06 - Espólios de Guerra
Betina e Levi decidiram levar o relacionamento ou seja o lá o que tinham da maneira que dava. Havia cumplicidade, havia sentimentos, de vez em quando uns beijos e amassos. Nada além disso. E ela o respeitava.
Eles não contaram para ninguém, embora alguns desconfiassem que havia algo mais entre eles. Era a maneira que tinham de se proteger.
Naquela manhã normal do ano de 845 eles saíram para mais uma expedição além das muralhas. Betina havia finalmente aceitado ser capitã e tinha seu próprio esquadrão. O objetivo era o mesmo, explorar as áreas ao redor das muralhas em buscas de recursos e eliminar o máximo de Titãs possíveis.
Para evitar qualquer contratempo, Betina e Levi saiam sempre de lados opostos.
-Capitã, tem um de 10 metros a frente! - Ernest, um dos integrantes de seu esquadrão anunciou.
Betina atirou com uma arma de fumaça. Fumaça vermelha indicando perigo. Era a forma deles se comunicarem em meio ao campo de batalha.
Betina se equilibrou no cavalo ainda em movimento e usou o dispositivo de manobra para se locomover e deu a volta no grandalhão que tentava acertá-la e rapidamente acertou a nuca do monstro que caiu desfalecido.
A nuca era o único ponto fraco.
-Vamos continuar com a formação! - Ela disse retornando ao cavalo.
Ela observou uma das soldadas a sua esquerda com os olhos arregalados em puro terror.
-Mirna! Fique atenta!
-S-sim senhora! - A garota mal terminou de falar, um titã pegou a garota numa velocidade absurda.
-Um anormal! - Ernest disparou fumaça preta.
Betina voou em alta velocidade e cortou a mão do bicho que segurava Mirna, Kristoff, um terceiro membro resgatou a moça.
Betina golpeou o titã que caiu para trás. Ela foi até a garota resgatada que estava em choque.
-Mirna! - Ernest chamava a moça pelo nome.
-Está em choque. - Betina disse ao perceber o estado da jovem. - Leve ela com você até a equipe médica, Kristoff leva o cavalo dela, vamos voltar.
-Sim, capitã!
Eles estavam voltando quando Ernest se atentou a algo.
-Capitã, aquilo lá na direção das muralhas... É fumaça?
Betina estreitou os olhos. Uma enorme nuvem de fumaça vindo a muitos quilômetros de distância.
-É fumaça... será algum incêndio? Um titã nas muralhas? Vamos comunicar ao Erwin.
Eles cavalgaram até o encontro de Erwin que organizava os pelotões de volta para a Muralha.
-Erwin! Você viu? - Betina apontou para as muralhas.
-Fumaça, está vindo das Muralhas... - Erwin olhou Ernest colocar Mirna na carroça ainda em estado de choque. - O que houve com ela?
-Foi pega por um titã, consegui tirar a tempo... mas...
-A mente dela já era. - Erwin concluiu a frase.
Eles seguiram todos de volta para as Muralhas quando foram chegando perto perceberam que havia algo errado.
-Merda... - Erwin disse aflito.
Eles pararam a alguns metros da muralha. Titãs estavam entrando sem parar por um enorme buraco feito nos portões.
-A Muralha foi perfurada.
O rosto dos soldados era de pura surpresa e horror. Depois de 100 anos a Muralha foi invadida. As muralhas eram muito longas para serem vigiadas por inteiro. Os topos das Muralhas eram protegidos por canhões montados em trilhos que podiam disparar ao aproximar Titãs. No entanto não tinha tanta eficácia devido as habilidades de regeneração dos Titãs e a falta de precisão. Para facilitar cada Muralha tinha 4 cidades sem sua periferia conhecidas como Distritos. Os Titãs eram atraídos para grandes concentrações de pessoas, com os distritos a humanidade podia concentrar suas defesas nesses distritos e repelir os Titãs com mais eficácia. Os distritos da Muralha Maria foram considerados os piores lugares para se viver, porque estavam sob maior risco de invasão.
-Minha família... - Kristoff disse em pânico. - É de Shingashina.
-Não entre em pânico, Kristoff. Vamos ver o que aconteceu. - Betina tentou acalmar o soldado.
O que aconteceu, foi um verdadeiro caos. Um titã de 60 metros de altura surgiu por cima das muralhas e arrebentou o portão e um outro terminou de danificar e invadir. Eram o Titã colossal e o titã blindado. Com a derrubada, milhares de pessoas morreram com a entrada de Titãs menores. Várias pessoas foram obrigadas a fugir e se abrigar na muralha Rose.
