𝒊𝒊𝒊. » BELLADONNA
𝟎𝟎𝟑. ⠀ ⠀ ⠀ ⠀ ⠀ BELADONA
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" Quando você não enfrenta as consequências, isso também traz consequências. "
ㅡ FRANK K. SONNENBERG
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QUANDO CRIANÇA, Jocelynn cresceu escutando alguns ensinamentos de sua mãe sobre o certo e o errado. Durante aquela época ela sempre acreditou que o mundo se dividia entre esses dois lados, ou você fazia o que era certo ou o que era errado, não havia meio termo. Cada escolha traz uma consequência, e sua mãe sempre deixou claro que, não importava como, as consequências dos atos vinham à tona.
Na adolescência, Joss — já com o espírito endurecido e olhos afiados pelo cinismo — começou a perceber as rachaduras naquela moralidade simplista. Nem todas as escolhas erradas traziam desastres, e algumas, perigosamente fáceis de engolir, deslizavam pelo presente sem deixar rastros no futuro. Essa constatação era uma faca de dois gumes, uma lógica que oferecia conforto, mas também corroía. Talvez tenha sido essa crença que lhe permitiu fechar os olhos para erros passados, erros que ela sabia que um dia voltariam para assombrá-la. Porque a verdade, cruel e certeira, é que não importa o quanto você ignore, esconda ou negue, o mundo sempre coleta suas dívidas.
Escolhas são sementes, e não importa o quanto você tente enterrá-las, elas crescem. Seja pela força da memória, do destino ou de algo ainda mais inexprimível, elas voltam. E quando voltam, trazem consigo raízes profundas, impossíveis de arrancar completamente.
No dia seguinte, Joss dirigiu em direção ao lado leste de Blüdhaven, onde a cidade se despia de qualquer tentativa de encanto. Ali, o glamour urbano cedia espaço a ruas desgastadas, becos mal iluminados e uma população esquecida por quase todos — os moradores de rua, as prostitutas, os pequenos traficantes que se tornavam parte da paisagem. Mas à luz do dia, aquele lugar ganhava outra face, menos soturna, quase funcional.
O tráfego era composto por ônibus lotados e carros velhos, conduzidos por trabalhadores que seguiam suas rotinas antes mesmo que o sol se fixasse no céu. Havia transeuntes com olhares apressados, mães empurrando carrinhos de bebê, jovens de cara fechada nas esquinas, avaliando o movimento como predadores à espreita. Joss manteve o ritmo do carro, tomando um gole do café ainda quente, enquanto lia as placas. Procurava um endereço específico.
Depois de algumas ligações — e favores que preferia não ter precisado cobrar —, conseguiu localizar Bella Garnet. Encontrá-la foi surpreendentemente fácil, o que, para Joss, era um mau sinal. As pessoas que tentavam evitar serem encontradas geralmente tinham boas razões para isso. Mas Bella, ao que parecia, não era mais a mulher que Joss conhecera.
O prédio de tijolos alaranjados onde Bella morava era tudo o que Joss imaginara, mas pior. Uma estrutura precária, com tinta descascando das janelas e uma porta principal que nem tentava passar a ilusão de segurança. Mulheres agrupavam-se na entrada, vestindo trajes curtos e apertados, algumas trocando risadas, outras lançando olhares avaliativos para Joss enquanto ela estacionava o carro.
Retirando os óculos escuros, Joss estudou o prédio por um momento antes de subir os degraus manchados que levavam ao terceiro andar. Não havia porteiro, recepção, nem câmeras. O cheiro de cigarro misturava-se ao de fritura velha, e cada passo dela parecia ecoar mais do que deveria no lugar úmido. As mulheres no corredor a cumprimentaram com um aceno provocativo, algumas enrolando mechas de cabelo nos dedos de forma teatral. Homens e adolescentes encostados nas paredes fumavam sem pressa, os olhos brilhando de desconfiança ao acompanharem os passos de Joss.
