Capítulo 25
7089 palavras - Arco viagem
Por Edan
Abro meus olhos, encarando um imenso mar de uma densa escuridão. Estou deitado de costas, tateando minhas mãos pelo chão que se encontra coberto de água. Me ergo devagar até conseguir ficar de pé, olhando em volta. Não consigo enxergar nada.
Não ouço nada, mas sinto um vento suave passando pelo meu corpo. Não consigo sentir ninguém aqui, nem nada. Lentamente, uma pequena luz surge diante de mim, aumentando seu brilho até se tornar forte o bastante para que eu não consiga mais encará-la. Fecho os olhos, escutando o som de risadas.
Abro os olhos novamente, me encontro no quintal de casa. Não sei como cheguei aqui. Escuto um som vindo de dentro da casa, parece o som de uma panela de pressão no fogo. Caminho até a porta da cozinha, parando na porta e observando. Vejo a mim mesmo quando criança, sentado na mesa com várias folhas na minha frente, uma garota que não sei quem é, mas reconheço como alguém familiar, eu já vi esses cabelos escuros antes. Vejo o pequeno Edan falando coisas totalmente animado, e a pequena garota presta atenção, com um brilho no olhar que apenas ela parece ter. Os dois rabiscam as folhas, e falam algo entre si que não consigo entender. Passo pela porta, percebendo alguém em frente ao fogão, cantarolando algo em voz baixa.
Minha mãe.
Fico a observando, abaixando meu olhar. Sinto uma dor tomando meu peito. Algo me diz que se eu falar com ela, não obterei nenhuma resposta. Apenas encosto no batente da porta e cruzo os braços, ainda olhando para minha mãe.
- Vamos assistir desenhos na sala? – Escuto vindo da mesa. Foi minha versão mais jovem quem acabou de dizer. Eu era tão animado assim?
- Claro, vamos lá! – A menina diz, já deixando a cadeira. Me vejo imitando o movimento, indo até ela e a puxando pela mão, com os dois correndo para a sala.
- Sem correr em casa crianças! – Escuto minha mãe dizendo. Me viro para ela, ela está balançando a cabeça negativamente, com um pequeno sorriso – Esse Edan, sempre fica assim quando ela vem aqui.
- Não me lembro de ter sido assim algum dia... – Balbucio para mim mesmo.
Minha mãe está retirando a panela do fogo, levando para a pia e começando a tirar a pressão com a água da torneira. Ela está secando as mãos na própria camisa junto a um suspiro, com um pequeno sorriso no rosto – Você era assim filho...
O que? Viro meu rosto para ela. Ela... Está olhando para mim?
- Mãe... Você... – Tento falar, mas minha voz não sai.
- Estou te vendo filho... – Ela vem perto de mim, me envolvendo em um abraço. Um, que nunca senti em tantos anos, que eu sempre pedi, implorei para sentir novamente. Eu... não sei como reagir a isso. Não sei quantas coisas eu estou sentindo, tantas coisas, tantas perguntas. Mas eu ignoro tudo, e somente a abraço, com toda a minha força.
Não sei quanto tempo ficamos assim, quando acho ser tempo o suficiente, me afasto a olhando, tão incrédulo quanto surpreso. Respiro fundo, contendo qualquer emoção que possa sentir agora. Olhar nos olhos dela, o mesmo verde que existe nos meus olhos, existe também nos dela, a pele mais morena, os cabelos levemente ondulados, o nariz fino, seu rosto levemente bochechudo. É ela, é minha mãe, tão única, tão bonita quanto me lembro.
Quando pisco, tudo desaparece da minha frente. Como se lançado novamente no mar de escuridão, os sons, minha casa... Minha mãe, tudo desapareceu.
Olho em volta desesperado, tentando achar ela, voltar para casa. Justo quanto estava tão perto, não posso deixar isso escapar. Uma nova luz surge ao longe, se aproximando de mim tão rápido que eu mesmo não esperava. Quando dou por mim, estou em um ambiente escuro. Olho em volta, estou em uma calçada, e está de noite. Uma avenida não tão movimentada.
Estranho, eu acho que já estive aqui.
Vejo alguns bancos virados para a avenida, e acabo me sentando, tentando entender o que está acontecendo. Junto as mãos em frente ao meu corpo, pensando no que eu acabei de ver. Eu... Eu vi minha mãe, ela estava em casa, pude abraçar ela. Só eu sei o quanto implorei por isso, quanto eu sofri por não ter isso. Eu queria tanto segurar ela firme, não deixar ir embora nunca mais, eu faria de tudo para manter minha mãe comigo. Saber que estive tão perto dela, poder sentir ela comigo e logo novamente perder ela de um momento para o outro. Meus olhos enchem, tudo me trás uma forte vontade de chorar de desespero, mas eu sei que não vai resolver nada.
Olho para o trânsito, olhando os carros passando de um lado ao outro. Respiro fundo, tentando me acalmar. Percebo um carro familiar vindo, parando no sinal. A cor prata chamou minha atenção, juntamente ao modelo.
