Sangue
Akira agiu rapidamente, afinal, era para situações como essas que ele fora treinado. Bem que não participara de nenhum treinamento especifico sobre desviar de uma multidão em pânico em uma discoteca e tentar capturar um possível lobisomem louco, além disso, tentar ser o mais discreto possível, não se podia esquecer da preservação do segredo sobre as criaturas sobrenaturais e seus associados.
— Saiam daqui. — Tinha se virado para proferir o comando a Gabriel e o lobinho "revoltado" que o acompanhava, mas para a sua surpresa (ou talvez nem tanta) notou que a dupla estava se direcionando contra o fluxo de pessoas, ou seja, em direção ao perigo.
— Perfeito... — Resmungou enquanto começou a se mover para alcança-los.
— Isso é jurisdição do conselho, vocês devem buscar um lugar seguro.
— E se eu me recusar? — Inquiriu o curandeiro sem encarar o agente — Vai me prender?
— Gabriel... Em outras circunstâncias eu adoraria te prender com algemas, talvez em uma cama, te deixar imobilizando enquanto eu efetuo o procedimento de verificar se portas algum tipo de arma ou instrumento suspeito, logo, tenho que fazer uma busca realmente minuciosa, apalpando todo o seu corpo e principalmente seus orifícios...
— Ai meu santo lobo celestial! —Rosnou Diego que se virou para encarar o agente tagarela — Isso foi muito ... Cara, você não precisa falar destas coisas em voz alta!
— Desculpe, esqueci que deveria adicionar censura para os menores de idade. — Akira disse isso com um sorriso nos lábios que indicava que a verdade era que o mesmo não sentia nem um pouco culpado pelo o que tinha dito.
— Oh! Céus... — Para a surpresa do lobisomem mais novo o seu "mestre" tinha estacando e detinha as mãos em uma posição bastante suspeita.
— Você só pode estar brincando?! Ficou excitado com isso!?
— Shhh! — Akira fez um leve cafune nos cabelos já revoltos de Diego — A mente dos adultos é realmente complicada para filhotes.
— Eu tenho quase 18 anos, seu pervertido! — Rosnou retirando a mão do oriental de sua cabeça com um movimento brusco.
— Pessoal, acho que devemos falar menos e agir mais! Olha, Akira, eu entendo mesmo que isso tudo seja o seu trabalho, ser o típico representando chato do governo, mas eu me comprometi com essa investigação! Ao menos que queira me arrastar daqui e deixar o seu parceiro sozinho lutando com sei-lá-o-que! — Fez um gesto melodramático com a mão provavelmente para indicar o monstro que iriam enfrentar dentre de instantes — Acredito que devemos esquecer esse papo burocrático e ir logo para a ação, não é mesmo?
Akira queria poder discordar daquele argumento, mas sabia muito bem o quanto Gabriel estava certo e poderia ser teimoso.
— Ok. Mas não façam nada estúpido. — Era mais uma ordem, outra que duvidava que a dupla de lobos seguisse.
O trio, com certa dificuldade, conseguiu abrir o seu caminho em meio ao público que tentava escapar do recinto. Pelo visto, devido a fumaça (efeito especial da boate), a escuridão combinada com os feixes de luz colorida, a visão dos humanos deveria estar comprometida, de modo que não poderiam perceber o que realmente estava acontecendo, pelo menos era o que presumia Akira. Chegaram ao local aonde estivera ocorrendo a "translação" entre o vampiro e o grupo de lobisomens, não havia sinal de Jack ou do monstro, na verdade o único que ainda residia no local era o vamp-traficante.
— E-eu... Eu não sabia... — No meio da confusão o rapaz deve ter perdido seus óculos escuros, sua íris azul florescente se destacava no ambiente de penumbra.
— Não sabia? — Akira rosnou furioso, pegou o menor pela a gola da camisa e o ergueu do chão com facilidade assombrosa — Veio aqui traficar "drogas" e não pensou que as mesmas poderiam dar certo? Quem você está querendo enganar?
— E-espere! — Diego interveio — A maioria das pílulas que ele estava comercializando eram na verdade balas, digo... Não eram drogas de verdade! Concordo com você que de qualquer forma o sanguessuga aí está cometendo um crime, mesmo que seja enganando viciados!
— E como você explica a transformação? Efeito alérgico a balas de framboesa? — O agente parecia cético quanto aquela explanação.