No terceiro andar, o silêncio era quase absoluto, quebrado apenas por música alta que vazava de um dos apartamentos, tentando mascarar gemidos que não precisavam de mais contexto. O corredor parecia congelado no tempo, com as portas esfoladas e o chão de linóleo exibindo rachaduras como feridas abertas que pareciam apenas aumentar com o tempo. Parando diante do número 39, Joss tocou a campainha e esperou, fingindo não sentir um desconforto que perdurava desde que sumiu todos os lances de escada até aquele andar.
Nada.
Ela apertou novamente, dessa vez segurando o dedo no botão por mais tempo. Passaram-se segundos eternos até que o som de passos arrastados ecoou do outro lado. Então vieram as trancas, uma após a outra, seguidas de um clique final da maçaneta girando. A porta se abriu apenas o suficiente para revelar Bella Garnet, e seu rosto parecia pronto para disparar uma ofensa automática.
— Quem diabos... — A voz dela morreu no meio da frase quando seus olhos encontraram os de Joss, tornando-se ainda maiores conforme o choque inicial ocorria e sua boca ficava meio aberta. Reconhecimento imediato.
Mas Bella não era mais quem Joss se lembrava. Anos atrás, Bella era praticamente um manequim ambulante, desfilando roupas que imitavam grifes, com saltos que pareciam caros, mas não eram, e uma confiança construída sobre bases frágeis. "Beleza é tudo", ela costumava dizer, enquanto sorria daquele jeito ensaiado, mas brilhante o suficiente para enganar quem não a conhecia.
O cabelo cor de cobre de Bella estava preso em um coque desleixado, com mechas escapando em todas as direções, como se tivessem desistido de manter qualquer ordem, e uma franja um pouco torta que cobria sua testa. Sua maquiagem deveria ter sido bem-feita horas atrás, em algum momento do dia, entretanto agora não era. O que Joss via era um rímel borrado que escorria dos olhos, já inchados e avermelhados, denunciando lágrimas recentes. Ela vestia uma regata rosa desbotada, com alças finas demais para cobrir o sutiã preto que se destacava por baixo, e um short tão curto que beirava o exibicionismo, como se tivesse abandonado qualquer pretensão de recato.
— Jocelynn — a voz dela saiu engasgada, carregada de emoção, como se o nome de Joss fosse uma tábua de salvação inesperada naquele momento árduo. — Meu Deus, é você mesmo.
Antes que Joss pudesse reagir, Bella já a envolvia em um abraço desajeitado, os braços apertando com força suficiente para desestabilizar. Bella sempre fora menor, mais frágil, e agora o contraste entre elas parecia ainda maior.
— Também é bom te ver, Bells — disse Joss, hesitante, enquanto dava tapinhas leves e incertas nas costas de Bella.
— V-você... — Bella gaguejou, os ombros tremendo com soluços que ela tentava conter. — Você não sabe como é bom te ver, Joss. Deus, estou tão... tão abalada.
Joss permaneceu imóvel, rígida como uma estátua. Ela não era boa com demonstrações de afeto, especialmente aquelas carregadas de emoções que ela não sabia decifrar completamente. Não que ela não fosse boa em consolar pessoas.
Houveram casos no passado onde Joss precisava fazer esse trabalho, apoiar alguém, estabilizar uma pessoa desesperada em meio a uma cena de crime, consolar uma criança que acabara de perder um dos pais... era comum nesse meio. Mas, naquele momento, depois de anos sem ver Bella e com tanta coisa não dita entre as duas, era estranho que a primeira interação dela fosse essa.
— Imagino que você já saiba sobre o Mike, então — disse Joss, a voz cautelosa.
Bella afastou o rosto apenas o suficiente para encará-la, e Joss percebeu as manchas escuras de rímel em suas bochechas que provavelmente estavam em seu blazer também agora.
— Saiu no jornal hoje cedo — respondeu Bella, o lábio inferior tremendo enquanto uma nova onda de lágrimas ameaçava cair. — Inferno, foi impossível não saber.