Acabo pendendo o corpo para frente, cerrando o olhar e vendo com mais atenção, a janela está aberta, mas está escuro e não vejo quem está dentro. Eu reconheço esse carro, esse é... O carro que era da minha família. Espera... não, não pode ser isso. Eu sei que dia é hoje. O dia que me assombra e fez tudo virar um pesadelo.
Olho para o lado oposto da avenida, está vindo um caminhão em alta velocidade, e o carro onde eu e minha mãe estamos já voltou a andar. Me levanto em um impulso, correndo em direção a avenida, em direção ao carro. Tomado por um desespero, eu grito – Não! Parem!
Vejo o que eu jamais gostaria. Escuto o som da batida, e mesmo de longe eu sinto o impacto como se fosse em mim. O Caminhão acerta o carro em cheio, o empurrando para trás e o fazendo rodar na pista. Estou em choque. Não, eu não posso ter presenciado isso.
Corro até o carro, alcançando a porta do condutor mais rápido do que imaginei. Está tudo destroçado, a batida foi muito mais forte do que pareceu. Olho pela janela, minha mãe está ali, acordada, mas agonizando de dor e com muitos ferimentos. Não, eu não posso ver isso. Eu vou te tirar daí mãe, eu te prometo.
Coloco minhas mãos na porta e forço para abrir. Com toda a força do meu quarto eu tento puxar a porta do carro, mas está emperrada. Essa maldita porta não abre. Recupero o folego que nem sabia que perdi, mas puxo novamente. Minhas mãos, meus braços tremem de tanta força, mas não adianta de nada.
- ...Calma Edan... – Escuto minha mãe falando, sua voz é fraca e completamente tomada de dor. Eu olho para ela, e mesmo nesse estado, ela está me olhando. Para mim, e não para minha versão criança. Minha mãe sorri, o que me faz sentir a boca tremendo e meus olhos se enchendo... Mesmo nesse estado, ela está tentando me confortar – ...Eu ficarei bem filho...
- Não... Não! Eu não vou te deixar assim! – Droga, não importa quanta força eu faça, a porta sequer se move. Não, eu não posso perder minha mãe de novo.
Minha mãe tosse, posso ver em seu rosto todo o sofrimento que está sentindo nesse momento, e eu consigo sequer fazer algo. Mesmo agora, eu não posso fazer nada para ajudar minha mãe? Eu continuo tão fraco? – Eu sei... Que você vai ficar bem... Está na minha frente, crescido...
- Não mãe... Por favor, não... Não fale isso. Eu posso te tirar daqui... – Digo com dificuldade em um sussurro, meu rosto já está molhado, estou chorando. – ...Só aguente... Mais um pouco...
Minha mãe continua com seu sorriso para mim, e ver que sou incapaz de salvar ela. Minha fraqueza é tanta que eu não sou capaz de fazer nada pela pessoa que é a mais importante na minha vida, isso só me causa mais dor... Chorar não adianta, não resolve nada, mas agora é tudo que consigo fazer... Sinto uma mão pousando sobre meu ombro, me pegando de surpresa. Olho para trás devagar, e ali estava uma figura vestida com um casaco negro, mas não posso ver seu rosto. Solto minhas mãos do carro lentamente, conformado que não sou capaz... Eu... Não pude salvar ela...
- Você fez o que pode Edan... – Escuto ele dizendo, antes de tudo de se apagar e eu me encontrar na cama.
Não sei o que aconteceu, mas eu choro em silêncio.
*****
Me lembro razoavelmente bem de que ontem quando ainda estava na van, eu havia dito que era diferente ver a Carol dormindo em um lugar que não fosse minha cama, mas eu não esperava acordar essa manhã e encontrar ela dormindo comigo na mesma cama, ou especificamente em cima de mim. Tudo bem que isso não é nada muito fora do normal se for ver a quantidade de vezes que ela dormiu em casa, mas ainda é inesperado.
Olho para o lado, sua mala está aberta e parte das suas roupas estão jogadas sobre a outra cama, que por sinal está desarrumada, acho que precisarei ajudar ela a arrumar isso depois. Agora que pensei, não tenho nem ideia de que horas fui dormir, sei que assim que Carlos e Regina chegaram com algumas várias compras, acabaram fazendo lanches como jantar, mas eu não estava com fome nem vontade de comer então deixei de lado, e assim que terminaram de comer, eu aproveitei uma brecha para subir de volta para o quarto enquanto todos ficaram na sala, só não notei de imediato que Carol também subiu comigo. Só a percebi que ela estava ali quando tinha acabado de vestir um pijama e deitou nessa cama do lado, e daí em diante já não me lembro de mais nada, o que me deixa na dúvida porque ela veio deitar na minha cama. O que será que aconteceu ontem?
Ergo a cabeça do travesseiro e olho em volta. Não sei onde está o meu celular, e nem sei onde deixei, então por consequência não faço a mínima ideia de que horas sejam, nem sei se já é de dia, eu não consigo enxergar nenhuma claridade que seja vindo da janela. Me concentro, tentando ouvir qualquer barulho que seja, porém não ouço nada na casa, nem vozes ou passos, apenas pássaros cantando do lado de fora da casa. Caramba, não tenho mais ideia de que hora pode ser. Agora tenho a impressão de ser mesmo muito mais cedo, tipo madrugada, mas não adianta nada tentar dormir de novo, já estou sem um pingo de sono.