— Eu pensei que a tinha guardado no meu bolso! Juro! — Choramingou o vampiro — Devo ter a misturado, sem querer, com as balas enquanto roubava...Digo... Pegava emprestado as mesmas em uma lojinha aqui perto!
— Guardado o que?
— A droga verdadeira...
O mini interrogatório foi interrompido com um uivo, perigosamente perto de onde eles se encontravam. Akira pode ver que havia uma porta próxima a eles aonde havia escrito que só era permitido pessoal autorizados, deveria ser a saída para os bastidores.
— Eu juro que não sabia! Eu ouvi falar da droga, mas não imaginei que ela fosse mesmo real! Eu s-só me aproveitei dos boatos... Digo, tem tanta coisa que é comercializada no "mercado negro" que não é de fato real! Poções, talismãs, macumbas... Como eu iria saber que precisamente essa droga era real?!— Continuava tagarelar o vampiro.
— Iremos conversar mais sobre isso depois. Por hora, quero salvar o meu parceiro. — Rosnou Akira jogando o traficante fajuto no chão e já se direcionando para a porta. Gabriel e Diego estavam logo ali ao seu lado, seria inútil mandar que eles se abstivessem do assunto, então o agente resolveu (somente desta vez) deixar que civis participem da luta.
Ao abrir a porta a trio foi surpreendido com uma cenário do caos. Akira tinha acertado, ali era os bastidores, um corredor estreito, mal iluminado, amontoado de equipamentos para shows, mas naquele momento, tudo estava espalho pelo chão, marcas de arranhões profundos agora decoravam as paredes negras. Jack estava ofegante em um dos cantos, tinha a mão sobre o ombro ensanguentado, o lobisomem ou melhor... Aquela coisa metade lobo metade humano, jazia no chão, parecia com dificuldades para respirar. Arranhava a própria garganta, abocanhava o vazio, como que tentasse engolir o oxigênio, mas nada disso estava adiantando.
— Ele está tendo um choque anafilático. — Só então Gabriel notou uma figura conhecida ao lado de Jack, era Cassandra que no momento estava dando os primeiros socorros ao agente, como a garota tinha se metido ali? Era uma pergunta ser feita em outra ocasião, aonde não estivessem em meio a uma situação de vida-ou-morte — Pelo menos eu acho...
— Uma reação alérgica a droga? — Questionou o curandeiro mais velho se aproximando do monstro, mas sendo contido por Akira.
— Ele ainda é perigoso!
— E o que devo fazer? Deixar que ele morra?
Os dois começaram, então, uma batalha de olhares. Diego aproveitou a distração para se aproximar do transformado.
— Gatinho! — Exclamou Jack ao ver o jovem lobisomem se ajoelhando ao lado do ser agonizante.
— Ele parece ter um edema de glote. — Confirmou Di, ignorando os resmungos de Jack que o ordenava que se afastasse — Mas... Lobisomens não costumam ser suscetíveis a alergias! Devíamos dar uma injeção de epinefrina intramuscular, anti-histamínicos... Sei lá! Qualquer coisa!
Gabriel conseguiu se libertar das "garras" de seu agente/namorado e também tinha se unido ao seu pupilo para a análise do paciente.
— Eu não trouxe nada disso comigo... Mas o que ele está sofrendo é diferente dos outros lobisomens que invadiram a nossa casa no inverno passado... — Mordeu o lábio inferior, pensativo, na última vez os transformados pareciam que simplesmente pararam de "funcionar", como se a transformação fosse demais para o seu organismo e gerassem um colapso geral de todos os órgãos. Agora, parecia uma reação alérgica. Será que a droga estava sendo modificada? Se tornando mais eficiente e não provocando a morte do consumidor? Mas qual era o objetivo final do fabricante?
Gabriel não queria observar aquele lobisomem morrer, não o conhecia, havia a possibilidade dele ser um lobo desgarrado e que causasse problemas aonde passasse, afinal, ele consumiu a droga visando poder, não é mesmo? Era essa a propaganda que o vampirinho tinha feito no seu post... Mesmo assim, aquela não era a forma honrosa de deixar o mundo dos vivos.
— A pele dele... — Balbuciou Diego apontando para o braço do transformado, surgira mais outro sintoma, a pele estava borbulhando e logo depois se rompendo, sangue escorreu ou praticamente jorrou dos ferimentos. Ok... Aquilo não era uma simples reação alérgica.
