Travessia de Caronte

* capítulos do Toji são em terceira pessoa*



Vozes soavam à distância, sirenes por todos os lados irritavam seus ouvidos. A dor da batida tomava suas costas. Toji estava completamente desnorteado, a visão fora de foco e sem controle motor das próprias pernas e braços. Foi necessário piscar algumas vezes até ver a destruição em sua frente, já não era mais um parque e sim uma cratera.

Nada havia além de destruição e os cadáveres já antes caídos, o homem empurrou os galhos e folhas caídos sobre si e se apoiou para levantar, tinha inúmeros pensamentos passando por sua cabeça. Mas não poderia dar voz a eles enquanto estava ali.

Se apoiando no que restou dos troncos, caminhou para a saída, seria um problema se autoridades comuns o vissem ali. Tinha muito sangue derramado no chão e nenhuma testemunha — com certeza o levariam se tivesse a chance —, quando estava prestar a sair da linha de escombros passou por um cadáver que reconheceu. O pai e o menino que tão alegremente se aproximaram pouco tempo atrás — enquanto Toji covardemente se escondia de seus verdadeiros sentimentos —, estavam jogados aos seus pés como lixo.

Não era adepto a sentimentalismo, mas algo em seu peito se revirou, ele se baixou devagar para fechar os olhos do pai que segurava o filho nos braços numa tentativa de o proteger; um pano branco caído ao seu lado revelava seu nome bordado junto de barcos e estrelas do mar. O bebê, Megumi Sanzui, morreu sem nem aprender o que era realmente a vida.

Nesse ponto nem mesmo ele sabia dizer se 'vida' significava algo — ou se sequer um dia soube —, a amaldiçoou por tanto tempo que quando foi presenteado com uma chance de entender a beleza que os poetas cantavam, deixou-a escapar por pura ignorância.

Quando Toji voltou para o quarto do hotel, a única coisa que indicava que [Nome] passara por ali era a aliança abandonada sobre a cama. Sentiu ódio de si mesmo e se encontrou chutando a primeira coisa em sua frente, a cadeira não aguentou a força de sua fúria — talvez nem mesmo as paredes pudessem o conter em tal estado —, se tornara tudo aquilo de ruim que as pessoas ao seu redor diziam.

Um inútil, bom para nada, um lixo que não merecia nada além da morte. Nunca concordou tanto, quanto naquele momento.

Poderia mentir para si mesmo e justificar que se tivesse mais alguns minutos... Mas teve tempo o suficiente para contar, sua maldição foi não conseguir identificar aquilo que batia em seu peito antes de tudo desabar. Agora tinha plena ciência.

Aquela dor excruciante apenas apareceu em outros dois momentos em sua vida, primeiro quando morreu sua mãe, segundo quando soube da morte de sua irmã. Agora ele mesmo carregava nas mãos o peso de ter matado — metaforicamente —, sua esposa. Nunca se esqueceria o momento em que o brilho em seus olhos desapareceu, não era diferente daqueles que tiveram suas vidas ceifadas pelo assassino de feiticeiros.

Seu casamento veio primeiro, se viu obrigado a morar com uma mulher que não conhecia para deixar de ser um pouco inútil perante aquilo que sua família pensava. Seu primeiro pensamento fora relacionado a sua beleza, [Nome] era elegante, andava com postura e seu rosto parecia feito de mármore. A esposa que escolheram para si era como uma estátua, esculpida por um talentoso artesão, do tipo delicado, mas dura. Nascida apenas para ser observada de longe; ou assim diziam.

O que viu era realmente uma estátua, do lado de fora. Dentro, pelas janelas que eram seus olhos, enxergou as chamas e as feras que se revolviam em desespero. As rachaduras que se faziam doer e até mesmo os grilhões que a prendiam a uma vida de miséria. Tudo teria passado desapercebido se já não tivesse visto as mesmas coisas quando se encarava no espelho.

Primeiro sua beleza, depois sua língua. Não foram muitas que tiveram culhões para o responder de tal forma, era afiada, destilava veneno em forma de palavras. Sibilava, o encantando de maneira perigosa dentre frases cortantes. O segundo passo em direção a sua ruína fora quando surgiu o interesse.

Toji não negou pensar que a primeira noite teve sorte, talvez com um pouco de insistência a mulher se soltasse e acabasse embaixo de si como todas as outras. Acabou de certa forma, mas não na cama, deferindo socos e levantando do chão de terra batida, poeira. Astuta, [Nome] se revelou ser uma fiel funcionária do submundo jujutsu, aquilo que mostrara no casamento foi apenas uma máscara.

Desejo surgiu depois, sua força o atraia. Seu corpo e seus músculos, atração carnal que o forçou a se tocar imaginando ser ela. Sua esposa o excitava por ser completamente diferente de qualquer mulher que já tivesse encontrado na vida, havia sempre um ar de desafio a sua volta que tornava as provocações ainda mais prazerosas.

