Capítulo Nove

Eros Stackhouse:

Ao retornarmos para casa, o rosto de Braxton assumiu uma expressão sombria, e ele imediatamente lançou um olhar ansioso na minha direção. A temperatura na sala pareceu cair abruptamente, fazendo-me franzir a testa devido à súbita sensação de frio.

Eu o encarava desconfiado, o que fez com que ele franzisse a testa e se queixasse:

— Você está me encarando muito! Odeio quando fazem isso.

O clima ao seu redor estava carregado de tensão. Braxton parecia tonto, quase cambaleando, não apenas pela fadiga, mas também pela quantidade abundante de sangue que ele havia ingerido. Já havia se passado algum tempo desde que ele permitira que seu apetite por meu sangue se saciasse, e essa última alimentação fora particularmente intensa. A explosão de poder selvagem que o dominara em um frenesi momentâneo havia destruído seu já frágil controle.

Eu ainda não tinha certeza de onde aquele poder havia surgido naquele momento, mas de repente Braxton estava em um estado de excitação incomum. Observei como ele ficou mais rápido, mais poderoso do que o normal, e agora, com o que Emma me contara, estava começando a entender o motivo.

Antes de falar com Emma, Braxton já estava tenso. Sabia que, se questionasse o que havia acontecido, ele ficaria ainda mais irritado comigo. Decidi então seguir para o quarto, deixando-o para trás e fechando a porta com força, deixando-o entregue aos seus próprios pensamentos tumultuados.

Dentro do quarto, senti um misto de frustração e confusão. As palavras de Emma ainda ecoavam na minha mente, revelando verdades desconcertantes sobre Braxton. Por mais que tentasse compreender e assimilar tudo aquilo, as peças do quebra-cabeça pareciam se encaixar de maneira caótica.

A magia que protegia as memórias de Braxton, a revelação sobre seu poder selvagem e sua sede de sangue eram informações avassaladoras. Enquanto processava tudo aquilo, não podia deixar de me preocupar com o estado atual de Braxton. Ele estava diferente, mais intenso e imprevisível do que nunca.

Aquele momento tenso na sala, quando ele reclamara do meu olhar, permanecia fresco em minha mente. Sua reação me alertou para a vulnerabilidade que ele estava experimentando. Eu sabia que tinha que lidar com isso de maneira delicada, mas não tinha ideia de como.

Enquanto isso, do lado de fora do quarto, ouvi passos apressados de Braxton. Ele estava se movendo rapidamente, como se estivesse agitado e perturbado. A situação estava se tornando cada vez mais complicada, e eu sentia que algo importante estava prestes a acontecer.

Permaneci no quarto, esperando que Braxton se acalmasse ou decidisse compartilhar o que estava acontecendo com ele. Sabia que precisávamos conversar, mas também entendia que ele precisava de espaço para processar tudo o que havia acontecido. Enquanto isso, eu continuaria a refletir sobre as revelações surpreendentes que havia recebido e a buscar respostas para as muitas perguntas que surgiram em minha mente.

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Acordei depois de algumas horas, minha mente ainda estava turva e confusa devido aos sonhos e pesadelos desencadeados pelas lembranças liberadas. Levei algum tempo para reconhecer o quarto em que estava, um ambiente suave e belo, decorado com abajures nas mesas de cabeceira que emitiam uma luz suave, cortinas longas feitas do mesmo tecido da colcha e aquarelas genéricas nas paredes.

A generosidade e o estilo dos amigos da mãe de Braxton eram evidentes na decoração do quarto. Ao me aproximar do espelho na porta do guarda-roupa, meu reflexo me fez perceber quão semelhante eu estava à pessoa que havia arruinado a vida de Braxton e seu irmão há 175 anos.

Com um suspiro, desviei meu olhar da janela e vi que o sono teimava em me escapar. Os olhos doloridos insistiam em ficar abertos, e a luz do sol finalmente começava a ceder ao crepúsculo. Resolvi me levantar e buscar algo para comer, pois meu estômago estava roncando de fome. Na sala de estar, ouvi um murmúrio de vozes baixas vindo da televisão.

Braxton estava sentado à mesa, olhando fixamente para a tela do noticiário, sem mostrar o menor sinal de interesse. A televisão alternava entre canais mundanos e canais do submundo, exibindo uma variedade de conteúdos.

Dirigi-me à cozinha e encontrei uma bandeja de comida pronta sobre a pia. Aqueci a refeição e retornei à sala de televisão, sentando-me no chão ao lado da mesa de centro. Comecei a comer a massa com molho verde, saboreando-a lentamente.

Enquanto comia, ocasionalmente virava o olhar na direção de Braxton. Percebi que ele nunca desviava os olhos da tela, mesmo quando os comerciais eram exibidos. À medida que a refeição avançava, uma sensação de inquietação começou a se apoderar de mim.

— Braxton, o que está acontecendo? Você está assim desde que voltamos da casa da Emma. Não quis mencionar isso antes, mas você passou o dia inteiro em silêncio enquanto eu estava dormindo — comentei, preocupado com seu comportamento.

Braxton levantou os olhos da televisão e olhou para mim com uma expressão vazia.

— Não é nada — respondeu, sua voz soando sincera, embora algo em mim não confiasse plenamente nele ou em suas palavras.

— O que ela te disse? — Insisti, desejando entender o que havia acontecido durante nossa conversa com Emma.