Como posso, tento me levantar da cama sem acordar Carol, mas cada movimento meu ela acaba reagindo. Com isso acabo desistindo, deixando a cabeça bater de volta no travesseiro. Eu não tenho por que sair da cama, mas também não tenho por que continuar aqui. Quase todas as manhãs eu fico brigando comigo mesmo em sair ou continuar na cama, eu sei que nada de especial vai acontecer se eu sair mesmo, nada importante, então para que vou sair da cama. Ainda sim, sempre saio apenas para evitar eventuais dores de cabeça, em outras palavras, faço isso contra minha vontade. Mas convenhamos, todas as vezes eu tive a escolha entre sair ou não, já hoje meio que estou obrigado a ficar na cama por não sei quanto tempo... E por ter aceitado vir nessa viagem, se eu não sair da cama com certeza vão vir todos aqui me encher perguntando se estou bem, e sinceramente não quero ninguém aqui perdendo tempo que poderiam estar fazendo algo útil se preocupando com uma coisa sem importância como eu.
Bom, vendo minha situação, acho que não tenho escolha a não ser esperar.
*****
Não tenho mais ideia de quanto tempo estou acordado esperando, poderia facilmente dizer que estou aqui a anos, mas também podem ter passado apenas dez minutos comigo olhando fixamente para o teto e para as paredes, ou então tateando minha mão debaixo do travesseiro tentando inutilmente achar o meu projeto de bomba particular que costumo chamar de celular, e com algumas vozes de sempre aparecendo na minha cabeça. Durante todo esse tempo, Carol não esboçou nenhuma reação, e quase na mesma hora que me dei por vencido, ela acordou por pouco tempo e saiu de cima de mim, o que me deu um grande alívio.
Agora que tenho chance, começo a debater novamente na minha cabeça se vale ou não a pena sair da cama. Por curiosidade, me levanto e vou até a porta, colocando só a cabeça para fora do quarto, tentando descobrir se tem alguém acordado, mas não ouço nada. A casa inteira está em silêncio. Por um momento eu tenho a sensação de estar em casa, claro, se eu imaginar um pouco mais de bagunça aqui ou ali.
Olho para trás, vendo que Carol continua a dormir. Com certeza ela está bem cansada da viagem, pelo que conheço dela, normalmente a Carol não precisa dormir muito para ficar disposta no dia seguinte. Lembro que algumas das vezes em que ela dormiu em casa, ela se deitava quase três da manhã para acordar as seis, e sempre ela tinha mais disposição do que eu, só nos casos de ela sair para alguma festa e aparecer bem tarde que ela se sente muito mais exausta. Acabo fechando a porta e indo em direção da cama, ne sentando bem na beirada. Olho para o rosto de Carol, pousando minha mão sobre sua cabeça, tentando um esboço de carinho nela. Não sou bom nessas coisas, acho ser uma das coisas em que sou pior, tanto que desisto de fazer algo mais que apenas tocar Carol do jeito mais suave que eu puder conseguir.
Não sei o que pensar, seja sobre ela ou sobre minha vida, não sei.
Sinceramente, eu nunca soube.
As coisas vem se tornando cada vez mais confusas, complicadas em todos os sentidos, as nuvens que existem na minha cabeça se tornaram mais densas com o tempo, uma angústia persiste no meu peito acompanhada de uma dor que não sei de onde vem, sendo raros os momentos que tudo se acalma. E o pior de tudo, eu sinto que a vida, ou melhor... A pouca vida que resta em mim parece estar desaparecendo, me abandonando cada vez mais... Mas está tudo bem, ela até durou muito, meio que anseio por esse fim.... As coisas não pioraram tanto desde que Carol começou a ficar por perto, por mais que nada esteja melhor, acho que devo agradecer ela por também ter sido presente nesses tempos. Ela ajudou muito para as coisas não explodirem tão rápido quanto deveriam.
Desço minha mão por trás de sua cabeça até seus ombros, não me lembrava que a pele de Carol é tá macia, é quase agradável ao toque, me permito admitir mais uma vez que essa garota consegue ser bonita até dormindo... Estou admirando ela por tempo demais, a pessoa quem não vou com a cara, e nem ela com a minha cara. Acho que a deixarei aqui descansando. Me ergo novamente, com meu corpo praguejando pela preguiça que estou sentindo, além pela vontade quase desesperadora de não fazer nada, e deixo o quarto para não incomodar.
Acabo indo primeiro ao banheiro, assim que entro vejo minha cara de sono. Acho que mesmo se eu dormisse por uma semana eu continuaria com essa cara. Abro a torneira, sinto como a água gelada toca minhas mãos e escorrendo pelos meus dedos, posso sentir uma corrente gélida passando pelos meus braços e se espalhando pelo corpo. Jogo um pouco da água no rosto algumas vezes na tentativa de despertar. Seco o rosto e sigo para a escada, descendo devagar até a sala, fazendo o possível para não fazer barulho. Vejo que espalhado no sofá tem uma caixa de baralho e algumas outras pequenas caixas que não sei dizer o que são, parecem ser jogos de tabuleiro. Agora que pensei melhor, eu não me lembro de ter visto nenhuma televisão por aqui, aliás não vi também nenhum rádio nem nada assim. Acho que a coisa que demanda de mais eletricidade por aqui é a geladeira, e talvez só ela.