— Sinto muito, Bella. Sei que vocês dois eram... próximos.
Bella fungou e assentiu, afastando-se devagar, como se a energia para sustentar o abraço tivesse desaparecido. Joss observou-a se recompor de forma fragmentada, limpando o rosto com as mãos, que tremiam levemente. Ela estava um caos. Não era uma performance. Bella sempre fora uma mentirosa habilidosa em relação ao que possuía, mas péssima em disfarçar sentimentos reais. E agora, estava tão exposta que Joss mal conseguia enxergar traços da garota confiante que conhecera anos atrás.
— Sei que não é um bom momento, mas queria conversar com você... sobre o Mike — disse Joss, com cuidado. — Será que posso entrar e fazer umas perguntas?
O riso de Bella foi cortante, uma lâmina de sarcasmo misturado com mágoa enquanto ela aind parecia chorosa.
— Então é isso? Você está aqui como policial, não como amiga. — disse Bella com desgosto evidente em seu tom de voz. — Eu deveria ter imaginado.
— Estou aqui como os dois — mentiu Joss, a voz firme apesar do incômodo. Amizade não era algo que Joss usaria para definir a relação delas — Descobrir quem fez isso com o Mike também é importante pra mim. Você entende isso, não entende?
O rosto de Bella endureceu, mas Joss notou o lampejo de vergonha em seus olhos. As palavras dela tinham atingido o alvo, forçando Bella a reconhecer sua própria reação egoísta. Ela deu um passo para trás, abrindo espaço na porta.
— Entra.
Observando o apartamento enquanto Bella caminhava até o sofá de couro descascado, Joss entrou e fechou a porta. O lugar era pequeno, apertado, e um retrato caótico da vida que Bella levava agora. Roupas amontoadas ocupavam uma poltrona no canto; garrafas vazias de cerveja estavam espalhadas pelo chão, junto a pacotes de camisinha rasgados. Sobre a mesa de centro de vidro, havia um pacote de salgadinhos esquecidos, uma garrafa vazia, um vaso de plantas no centro e uma trilha de pó branco que não deixava dúvidas sobre seu propósito.
A loira deixou o olhar pairar por ali por um momento antes de encará-la novamente. Nas paredes, quadros exibiam fotos antigas de Bella. Vestidos apertados, lingeries provocantes, poses cuidadosamente ensaiadas para um catálogo que prometia mais do que entregava. Ela estava deslumbrante em cada uma delas, retocada ao ponto da perfeição artificial, mas mesmo assim cheia de brilho, cheia de algo que agora parecia ausente.
A Bella de antes tinha sonhos. A Bella de agora parecia um reflexo distorcido do passado, como se algo tivesse se quebrado e nunca mais fora consertado. Joss gostaria de saber quando tudo saiu dos trilhos.
— Fique à vontade — disse Bella, sua voz embargada, mas tentando soar casual enquanto enxugava o rosto com um pano.
Joss parou diante da mesa de centro, as mãos no bolso do blazer, o olhar calculado. Não ousou se mover do seu lugar, preferindo se manter de pé.
— Parece que a vida tem sido... complicada — comentou ela, com um tom que parecia tanto uma observação quanto uma provocação sutil.
Bella ergueu os olhos, avaliando Joss com uma expressão cansada, mas ainda assim desafiadora.
— Você não faz ideia.
— Como você chegou a esse ponto? — Joss perguntou, a voz baixa, mas com um peso que enchia o pequeno apartamento.
Bella arqueou uma sobrancelha, o sarcasmo colorindo seu rosto pela primeira vez desde que se reencontraram. Ela estava tentando recuperar uma ponta de controle, um vestígio da velha Bella Garnet, e Joss não negaria, era engraçado ver isso acontecendo.
— Quer mesmo saber? — perguntou, a voz carregada de veneno disfarçado de doçura. — Vamos apenas dizer que nem todo mundo tem a sorte de virar a "Garota de Ouro" da polícia de Bludhaven como você.
