Capítulo 16

Diferente dos demais, esse estava mais cheio, mesmo que isso significasse ter apenas uma bolsa e um casaco a mais do que os quartos dos outros hóspedes. Sua cama estava na mesma situação da do hóspede anterior, Santos fez sua caminhada até a janela e iluminou, mas dessa vez não conseguiu ver o chão pois cresciam alguns arbustos na encosta da parede, eram de um verde escuro que quase desaparecia na noite.

Santos movimentou a câmera em várias direções buscando ângulos diferentes e durante o ato, algo branco chamou sua atenção, estava protegido pelas folhas do arbusto. Ele voltou a lanterna para o ângulo anterior e então conseguiu deixar o objeto mais visível. Tal qual o objeto metálico visto na janela do quarto anterior, nessa também não era possível identificar com certeza o que aquilo era.

Santos se afastou do parapeito e voltou até a bolsa a abrindo, não havia nada além dos tais brincos de esmeralda e algumas outras pulseiras de ouro e anéis.

No andar de baixo o clima ainda continuava tenso e a demora do policial no andar superior estava deixando todos inquietos. André balançava o pé constantemente enquanto Dulce tamborilava a ponta dos dedos na madeira da bancada.

Os irmãos Lima continuavam no mesmo lugar mais pacientes do que todos, pareciam não saber o que estava acontecendo.

Eles sabiam quando era a hora de ficar quietos, sem movimentos bruscos, sem demonstrar nervosismo, sem deixar brecha para que duvidassem deles. Foi desse modo que escaparam de uma emboscada há dois anos quando só tiveram tempo de pegar moletons, bonés e óculos para despistar os policiais. Nesse dia tiveram sua maior prova de autocontrole pois precisaram ficar mais de uma hora dentro do pátio de um shopping esperando que os policias que estavam fazendo a guarda das saídas liberassem a passagem após o principal, que rondava no meio das mesas dos clientes os procurando, não encontrou nada.

Santos levantou o casaco o pegando pela barra de seu terno e analisou o objeto, mas não encontrou nenhuma pista. Se bem que seria um pouco complicado revistar aquele emaranhado de pelúcia escura procurando por algo. Ele apontou a lanterna do celular para o tecido e o observou por mais alguns segundos.

Suly tinha voltado para seu lugar de antes, estava próxima da porta e bem na frente de Lucas quando sentiu uma leve brisa atingir sua nuca, um arrepio passeou por ela e no instante seguinte a brisa se tornou um sopro. Suly se virou assustada e encontrou o outro ofegante. Ela colocou suas mãos sobre o ombro dele atraindo sua atenção para ela, os olhos dele estavam arregalados, sua boca aberta puxando o ar, seu peito que subia e descia continuamente.

- O que houve? – ela perguntou. Ele não respondeu e a bagunça acabou por atrair a atenção de André.

- O que está acontecendo? – perguntou ele.

- Crise... an...si...edade... – Lucas pronunciou com esforço. Suas mãos estavam tremendo e seu coração acelerado.

Depois de todo o ocorrido com seu chefe, essa acabou sendo a consequência das noites mal dormidas e de ficar em alerta o tempo inteiro. Ele até tinha começado a controlá-la mas depois do que fez antes de fugir para essa viagem, todo seu esforço evaporou, ele não conseguia mais lidar com o desespero que surgia, precisava se sentar e esperar que passasse.

- Eu vou pegar um copo d'água! – Suly o soltou e ele foi deslizando até se sentar no chão com a mão sobre o peito.

Ela deu uma passo na direção do tanque mas seus pés se torceram e ela acabou tropeçando, se não fosse André se mover para frente seu rosto teria ido de encontro ao chão sem nenhum impedimento.

- Muito obrigado – ela falou se agarrando nele para se levantar. Suly agradeceu aliviada por ele ter evitado a possibilidade de ela ter que fazer alguma cirurgia facial de reparação. – Esse crime... toda essa situação... está deixando todos muitos nervosos.

André apertou de leve os dedos dela que tremiam sem parar tentando passar um pouco de ânimo, então a deixou e foi em direção a Lucas se abaixando em sua frente.

- Acalme-se. Lembre de respirar devagar – ele falou.

- Aqui a água! – Suly passou o objeto para André segundos depois e ele o entregou a Lucas em seguida. O outro segurou o copo com um pouco de dificuldade mas aos poucos conseguiu engolir o conteúdo. Ele fechou os olhos e respirou fundo.

Depois de ter sua certeza de que não havia nada no casaco, Santos largou o objeto sobre a mesa novamente e saiu. Sua lanterna ainda estava ligada, ele passou pelo corredor e quando estava próximo de desativá-la

... degraus. Dois degraus.