Foi na manhã seguinte que recebeu sua missão.

Mundi tinha seus meios para o comunicar, um agente entrou em contato e lhe entregou a missão. Aquela que dormia em sua cama era alvo de importância para um de seus contatos; a ordem era simples. Garantir que nada acontecesse até que o momento de a entregar chegasse.

Seu pagamento era imenso, aumentava a cada proposta de assassinato que aparecia por ela no mercado. Quando sua própria família atentou contra a vida da mulher os valores foram ao céu. Seu eu antigo deveria estar mais que satisfeito, contudo, passar os dias ao lado dela fez algo que não entendia.

[Nome] conseguiu chegar a partes de seu passado que jurou nunca mais lembrar, mostrava compaixão ainda que ele apenas tentasse a afastar. Brilhava seus olhos sempre que se aproximava e lentamente respondia os desejos do corpo do homem com os seus mesmos. Não acreditava em alma gêmeas ou qualquer baboseira que jovens tolos falavam esses dias, mas a mulher parecia, sim, ser moldada especialmente para ser sua.

Suas vontades ainda eram majoritariamente carnais, mas havia essa pequena coisa florescendo no fundo de sua mente que colocava dúvidas em suas ações. Esse fora o maior perigo que sentiu em anos de vida e mais uma vez forçou-se a o esconder; calá-lo, trancar tal sensação entre as fendas de sua cela. Não havia felicidade disponível para alguém como ele e ainda assim se viu cobiçando a mesmo de tempos em tempos.

Nesses dias Toji parava para observar sua casa, uma esposa que não escolheu levou para paredes vazias algo que nunca achou precisar. E perdera por egoísmo e idiotice.

As semanas que passou acompanhando [Nome] foram uma tortura, aquilo calado começava a gritar. Dúvidas surgiam e o homem insistia em os ignorar, fugir deles como o covarde que era, muitas das vezes nada tinha a resolver. Contudo, a cada momento próximo dela mais difícil ser tornava afastar.

A verdade que não queria admitir foi aquela que tirou de seu alcance o melhor que já acontecera em seus miseráveis anos de existência. Todos aqueles que mantinham uma relação com ele de alguma maneira pareciam desaparecer. Foi assim com a parte que importava de sua família, Hatsu e as pirralhas sofriam dentro da própria casa. Enquanto mentisse para si mesmo que [Nome] não era algo relevante para si, ela estaria a salvo de sua maldição.

Não foi até o dia anterior que soube o real motivo de sua missão, Toji não fazia ideia dos planos de Minori ou seu envolvimento com Amarate. Ele seguia o que Mundi mandava e não tinha contato com a cunhada psicótica, quando a esposa contou seus pensamentos que soube ter algo de errado com toda aquela proteção exagerada.

Mas negou com todas as forças, gastando suas últimas vontades para suprir um desejo egoísta para se autoproteger. Ele não se importava — mentiras —, logo se algo acontecesse com [Nome] não doeria. Levou tais falsidades na boca até se afogar naquilo que ele mesmo lutou tanto para fugir.

Quando [Nome] pegou o garotinho nos braços, Toji desejou que fosse seu. Que um dia talvez ela sorrisse de maneira tão gentil para algo bom nascido deles. Admitiu, mesmo que em silêncio, sentir algo, mas já era tarde demais.

Não pode salvar sua esposa, não pode falar a verdade, para se lembrar agora restava apenas o ódio com que a mulher o encarou e a dor que tomou seus belos olhos. Ele a traiu, e nada havia no mundo que pudesse mudar isso.

Tomou então uma decisão, jogou o que restava de seus pertences na bolsa junto com o orgulho que não precisava, guardou a aliança abandonada no bolso e partiu daquele quarto que seria para sempre a tumba de um futuro desconhecido. Encontraria [Nome], a conhecendo, talvez o matasse no momento em que se reencontrassem; não importava.

Se o preço para ver sua esposa mais uma vez fosse a morte, entregaria sua alma ao barqueiro de bom grado.











N/A: Entramos no novo arco! Ehhhhhhhh, clap clap. Não serão muitos capítulos do Toji, mas vai resumir aí um tempo de procura.

Não o odeiem.  Hahaha, e não deixem de ler que prometo que vou dar meu melhor!

Na minha visão a questão com o Toji é "quero, mas não quero me machucar porque minha vida é uma merda" sabe o: manter expectativas baixas para não se decepcionar. E outra, o cara vendeu o filho (no mangá) não faz o perfil do personagem ser 'bom' é um babaca com algumas boas intenções. (porque ele vende o Megumi acreditando que ia ser o melhor pra ele).

Enfim! Ainda longo caminho a percorrer, agora junto do Caronte até o submundo!

Vejo vocês na próxima atualização.

Até mais,XX!

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