Jocelynn sentiu o impacto daquelas palavras como um golpe seco. Ela comprimiu os lábios, segurando a resposta que queria dar. Este não era o momento para discutir ou reviver velhas mágoas. Seu papel ali era como detetive, não como uma mulher revisitando cicatrizes do passado.
Se pudesse, Jocelynn teria falado o que realmente pensava: não era culpa sua que Bella tivesse afundado em uma vida medíocre. Quando os Extraordinários se dissolveram, todos tinham algo para onde correr — carreiras, estabilidade, vidas que prometiam um futuro. Bella, no entanto, havia optado pelo colapso, e agora parecia desesperada para encontrar alguém a quem culpar. Joss não iria se deixar levar pelas palavras dela.
— Colocaram você no caso do Mike? — Bella perguntou, limpando o nariz com as costas da mão enquanto o tom de desafio suavizava levemente.
— Eu estava por perto quando encontraram o corpo. Me chamaram para o local do crime, e fui. — Joss hesitou antes de continuar, escolhendo as palavras com cuidado. — Não fazia ideia de que era ele.
Desviando o olhar para o lado, Joss observou a cozinha. Havia mais plantas sobre a pedra de mármore que dividia sala e cozinha, algumas estavam penduradas no teto, outras em pequenos vasos. Enquanto Joss olhava para as plantas, Bella inclinou a cabeça, os olhos avaliando Joss com algo que parecia ser desconfiança misturada com dor.
— Você deve ter percebido na hora.
— Não dava para reconhecer de imediato. — A resposta saiu mais firme do que Joss pretendia, um reflexo de sua própria relutância em reviver a cena. — Mike estava... diferente.
"Diferente" era uma palavra simplista para o que encontraram. Deformado, corrompido, como se o corpo tivesse apodrecido de dentro para fora. Até Graham, o legista, parecia desconcertado. Ele dissera a Jocelynn mais cedo, quando ela ligou, que o corpo não apenas deteriorava, mas fazia isso em uma velocidade quase antinatural, uma putrefação que desafiava a lógica. Mas ela não compartilharia isso com Bella. Algumas verdades eram piores que o silêncio.
Bella assentiu, o gesto lento e vazio, enquanto seus olhos vagavam para além de Jocelynn. Sua perna balançava em um ritmo nervoso, a energia inquieta consumindo-a por inteiro. Havia algo quebrado em Bella, algo que ninguém conseguiria consertar.
E Jocelynn não tinha certeza se ela sequer queria tentar.
— Bella, você e Mike ainda mantinham contato? Se encontravam com frequência? — A pergunta era direta, mas o tom de Joss foi deliberadamente suave, como quem sabia a resposta, mas queria ouvir da boca dela.
— Ele aparecia de vez em quando. — Bella deu de ombros, como se estivesse contando algo trivial. — A gente transava, ele ia embora, e depois sumia por um tempo. Quando brigávamos, ficava um mês sem aparecer.
Joss assentiu, assimilando a confissão sem surpresa.
— Quando foi a última vez que você o viu?
— Mês passado, acho. — Bella mordeu o lábio por um momento antes de continuar. — A gente discutiu feio, ele sumiu, mas me mandou uma mensagem semana passada. Perguntou se eu estava em casa. Respondi que sim.
— E depois disso?
— Nada. — Bella deu de ombros novamente, a expressão agora misturando descaso e algo que parecia melancolia. — Tentei ligar, mas ele não atendeu. Nem respondeu às mensagens. Então eu deixei pra lá. Achei que tinha encontrado outra garota ou coisa parecida. Mike é assim.
Os olhos de Joss estavam levemente semicerrados. A expressão no rosto de Bella e a casualidade como ela falava não davam margens para dúvidas, mesmo assim Jocelynn a analisava com cuidado. Se Bella estava mentindo ou escondendo algo, Joss precisava saber.
— E qual foi o motivo da briga entre vocês? Você lembra?
Bella negou.
