O Segundo Passo
Bom, vamos lá.
Como eu disse antes, esse Passo consiste em, resumindo, superar as expectativas. Claro que percalços são inevitáveis, tal como a Trish, mas podem e DEVEM ser contornados.
Querem saber como irei sair dessa saia justa?
Parece algo bem difícil não é? Ainda mais tendo os olhos sagazes de Candice perfurando a minha nuca até chegar no meu amigo de baixo e fazer ele perder toda empolgação recente. Ela está apertando meu saco sem nem usar as mãos e, temos que concordar, está conseguindo lindamente. Sequer olho para trás.
Contudo, o Manual dos Sacanas, no capítulo da página trezentos e quarenta e cinco, ensina algo sobre dez formas de lidar com situações indesejadas. Acreditem, não é a primeira vez que estou no meio de duas mulheres que me questionam, a diferença é que pelo menos estas não saíram na porrada como as outras.
Mulheres, nunca lutem fisicamente por causa de um homem. É absolutamente ridículo que fiquem brigando por um cara que possivelmente é que vos enganou. O que não é o caso de momento, essa minha vizinha é que tem os miolos fora do lugar.
Mesmo sendo um Sacana, as folhas amareladas ensinam que primeiro é preciso dosear qual das duas é a mais importante. Se um homem se mantiver calado ao ser apanhado em flagrante, então ainda não definiu a sua prioridade. Se isso acontecer, então aconselho as duas a pularem fora de imediato.
É ainda muito menos imprestável do que possam imaginar.
Mas... Se já tiver bem definido quem é que precisa manter ao lado, então a regra é única e simples: A verdade, sempre a verdade.
Não fiquem admiradas, nós os Sacanas também sabemos evitar mentiras quando necessário, até porque tudo o que uma mulher quer além de ser bem tratada, é de um homem que fala a verdade. Por mais dolorosa que possa ser! Aí ela vai dizer sempre a famosa frase "ah, mas pelo menos ele foi sincero." Acreditem, raramente falha.
Eu pessoalmente nunca tive um namoro sério e como já disse também nunca fiz promessas erróneas a ninguém, apenas deixei que captassem aquilo que queriam e fui puxando a corda. Na hora H ao ser interceptado por uma situação similar a que decorre, tudo o que fiz foi lembrar que não devia nada a nenhuma delas.
Traições não deveriam, mas elas são comuns. Romantizá-las é errado, mas o número de pessoas que dá uma segunda, terceira ou milésima oportunidade é enorme. Prefiro não julgar, mas se puderem, caiam fora na primeira vez. Também acredito que todos merecemos uma nova oportunidade, não somos perfeitos, mas lembrem-se de não aceitar menos daquilo que possam receber, pois a pessoa que te quiser, irá fazer por valer.
Sempre.
A chance da pessoa que te traiu uma vez, trair a segunda, é de nove em cada dez.
— Desculpa... — Trish finalmente olha por cima do meu ombro e vê Candice parada atrás de nós. — Eu não sabia que estava acompanhado.
— Pensei que viesse se juntar a nossa pequena festinha. Só não sei se ele aguenta. — Lá estava aquela cientista maluca se colocando num degrau acima do esperado. A voz de Candice está calma, não parece furiosa ou sequer dá ao gosto da outra se sentir uma possível vencedora. Esta sabe muito bem jogar.
Agora acompanhem:
— Não sabia que eu estava acompanhado? — Levanto o sobrolho e me afasto como se tivessem anunciado que a gripe das aves chegou com a minha vizinha. — Mesmo que não estivesse... Desde quando teve a liberdade de aparecer na minha casa dessa forma?
Se eu pudesse, sairia fazendo a dancinha da vitória agora. Não olho para Candice, mas posso imaginar a cara dela, meio desconfiada e um quanto atenta.
— Eu...
— Olhe, Trish. Não posso e não devo falar do passado aqui porque é algo que irei respeitar, até porque não sou nenhum piralho e muito menos ingénuo. — Estou dançando. Estou dançando. — Mas veja bem, nunca cruzamos fronteiras como a que acaba de tentar ultrapassar. Deixando não só a mim, mas a minha convidada, um quanto emabaraçados pela situação. Não imagino o que pode ter dado em você.