— Ela não me disse nada de relevante, mesmo se tivesse dito, não seria apropriado compartilhar contigo — Braxton respondeu, levantando-se subitamente e fazendo com que o sofá quase quebrasse sob seu movimento.

Ele se afastou, indo para o quarto onde estava hospedado, e bateu a porta com força, quase arrancando-a do batente.

Cada vez mais, percebi que tinha um papel não apenas como amigo, mas também como alguém que deveria trazer a sensatez e a inteligência para a vida de Braxton. Sua atitude estava começando a me irritar profundamente, e decidi sair para espairecer um pouco.

Deixei o prédio pelo lado submundo, ainda curioso sobre aquele lugar e, principalmente, sobre como minha mãe treinava com as adagas que eu havia visto em minhas lembranças. Parei diante de um beco escuro e observei um pequeno brilho ao fundo.

Adentrei o beco escuro, com apenas a luz da lua como guia, enquanto utilizava o celular para iluminar melhor o caminho. A cada passo, o lixo do local era esmagado sob meus pés, e eu procurava um lugar para pisar entre os detritos.

Repentinamente, ouvi um som próximo, um som de algo ou alguém em busca de comida. No entanto, olhando ao redor, tudo o que eu via era lixo e não havia sinal de vida humana.

— Estranho... — murmurei

para mim mesmo, enquanto continuava a avançar pelo beco escuro, guiado pelo brilho tênue da Lua. Cada passo que eu dava fazia o lixo se acumular sob meus pés.

Enquanto caminhava, percebi que os montes de lixo que se assemelhavam a colinas à distância eram, na verdade, montanhas de resíduos empilhados. Moscas zumbiam ao redor, cães e gatos famintos vasculhavam os detritos em busca de comida.

Em um determinado momento, um farfalhar em meu ouvido me fez parar abruptamente. Era um som próximo, como o de uma criatura em busca de alimento. No entanto, tudo ao meu redor era lixo, e eu não conseguia identificar a origem do som. Virei-me, pensando que talvez tivesse me enganado.

Eu queria sair dali o mais rápido possível, pois o cheiro nauseante e pútrido do lugar estava se tornando insuportável. Era um ambiente inabitável para seres humanos.

Mas, então, ouvi novamente o som, mais claro desta vez, como um lamento fraco e distante. Rapidamente, segui o som, minha curiosidade superando meu desconforto.

O som me levou a uma cena que me chocou profundamente. Deitada entre os detritos estava uma criança pequena, com cabelos negros e emaranhados, olhos que lembravam pequenas estrelas douradas, agora opacos e sem brilho. Duas pequenas asas estavam encolhidas em suas costas, com as asas da frente maiores que as de trás.

Fiquei boquiaberto, incapaz de acreditar que alguém pudesse viver em um lugar tão desolado. A visão era angustiante, com todos os tipos de lixo espalhados pelo pátio, desde móveis quebrados até papéis sujos e comida estragada, além de objetos mágicos que pareciam ter perdido seu poder. O chão estava coberto de detritos, tornando difícil encontrar um local onde pudesse pisar.

— Que horror... — murmurei, cobrindo o nariz para escapar do odor ácido e podre. Enquanto olhava ao redor, notei uma pilha de resíduos que se assemelhava a uma colina. Aquilo era, na verdade, uma montanha de lixo empilhado.

Aproximei-me com cautela, e moscas voaram ao meu redor enquanto cães e gatos famintos escavavam freneticamente em busca de comida.

Foi então que ouvi um som fraco e choroso, mais uma vez, vindo de perto. Parecia o som de uma criança em sofrimento, mas não conseguia ver nenhuma criança por perto. Olhei rapidamente ao redor, tentando identificar a origem do som.

Mais uma vez, o som se fez ouvir, e desta vez não havia como ignorá-lo. Era um lamento fraco, e minha curiosidade e preocupação me impulsionaram a seguir o som.

Quando finalmente localizei a fonte do som, meu coração se apertou. Era uma criança pequena, deitada ali, sem forças. Seus cabelos ásperos estavam espalhados pelo lixo, e seus olhos, que em tempos brilhavam como estrelas douradas, agora estavam opacos e sem vida. Duas pequenas asas, uma das características mais marcantes, estavam encolhidas em suas costas, os membros frágeis quase irreconhecíveis.

— Ajuda? — A voz da criança era fraca, e sua pequena mão, trêmula, agarrou a bainha da minha calça, como se buscasse apoio em meio ao desespero.

Franzi a testa, sentindo um aperto no peito diante da visão daquela criança sofrida. Era inconcebível que uma criança tão pequena estivesse vivendo em condições tão deploráveis. Enxuguei as lágrimas que escorriam por minhas bochechas, meu coração transbordando de tristeza e compaixão. Aquela criança não merecia passar por aquilo.

— Tudo vai ficar bem, vou te levar para alguém que possa cuidar de você e dos seus ferimentos — sussurrei, sentindo a mão trêmula da criança agarrando meu braço com força.

Com cuidado, ergui o pequeno corpo da criança, que estava fraco demais para ficar de pé. Suas mãos e pés estavam sujos e desnutridos, mas eu sabia que precisava levá-lo a um médico o mais rápido possível. Rapidamente, tirei a blusa que estava usando e a enrolei ao redor do corpo frágil da criança, formando um improvisado cobertor.

Segurei a criança em meus braços e comecei a sair daquele lugar, determinado a encontrar ajuda para aquele ser tão vulnerável.

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Gostaram?

Até a próxima 😘

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