O treinamento
Após o jantar continuamos à mesa conversando, meus pais e meu tio sempre fazendo questão de envolver Finnick na conversa. O garoto foi se soltando mais durante a refeição e a conversa e agora um sorriso pintava seu rosto bronzeado enquanto ele falava para meu pai sobre lanças e tridentes serem suas armas de preferência.
— Eu luto bem com lanças, mas acho que espadas são minhas favoritas... — Wade fala para Finnick. — Como tem sido seu treinamento, Finn?
— Considerando que apenas treino na escola e sozinho com um arpão enferrujado depois da aula, não sei muito bem... — Finnick fala olhando para baixo — Mas os instrutores na escola dizem que tenho talento.
— É exatamente por isso que pedi a Wade para trazê-lo aqui, Finnick — meu pai começa — Eu e meu irmão pensamos, e como você é amigo do Wade e já tem algum talento, decidimos ajudá-lo com o treinamento, temos seis meses até a colheita, sinceramente espero que não seja você a ser sorteado, mas caso seja, queremos que tenha uma chance de lutar.
Todos nós ficamos em silêncio enquanto Finnick encara meu pai, após a informação ser processada, Wade dá um grande tapa nas costas do amigo sorrindo.
— Isso é ótimo, cara! — Ele fala animado — Poderemos treinar juntos todos os dias!
Os olhos de Finnick ficam marejados e ele olha para meu pai com um sorriso de gratidão.
— Obrigado, senhor — ele esfrega as mãos nos olhos marejados— Não irei decepcioná-los.
— Tenho certeza que não vai, filho... — meu pai diz com um sorriso caloroso.
Conversamos mais um pouco e Nico que depois de comer arrastou sua cadeira até que ficasse colada na minha, agora dorme agarrado em meu braço. Minha mãe olha para o pequeno com carinho e passa a mão levemente pelos seus cabelos negros.
— Bom, agora que resolvemos tudo, vou indo — meu tio fala e se levanta — Eu te acompanho até em casa Finnick, o distrito é calmo, mas nunca se sabe...
— Pode deixar o Nico aqui, Willian — minha mãe fala para o cunhado que acena — Amanhã é sábado, então posso andar um pouco com ele por ai.
— Muito obrigado, Eve. Nao sei o que faria sem vocês...— meu tio agacha perto do filho e calmamente o acorda — Nico, o papai já vai, você pode dormir com a Pearl hoje, tudo bem?
Nico abre os olhinhos sonolentos e acena para o pai, ele então solta meu braço e abraça meu tio, dando um beijo em sua bochecha, o adulto faz o mesmo com o pequeno e se levanta.
Vamos até a porta nos despedir de Finnick e meu tio, Wade abraça o amigo com promessas de vê-lo no dia seguinte, minha mãe segura Nico no colo.
— Nos vemos na segunda, Finnick. — meu pai aperta o ombro do mais novo e se vira para meu tio - Até amanhã, irmão.
— Até segunda, senhor. Obrigado novamente. — Finnick acena para Wade e me da um aceno de cabeça que eu retorno e ele e meu tio saem pela noite.
— Sua irmã ajudou a arrumar, você ajuda a limpar, Wade. — minha mãe fala para meu irmão que concorda e volta para a sala de jantar - Vou colocar Nico na cama.
— Ele pode dormir comigo, mamãe. Não tem problema. — falo subindo as escadas.
No meu quarto, arrumo a cama e minha mãe coloca o pequeno adormecido nela e arruma os cobertores sobre ele.
— Já está tarde, pode se deitar. - minha mãe fala para mim — Vou ajudar seu irmão, boa noite, querida.
Minha mãe me dá um beijo na testa e sai do quarto iluminado apenas pela luz da lua que entra pela janela. Troco minhas roupas pelo pijama e me deito ao lado de Nico, ele abre os olhos e então chega mais perto de mim. Passo o braço pelo seu corpo pequeno e ele volta a dormir e não demoro muito para cair no sono também.
Passo o sábado com Kara e Keelan em uma das piscinas naturais escondidas que encontramos enquanto explorávamos quando mais novos.
Desde então tem sido nosso lugar, é para sempre onde vamos quando temos tempo ou quando um de nós quer ficar sozinho.
Naquela segunda, Finnick começou a treinar junto de Wade com meu pai e meu tio, meu pai sempre falando no talento nato do garoto.