— É que nos vimos lá em baixo no ginásio e você foi tão simpático, então pensei que... — Trish está envergonhada. Eu não queria vê-la assim, mas foi ela que se colocou nessa situação, e era a sua cabeça ou a minha. Lamento informar, mas... prioridades.
— E por que razão eu não seria simpático com você? — Encolho os ombros ao de leve. Candice ainda está quieta. — Não sou nenhum homem das cavernas.
— Mesmo que pareça. — Ela diz. Estava melhor calada.
— Não vou mais atrapalhar. Com licença. — A minha vizinha está querendo cavar um buraco para se esconder e eu iria ajudar de bom grado. Até colocaria uma flor por cima para enfeitar.
— Olhe, Trish... — Chamo e minha voz sai mais grave. — Não se preocupe. Está tudo bem.
Ela confirma com a cabeça, acena para Candice e sai do apartamento na mesma velocidade que entrou. Agora era um para um, por isso giro lentamente e apanho um choque ao perceber que a atrevida ainda está de busto fora!
Muito mais ardilosa do que parece.
— Lamento pelo ocorrido. — Começo por dizer. Lembrem-se, a verdade, sempre a verdade! — Sem querer entrar em detalhes, acredito que é inteligente o suficiente para compreender. Infelizmente nunca fui nenhum santo e não tenho como prever esse tipo de situações.
— Se ela tivesse chegado um tempo depois de eu ter ido embora, vai dizer que não a teria recebido na sua cama? — Os olhos rasgados me encaram quase sem piscar.
Faço uma cara falsa pensativa.
— Iria depender da sua performance! — Tufa!
Ela abre os olhos mais do que consegue e aperta os lábios.
— Se eu fosse embora logo após de ter estado com você, é porque é a sua que teria sido bem fraca. — Finalmente responde e eu desato rir. — Já agora, belo batom. É o Rose Perfecto da Givenchy?
— Não sei... — Respondo e limpo o meu rosto onde as marcas dos lábios da minha vizinha provavelmente estavam. — Gostou? Depois pergunto a Trish para você.
Toma!
Estou rindo de novo.
— Seu imprestável! — Candice caminha na minha direção e bate no meu peito. Está irritada, por muito que tentasse disfarçar, posso ver as labaredas que dançam nos olhos escuros. Por muito forte que uma mulher possa ser, fica sempre incomodada ao ver outro cachorro mijando na sua árvore.
Cada um com o seu território, não é?
— Ei! — Seguro as mãos dela. — A vida é curta demais para desentendimentos de longo prazo. – Parafraseando Elon Musk.
E então ela me lança aquele olhar meio perigoso, não do tipo ameaçador ou algo assim, mas que me avisa que devo recuar. Os olhos escuros quase se descortinam, mostram aquela menina lá dentro que está habituada a ser forte a todo momento, a se proteger do mundo e a lutar contra tudo e todos, sozinha. Aquela menina que precisa de colo de vez em quando porque é humana, mas todos a vêem como a Mulher Maravilha.
Eu me familiarizo com essa situação. Por isso, recuo. É um ato involuntário, até porque tenho em mente que Candice é uma Requisição e isso não pode sair do controle. Não quero que ela se abra para mim e me conte seus segredos, seus medos e seus anseios. Seria arriscado demais, pois não teria condições para devolver.
Não presto. Não prestarei. E nem pretendo prestar.
Ela é meu bilhete para Aida Podolski.
— Quer que eu leve você para casa? — A pergunta escapa de meus lábios. Sexo por sexo. Outra coisa não estou nada a fim.
— Claro. — Finalmente se solta dos meus braços e se afasta para ir até a estufa se vestir. Prefiro que pense que a estou respeitando, e não que estou com receio de a magoar. Essa constatação é chocante, bem pior que o final dos Vingadores – Guerra Infinita.
Candice volta arrumada e procura por suas coisas. Faço o mesmo e em pouco tempo, estamos os dois prontos para sair. Mesmo calados consigo sentir a respiração lenta ao meu lado quando entramos no elevador, o calor que transmite – mesmo sem querer – para mim, e a nossa sintonia que paira por cima de nossas cabeças. É como se estivéssemos nos amaldiçoando em simultâneo por tudo aquilo ter começado a descarrilar.