Vou para a cozinha ver se ainda tem algum pão sobrando. Por sorte ainda tem alguns, parece que os pais de Anne compraram o suficiente para ontem e hoje, mas logo terão que comprar mais. Acabo pegando a metade de um pão e como puro, indo de volta para a sala, e me sentando no sofá para comer, acabo alcançando o baralho com a mão livre e fico lançando as cartas uma a uma no meu lado, é o máximo de entretenimento que consigo pensar. Se em casa eu já não tinha vontade de fazer nada, aqui tudo colabora para que eu não faça mesmo. Escuto então uma porta se abrindo e logo mais sendo fechada no andar de cima. Passos vindos pelo corredor e então descendo pela escada.
- Olha só quem também já tá acordado, bom dia Fantasma Edan. – Me viro e vejo Tamires descendo, ela está descabelada e sequer alinhou o a curta roupa que usou para dormir.
- Bom dia... – Respondo com um gesto de cabeça, a vendo dando um toque no meu ombro e indo se sentar no outro sofá. Seu rosto está marcado do travesseiro. – Conseguiu descansar?
- Consegui e muito bem, amei a cama daqui. Não gosto de beliche, mas é um pouquinho melhor que a minha, mais macia... E dormir na cama debaixo é melhor pra mim, tenho um pouco de medo de altura. – Ela diz, se espreguiçando e com um largo sorriso no rosto. – E você fantasma, acho que também dormiu bem hoje. Afinal você deu sorte.
Não entendi o que ela quis dizer com isso, o que me faz pender a cabeça para o lado – Sorte? Por que?
- Porque você foi quem teve uma noite bem acompanhado. – Arqueio uma sobrancelha com o comentário – Depois que você e a Carol subiram para o quarto, os pais da sua colega baixaram uma lei. Era para todos os rapazes dormirem em um quarto, e nós moças dormiríamos em outro quarto. Vocês foram exceção a essa lei por já terem ido dormir.
Não tenho a menor ideia de que hora pode ter sido isso. Acho que ninguém nos incomodou nessa noite pela porta estar fechada, que por sinal não fui eu quem fechou... Agora eu penso, o que eles devem ter imaginado por terem visto aquela porta trancada?
Diante do meu silêncio, Tamires continua a falar – Nós ficamos no quarto 4, e os rapazes ficaram no quarto 2. O quarto 3 é como uma sala de jogos com um deposito, tem umas uns jogos de tabuleiro, baralho e até uma mesa de sinuca ali, eu não tinha nem ideia de ter uma dessas aqui... – Ela da um sorriso – Agora eu sei como as pessoas aguentavam ficar nessa casa. Não tinham televisão, mas sabiam se divertir.
- Depois olharei essa tal sala... – Digo, então decido voltar ao assunto anterior – Acho que realmente dei sorte em uma parte. Não conseguiria descansar com tanta gente do lado, seria muita bagunça. Pelo menos a Carol dormir em cima de mim não atrapalhou em nada no meu sono... – Respondo, isso faz Tamires me encarar. Parece que ela não estava esperando ouvir isso, mas ela deu um sorriso bem malicioso.
- É... Se os pais da Anne queriam impedir alguma coisa por aqui, então devo dizer com toda que certeza que não conseguiram impedir nada. – Tamires ri de forma maldosa. Não sei se entendi o que ela quis dizer. – E não sei como foi no quarto dos rapazes, mas no nosso, a Anne passou quase toda a noite bufando.
Não quero perguntar o porquê, mas minha curiosidade pede por isso – Por qual motivo?
- Obviamente pela Carol ter ido dormir com você ué. – ela me diz rindo, fazendo parecer até algo óbvio. – A Anne disse que a Carol não deveria ter ficado sozinha com você, mas não tinha jeito, ninguém iria tentar derrubar a porta. Não tinham camas suficientes nos quartos, alguém teria que ficar naquele quarto, ou aqui na sala. – Tamires pende seu corpo para frente e colocando a mão próxima a boca, claramente querendo falar mais baixo. Acabo me aproximando também de automático – Isso deve ser só impressão minha, mas acho que ela gostaria de estar no lugar da Carol.
- Prefiro não acreditar nisso... – Digo, voltando a me encostar melhor no sofá. Que decepção, esperava por algo mais importante... Não, isso é impossível de acontecer...
- É só o que parece. Você pode não querer gostar, mas vendo as coisas, essa é só a impressão que eu tenho... Que eu e todos nós temos, só que nenhum de nós fala disso para o Fabiano. – Ela diz com um largo sorriso. Tamires então olha para os dois lados, olha na direção da escada, então me encara – Enfim, mudando rapidinho de assunto.... Você se lembra do dia em que você, a Carol e eu fomos nos fundos da escola?
Junto as mãos em frente ao corpo, demoro um pouco para conseguir me lembrar bem – Acho que sim. O que tem?
