Prólogo
Olhei mais uma vez para o corpo da minha mãe, mesmo assim ainda não consigo acreditar. Minha cabeça rodopia várias vezes, sinto como se meus pés não tivessem tocando o chão. Estou sem conseguir dormir ou comer alguma coisa, não consigo sentir fome, não consigo sentir sono, mas sinto meu corpo cansado. As pessoas ao nosso redor me olham com pena, e até eu sinto pena de mim mesma.
Minha mãe morreu faz dois dias, hoje vamos enterrar ela.
Vamos enterrar ela...
É isso mesmo? Minha mãezinha vai ser enterrada? Minha mãezinha vai ser colocada em um buraco fundo onde não poderá ver ninguém? Como assim? Ainda lembro que á dois dias, minha mãe estava bem, estava feliz e sorridente. Via cansanso em seu rosto, mas como sempre ela sorriu, sorriu e fez eu e Valentina sorrir também. Ela voltou do trabalho e como sempre, começou a fazer o jantar, ela estava feliz, eu vi que ela estava feliz. Mas em um segundo tudo mudou.
Meu pai chegou em casa bêbado, como acontece todos os dias. Minha mãe continuava a fazer o jantar, eu ajudava Valentina a fazer o dever da escola. Nós não éramos ricos, não tinhamos coisas luxuosas em casa, mas tinhamos muito amor, minha mãe nos dava todo amor do mundo.
O rosto do meu pai transmitia preocupação, ele não era má pessoa, só tinha vícios demais e que o levaram para o fundo do poço. Ele deu um beijo em mim e em Valentina, logo se aproximou da minha mãe e os dois foram para o quarto conversar.
Depois de algum tempo ouvimos os gritos da minha mãe, ela gritava com o meu pai e quebrava as coisas do quarto. Fiquei em alerta na hora, porque apesar do meu pai ser um alcoólatra, ele jamais levantou a mão para minha mãe ou para nós, e também era muito difícil ver minha mãe gritando ou chateada, ela era sempre alegre, sua alegria contagiava tudo e todos.
Peguei na mão de Valentina que se assustou com os gritos, a levei para o quarto, pedi que ela ficasse lá e não saísse por nada. Fui até o quarto e chamei pelos dois, minha mãe abriu a porta com lágrimas no rosto e logo me abraçou.
— Minha filha...
— O que foi mãe, porque está chorando desse jeito? — Perguntei também me sentindo assustada, tenho 15 anos e nunca vi minha mãe assim.
— Seu pai... Ele...
Imagino logo que, ou ele arranjou outra ou bateu nela.
— Eu não tive escolhas Ana, me perdoem por favor... — Meu pai diz atrás da minha mãe.
— O que você fez pai?
— Que escolhas Roberto? — Minha mãe se soltou de mim e o encarou com raiva. — Você está devendo para um agiota, você quer fugir com a gente por isso, mas para onde nós vamos onde esses homens não vão nos encontrar? E nossas filhas... Você pensou nelas quando se encheu de dividas, só esqueceu de um pormenor importante, a gente è pobre e não tem onde cair morto, essa casa é a única coisa que temos.
Meu pai baixou o rosto e consegui ver lágrimas escorrendo por eles.
Ele ia dizer alguma coisa, mas algo quebrando na sala, roubou toda a nossa atenção.
Meu Deus!
— São eles! — Meu pai falou eufórico. — É tarde demais, eles vão matar todos nós!
Minha mãe deu um tapa bem forte no rosto do meu pai, e se virou para mim.
— Corre para o quarto e entra no sótão com a sua irmã, não saíam de lá por nada, nem se ouvir gritos.
Entrei em pânico e começei a chorar.
— E você?
Na hora começamos a ouvir tiros.
— Vá logo Eiza, eu vos amo, diga isso para sua irmã, eu vos amo.
Tremendo, corri para o quarto onde Valentina estava escondida em um canto. Correu para me abraçar, percebi logo que estava com muito medo, tentei acalma-la beijando sua testa. Pedi que ela não fizesse nenhum som, abri a porta, que mais parecia uma parede, entramos e descemos as escadas sem fazer barulho nenhum.
Faz muito tempo que não viemos aqui. Meu pai construiu ele quando estavam construindo a nossa casa, ele é arquiteto, mas gastou todo dinheiro em bebidas e jogos.
— O que são aqueles barulhos Eiza? — Val perguntou ainda sem me soltar.
Caminhei com ela até ao sofá que havia ali, e nos sentamos. A abraçei e acariciei seu cabelo.
— Não foi nada meu amor.
— E a mamãe?
