Capítulo 3

2182 palavras - Arco introdutório

Mais um dia de aula está acabando. Uma sexta-feira agradavelmente quente e ensolarada, porém não demasiada abafada. Cada um dos alunos em classe planejava o que fazer no final de semana comentavam uns aos outros sobre suas ideias em voz alta e em meio a risadas ou gritos espalhados, enquanto todos tentavam se manter refrescados como era possível, alguns abanando-se usando as mãos, puxando a gola da camisa frenéticas vezes, ou então esvaziando garrafinhas de água em longos goles. Todos, com exceção de Edan. Este batia os dedos na mesa, esperando impaciente o momento em que o sinal da escola finalmente tocasse, se preparando para levantar e sumir como se fosse um fantasma. Ouviu o toque se iniciando e já se levantava para ir embora, despercebido de todos os outros alunos que o rodeavam, com exceção de uma que o notou assim que se moveu.

- Ei! Aonde pensa que vai? – Anne o segura pela gola da camisa com a ponta do dedo.

- Para casa, é claro. – Responde, se virando para encará-la. Os dedos da garota deslizam lentamente para a frente da gola.

- Você não pensa em sair, ou fazer alguma coisa como todo mundo? – pergunta, virando um pouco o rosto e olhando a sala.

- Não. Eu prefiro ficar em casa deitado no sofá com a televisão desligada. Acho que é o melhor tanto para mim quanto para todo mundo. Infelizmente, não sou sociável. – Comenta, pensando se não havia exagerado, enquanto retira a mão de Anne da forma mais gentil que conseguiu, e continua a falar antes de seguir até a porta da sala. – Desculpe... Talvez outro dia...

Edan vestiu o capuz de sua camisa, deixando a escola em passos tímidos, quase como se temesse em ser notado por mais alguém a sua volta. A medida que andava, olhava de um lado ao outro cautelosamente para ter certeza de que não havia ninguém o observando, apesar de ao mesmo tempo imaginar que deveria ser quem mais chamava atenção por estar saindo da escola, usando um capuz em meio uma sexta ensolarada. Ignorou isso balançando a cabeça de um lado ao outro por uma vez, se sentindo no mínimo aliviado quando passou pelos portões da escola. Caminhou de cabeça baixa no mesmo caminho de sempre, decidindo em passar no mercado antes de seguir para casa de vez.

Melhor do que estava a rua, o mercado estava muito mais fresco, até mais do que estava esperando antes de entrar. Sentiu o alívio de encontrar o lugar sem muita movimentação, indo atrás do que estava querendo. Comprou pacotes e mais pacotes de lanches de micro-ondas, mini pizzas, hambúrgueres e outras mais carnes, várias das quais sempre ouviu falar que são de fácil preparo, sendo o único motivo para escolhe-las. Partindo finalmente para casa.

Quando chegou, foi recebido pelo silêncio e o frio de uma casa vazia. Olhou para a sala, vendo todas as cobertas que deixou espalhadas pelo sofá na noite anterior, o travesseiro jogado no chão, e o controle da televisão junto ao de seu game na mesa de centro que organizou para se entreter, mas desistiu assim que terminou de instalar todos os cabos, e ao lado do game havia de um pequeno vaso de flores. Bufou olhando para este cenário caótico que havia deixado para trás quando saiu para a escola. Tinha coisas a fazer, mas quando fazer?

Levou as compras a cozinha, guardando tudo na geladeira do jeito menos bagunçado possível, retirou as roupas da escola e colocou outras mais leves. Voltou a cozinha, escolhendo um lanche congelado e jogando na mesa, se preocupando apenas em retirar a embalagem plástica do sanduíche e jogando a caixinha com o plástico protetor no micro-ondas e deixou esquentando, pegou uma caixa de suco de uva junto com um copo no armário e partiu para a sala assim que o micro-ondas apitou. Ligou a televisão, apagou as luzes e se instalou no sofá ainda bagunçado, optando por apenas assistir televisão em mais uma de suas vãs tentativas de se entreter com qualquer coisa que fosse. Apesar de ser um dia ensolarado, a casa de Edan estava tão fria como um dia do mais pesado inverno. Pouco tempo se passou no sofá quando ouviu alguém tocando a campainha de sua casa. Hesitou um pouco, mas se levantou entre resmungos para abrir a porta. Parou em frente a porta, pensando quem poderia ser, questionou também se tinha que aparecer alguém logo quando estava instalado no sofá. Para sua surpresa quando abriu a porta, lá estava Anne do outro lado do portão, com uma cara pouco amigável. Ele se dirigiu ao portão e abriu, sendo forçado a recuar assim que Anne entrou.

