Capítulo 1. Dezembro

        Não deveria ter vindo, o pensamento não saia da cabeça de Alice, que tentava a todo custo aquecer as mãos geladas. Estava demasiado frio para a roupa que trazia vestida. Afinal um vestido preto curto, com um simples casaco de algodão, não era roupa de inverno. Se não fosse a sua colega de quarto Rita, ter insistido que deveria vestir algo para impressionar, não estaria agora a congelar pelas ruas Lisboetas. 

        Segundo Rita, o David era um partido que Alice deveria agarrar. Ela é que não estava muito certa disso, sentia que faltava algo. Esta noite ficaram de se encontrar, para Alice conhecer o seu amigo de infância e passar algum tempo juntos. Por isso em vez de estar com o pijama de flanela vestido a ler um bom livro ou a ver algum dorama na Netflix, andava pela noite gelada.

        As ruas estavam movimentadas, Alice gostava de passear pelas ruas centenárias de Lisboa, principalmente pelo Bairro Alto, que lhe fazia lembrar os anos 80 e 90. Principalmente pela aura boémia.

        "Portas Largas" era o ponto de encontro, a discoteca predileta dos estudantes, uma antiga taberna espaçosa transformada em discoteca, com um ambiente descontraído, música variada e cerveja barata.

        Assim que entrou na discoteca, sentiu o calor a aquecer-lhe o corpo, a música estava alta, e a pista de dança já tinha alguns ocupantes. O lugar emitia uma energia refrescante. Ela olhou em volta tentando encontrar David no meio da confusão, mas a sua atenção foi desviada, quando sentiu uma mão a puxa-la em direção à pista de dança, era a sua colega de quarto, Rita.

        — Vamos dançar Alice, isto está uma loucura. — Disse Rita com os braços no ar, o que fez Alice rir.

        Alice, pensou que precisava de uma bebida antes de ir para a pista de dança, indicou à amiga que já vinha e dirigiu-se para o bar.

        Como suspeitava o bar estava cheio, era quase impossível chegar ao balcãoapós várias cotoveladas e pedidos de desculpa, finalmente conseguiu alcança-lo, mas para seu desespero a bartender estava mais interessada em conversar com todos os homens, do que em atender a clientela.

         Alice levantou a mão numa tentativa de chama-la, mas foi completamente ignorada, pois nem sequer conseguiu que a mulher olhasse para ela. Alice tinha o pressentimento, que seria mais rápido ser ela a ir buscar a bebida que tanto queria. A ideia pareceu-lhe cada vez mais atrativa, de certeza que conseguia passar despercebida, no meio da confusão de braços a chamar a bartender.

          Uma voz masculina profunda chamou a bartender, tirando Alice do seu devaneio, a mulher olhou na direção da voz masculina e fez um sorriso presunçoso. Num abrir e fechar de olhos a bartender estava mesmo à frente de Alice, por um momento ela pensou que lhe iria perguntar o que queria beber, uma vez que olhou para ela. Finalmente!

        Mas no mesmo instante a maldita mulher, levantou o olhar e voltou a fazer aquele sorriso presunçoso.

         — Oi gato o que vai ser? — Disse com uma voz melosa. Claro que a bartender não estava a perguntar a ela o que queria, mas sim ao desconhecido que estava nas costas de Alice e ainda piscava-lhe olho. 

        — Uma cerveja e uma Vodka Cranberry para a menina.

         Maldição. Alice apertou os lábios. Claramente a bartender  tinha algo contra as mulheres. Sem conseguir conter a sua língua afiada, Alice deu por si a dizer, mais para si do que para o desconhecido.

         — Não sabia que um dos requisitos para ser atendida neste bar era ter pila. — Ele riu-se. Uma gargalhada profunda que pareceu erguer-se diretamente do peito e encher de calor o espaço entre eles, deixando Alice surpreendida. — Ter pila ou ter um sorriso sexy. — Ele continuou a rir. Alice revirou os olhos e resmungou entre dentes. — Nada modesto. — Ela olhou para o desconhecido pela primeira vez e a sua garganta ficou seca tornando-se incapaz de formar palavras coerentes.

         Ele tinha uns olhos verdes brilhantes e um sorriso de derreter qualquer mulher. Meu Deus isto não é justo, o homem tinha um rosto belo e Alice não conseguia desviar o olhar dos seus olhos verdes brilhantes. Olhava fixamente para ele, sentiu-se corar o que a fez sentir como uma idiota. Iupi.

         Virou-se completamente para ele e limpou a garganta tentando formar algum tipo de resposta.

         — Hum ... Pois... Eu.. estava primeiro.

         —Por isso mesmo pedi uma bebida para ti. — Ele pisca-lhe o olho e faz um sorriso enviesado.

         Alice sorriu incrédula com a audácia do desconhecido. — Como assim...

         A bartender entregou as bebidas e piscou novamente para o homem, entregando-lhe ao mesmo tempo um guardanapo dobrado.

        — Não acredito, ela deu-te o número de telemóvel! — Alice olhou cética para o guardanapo. — Acredita, acontece muitas vezes. — Ele entregou-lhe a Vodka Cranberry. 

          — Obrigada, mas eu poderia querer uma cerveja. — Ele riu-se e o calor da sua gargalhada voltou a encurtar o espaço entre eles. Meu Deus, até o seu riso era sensual. Aquilo não era mesmo justo. Alice deu por si, a pensar que gostava de ouvi-lo rir, era contagiante e lindo.

         — Desculpa. Mas não pareces gostar de cerveja. Prova vais gostar do Cranberry, é doce.