— Não se esqueça da nossa viagem. — A recordo quando nos acomodamos dentro do carro.
— Enviarei informações logo cedo.
— Ficarei a espera.
Dirijo pelas ruas, as músicas tocam sem parar, aprecio o dia brilhante que se espelha do lado de fora, mas ainda dá para sentir o quanto estamos tensos. A casa dela parece uma daquelas dos cientistas dos filmes de terror com muros altos que escondem as pesquisas sombrias que ocorrem lá dentro.
Estou mentindo.
Contra todas as probabilidades é muito grande sim, mas bem acolhedora, com um jardim na parte frontal e muitas janelas. De longe dá para perceber que é um lugar familiar e um lar completamente feliz. Quase tenho vontade de entrar.
— Não lhe disse onde vivia. — Candice ressalta.
— Você é a senhorita Cotton. É fácil descobrir seu endereço.
— Você é um louco.
— Disse a cientista maluca.
Ela finalmente ri e abre a porta quando paro o carro em frente aos portões. A ideia de entrar morre na hora que vejo a pestinha da Thandiwe correndo nos gramados diante de uma mulher mais velha que está sentada numa cadeira de descanso.
Quando penso que vai se despedir com um simples "adeus", sou como sempre apanhado de surpresa com um beijo bem molhado. A língua atrevida invade meus lábios sem hesitar, e sou sugado de um jeito que perdi a noção do tempo. Essa mulher pensa que me confunde, mas isso, minhas queridas, é ela agradecendo por eu ter sido o mínimo verdadeiro.
As mulheres raramente pedem muito para deixar um homem entrar dentro do seu coração. Eles é que são tolos demais para ousarem acampar prometendo sentimentos incapazes de cumprir e fugir na hora de fazer moradia.
Dica: Não cultivem terrenos para quem é nómada!
— Tenha uma boa viagem, senhor Steel. — Pisca o olho e pula para fora do carro. Os portões se abrem e fico atento a cada movimento seu, a forma como a sobrinha corre quando a vê e a abraça, mas depois mexe o pequeno pescoço para o lado e tira a língua de fora quando me encontra.
Peste!
Acelero para fora dali, preciso chegar a tempo do almoço com minha mãe e organizar certas coisas. Principalmente os meus pensamentos que se desgovernam como uma pessoa que está aprendendo a andar de bicicleta. Aida Podolski quer a fórmula científica e para isso quer que me case com Candice. Eu não quero me casar e para ter o que a Procuradora precisa, tenho que roubar seus sentimentos muito antes dos três meses estipulados. Então por que a ideia de magoar aquela jovem mulher me pareceu tão ruim? Desta vez era eu ou ela e, talvez, precisasse de redefinir minhas próprias prioridades.
Meu telefone toca e ao ver o nome de Virgínia na tela, a coloco em Viva-voz.
— Senhor Steel? — Está com a voz rouca. Céus!
— Pode falar.
— Desculpe estar incomodando, é que não sei mais com quem falar.
— Já tentou com sua mãe, sua amiga ou seu gato? — Resmungo. Não quero virar conselheiro amoroso. Longe de mim.
— Só o senhor sabe o que está acontecendo e me compreende tão bem. Nunca tive uma pessoa que me dissesse as coisas de forma tão direta. Estava precisando do choque de realidade.
— Se já sabe isso, então por que me ligou? Pode poupar os agradecimentos.
— Ah, senhor Steel. — A minha secretária solta um suspiro. — Eu chorei bastante, mas não consigo deixar de me perguntar por que os homens preferem enganar tanto?
— Duvido que Beau a tenha enganado. — Isso sem querer defender o meu irmão.
— Não com palavras, mas atitudes também contam. Ele me fez sentir como se eu fosse a única flor do seu jardim. Compreende?
— Não — retruco. — Até porque você alguma vez viu um jardim com apenas uma flor?
Virgínia tem um ataque de riso do outro lado do telefone.
— Saia da cama, lave essa sua cara que deve estar horrível e... — Uma luz se acende na minha cabeça. — Se arrume. Vou arranjar um encontro para você.