— Pela a lua... — Sussurrou Gabriel assombrando com a grotesca visão. Em poucos segundos o sangue verteu do corpo agora já sem vida do monstro. Sangue de lobo...
Lobisomens não costumam ser suscetíveis a alergias
De fato, lobisomens eram bastante resistentes, mas havia determinadas coisas que para eles eram seu ponto fraco, Gabriel recordou de Eric, quando este chegou na alcateia com feridas abertas e que dificilmente cicatrizavam, isso por que foram provocadas por outros lobisomens. Se o contato com garras e saliva já provocava tamanha consequência, imagine se o sangue lupino fosse, de alguma forma, implantando dentro de um lobisomem saudável?
— Eu não acredito! — Exclamou surpreso com a própria linha de raciocínio. Será que era isso? Sangue de lobo era a base química da droga? Mas, infelizmente, não tinha tempo o suficiente para ponderar sobre o assunto pois o som de tiros advindo do salão da boate assinalou que a confusão da noite ainda não tinha terminado.
A porta se abriu e um nervoso vampiro adentrou, este a fechou em seguida e depois soltou um gritinho alarmado ao ver a imensa poça de sangue e o seu ex-cliente morto.
— O que você está fazendo aqui? — Exigiu Akira.
— Olha, cara... Posso não confiar em vocês e tal, sei que fiz muita besteira hoje e que também não sou confiável, mas você tem que acreditar em mim quando digo que acho melhor vazar daqui! Tem uns vampiros metidos a "tropa de elite" aí fora! Não acho que eles vieram dançar e muito menos ter uma conversa amigável.
— Você é um vampiro, não é? Não devia estar com medo dele. — Disse Diego, desconfiado.
— Vampiros são a raça mais esnobe que existe, mano! Já deve ter reparado que não sou um nobre! Eles não vão dar a mínima em eliminar um parasita... É assim que eles chamam pessoas como eu.
Akira farejou o ar, sim, podia identificar o cheiro de pólvora advindo do salão, também o aroma de ferrugem que era característico dos vampiros. O conselho dos lobisomens tinha pouco contato com a organização vampiresca, a qual é chamada de império (sim, de fato eles eram esnobes), logo, era melhor evitar um embate entre duas raças e suas respectivas representações.
"Além disso, esses vampiros podem não ser agentes do Império..." Analisou com desconfiança, afinal, por que o Império iria mandar seus membros para aquele clube? Ao menos que soubessem que um vampiro estava por trás da confusão? Um parasita como o traficante(falso) se intitulou... Não fazia sentindo.
— Vamos sair daqui. — Mandou pôr fim apontando para as portas dos fundos, logo ao fim do corredor.
— Mas e ele? — Questionou Diego apontando para o cadáver.
— Não podemos leva-lo conosco, sinto muito.
Gabriel retirou uma ampola do bolso e começou a coletar algumas amostras de tecido e sangue.
— Não acredito que você carrega essas coisas normalmente!? — Akira franziu o cenho com a atitude profissional do curandeiro.
— Melhor estar sempre preparado, não é? — O loiro forçou um sorriso, infelizmente não estava preparado com remédios que poderiam, pelo menos, amenizar o sofrimento do transformado, o mínimo que poderia fazer é que a sua morte valesse algo...
Mais tiros foram ouvidos, era o sinal para que fugissem, o mais rápido possível.
~~**~~
A noite estava úmida, o cheiro da brisa salina do mar não deu um efeito reconfortante ao grupo de fugitivos que corriam pelo beco. Estavam cercados, nas ruas adjacentes se podia ver furgões ao estilo SWAT aonde os vampiros armados saiam e se dirigiam a boate. Não iria demorar muito para notarem os lobisomens (e vampiro).
A esperança de fuga chegou em uma limusine. Sim, esse carro chique estacionou justamente na entrada do beco e as portas de trás foram abertas.
— Sugiro que entrem se querem escapar com vida. — Uma voz melodiosa advinda do interior do veículo se pronunciou, apesar de ninguém ver quem ou o que tinha proferido essas doces palavras.
— O que faremos? — Inqueriu Cassandra.
— Eu não sei quanto a vocês, mas eu vou entrar! Não quero morrer (de novo)! — Nisso o vampiro pulou para dentro do carro, isso parece ter impulsionado ao resto do grupo a segui-lo rumo ao desconhecido...
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