- Você também se lembra que nesse dia, falamos de um cara de casaco preto que estava aparecendo na cidade? – Balanço a cabeça confirmando. Isso sim eu me lembro muito bem. – O que você me diria se eu falar que ele é real?
- A menos que você me diga que ele apareceu na sua frente, vou achar que você só está louca – Respondo sem dar nenhuma importância.
- Então fique sabendo que eu encontrei ele pessoalmente, e o Paulo estava junto. E eu vou te falar, depois que ele apareceu, tudo ficou muito estranho... Eu não estou brincando Edan, a realidade pareceu enlouquecer... – Neste momento, Tamires acabou de conseguir toda a minha atenção. Seu tom de voz mudou muito. – No dia, estávamos andando de skate com alguns amigos no parque, eu tinha me sentado pra tomar um ar... E então ele apareceu do nada bem do meu lado, o mundo em volta parecia ter parado na hora que ele apareceu... Ele é igual ao que falam, aparece do nada, veste um sobretudo preto, e é alguém muito estranho...
Balanço a cabeça em concordância, por mais que eu não acredite muito no que Tamires está falando. Apesar disso, devo dar algum crédito a ela caso tenha inventado toda essa história, a expressão no rosto da Tamires está conseguindo me assustar.
- Ele sabia meu nome, minha idade, onde eu moro e onde estudamos... Na verdade, ele parece saber de tudo sobre mim, até disse alguns segredos meus que nunca contei para ninguém, nem minha mãe sabe de alguns desses segredos, mas ele sabia. – Tamires parou de falar por um segundo, olhando as próprias mãos – Foi a primeira vez que senti tanto medo, nunca me senti assim na minha vida... Ele via através de mim, eu e nem ninguém conseguia nem se mexer perto dele, eu te garanto que tentei me afastar. Foi como se eu estivesse presa no chão.
- Mas... Ele falou o que queria? – Questiono, com minha voz falhando mais do que eu esperava.
Tamires hesita por um segundo – Ele primeiro sentou do meu lado, começou a puxar conversa comigo como se eu fosse uma amiga de muito tempo... Eu ignorei, nem olhei na direção dele e mandei ele se mandar... Quando ele riu e falou meu nome, eu olhei e percebi quem ele era... Falou o nome de cada um de nós... Incluindo o seu Edan, e disse estar "procurando" por uma pessoa que eu conheço... – Tamires parou de falar. Ela olha na minha direção, mas então desvia seu olhar. Nesse momento, tenho a impressão que ela me esconde alguma coisa. – Ele não disse quem é, mas que na hora certa iria aparecer para essa pessoa.
Assim que termina de falar, fico pensativo sobre o que Tamires acabou de falar. Tudo isso parece, não... Não só parece, e sim é estranho demais. Não sei o que dizer, parece informação demais para mim – Parece fantasioso. Não sei se acredito.
- Não é fantasioso... Você lembra que nesse dia que fomos nos fundos da escola, eu disse que séria ótimo ver ele por mim mesma, que ele não era nada e que eu poderia socar ele se eu quisesse? – Eu me lembro desse dia, então concordo com a cabeça. – "Estou bem do seu lado agora, se quiser pode tentar me socar. Eu deixo você tentar..."
- Espera, ele te disse isso? – Questiono. Com um estalo, me lembro do que Tamires havia dito na escola, também da sensação que eu tive na hora. – Então ele...
- Ele estava lá com nós. Ele estava nos observando de algum lugar. – Tamires termina de falar. Eu sinto um calafrio passando pelo meu corpo. – Ele disse que viu quando a Carol e eu devolvemos aquelas medalhas para a caixa sem você ver... Fizemos isso pra nenhuma de nós ficarmos mal com você, viu quando saímos... Não sei onde, mas ele estava ali.
Não sei o que dizer sobre isso. Não tenho palavras.
- É fantasioso eu falando... Sei disso, mas uma coisa eu te digo... – O tom de voz dela fica ainda mais sério de repente – É um aviso de uma amiga. Não queira estar no mesmo lugar, se o ver não chegue perto demais dele Fantasma, de nenhuma maneira se aproxime dele. De alguma forma ele sabe sobre você... Sobre cada um de nós, ele parece e é perigoso como falam... Esse cara é um monstro...
Não esperava algo assim vindo de Tamires, esse tom de voz, tanta seriedade e medo de uma coisa que ela zombou a tanto tempo atrás. Acho que do jeito que ela falou, tenho que levar alguma coisa em consideração.
- Sabe, eu também achei fantasioso... Sei lá, mas eu encontrei ele, eu vi com meus olhos que tudo que falam dele é verdade... Nunca passei por nada assim na minha vida... – Tamires para de falar assim que escutamos uma porta sendo aberta no andar de cima. – Vamos deixar isso entre nós dois.
Concordo com ela e então cruzo os braços. Começar o dia com uma história dessas, ninguém merece. Vejo que quem desce agora é a mãe de Anne, ela nos cumprimenta e segue direto para a cozinha. Acho que irei atrás de algo para me distrair, senão o que Tamires disse vai ficar preso na minha cabeça.
*****
- Você tem certeza disso? – Regina me questiona. – Posso fazer sozinha sem problema nenhum.