— Um encontro?
— Sim. Não para sair beijando ou fazendo oba-oba. Apenas para conversar com outra pessoa e beber uns copos. Dizem que não, mas o coração também precisa de umas doses de álcool em suas feridas.
— Eu...
— Confie em mim. Quando foi que lhe decepcionei?
— Deveria ter sido o senhor. Pena que o seu irmão é mais bonito! — Ordinária! Como ousa desdenhar de quem está ajudando? Mas a verdade é que dessa vez até rimos juntos.
Logo que chego em casa da mamãe, vejo Ivy escorado no sofá a jogar na Play Station e quase tenho um vislumbre dum passado muito distante na minha vida, mas parece que para ele nada mudou.
— Boa tarde. — Murmura sem olhar para mim.
— Ainda não deu meio-dia. — Encaro o relógio e ele dá de ombros.
Beau surge da cozinha, os olhos azuis me perscrutam por inteiro.
— Que cara é essa de quem não transou? — O sacana me pergunta e me dá uma das cervejas que trazia na mão.
— Na verdade, preciso de colocar alguns pontos nos i's. — Digo espreitando para a porta da cozinha onde oiço dona Amanda cozinhando enquanto cantarolava alguma coisa. Ela ficava feliz por nos ter todos ali reunidos. — Primeiro preciso do contato da sua última Requisição, Ivy. O homem que você comeu a mulher.
— Para quê? — Ele aperta os botões do comando e sequer me encara.
— Para lhe dizer que você não fará mais parte dos Sacanas Profissionais. Está banido por tempo indeterminado. O Manual não terá a sua parte nas últimas folhas, não até você se endireitar. — Falo, e vejo Beau cuspir a cerveja enquanto Ivy finalmente para de jogar.
Eles sabem o que aquilo significa para um membro da nossa família. Desonra.
— E preciso do contato direto de Gian Carlo Solidari. Tenho um encontro para ele esta noite. — Adianto para Beau que me olha um bocado confuso. — Precisamos nos redimir do espetáculo que nosso queridinho deu no seu evento. A Star Party precisa limpar essa nódoa.
— Encontro? — Beau ainda nem se sentou.
— É com a Virgínia Smith. Não que eu seja um casamenteiro de primeira, mas acho que pode ser uma amizade que possa reunir frutos. Todos sabem que Solidari é um homem extremamente solitário.
— Está vendendo nossa secretária? — Meu irmão estava mais curioso do que preocupado. Conheço a peça para saber que pouco se importava.
— Estou lhe dando possibilidades melhores do que um idiota como você.
— Desde quando se preocupa?
Desde que entrei no Segundo Passo. Praticar com exatidão sobre o que as mulheres precisam, me fizeram compreender por que o meu avô tinha decidido como regra que deveríamos nos aposentar aos trinta e cinco anos. A maturidade está mais intrínseca nessa altura mesmo que não nos apercebamos.
— É a cientista que estava com ele na festa, só pode. — Ivy ainda está pálido, mas os olhos escuros e malandros indicam que sabia que em menos de três meses, Beau estará na liderança dos Sacanas, e o poderá restituir sem que eu possa argumentar.
— Cientista? — Dona Amanda entra com uma travessa cheia de aperitivos e os olhos brilham. — Será que Deus irá me abençoar desta vez? Meu primeiro filho se casando, sendo pai...
Ia a abrir a boca para refutar, mas a campainha toca e minha mãe sai correndo para abrir. Não sabia que estávamos esperando visita, mas a cerveja quase escorrega de minha mão quando vejo o diabo travestido de mulher entrar.
Era Aida Podolski, em veneno e osso.
E era aquela maldita que segurava o meu segredo. Este que certamente iria voltar a assombrar a minha família.
E então? Preparadas para descobrir o segredo do Knox?
Já no próximo capítulo ele estará contando para a gente o que o atormenta. E saberemos bem por que a Aida quer tanto acabar com a raça dos SP. Heheheheeh. Sem mais delongas, estamos caminhando para a reta final.
Saudades do nosso sacaninha já. Parece que está acordando pra o amor não é? Ele ta todo enrolado.
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