RODA GIGANTE

Olhei para o vácuo do céu escuro e senti um leve frio na barriga com a lenta subida. Segurei firme na barra de ferro à minha frente e respirei, tomando um ar um pouco mais forte. Mesmo assim continuei sentindo meu coração batendo forte e ansioso para chegar ao topo.

Havia uma sensação de desconhecido à espreita, e eu não poderia perder isso por nada. A sensação que parecia apertar meu peito, se tornava cada vez mais intensa ao passo que me aproximava das nuvens. Eu não sabia como contê-la.

Tive medo muitas vezes, me senti feliz em outras, até mesmo extasiado com tudo o que estava acontecendo naquele milésimo de segundo. Todos os sentimentos dentro de mim se chocavam como bolas enormes de destruição.
Respirei mais uma vez contando quantos palmos de distância estávamos da terra, mas ainda eram pouco. Segurei a mão de Sarah – ou a pouca lembrança que tinha de nosso primeiro encontro. Não queria que perdêssemos toda essa sensação que estávamos vivendo. Mesmo que não passasse de uma boa lembrança. Simplesmente era como se eu pudesse ser criança novamente e me lançar no que realmente era desconhecido e diferente.

Não demorou para que olhasse para o lado esquerdo e fosse possível ver um esboço do seu sorriso único – ainda mais belo em pleno o ar. Subimos devagar como se não houvesse um destino a chegar, e isso me fazia sentir como se fosse possível tocar as estrelas, mesmo elas estando a milhares de quilômetros de mim.
Senti uma pequena impressão de ter seus dedos sobre os meus, e o vento batendo em nossos cabelos. Um medo como furacões dentro de nossas almas. Tentei ao máximo segurar algumas pequenas lágrimas de emoção que brotaram em meus olhos por estarmos no primeiro e último lugar em que havíamos nos conhecido. Eu não poderia contê-las, mesmo que quisesse. Apenas deixei cada uma delas escorrer pelo meu rosto até se soltarem ao nada.

O silêncio então reinou sobre nosso pouco espaço. Podíamos falar de tantas coisas a serem descobertas ao longo dessa viagem incrível, mas preferimos somente admirar a vista e a quietude de tudo.
O que se mostrava a nós era perfeito, como tudo o que era feito por Deus. Não haviam muitos detalhes, mas o simples fato de poder estar ao seu lado me fazia sentir uma tranquilidade e uma força incomparável.

Fixei meus olhos nas luzes que existiam ali e que, de longe, podiam ser vistas com clareza. Se houvesse como, não queria me ausentar daquele lugar por um bom tempo. Podia ver tantas outras pessoas com suas felicidades e suas maneiras de viverem a vida. Conseguia perceber cada mínimo detalhe, até mesmo os que não eram observados por ninguém – e eu me lembrava perfeitamente que era Sarah que amava fazer isso.
Havia muitas maneiras diferentes de fazer a vida passar sem ser bem compreendida, e algumas delas eram, encarar subidas difíceis. Olhar também as menores coisas, que muitas vezes eram esquecidas por alguém, me trazia a memória, Sarah e seus anseios pelo modo de como queria mudar o mundo.

Os poucos segundos que haviam se passado pareciam eternidades fantasiadas. Não queria que o tempo corresse, mas talvez fosse necessário que ele passasse.
Eu prometi mostrar a ela essa visão incrível, e sentir que ela estava ao meu lado me reconfortava, mesmo vivendo uma realidade bruta e cruel. Subi e subi até chegar ao topo, de todos aqueles, este seria o momento mais difícil, e eu precisaria encarar uma força intrigante. Não fazia ideia de onde vinha tanta força para continuar suportando.

O simples fato de poder estar ao seu lado melhorava ainda mais cada sensação. Eu tinha curtido cada detalhe, cada minuto, cada estrela que havia visto resplandecer no céu ao seu lado e que, provavelmente, eu nunca mais teria lembranças como essas. Eu precisava guardá-las o mais profundo que pudesse – guardá-las para sempre.
Coloquei uma das minhas mãos sobre meu coração, e percebi que estava um pouco acelerado. Eu seria obrigado a fazer algo complicado e difícil naquele momento. E por mais que eu acreditasse estar preparado, no fundo eu sabia que não. Continuei segurando a esperança em meu coração.

Quando cheguei ao topo me senti um pouco mais aflito, queria que realmente Sarah conseguisse ver todos aqueles prédios reluzentes, todas aquelas pessoas curtindo suas vidas passageiras e tudo aquilo que poderia ter sido aproveitado... Mas ela não estava mais ao meu lado.
Estava esperando o momento certo para lançar suas cinzas ao vento e deixá-las voar e se espalharem como o brilho das estrelas. Havia uma certeza muito grande de que Sarah estaria sempre brilhando com seu sorriso de onde estivesse. E eu queria muito que ela estivesse.
Esperei o momento exato para realizar seu último desejo, mas queria me despedir antes de deixá-la partir. De todas as vezes em que eu havia me arriscado a subir tanto, essa havia sido uma das melhores e piores.

Segurei novamente a barra de ferro à minha frente e olhei para o céu acima de mim. Como eu poderia estar fazendo aquilo?
Me perguntei mesmo sabendo que não conseguiria responder. Suspirei fundo e confiei mais uma vez em mim mesmo. Coloquei aquele pequeno vaso sobre meu colo e contei até dez, antes de tomar qualquer decisão imatura. Havia prometido mostrá-la como era ver tudo de cima de uma roda gigante, e era por esse motivo que não deveria ter medo de concluir o seu último anseio.
Abri a tampa com muito cuidado e segurei firmemente em minhas mãos um pouco de suas cinzas. Respirei novamente.

— Está pronta para partir, Sarah? — Perguntei esperançoso.

Olhei para o céu, e a resposta parecia estar escrita claramente nele – eu tinha certeza de que seria sim. Lancei as cinzas aos poucos. Vê-la fazer aquilo não era algo de se encarar de cabeça erguida, mas algo necessário de ser enfrentado e vivido. Virei aos poucos enquanto o vento levava meu maior amor embora.

Senti alívio em poder saber que tudo aquilo era uma fase e que ela nunca estaria sozinha ou me deixaria sozinho. O seu último toque foi o que me deixou mais desestruturado por dentro, mas ainda assim a vi partir, aos poucos, nas correntes dos ventos.
Quando seu último ar partiu, abaixei minha cabeça e permaneci parado por alguns minutos sem reação qualquer. Respirei fundo. Toquei meus cabelos gelados com o sereno. Fechei meus olhos e percebi que não demoraria muito para que algum dia eu a encontrasse em algum lugar.

Continuei por um bom tempo com meus olhos fechados e me lembrei de uma simples frase que Sarah sempre me dizia:
“Nossa vida é como uma Roda Gigante, podemos até estar preparados para a subida, mas nunca saberemos como será a descida. Por isso, devemos sempre estar preparados para elas”.

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Espero que tenham se emocionado com essa história ♥️
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