- Eu insisto, faço questão de ajudar no almoço. – Respondo, cruzando os braços, estranhando sua reação – É tão estranho assim eu querer te ajudar a fazer o almoço de hoje?
- Não é isso... É que você vai acabar trabalhando ao invés de aproveitar a viagem. – Ela insiste.
- Relaxe, estarei aproveitando melhor se estiver ajudando aqui do que lá fora com todos... – Digo, apontando na direção da porta. Com toda certeza eu não gostaria em nada de estar lá fora jogando futebol com eles. – Me sinto um pouco menos inútil.
Ela me olha, mas então desiste. – Tudo bem, você quem sabe. Iremos fazer duas coisas, uma carne refogada com pimentões, e também de sobremesa minha ideia é fazer um bolo trufado. O que prefere fazer?
Ai caramba. Duas ideias terríveis para mim. Em toda minha vida nunca sequer pensei em chegar perto de fazer uma carne refogada, é trabalhoso demais... Bolo trufado é igualmente difícil, mas acho que o fracasso será menor se eu tentar o bolo – Bem... Acho que se eu cuidar do bolo, ficará mais saboroso.
- Já fez algum bolo assim antes? – Ela pergunta com um sorriso irônico.
- Sim claro, já fiz... – Mentira. Nunca fiz nada desse tipo antes. Só li algumas receitas nas revistas que tenho, e vi alguns vídeos a muito tempo atrás.
Ela então se vira para a geladeira, começando a tirar algumas coisas – Confio em você, vai ser muito bom ter uma companhia na cozinha. As coisas para o bolo estão naquele armário, e a batedeira naquele outro.
É, vamos lá. Acho que tenho um desafio pela frente.
Vou no armário, tirando tudo que acredito que será necessário. Vou então para a geladeira retirando o restante. Puxo pela minha memória como iniciar o bolo, mas minha memória se apaga de um segundo ao outro. Acho que precisarei improvisar. Lanço a massa da caixa do bolo, fermento, um pouco de farinha e uma ótima quantidade de açúcar no pote da batedeira, quebro cinco ovos e viro no pote. Nesse momento percebo que Regina parou o que estava fazendo e está olhando em minha direção, como se estivesse curiosa. Acho que errei em alguma coisa. Comecei cedo com a sequência de falhas. Bem, vamos ver até onde isso vai, acredito que não serei incompetente a ponto de explodir a casa... Acho melhor não duvidar disso.
Ligo a batedeira, controlando a intensidade, alcanço o leite e despejo uma quantidade quase descontrolada dentro do pote, junto com algumas colheres cheias de margarina. A massa começa a tomar uma consistência diferente, parece que estou criando um mutante. Se a massa não virou uma coisa estranha, então acho que é um bom sinal. Diminuo a potência da batedeira, indo nos armários atrás de uma forma bem grande. Encontro uma que me parece boa, vou controlando a batedeira enquanto vou untando a forma com a margarina. Regina acabou ligando o forno para mim, será bom já ter ele pré aquecido. Viro a massa na forma e coloco no forno.
Olho para a mesa onde deixei a barra de chocolate separada. Pego uma tábua de madeira guardada no armário, alcanço uma faca e começo a cortar o chocolate em algumas tiras, mas o chocolate é tão duro que preciso fazer mais força que eu gostaria, e levo algum tempo até conseguir cortar a barra inteira. Assim que termino, vejo as várias tiras de chocolate muito uniformes. Agora só jogar todas na panela para derrete-las e fazer a cobertura, essa parte imagino que será fácil...
Mas agora que percebo, ainda não soltei a faca.
Meu corpo parece que não quer solta-la... Agora que percebo, meus dedos parecem segura-la com ainda mais força... Estranho... Olho para trás, na direção de Regina, ela não está olhando na minha direção, então volto meu olhar a faca. Algo ecoa na minha mente, ressoa no meu corpo, eu sei o que é. A mesma sensação de antes, que sempre volta. A sensação de vazio que me ataca, convida todas as vezes, um abismo escuro se torna visível para mim, as vozes me falando que é isso que preciso para me juntar a elas, para que tudo acabe como sempre quis. A dor que sempre senti retorna a minha mente e ao meu peito, a solidão, os momentos de desespero, as sombras do passado retornam, me fazendo lembrar toda a angustia que sempre encaro quando tento dormir... O que me convida para dormir para sempre. Os cantos da minha visão se tornam mais escuros, não consigo focar em nada, nada além da faca em minha mão. Com força toco a ponta da faca com o indicador, a dor aguda corre pelo meu corpo em uma sensação maravilhosa, me causando um êxtase. A saída obvia que eu nunca vi, se eu quero acabar com tudo, é isso que preciso. Um fim a minha vida. É isso, agora. Me jogar. O que preciso fazer para que as coisas acabem, para que o vazio me consuma de uma vez...
Quem notaria se eu sumisse?
Quem se importaria?
Ninguém!
Minha mão treme pela força inconsciente que faço para segurar a faca, que gradualmente gira em direção ao meu peito. A pressão do meu corpo, o desejo por isso, esse desejo sem fim, insaciável. Eu anseio por isso. Eu quero o fim dessa agonia sufocante.