- Por que saiu daquele jeito da escola? Não conversa mais com os amigos? – diz apontando o dedo no peito de Edan, o fazendo recuar mais do que já havia feito, aproveitando para entrar na casa do colega e fechar o portão com o calcanhar resultando em uma batida muito menos barulhenta do que era esperado. – Eu tinha a ótima ideia de chamar meus colegas de sala para dar uma volta, ou para tomar um único sorvete que seja, passar um tempo depois de uma terrível semana de aulas, mas uma das pessoas que eu iria convidar fugiu falando "eu não sou sociável", e o outro não poderia ficar muito tempo por precisar ter que ir para o trabalho. O que tem a dizer sobre isso?

- Ahn... Me desculpe? – responde olhando para o lado, como se buscasse uma resposta melhor.

- Só me desculpe? – questionou abrindo as mãos esperando por uma explicação, porém não obteve resposta do colega. Ele apenas trancou o portão e seguiu de volta para dentro de casa, Anne o seguiu, continuando a falar assim que entraram – E nem vai falar nada pra se justificar... Você é o pior. – Suspirando, Anne leva as mãos nos braços nus, tentando se esquentar. – Por que sua casa está tão apagada e fria?

- Eu não acho que esteja apagada, e não está tão fria... – Edan arqueia as sobrancelhas – Mas se quiser se esquentar, tem umas cobertas ali na sala, voc...

- Sério mesmo? Sai da frente, vou me esquentar agora! – diz enquanto empurra o rapaz na parede e correndo para a sala, jogando sua mochila no chão e pulando no sofá, se enrolando nas cobertas na hora. – Ah, que quentinho, agora está bem melhor. Olha só, tem até um lanche de micro-ondas prontinho na caixa. Estava me esperando, né?

- Na verdade, não... – responde, olhando suas cobertas em total posse de Anne, e seu lanche sendo devorado sem chance de conseguir evitar.

- Tenho certeza que sim, por causa de sua boa vontade em deixar um lanche preparado para mim, eu acho que posso te desculpar pelo que aconteceu mais cedo.

Edan semicerrou o olhar e abriu os braços, tentando entender o que Anne havia acabado de dizer. Se questionou se ela estava considerando isso como um pedido de desculpas.

- Essas cobertas já estavam quentes quando cheguei... – Anne aproxima as cobertas e parece sentir o cheiro delas – Você até cheira bem para um garoto de 15 anos.

- Que tipo de coisa você tem na cabeça? – resmunga consigo mesmo, se sentando ao lado da garota soltando um pesado suspiro. – Então, por que veio aqui em plena sexta-feira?

- Eu trouxe meus desenhos. – Pela expressão e sorriso que a garota fez e seu tom de voz, Edan sentiu como se Anne conseguisse ver sua alma. Isso o fez sentir um calafrio. – Era pra eu ter mostrado na escola, mas como um certo alguém saiu tão rápido para voltar ao seu abismo escuro e frio, não tive tempo nem de lembrar de comentar. Por isso estou aqui.

O rapaz olhou de um lado ao outro, começava a suar frio. Na verdade, sequer lembrava que a garota desenhava. – P-Pode me mostrar então... – Fingiu uma tosse para se recompor, e então continuou, ligando a luz – Onde estão?

- Estão ali na minha mochila – De um segundo ao outro, ela mudou novamente para a mesma garota de jeito e voz meiga de antes.

"Que rápida mudança de humor" foi o que pensou dizer desistindo logo em sequência, enquanto observa Anne tentando alcançar sua mochila, mas sem sair das cobertas. Vendo tal cena, Edan suspira pesadamente por ter que fazer isso, pegando a mochila da garota – Seria mais fácil se você se levantasse e tentasse pegar de verdade.

- Besta, me deixa. – diz sorrindo, abrindo sua mochila e retirando um fichário, com vários adesivos colados – aqui estão meus desenhos.