O desespero ficou estampado na cara das pessoas. A segurança e confiança depositada em 100 anos terminou em questão de segundos.
Em meio aos escombros uma garotinha de cabelos avermelhados chorava sobre o corpo da mãe esmagada por um dos pedaços da muralha. A menina de aparentemente 10 anos de idade chamava pela mãe insistentemente, quando um dos soldados a pegou pela mão.
-Venha menina, sua mãe já está morta.
-Não... - às lágrimas brotavam no rosto da garota.
-Qual seu nome?
-É... Ygritte.
-Venha Ygritte, vamos para um local seguro.
A correria por salvação, o tumulto. Enquanto isso os Titãs e entravam sem parar. Só havia um portão de fuga para todo o distrito. Fugiram em barcos pelo canal até a Muralha Rose. 10 mil pessoas morreram, aproximadamente.
Os desabrigados foram levados para um barracão improvisado. Milhares de pessoas sem lar e sem família. Ygritte caminhou sozinha e encostou num canto.
-Você... também perdeu sua família? - Um garotinho loiro de grandes olhos azuis disse pesaroso.
-Sim... minha mãe.
-Nós também perdemos tudo. - o menino disse triste. Ela observou o trio. Um garoto de olhos verdes, o menino loiro e uma menina de olhos escuros e cinzentos que ela nunca havia visto na vida. - Qual o seu nome?
-É... Ygritte.
-Eu sou o Armin, estes são Eren e Mikasa.
O garoto de olhos verdes Eren mantinha o olhar fixo em algum ponto do cômodo, como se estivesse imerso em seu próprio mundo. A garotinha, Mikasa, estava enrolada em um cachecol vermelho e apenas acenou com a cabeça.
Eram inúmeros refugiados, milhares. A comida que já era escassa para os moradores da muralha Rose, iria ficar ainda mais dividindo com os refugiados.
Ygritte segurou o pedaço de pão mais duro que uma pedra. E chorou ao se lembrar de sua família.
Os refugiados foram designados para o campo para cuidar do plantio e colheita. No ano seguinte, 250 mil refugiados foram enviados para a recuperação da Muralha Maria na intenção de controlar a escassez de comida. Destes, apenas 20% sobreviveu. Um sacrifício, que controlou a falta de comida na Muralha Rose.
Ygritte estava tentando sobreviver sozinha naquele mundo. Tudo era estranho e diferente, não haviam amigos, nem um lar e nem tampouco um lugar fugir.
-Vejam, a divisão de Reconhecimento! - alguém disse ao ver um pequeno grupo se aproximar.
-Vieram trazer comida!
-Graças a Deus.
Ygritte se apertou entre as pessoas e viu o pequeno grupo. A capa verde com a insígnia das Asas da Liberdade.
-É uma mulher... - Ygritte disse a si mesma.
A mulher era alta tinha olhos verdes e intimidadores. Ela estava a frente dos demais que a acompanhavam e eles a chamavam de capitã.
Ygritte tinha os olhos brilhando. Nunca havia visto uma mulher tão bonita e com uma presença tão marcante.
A mulher desceu do cavalo e disse com uma voz que Ygritte não tinha ouvido em outro lugar. Era grossa e suave ao mesmo tempo, quase como uma melodia.
-Kristoff vamos descer os suprimentos.
Ygritte ficou olhando para a mulher. A capitã percebeu e se aproximou da garota com um pedaço de pão.
-Aqui. Para você.
-O-obrigada.
A mulher sorriu e foi se afastando. Ygritte correu até e tocou sua capa.
-Senhora? Como... - Ygritte estava com os olhos marejados. - Como eu faço para ser como você?
-Ser como eu? - A mulher pareceu surpresa.
-Sim. Forte e destemida. Eu quero entrar para o reconhecimento!
-Bom... - Ela se abaixou e olhou para os olhos dela. - o reconhecimento não é lugar fácil. Na verdade, é o último lugar que qualquer pessoa quer estar.
-Eu quero lutar e ser mais forte, não quero perder mais ninguém...
A mulher deu um longo suspiro. E depois disse calmamente.
-Então, seja forte. Lute. E não desista nunca. Foque no que acredita e abrace esta causa com todas suas forças!
-E qual seu nome? Capitã?
-É Betina. Betina Drachen.
Ygritte ficou olhando Bettina se afastar. A mulher mais forte e destemida que ela havia conhecido até então.