Os últimos quatro meses de aula do ano passaram voando, eu e meus amigos ficamos felizes por ter alguns meses de férias antes de ter que voltar para as lições maçantes da história dos distritos e de Panem, da revolta, da criação dos jogos como um lembrete do que acontece com aqueles que se opõem à Capital.
Todos conhecíamos a história, mas eles faziam questão de gravá-las em nossas mentes a base do medo, medo de ser um tributo, ou de alguém querido ser um tributo, medo de morrer na arena. Aprendi que era assim que o Presidente Snow governava toda Panem, nos mantendo em correntes de medo, presos por nossas próprias mentes. Ele era a serpente que rastejava aos nossos pés inspirando terror, com um sorriso no rosto e uma rosa branca na lapela.
Naquela colheita, ficamos todos aliviados quando o nome de Finnick não foi dito por Sapphire, a acompanhante da Capital, designada ao Distrito 4. Naquela noite, celebramos com um jantar. Quando os jogos começaram, assistimos não pelo prazer de ver 24 crianças se matando, mas como forma de aprendizado, meu pai sempre repetiu que informação e conhecimento eram poder. Então absorvíamos tudo, desde o comportamento dos tributos durante a parada, durante suas entrevistas com Ceasar Flickerman, em como certos comportamentos agradavam mais os cidadãos da Capital e consequentemente gerava mais patrocinadores, o que era extremamente vital para a sobrevivência na arena, seja para conseguir um pouco de água, algum remédio e até mesmo armas. Apesar da última não ser tão comum, eles sentiam prazer em ver os tributos se desesperando e fazendo o possível para permanecerem vivos, por conta própria.
No ano seguinte, eu comecei meu treinamento, com um ódio que queimava frio dentro de mim, ódio daqueles jogos e de seu maior responsável. Treinei com mais afinco do que meu irmão, dominei tudo o que meu pai e meu tio podiam me ensinar, meu pai costumava brincar em como um rosto angelical como o meu podia esconder uma letalidade brutal e uma mente tão afiada quanto.
E a 64ª edição anual dos Jogos Vorazes chegou e meu coração ficou apreensivo, não só Finnick teria o nome na tigela, mas Wade e Mareen também teriam, pois completaram doze apenas alguns meses antes. Mas novamente a sorte parecia estar ao nosso favor. Nenhum dos três foi sorteado, e novamente celebramos.
No fim daquele ano, um inverno brutal atingiu o distrito e muitas pessoas começaram a passar necessidades, meu pai decidiu que a família ajudaria aqueles mais necessitados, então num certo fim de semana, todos da família e nossos amigos nos ajudaram.
Os meninos, ficaram encarregados dos peixes que seriam entregues para as famílias necessitadas, todos passaram o sábado em um dos galpões de pesca da família Marcet, separando peixes para serem distribuídos. As meninas, ficaram em casa com a minha mãe e a senhora Harbor, preparando tantos pães que no fim daquele fim de semana as mãos estavam cheias de bolhas, mas o coração de todos estava leve quando saímos pelas ruas do distrito indo de porta em porta e oferecendo aquela ajuda simples, mas que salvou muitas famílias da fome.
E o ano seguinte chegou, junto com a 65ª edição dos Jogos, naquela manhã acordei de um pesadelo que não conseguia me lembrar, me arrumei com aquela ansiedade no coração, quando estava saindo do quarto olhei para a pequena caixa de madeira em cima da minha penteadeira e por algum motivo fui até ela e abri, observando as pérolas que brilhavam dentro da caixa, pérolas que me foram dadas por todos os meus amigos e pela minha família, sempre que achavam alguma nas praias do distrito. Segurei uma azul, da cor dos meus olhos contra a luz que entrava pela janela.
Nesse momento minha mãe me chamou e sai correndo para encontrar minha família e irmos até o prédio da justiça para a colheita, quando reparei que ainda segurava a pequena joia, a coloquei no bolso do vestido que usava e fiquei com minha família enquanto meu irmão, Mareen e Finnick estavam nas filas de jovens selecionáveis.
Sapphire cumprimentou a todos com seu sotaque da Capital e soltou o notório "Que a sorte esteja sempre ao seu favor" antes de passar o filme preparado pela Capital, que todos ali naquela praça já tinham decorado cada palavra. Sapphire começou como sempre, pelas garotas e assim que ela falou o nome de uma desconhecida, o esqueci imediatamente.
— Agora para os cavalheiros — Sapphire enfiou a mão com as grandes unhas azuis na tigela de vidro e tirou um papel — Finnick Odair.
E então meu coração despencou.
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