         Alice provou a bebida e ele tinha razão era doce e saborosa, o sabor a álcool era subtil. Ela lambeu os lábios e olhou para o estranho que olhava na direção da sua boca, Alice sentiu um estranho aperto na barriga.

         — Tens o hábito de escolher as bebidas pelas outras pessoas?

        — Nem por isso ... foi apenas um gesto de cortesia.

        — Seria um gesto de cortesia, se me tivesses dado a tua vez, quando foste atendido...

        Ele esboçou um pequeno sorriso.

        — Sabes... vi uma miúda gira na fila que precisava de ajuda e ... pareceu-me uma boa ideia...

        Ela riu-se, com a atrapalhação dele.

        — Estás a dizes que ganhei uma bebida porque sou gira... Então se eu não fosse, não ganhava nada...

        Ele revirou os olhos.

        — Esquece. Vamos apenas aproveitar o momento. — Antes de dar um gole na cerveja que tinha na mão, bateu no copo dela fazendo um brinde, mantendo os olhos fixos nela.

         Ela encolheu os ombros e murmurou - por agora... — e deu um gole na sua bebida.

         Ele dirigiu-lhe um sorriso enviesado, e havia um toque de malandrice na sua expressão o que fez Alice corar. A maneira como ele a olhava inquietava o seu interior.

         Alice pensou numa forma de poder sair dali, o estranho deixava-a inquieta e possivelmente estava a gozar com ela, mas ao mesmo tempo, queria falar mais com ele. 

         — O que vais fazer com o número de telefone que a bartender te deu?

         — Nada... mas... podes dar-me o teu. — Ele pisca-lhe o olho e esboça um sorriso.

         — Oh, meu Deus, tu não tens mesmo filtro.

         Ele sorriu, com algo diferente brilhando-lhe nos olhos.

          — Hum... Talvez no fim da noite possas dar-me o teu número, depois de te convencer que sou apenas um bom rapaz a tentar ser engraçado para uma rapariga bonita. 

        Lá está ele com a aquela conversa... Ela sentiu-se corar, desde dos pês à ponta dos cabelos. Olhou-o nos olhos, reparou como ele era alto as curvas do rosto eram bem definitas. Tentou mais uma vez pensar em algo para dizer, mas apenas deu um resposta automática.

         — Bem podes esquecer, não dou o meu número a estranhos com sorrisos sexys. — Ela contraiu os lábio, para não rir.

         Ele encolheu os ombros e piscou-lhe o olho.

            Os dois entreolharam-se, ela não sabia dizer por quanto tempo estavam assim, talvez segundos ou horas.

         Alice deu por si a pensar que o silêncio não era incomodo, ele era bastante agradável de se olhar. Mas resolveu quebrar o silêncio.

        — És de Lisboa? Nunca te tinha visto por aqui. — Alice riu-se consigo própria, até parece que ela costumava sair à noite, pelo menos dava uma imagem de ter vida social.

        — Na verdade é a primeira vez que venho a este bar, vim ter com um amigo. Estou no primeiro ano do doutoramento em Harvard. 

        Alice ficou surpreendida, de alguma forma esperava que ele também estuda-se em Lisboa e não no outro lado do mundo. O desconhecido tinha começado a contar como era a sua vida escolar em Harvard, mas Alice só conseguia olhar para a boca dele, para as covinhas que fazia quando ria. Para a linha direita do maxilar. Realmente era um desconhecido bastante jeitoso. Deu por si a divagar por entre as palavras dele, apenas conseguiu reter que a mãe era portuguesa e que ele estava com o pai nos EUA e que só vinha a Portugal durante as férias.

        Alice reparou que já tinha bebido toda a sua bebida. Ele, também percebeu, parou de falar e agarrou-lhe no copo.— Vou busca-te outra.

       — Será que eu também conseguiria um número de telefone, se fosse ao bar onde está o barman a servir. — Alice mordeu a língua, de tudo o que poderia dizer, disse a coisa mais disparatada que podia ter dito. Maldição.

        Ele franziu o sobrolho, surpreendido. — Hum... não sei... 

        Ela riu-se. — Achas que não sou capaz, de fazer sorrisos idiotas, para atrair o sexo oposto.

        — Não sei é se gosto da ideia. — Disse entre dentes

        Alice ficou sem saber o que dizer. Foi surpreendida pela sua sinceridade. Talvez isto pudesse ser divertido. Afinal seria desafiante provoca-lo.

        — Hum... já sei... Vamos fazer uma aposta!

         Ele ergueu a sobrancelha, mas quase ao mesmo tempo fez um sorriso enviesado.

          — Já gosto mais dessa ideia... O que tens em mente?

         Alice juntou as sobrancelhas e ele riu-se com a sua expressão.

        — Hum... Se eu conseguir que o barman me dê o numero de telefone ... hum... vou considerar dar-te o meu numero de telefone. — Disse com um brilho nos olhos.

         Ele levantou a sobrancelha e fez um sorriso malandro. — Se eu ganhar vamos sair deste sitio e vamos comer qualquer coisa.

        — Está bem... — Alice engoliu em seco. Não sabia bem, se aquilo era uma boa ideia. Mas agora não havia volta a dar. Tinha sido ela que se tinha metido naquela alhada. Alice olhou-o receosa sentindo um frio na barriga.

         Os olhos verdes dele fixaram-se nos dela.

         — Pronta?

         Alice voltou a engolir em seco. Fez um gesto de concordância, sem pensar muito no assunto. Porque tinha uma aposta para ganhar.

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