O tempo passou. Já havia se passado 2 anos desde a queda da Muralha Maria. Ygritte resolveu entrar para a academia de Cadetes do exército. A 104° tropa de cadetes. Lá ela viu alguns rostos conhecidos como o trio daquele dia.
Todos ali tinham suas motivações, seus sonhos. O comandante responsável pelos cadetes era Keith Saids e de cara Ygritte percebeu que não seria nada fácil.
Ygritte estava na varanda observando uma garota correr exaustivamente.
-A garota da batata ainda está correndo? - Armin disse se aproximando de Ygritte.
-Sim. O comandante ficou bravo mesmo com a história da batata.
-Ela ficou mais chateada por ficar sem as refeições do que por correr. - Um outro garoto de cabeça raspada, Connie Springer disse sorrindo.
-Você é de onde, Eren? - Connie perguntou. Ygritte nem tinha visto Eren se aproximar.
-Sou de Shingashina, assim como o Armin.
-Você também é não é? Ygritte. - Connie perguntou a ruiva
-Sim.
-Vocês estavam lá? - Connie perguntou curioso.
Um filme passou na cabeça de Ygritte, Armin e Eren falaram algo, mas ela não ouviu. Sua mente estava no dia da queda da Muralha.
Depois disso ela entrou para dentro e viu a garotinha daquele dia. Agora também já crescida, Mikasa.
-Ah, oi Mikasa! - Ygritte tentava disfarçar, mas desde o dia que a viu, se encantou por ela. Um sentimento estranho e confuso. Talvez fosse admiração pela força absurda dela, mas quem sabe ao certo o que o coração de alguém guarda.
-Oi. Você viu o Eren? - Mikasa perguntou. Era sempre ele. Sempre ao redor dele como se ele fosse a única razão dela viver.
-Está lá fora.
Ygritte viu Mikasa se afastar. Ela não tinha olhos para outra pessoa. Infelizmente para ela.
Treinaram juntos por dois anos. Alguns desistiram no meio do caminho e resolveu seguir no campo. Havia 3 divisões que podiam escolher.
Os dez primeiros colocados podiam ir para a polícia Militar. Eles ficavam somente no interior das Muralhas servindo ao rei. Eles nunca saiam ou enfrentavam Titãs. Apenas uma vida tranquila e pacata. Ainda tinha a divisão de Guarnição que ficava nas Muralhas e o Reconhecimento.
O treinamento foi duro, mas Ygritte não desistiu.
No refeitório todos conversavam suas classificações, Eren havia sido bem classificado, porém escolheu O Reconhecimento. Ninguém entendia como alguém iria querer sacrificar suas vidas. Mas, Ygritte entendia bem o sentimento.
O Reconhecimento passou os últimos anos ajudando a levar mantimentos para os refugiados. E depois de um tempo foram voltando a realizar missões além da Muralha.
Neste meio tempo, Levi escolheu a dedo um novo esquadrão. Dentre eles, uma soldada chamada Petra Rall. Uma ruiva baixinha de quem Betina não gostava muito.
-Por que ela tem que ficar grudada nele? - Betina disse a Hange enquanto se sentava a mesa para jantar.
-Precisa controlar seu ciúme. Não era pra vocês serem discretos?
-Estou cansada disso... eu sei que não somos pessoas normais. Mas, seria tão bom pelo menos fingir uma vida normal de vez em quando.
-É do Levi que estamos falando.
-Olha só pra ela! Ela tem quase a mesma altura que ele. Deve ser até mais baixa. Toda meiga.
-Tome uma cerveja e relaxe um pouco. Ele não vai gostar de saber do seu ciúme.
-Não. Valeu. Eu vou deitar. Boa noite.
-Boa noite.
Hange viu Betina sair emburrada. Ela realmente mudava quando o assunto era Levi.
Levi e Betina ainda mantinham o estranho relacionamento apesar dos pesares. A morena aprendeu a amar o que havia de melhor em Levi, mas, ainda assim era complicado.
Betina seguiu para seu quarto e se jogou na cama. Ficou pensando em como viveram nos últimos anos. Como as pessoas estiveram apavoradas. Estava imersa em seus pensamentos quando cerca de meia hora depois ouviu alguém bater na porta.
Ela levantou meio preguiçosa e foi ver quem batia aquela hora.
-Levi... - Ela disse ao ver o baixinho parado na porta.
-Por que você saiu daquele jeito? - ele tinha a mesma expressão meio monótona meio brava de sempre.