Meu coração apertou quando ela falou da mamãe. Não sabia o que responder, também estava com muito medo, muito mesmo, mas preciso ser forte por ela, só espero que a mamãe esteja bem.
Passou horas demais, passou um dia inteiro, nós ficamos trancadas no sótão por dois dias, ninguém foi nos buscar, ninguém dizia nada, o silêncio naquele lugar era ensurdecedor. Ganhei coragem e decidi ir ver o que estava se passando, a casa também estava silenciosa, mas quando cheguei na sala, vi várias pessoas e um caixão no meio dela. As pessoas ficaram chocadas quando me viram, várias vizinhas vieram me abraçar chorando e perguntando por Valentina.
Não conseguia dizer nada, não conseguia entender nada. Onde está minha mãe e o meu pai?
— Sinto muito meu amor, sua mãe era uma mulher incrível, o céu ganhou um anjo. — Uma vizinha me abraçou dizendo essas palavras.
Corri até o caixão e cai no chão quando vi quem estava dentro, era a mamãe, era a minha mãe com os olhos fechados para sempre.
Minhas lágrimas começaram a cair como água nas cascatas, não conseguia levantar do chão, não tinha forças, mas tudo piorou quando Valentina veio atrás de mim e parou do meu lado, tentando me levantar e apontando para mamãe no caixão.
— Eiza, Eiza... Ela morreu, Eiza... É a mamãe, ela está num caixão, ela está com os olhos fechados, Eiza mamãe está morta!
O peso do seu corpo caiu sobre mim, me deixando ainda mais angustiada. Foram momentos muito tensos, Valentina teve que ser levada para o hospital por uma vizinha, não pude ir porque tinha que acompanhar o enterro da minha mãe.
Valentina tem 8 anos, ela entende tudo o que se passa, isso vai assombrar sua mente para sempre.
Não recebi nenhuma notícia do meu pai, os vizinhos dizem que eles não encontraram ele aqui, somente o corpo da minha mãe jogado no chão. Sinto uma raiva crescendo dentro de mim, cada vez que imagino que a culpa é toda dele, do maldito vício dele.
Foi isso que aconteceu, agora minha mãe está aqui jogada nesse caixão sem poder se mexer, sem poder sorrir... Ah ela amava sorrir, onde vou encontrar esse sorriso maravilhoso?
Algum tempo depois, fomos ao cemitério e enterramos ela, foi a coisa mais dolorosa que tive que presenciar, era minha mãe ali, era minha mãe morta ali. Ainda bem que Valentina não viu isso, com certeza ela não aguentaria.
Os dias passavam e nada de receber notícias do meu pai. Achei melhor, porque se recebesse ou o visse, acho que o mataria com as minhas próprias mãos.
Tive que começar a me virar para dar de comer á minha irmã, as vizinhas ajudavam com alguma coisa ou outra, mas nós vivemos em um bairro pobre, todos passam muitas necessidades, por isso, arrumava casas, lavava roupas, até fazia de garçonete.
Passou um ano desde a morte da minha mãe, nossas vidas nunca mais foi a mesma, Valentina nunca mais foi a mesma, tudo na casa lembrava ela, todos os cantos. Eu nunca mais fui a mesma, precisava de algo que me tirasse da minha realidade, estava quase entrando em depressão, mas tentava lutar por conta da minha irmã que ainda era pequena.
Por isso decidi que tinhamos que sair do México. Não tinhamos condições para sair, mas nós tinhamos de sair. Se continuarmos nessa casa, ainda acabamos depressiva, as duas.
Comecei a trabalhar feito louca, trabalhava todo o dia e só tinha descanso a noite. Mesmo assim, o dinheiro ainda era pouco. Não conseguiríamos nos manter noutro país, com uma mão na frente e outra atrás.
Uma manhã, quando levava Valentina á escola, vi umas garota dançando em uma academia, fiquei observando admirada, sempre gostei de dançar, mas nunca tive oportunidade de fazer uma formação. No caminho de volta, continuei parada e observando, até que uma garota me notou pelo enorme vidro, e me chamou para dançar com elas.
Algum tempo depois, já era uma profissional de Pole dance, dançava em bares e boates, passei a ser conhecida, consegui o dinheiro suficiente para manter a mim e a minha irmã longe do México, e assim fomos formar nossas vidas em outro lugar, nos Estados Unidos, propriamente em Los Angeles.
O pole dance me ajudou muito a superar a morte da minha mãe, além de ser uma dança sensual, me ajudou muito a expressar os meus sentimentos através de cada movimento que fazia.
Aquilo mudou a minha vida.
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