verdade.
- Sebastian...
- Sim, Bocchan?
- Suma da minha frente e resolva logo as questões deste treinamento. E, óbvio... - Agarrei a gravata de seu fraque com força, o puxando agressivo. - nunca mais faça esses tipos de joguinhos comigo, seu maldigo. É uma ordem.
- Yes, my Lord.
[...]
"Hoje, definitivamente foi um dia e tanto. Honestamente, eu não imaginava que o trabalho por aqui seria tão agitado quanto tem sido. Parece que cada dia é imprevisível e que não posso saber quando vou passar o dia varrendo o chão e limpando janelas, ou quando vou simplesmente me jogar na fenda de um lago congelado para salvar um fedelho que mal conheço, e muito menos me importo.
Mas, ainda assim, eu tinha que ter feito o que fiz. Ele é uma mercadoria, um trabalho a longo prazo. Até que eu, realmente, consiga o que quero e complete minha missão até o fim, ele precisa permanecer intacto.
Ele só poderá morrer, quando eu achar que deve morrer.
Bom, é isso. Hoje completam trinta e seis dias que estou na mansão Phantomhive."
*
Oi gente! Capítulo agitado, né? Eu espero muito que vocês tenham gostado!
Não tenho muito o que dizer hoje, apenas que estou satisfeita com o que escrevi e que estou ansiosa pra ler as suas opiniões! É isso, beijinhos!
- QUADRO DE CURIOSIADES -
Bem vindos ao "Quadro de Curiosidades", onde eu compartilho curiosidades sobre os personagens centrais da fanfic e, também, respondo algumas perguntas sobre os personagens!
Se você quer aparecer por aqui, tem alguma pergunta e deseja que ela seja respondida por mim, aqui nas notas finais, basta colocar o emoji "📖" e em seguida, sua pergunta!
E, desta vez, eu resolvi responder uma pergunta de um querido leitor @baciaPontoCom !Onde o mesmo pergunta "Qual animal representa a Ayuni"? E, hoje, eu estou aqui para responder essa pergunta!
Uma Raposa! As raposas são animais astutos e inteligentes, conhecidas por sua perspicácia e habilidade de se adaptar a diversos tipos de situação. São animais curiosos e atentos. Podem representar a praticidade e a capacidade de encontrar soluções! Casando bastante com a personalidade de Ayuni El-Din!
E ai, gostaram?! Querem saber quais animais representam nossos outros queridos personagens?! Basta colocar o emoji "📖" e sua pergunta!
*
Por hoje é só!
Não esqueça de deixar seu voto "⭐️" e comentário!
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