-Eu... só estou cansada... - ela tentou disfarçar.
-Mentira. É forte como uma égua, muito difícil de acreditar. Tenta outra.
A sinceridade e acidez de seus comentários era algo que ela estava se acostumando.
-Não é nada...
-Vou entrar. - ele disse fazendo ela dar passagem para ele entrasse no quarto dela.
Ele entrou deu uma olhada na cama meio desarrumada e não disse nada, mas pela expressão, Betina sabia do que se tratava.
-Eu levantei atrasada... - ela tentou se justificar.
-Enfim, falaremos dos seus hábitos ruins outra hora. - ele sentou-se na cama dela e depois disse calmamente. - Eu te conheço a bastante tempo, achou que eu não perceberia seu ciúme da Petra?
-Não seja bobo. - ela desviou o olhar.
-E é mentira? - ele manteve o olhar fixo nela.
-Eu não estou com ciúmes. Não tem nada a ver.
-Betina, você me prometeu que seria profissional. Que não misturaríamos nosso trabalho e nossa relação.
Betina mordeu o lábio inferior com raiva e disse chateada.
-Eu não misturo. Mas, daí ela ficar grudada em você o tempo todo me irrita. As pessoas dizem que ela é a fim de você!
-Betina, insegurança não combina com você. Embora eu saiba o porquê disso tudo.
-E o que você acha que é? - Betina disse cruzando os braços.
-Acha a Petra mais compatível comigo. Porque ela não é mais de um palmo mais alta do que eu.
Betina ficou visivelmente irritada e pisou duro até a porta e abriu violentamente
-Sai. Não quero mais falar com você.
Ele se levantou, tocou a maçaneta e fechou a porta. Cruzou os braços diante dela e ficou encarando Betina em silêncio. Depois disse calmamente.
-Não seja boba. Eu nunca disse que sua altura me incomodava.
-Ela é fofa, delicada... - Betina disse com a voz baixa.
Ele tocou os quadris dela e a aproximou dele, depois tocou a segurou pelo pescoço e encostou a testa na testa dela.
-Não diga bobagens.
Ela fechou os olhos e depois disse com a voz embargada.
-Algum dia, você me deixará te amar por completo?
Ele abaixou o olhar e depois disse
-Só mais um pouco de paciência. Tá?
Ela sentou-se na cama e ficou olhando da janela pensativa. Ela sentia como se eles não tivessem um relacionamento completo. Pareciam mais amigos.
Ele se aproximou dela e tocou o rosto dela para que olhasse para ele.
-Eu... nunca disse pra você. Eu, nasci e cresci no subterrâneo, lá é um lugar imundo, esquecido da humanidade. A minha mãe... - ele fez uma pausa. - Minha mãe era uma... prostituta. Ela ficou doente quando eu era criança, e lá embaixo não tem recursos, nem remédios ou dinheiro. Ela morreu sozinha, a míngua. E... eu fiquei lá. Com ela, eu nem sei por quanto tempo. Até que um cara me achou e me levou para viver com ele. Kenny. Aprendi tudo que sei com ele, aí ...ele também me abandonou.
-Eu... não sabia disso. Me desculpe.
-Não. A culpa não é sua. É a vida. Eu criei um verdadeiro asco por sujeira. Parece que quando eu limpo tudo, me sinto melhor. Me sinto longe daquele lugar . Daquela vida.
Betina ficou comovida. Não sabia de nada disso e se sentia mal por não tentar compreender o lado dele.
-Eu posso te dar um abraço? - Ela disse abrindo os braços.
-Pode.
Ela abraçou Levi fortemente. Depois que ela soltou o abraço ele perguntou.
-Você tem família? Nós nunca falamos sobre isso.
Betina abaixou a cabeça e ficou pensativa por um bom tempo.
-Não.
Ele não perguntou mais nada. Betina nunca dava informações completas. Era como se escondesse algo e ele tinha certeza que Erwin sabia.
-Eu vou para meu quarto. - Ele disse encerrando o assunto.
-Não quer ficar?
-Você sabe que eu nem durmo direito.
-Ta ficando pior? - Ela perguntou pesarosa. - A insônia?
-Os pesadelos são piores. - ele manteve olhar triste. - Boa noite Betina.
-Boa noite.
Ela viu o baixinho se afastar e ficou pensativa. Cada nova expedição ele dormia menos. Ele podia tentar ser uma pessoa fria e dura, mas no fundo ela sabia o quão emotivo ele era.
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