Tudo se torna mais forte, a medida que enxergo a faca se aproximando do meu peito, a luz reluzindo no ferro da faca, me seduzindo, atraindo tudo em mim.
Eu quero.
Eu tenho como acabar com tudo.
Tenho que acabar com tudo.
Eu preciso acabar com tudo, eu preciso morrer. Eu quero morrer.
Algo ecoa forte na minha mente, uma voz tão forte como um trovão, me fazendo despertar desse transe e afastando toda essa vontade. Algo segurou minha mão com força, tanto que solto a faca na mesa na mesma hora em um som quase ensurdecedor para mim. Sinto a ponta do meu dedo doendo de leve, mas não vejo sangue. Minhas mãos, não, meu corpo inteiro está tremendo.
Eu... Estou com medo?
Olho para Regina, ela fala algo que sequer consigo entender o que sai de sua boca.
- Ei, está tudo bem? – Regina estala os dedos em frente aos meus olhos. Isso me faz voltar de vez a realidade. Sua voz que antes apenas ecoava, agora faz sentido. – O que foi Edan?
- Ah... N... Nada... Eu só... Imaginei que tivesse ouvido algo, e me distrai... – Digo, tentando parecer convincente. Acho que minha voz saiu mais trêmula do que eu gostaria.
Ela semicerrada seu olhar em minha direção. Seu olhar é duro, e quase inquisidor. Ela sabe, ou pelo menos imagina que tem algo errado, o que me força a desviar o olhar. Mas diferente do que eu esperava, Regina não me questiona nada. Apesar de sua desconfiança, ela aparenta confiar em mim. Ela volta para o que estava fazendo, levando um longo tempo antes de finalmente retirar seu olhar de mim, quase que tentando me sondar de alguma forma. Vejo que ela já está terminando com a carne, enquanto separa alguns tomates, acho que para a salada. Me viro para a tábua, abaixando um pouco a cabeça. Meus olhos vão em direção a faca... O que foi que acabou de acontecer? Que vontade foi essa tão de repente?
Passo a mão nos olhos, voltando ao que estou fazendo. Pelo menos isso eu tenho que tentar terminar. Eu devo tentar me concentrar. Assim, pego a tábua e volto ao meu trabalho.
*****
Acabo saindo pela porta da cozinha, indo me refugiar no sofá. Regina ficou na cozinha avaliando o bolo que eu fiz, que por sinal foi um desastre completo. Ele queimou bem pouco embaixo, acabei cortando tudo errado por minhas mãos não pararem de tremer, e coloquei o recheio e a cobertura de forma muito desigual, recheio de menos e cobertura demais. nem da pra ver o bolo debaixo de tanto chocolate, e o recheio não ficou nem um dedo de espessura. Depois que deixei na geladeira, ele aparentou estar ainda mais feio do que antes. Ficou horrível. Mais um fracasso. Deveria ter deixado a Regina cuidar de tudo sozinha.
Regina então sai da cozinha, indo chamar a todos que estão do lado de fora para avisar do almoço. Eu não estou com apetite, então não irei comer. Vejo um a um entrando entre risos, todos bagunçando como gostam, acho que sem professores ou pais por perto, normalmente se soltam bem mais. Todos foram direto para a cozinha, acabo olhando para eles e pensando em uma manada de elefantes correndo. Parte do barulho que fazem na cozinha fica abafado, mas ainda assim é incomodo. Todos conversando de uma só vez, por mais que seja no cômodo do lado faz eu me sentir no centro da cidade.
Fico na sala por mais algum tempo, juntando minhas mãos em frente ao corpo. O que aconteceu agora a pouco me incomoda, não sei o que foi aquilo. Eu senti como se tudo pudesse acabar ali. Nunca esteve tão forte assim. Nunca uma resposta definitiva me pareceu tão próxima. É errado, mas... Eu não sei, parece tão certo. Acho que quero isso.
Meu pensamento é interrompido quando escuto as várias risadas e vozes altas. Olho em direção da cozinha, pensando agora em como eles são barulhentos. Me levanto do sofá e vou ao andar de cima, acho que preciso de silêncio. Olho para a porta no fim do corredor, a mesma que vi na noite anterior. Vejo que a chave está no mesmo lugar que deixei, a agarro, abro a porta e entro.
A luz do sol ofusca meus olhos por alguns segundos, mas me acostumo logo. Hoje não está tão frio, na verdade o sol até consegue aquecer um pouco. Agora consigo ver melhor em volta, aqui tem uma mesa redonda e alguns bancos de madeira, um muro não muito alto, uma escada com altura suficiente para chegar ao telhado, o piso de ladrilhos, e apenas isso. Pego um dos bancos e levo até o lado do muro, coloco bem ao lado do muro e me sento, encostando minhas costas, colocando meus braços sobre o muro e apoiando minha cabeça para o alto. Respiro fundo e fecho os olhos. Silêncio. Finalmente silêncio.
Poderia ser assim para sempre.
Está quente de um jeito bem agradável, ventando pouco mas também está bom. É incrível, as vezes o mundo sabe como compor um ambiente agradável, e muito relaxante. Tamanha calma assim poderia entediar fácil, mas acho que poderia suportar isso tranquilamente... Aliás eu já suporto, mas silêncio e calma nunca foram tão agradáveis lá em casa.