Levou alguns segundos para ele perceber que a luz tinha sumido e o que ele estava vendo era somente onde o foco da lanterna estava clareando. Expressões de susto ecoaram no andar de baixo e ele desceu apressado.

- Espera – a voz de Dulce surgiu no meio da multidão. – Eu tenho alguns lampiões guardados no quartinho, eu vou pegar.

- Pode deixar dona Dulce – André se levantou com cuidado. – Eu pego para a senhora.

Santos apareceu na porta da cozinha iluminado os rostos assustados. Lucas se engasgou por um momento com a surpresa mas voltou ao normal.

- Tudo bem por aqui? – Santos perguntou e eles balançaram a cabeça em afirmação. – Dona Dulce preciso que a senhora abra a porta para mim.

- Ah, sim claro – ela se levantou seguindo a luz da lanterna do celular dele até o balcão e pegou as chaves, mas antes que fosse até a porta Santos estendeu a mão. Ela relutou no momento mas entregou o objeto no fim. – Mas vai sair nessa chuva? – perguntou.

- Vou averiguar uma coisa – disse ele deixando os hóspedes para trás.
Assim que Santos saiu, André se encaminhou para o quartinho em busca dos lampiões.

- Cuidado André, você pode se machucar meu filho – Dulce alertou. – Eu... acho melhor todo mundo vir pra sala – eles começaram a passar pela porta escorando nas paredes e se firmando nas mesas.

Santos saiu para a chuva que não parava de cair já fazia horas. Ele arrancou seu paletó para usar como guarda-chuva e se esgueirou pela beirada do telhado ao lado da casa na tentativa de evitar ficar encharcado.

Depois de alguns deslizes pela lama que chegava a cobrir uma parte do seu sapato, Santos chegou em frente à janela do quarto de Bernardo e iluminou o espaço na procura do objeto metálico que antes tinha chamado sua atenção.

Sua esperança desapareceu assim que ele se aproximou mais um pouco e sentiu uma pontada de decepção ao constatar que não passava de um papel de bala com o lado metálico virado para cima. Sem querer deixar os hóspedes no mesmo lugar que os irmãos Lima por muito tempo, ele se levantou e voltou a esmagar a lama, dessa vez em direção à janela do quarto de Suly.

Com cuidado Suly seguiu André e passou pela porta estreita do quartinho.

- Ai – ela gemeu ao chutar uma caixa e sentir seu dedo mindinho ficar dormente. – Onde estão esses negócios mesmo?

- Dentro de alguma dessas caixas por aqui – André tateou na escuridão torcendo para os encontrar, segundos depois suas mãos deslizaram sobre a tampa da caixa de papelão.

Suly seguiu seu gesto e retirou o objeto não muito pesado de dentro, em  seguida retornou para a sala, dessa vez tendo certeza de manter os pés o mais próximos do corpo possível, e seus passos, mais cuidadosos.

- Precisamos de um isqueiro, não? – ela falou para o nada.

- Espera – Dulce respondeu. – Acho que tinha um isqueiro aqui embaixo do balcão.

Ela tateou o escuro e no fim conseguiu agarrar um objeto retangular. Dulce esfregou a palma da mão na ponta do mesmo e ficou aliviada ao sentir a resistência causada pelo ferro.

Suly pegou o isqueiro em seguida e acendeu seu lampião, e com ele, ela iluminou o quartinho para que André pegasse os outros objetos. Com todos na sala, ele os espalhou pelo lugar os colocando em cima do balcão e das mesas iluminando o espaço.

O arbusto realmente era bem volumoso, tanto que Santos de início ainda teve que procurar o ângulo certo de iluminar para que conseguisse enxergar o objeto completamente. Seu paletó já não conseguia mais segurar a água como ele esperava pois ela começou a atravessar pelo tecido formando gotas.

Ele esticou a mão para afastar as folhas e observou que em sua frente estava um pedaço de pano branco, estava quase todo encharcado e uma pequena parte dele estava parcialmente rosa. Santos aproximou ainda mais a lanterna, e então teve certeza de que realmente estava rosa, mas quando foi pegá-lo seu corpo inteiro se arrepiou, e não foi o frio o responsável.

Santos largou tudo que estava fazendo para voltar para o lado de dentro, seus pés deslizaram e ele quase caiu se não fosse por sua mão que foi ao chão primeiro. Seus dedos completamente pretos não conseguiram roubar sua atenção pois o grito que escutou vindo do lado de dentro foi tão forte e afiado que só poderia significar más notícias.

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