Edan começa a folhear, observando atentamente cada traço feito. Fez um rápido olhar para Anne, que ficou de olhos fechados, como se estivesse se concentrando em algo. Terminou de observar tudo, e os organizou na mesa. – É, você desenha muito bem.

- Há quanto tempo você parou? – A garota pergunta de repente

Sem saber como reagir após tal pergunta, Edan questiona – Do que está falando?

- A quanto tempo você parou de desenhar? Eu percebi quando entrei no seu quarto... – Anne o encara de maneira séria – Pela poeira nos móveis e nos desenhos na parede, você não entra lá já faz muito tempo...

Edan olha para baixo, avaliando o olhar clinico de Anne. Imaginou como deve ter sido fácil para ela deduzir. – É verdade... Parei de desenhar a uns 7 anos...

- E por que? – Anne se ajeita melhor no sofá, observando o rapaz.

- Depois daquilo... – Edan engole o que estava prestes a dizer, passando o dedo no pescoço. Ele recebe o olhar curioso da garota, tentando mudar o que iria falar do jeito que evitasse o máximo de detalhes possíveis para Anne. Não tinha vontade que ela se intrometesse. – Algumas coisas aconteceram, coisas minhas... Não consigo mais desenhar, não tenho vont... Na verdade não tenho vontade de fazer mais nada na minha vida. Não vejo graça, e é tudo um saco... – Anne para pensar um pouco, até acertar o rosto de Edan com o travesseiro. Antes que pensassem falar qualquer coisa, Anne o golpeia de novo, e então mais uma vez – Por que fez isso?

- E você ao menos tentou criatura?

- O que? – diz, mas antes de falar mais algo ele é puxado pela orelha pela garota, largando as várias folhas pelo sofá e no chão, sendo arrastado do sofá até seu quarto, Anne liga a luz assim que entram e o arremessando no chão.

- Sua... Por que está agindo assim? – pergunta a encarando, enquanto se endireita e ficando de joelhos. Anne pensa, pensa e pensa. Seu lado meigo sumiu outra vez. Ela encara o colega de uma forma que ele não sabia como descrever com clareza. Parecia seriedade junto com mais algo.

- Olhe para tudo isso. – diz, se abaixando ao seu lado e olhou o quarto. – Você tem habilidade, não pode ter desistido e parado assim tão fácil quanto está parecendo. Seja lá o que aconteceu, isso não pode te parar. Você ainda gosta e tem vontade de desenhar, não é? – diz, agora observando o colega.

Edan responde com seu silêncio e abaixando seu olhar. Não sabia o que responder.

Anne solta um pequeno sorriso – Acho que vou encarar isso como um sim...

- Anne... Por que você se importa tanto com isso? – Pergunta sem a olhar. Tentava entender o por que dela estar falando disso, tratando como se fosse uma coisa muito importante, quando na verdade não era nada. Ele mesmo não se importava, algo sem significado algum. – Essa é uma coisa que eu decidi parar de fazer.

Ela fica um tempo sem falar, seu olhar parecia estranho para Edan, tanto que não conseguia imaginar o que sua colega estava pensando. Ela então começa a falar – Sabe... Uma vez, eu estava quase do mesmo jeito que você, acho que eu estava bem perto de desistir de viver. E alguém... Um antigo amigo... Não, o meu herói me deu coragem e devolveu a minha vontade de continuar. – Anne se levanta. – É brega pra caramba, um clichê, eu sei... Mas vai saber onde eu teria parado sem a presença dele. – A passos curtos, abre a janela do quarto, deixando a luz bater no rosto de Edan. Devagar, a garota se vira para Edan. Aos olhos do garoto, Anne e seus cabelos ruivos brilhavam com a luz do sol, como se a garota fosse o próprio sol, algo que o deixou sem o que dizer. Ela se aproxima e lhe estende a mão. – Vou fazer o mesmo que ele faria. Agora levante, volte a fazer o que gosta. 

Considerações finais:

Olá a todos, o que acharam deste capítulo? Sintam-se livres para comentar o que esperam, teorizar os próximos acontecimentos, dar opiniões. Em breve terá mais.

(Se parece clichê até esse momento, relaxe porque ainda tem muita coisa a acontecer)

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