- Edan? – Escuto a voz de Raquel. Abro os olhos, olhando em sua direção. Ela estava parada ao lado da porta – O que está fazendo?
- Só tomando um ar... – Endireito minha postura. Raquel vem se aproximando de mim.
- Você sumiu faz um tempo, desde a hora do almoço. – Ela cruza os braços, encostando bem ao meu lado. Eu a observo. – Pensamos se você estava passando mal, ou no quarto dormindo, mas nem no quarto você estava.
Estranho isso que ela acaba de dizer – Como assim, desde a hora do almoço? Eu sai da sala não faz nem cinco minutos, e vocês ainda estavam almoçando.
Ela solta um pequeno riso – Terminamos de almoçar a mais de meia hora.
- Nossa... De novo o tempo passou de um jeito que nem notei. – Termino de falar e olho em volta. Caramba, que estranho. Fechei os olhos e se passaram meia hora?
- E aliás, agora que pensei... Por acaso você almoçou criatura?
Eu apenas nego com a cabeça.
- Não me surpreende você ser tão magro... – Ela me olha me repreendendo. Não sei o que responder, mas entendo todo esse cuidado dela comigo. Em várias vezes ela sabe como me deixar sem resposta. Raquel então da um sorriso para mim – Você não vai gostar de saber, mas nós ficamos preocupados com você quando sumiu.
Não a respondo. Sinceramente, não quero que percam tempo com uma preocupação tão pequena como eu... Acho que todos devem se preocupar com algo importante, e não comigo. Saber disso faz com que eu me sinta horrível, parece me machucar saber dessa preocupação toda, do mesmo jeito que sempre me machucou antes.
- Acho que... Você deve sabem quem foi a pessoa que notou que você não estava em nenhum lugar... – Ela pausa por um segundo – Então começamos a te procurar.
- Eu sei quem? – Ergo a sobrancelha. Não tenho ideia de quem ela está falando.
Raquel sorri – Esqueça isso. Bem, vamos voltar lá para a sala, o que acha de jogarmos cartas agora?
Me levanto devagar. Meu corpo inteiro dói de eu ter ficado sentado nessa posição. – Ta, pode ser. Não temos outra coisa para fazer mesmo...
- E aliás, você ainda tem que comer aquele bolo, isso se ainda tiver. – Paro por um segundo, revirando os olhos. Raquel me encara – O que foi?
- O bolo? Não quer dizer o fracasso? – Questiono.
Ela ri, e então semicerrou seu olhar pra mim – Fracasso? Por que diz isso?
- Eu sei que ficou péssimo, afinal... Fui eu quem fez, e deu errado.
Ela não me responde. Raquel solta uma pequena risada, olhando para mim. Ela bate as mãos nas pernas e diz – Você tem certeza disso?
- Tenho, por que foi isso que aconteceu.
Raquel ri outra vez – Então você está muito enganado, porque acho que todo mundo naquela cozinha adorou, e se meus olhos não mentem, todo mundo repetiu o bolo...
Que? Aquilo não deu errado?
- Bolo trufado em? Quem diria que você sabe como fazer um desses... Você sempre me impressiona irmãozinho. Quando aprendeu?
- Eu... Pesquisei em uma hora vaga, e acabei aprendendo.
- Ficou muito bom. – Raquel leva as mãos a cintura – Quando a mãe da Anne falou que foi você que fez, todo mundo ficou bem surpreso... Eu fui para meu segundo pedaço, e a Anne foi para o terceiro pedaço dela quando soube que foi você quem fez.
- Espera... Vocês sabiam que fui eu quem fez o bolo?
- De começo não. Só ficamos sabendo depois que comemos o primeiro pedaço, a Regina fez mistério – Ela disse rindo. Raquel então me puxa – Você tem que comer pra ver. Aliás vamos logo, já devem ter começado a jogar lá na sala.
- Tá, tudo bem... Já vou, só vou colocar o banco de volta no lugar – Digo, enquanto Raquel me solta.
- Tudo bem, só não demore muito, senão volto aqui para te buscar – Raquel termina de dizer, e volta correndo para dentro.
Balanço a cabeça, agora ficando pensativo. Então, não foi um fracasso? Eu não falhei?
Consegui mesmo acertar?
Isso foi inesperado. Acho que não sou uma falha completa no fim das contas... Ou talvez seja, e apenas dei sorte hoje.
Considerações finais:
E aqui acaba mais um capítulo. Preciso admitir algo aqui, escrever esse arco da viagem acabou rendendo muitas coisas que eu mesmo não planejava. Eram para os acontecimentos correrem de forma parecida, mas tomaram proporções um pouco maiores do que eu esperava. Tanto os pesadelos que ele tem naquele espaço vazio, sempre retornando em algum ponto do seu passado, quanto o que ele tentou fazer aqui não foram exatamente planejados, aconteceram mais de forma mais inesperada.
Enfim, espero que tenham gostado do capítulo, que continuem lendo... Já sabem, opiniões, teorias, contem que eu adoro. Os encontro no próximo capítulo.
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