Brincar com a inteligência
— Está me dizendo que você agora mora nesse buraco? — Chris pergunta quando estacionamos na rua escura em frente à minha casa, bem atrás da Mercedes preta antiga. — Sabe que pode voltar para o nosso castelo a hora que quiser, né?
A casa de Christian não é nada luxuosa, mas tem dois andares e fica num bairro residencial decente, que faz esse lugar de fato parecer um pulgueiro. Eu costumava chamar de "nosso castelo", mas eu não sou uma princesa, nem sou a boneca dele.
Sendo assim, não digo nada, apenas abro o portão que range alto e ele me segue para dentro do prédio.
— Só devem morar prostitutas e ex-presidiários nesse lugar, boneca. Você não devia estar aqui.
— Não é tão ruim — defendo.
— Não é tão ruim? — Ele acha graça enquanto subimos a escadaria escura, seguindo no meu encalço. — Se eu fizer uma batida aposto que levo para cadeia mais da metade dos seus vizinhos.
Penso no Kennedy. Se o Chris conseguiu enquadrar o Kyle só por olhar para mim, ele faria bem pior com o Kenny. Ele não pode descobrir sobre nós dois. Não quero que mais pessoas sejam prejudicadas por minha causa.
— Dá pra falar mais baixo? — Peço enquanto nos aproximamos do meu andar.
Ele assente.
Ouço uma porta se abrir e eu só penso "droga, por favor, não seja o mágico". Mas claro que não tenho tanta sorte. Viramos o último lance de degraus e eu dou de cara com ele.
— Barbara! — Kenny dá aquele sorriso dele. Está vestindo terno, provavelmente a caminho do Harvey's. — Uau! Você está... — Mas então se interrompe quando nota com estranheza o policial fardado ao meu lado. — E ele está aqui por causa das...
— Não! — Interrompo antes que traga à tona o tema das calcinhas. Na atual conjuntura, quanto menos o Christian souber da minha vida, melhor. — Chris é só meu... — Finjo um engasgo pigarreando. Não sei o que ele é meu. — Então te vejo por aí... até mais.
Puxo meu ex escadaria acima, sem dar chance para Kennedy responder.
— Quem é esse cara? — Christian indaga com um tom incisivo.
Eu enfio a chave na minha porta, abrindo rápido.
— Ninguém — minto.
— Já pedi para não brincar com a minha inteligência, boneca.
— O quê? — Finjo.
— Não mente para mim! — Grunhe. Segurando o meu pulso com força, ele me puxa para dentro de casa. — Quem é o cara?
— É só um vizinho, Chris! — Eu o encaro nos olhos para soar sincera. — Ele só me cumprimentou. — Coloco uma das mãos na gola do seu uniforme, mexendo com a sua imaginação. Digo com um tom sugestivo: — Relaxa.
Então ele afrouxa o meu pulso. Esboça o que é quase um sorriso. Escorrego minha mão com cuidado até pegar a arma enroscada no cinto. Sem aviso, puxo e aponto em direção ao seu peito, os braços esticados e o dedo no gatilho. Chris balança a cabeça, umedecendo os lábios grossos.
— Não brinca com fogo, boneca. — Ele pega a arma da minha mão com um movimento ágil. Torce o meu braço, me vira, e agora está nas minhas costas, me sufocando só um pouquinho. E é claro que o filho da mãe está excitado. — Você nem sabe como usar isso.
Tento me esquivar e ele segura com mais força.
— Quer brincar de policial e ladra, é? — Me provoca.
O cano gelado da arma desliza pelo meu rosto. Normalmente, teria um incêndio incontrolável acontecendo dentro de mim, lá em baixo. O Chris sabe bem como me provocar. Fico esperando por qualquer faísca de desejo, mas não acontece nada.
— Está machucando, Chris — reclamo.
Ele afrouxa a mão. Deixa a arma sobre o balcão, mas não me solta.
— Você não faz ideia da falta que eu senti de você — murmura.
Sua boca desliza úmida pela minha nuca. Suas mãos vão descendo pelo meu corpo: Pescoço, seios, cintura, até chegar no meu ponto mais frágil. E eu costumava gostar tanto disso.
— Chris, Chris... — Interrompo. — Por que a gente não vai mais devagar hoje, hein? Tem tanto assunto para colocar em dia.
Ele me vira.
— Relaxa. Você pode me contar tudo, boneca. — Vai descendo beijos pelo meu decote. — Logo depois que eu cuidar de você.
Não é como se a gente nunca tivesse transado antes. Pelo contrário, Christian era o único homem com quem eu tinha transado antes. E ele costumava me convencer a literalmente qualquer coisa usando os dedos. Ele era bom nisso.
Era.
Não que tenha perdido a prática, ele ainda é tão bom quanto costumava, eu é que já não sou a mesma. Quando ele me toca, faço o que eu faço de melhor: Fingir. Finjo que gosto. Finjo que gemo. E finjo que chego lá só para acabar com isso o mais rápido possível.
Brinco com a sua falta de inteligência, como quem brinca com uma marionete. Puxo as cordinhas, e dou tudo o que ele espera de mim: Prazer, carinho, dominação. Deixo ele acreditar que eu morri de saudade do seu toque afiado em cada dia que passei longe dele. Deixo se envolver pela ideia de que ele ainda é o único que já me tocou desse jeito. O único que vai me tocar.
Se quer saber, eu sou uma fraude sim, mas engano Christian Colvin como um patinho.
— Você não vive sem mim. Você sabe disso, não sabe, boneca?
— É claro que sei, Chris. — Deslizo a ponta do meu dedo pelo seu peitoral atlético. A pele morna, a minha mão gelada. É como ser sugada para o passado, só que eu não sinto nada. Nunca estive tão vazia. Acho que um pedaço de mim morreu nessa transa com ele. — O que vai acontecer agora?
— Não se preocupa, você está comigo. Sabe que enquanto a gente namorar, eu sempre vou fazer o impossível pra te proteger.
— Menos de você — murmuro.
— O quê?
— Disse que senti saudade de você — minto e ele acredita.
Depois que Christian dorme, eu me esquivo para fora da cama. Preciso tomar um banho. Me sinto suja. Ligo o chuveiro na temperatura morna, e a água escorrendo pelo meu cabelo se mistura com as lágrimas que escorrem dos meus olhos, lavando a maquiagem. Reclino-me com as palmas na parede, e a única coisa que eu consigo pensar é: Que merda eu estou fazendo com a minha vida?
Fico sob a água corrente por quase uma hora, até as pontas dos meus dedos se enrugarem, implorando por hidratação. Fecho o registro e envolvo uma toalha no corpo e outra no cabelo. À distância, ouço o som abafado do meu celular vibrando no sofá. Corro na ponta dos pés e pego o aparelho.
Chamada recebida de Dominique.
Olho para Christian, ele está apagado. Solta um resmungo baixo e se vira na cama. Com cuidado, me esgueiro para fora do quarto, sem deixar a porta bater. Somente enrolada na toalha, já estou imersa nas escadarias escuras quando deslizo para atender a ligação.
— Barbie, onde você está? — Minha amiga soa preocupada.
Eu solto um suspiro de alívio ao perceber que ela não está furiosa.
— Eu... tive um problema, Mini — invento o mais rápido que consigo. — Precisei sair do leilão às pressas. Está tudo bem?
— Estava preocupada. Uns policiais apareceram, levaram seu Dj detido. Pensei que você estivesse junto com ele.
— Não estava. Sinto muito ter ido embora.
— Tudo bem. No final arrecadamos um bom dinheiro. Devia ter visto a Jessica na passarela. Todo mundo parou para ver, e os lances estouraram!
— Ela foi!?
— Claro! Eu estou com ela agora, quer dar um oi, Jés?
— OI! — Ouço um grito da Jessica ao fundo.
— Oi! — Devolvo, surpresa por ouvi-las juntas. — Que bom que estão se dando bem, eu...
Ouço passos subindo a escada. Preciso pensar rápido.
— Barbie? Tudo bem?
— É só uma coisa... A gente conversa depois! — Desligo.
Antes que eu possa escapar para dentro da minha kitnet, sou impedida por um par de mãos que me pegam pela cintura. Viro para me defender, mas ele age mais rápido e me cerca na parede do corredor entre as nossas portas. Faz meu coração acelerar com a surpresa.
— Por que diabo você está sem roupa no meio do corredor, Barb...
Eu tapo a sua boca com as minhas duas mãos. Olho para a minha porta, assustada. O encaro, arregalo os olhos.
— Fala baixo, mágico.
Ele ri. Se livra da minha mão e chega pertinho do meu ouvido para dizer:
— Não devia andar sem roupa por aí. Você não sabe que nesse prédio tem um tarado que rouba calcinhas?
Eu rio baixo.
— Não estou usando calcinha pra ele roubar — rebato sussurrando.
Kenny dá um sorriso cheio de malícia. Se aproxima para me beijar, e a boca dele é tão beijável, mas eu simplesmente não consigo. Não agora. Não com a cabeça tão atordoada, e Christian Colvin dormindo há exatos cinco metros de distância daqui.
Se ele souber disso, ele vai ferrar o Kennedy. E só deus sabe o que vai fazer comigo. Então desvio discretamente.
— Está tudo bem? — Ken percebe a minha mudança de postura. Assinto em silêncio, olhando para a porta, um tanto nervosa. — Quem era o policial que chegou com você?
Desvio o olhar do dele.
— Meu... — pigarreio. — Namorado.
Ele franze o cenho.
— Desde quando?
— Desde... desde sempre, Kennedy.
— Eu não...
— A gente tinha terminado — explico. Não quero que ele pense que eu estava traindo o Christian com ele de propósito. — Agora a gente voltou.
— Entendi. — Kenny assente, visivelmente frustrado, mas não se afasta.
— Desculpa — me sinto na obrigação moral de pedir. — Isso entre a gente estava legal até, mas não vai rolar mais, Ken.
Ele aperta os lábios em um semi-sorriso. Parece decepcionado, mas sincero quando diz:
— Relaxa. Faz seu lance, Barbie. Eu não vou sair daqui.
Coloca uma mão na minha nuca, e se despede deixando um beijo longo demais na linha do meu maxilar. A respiração morna e a barba rala me causando todos os tipos de sensações. Quando se afasta, um pedacinho de mim vai junto com ele.
— Ainda somos amigos, né?
Eu não usaria essa palavra para definir a nossa relação. Definitivamente não somos amigos. Um amigo não me deixaria com a boca seca, ou com o coração tão acelerado, mas assinto, concordando com ele.
— Somos.
— Boa noite, Barbie — murmura.
— Boa noite, mágico.
Demoro cinco minutos recostada no corredor até ter coragem de voltar para dentro. Christian não acordou. Eu visto o meu pijama sem acender as luzes e arrumo um espaço para me aconchegar ao lado dele na cama estreita. Fecho os olhos e sinto os lábios mágicos de Kennedy tocando o meu rosto de novo, e de novo, e de novo.
Se eu conseguisse dormir, com certeza teria sonhado com ele, mas passo a noite toda em claro.
***
O coraçãoo fica como!!?
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