— Alguma coisa fútil, provavelmente. Mas eu mal me lembro do que aconteceu, estava chapada demais na hora — respondeu a Garnet, enquanto arrancava um fiapo solto da manta que cobria o sofá — Mike ficou irritado e foi embora.
Em silêncio, Joss absorveu cada palavra, os olhos fixos em Bella. Nada disso era surpreendente. Mike e Bella sempre tiveram um relacionamento que oscilava entre o tóxico e o performático. Eles adoravam posar como o casal perfeito, mas nos bastidores eram um turbilhão de problemas. Talvez fossem as únicas pessoas no mundo capazes de se complementar no caos que orbitavam.
— Você tem falado com os outros? — Joss perguntou, mudando ligeiramente o foco da conversa.
— Não vejo Amadeus e Frankie desde que tudo desmoronou. — Bella revirou os olhos, claramente incomodada com a lembrança. — A Tara? Vi ela uma vez no centro, quando fui fazer compras. A filha dela perguntou quem eu era, e a vagabunda fingiu que nem me conhecia. Que se dane.
— E o Elliot?
Bella bufou, pegando um canudo que estava sobre a mesa.
— Elliot me mandou solicitação no Facebook anos atrás. Pensei que ele queria contratar meus... serviços. Mas não. Foi só pra me convidar pra ir na igreja dele. Aquele hipócrita. Acredita mesmo que aquele babaca piromaníaco agora se diz crente? — Bella indagou, quase soando ofendida.
— Por essa eu realmente não esperava — Joss cruzou os braços, e seus pensamentos se direcionam a Elliot. De todos no grupo, Elliot era o mais distante de todos. Não porque ele não tentou se aproximar, mas sim porque de alguma forma sempre acabava sendo excluído por ser esquisito.
De alguma forma, Elliot sempre acabava sendo um incomodo para os outros. Joss não tinha reclamações sobre ele, mas Amadeus, Mike, Bella e Tara sempre tinham algo para dizer — a maioria das vezes era sempre uma ofensa. Frankie sempre foi como um mediador nos conflitos internos do grupo, buscando sempre acalmar os ânimos, mas até ele se estressou com Elliot uma vez. Joss, por sua vez, estava sempre muito ocupada para se importar.
Naquela curto período de silêncio entre ela, Bella se moveu. Joss observou em silêncio enquanto Garnet se inclinava sobre a mesa de centro, o canudo já posicionado próximo ao pó branco. Ela se moveu sem mostrar se importar com a presença de Joss na sala.
— Vai mesmo fazer isso na minha frente? — perguntou ela, arqueando uma sobrancelha.
Bella pausou por um segundo, um sorriso cínico curvando seus lábios. Mesmo assim, Bella não perdeu o semblante triste. Seus olhos ainda estavam úmidos e seu rosto abatido, mesmo que agora estivesse buscando provocar Joss, ela não conseguia escapar da dor da perda.
— Sim. O que você vai fazer? Me prender?
Antes que Joss pudesse responder, Bella inalou profundamente, jogando a cabeça para trás enquanto limpava o nariz com um movimento teatral.
— Ser a policial malvada não combina com você, Joss. — A voz dela carregava um tom de escárnio, mas seus olhos estavam pesados, como se parte dela soubesse que estava apenas se afundando ainda mais. — E eu estou de luto, no momento. Preciso lidar com a perda de alguma forma.
— Acho que não me conhece tão bem quanto pensa. — Jocelynn inclinou-se levemente para frente, os braços cruzados de maneira firme. Sua postura endureceu, uma barreira invisível que a separava da atmosfera densa e esfumaçada do apartamento. Ela precisava voltar ao motivo de estar ali, focar no que realmente importava. — Você disse que ele te mandou uma mensagem semana passada. Perguntou se estava em casa. Não achou estranho ele não aparecer?
Bella deu de ombros, os lábios se curvando em um sorriso irônico enquanto revirava os olhos.
— Mike fazia isso o tempo todo, Joss. Ele gostava de me deixar esperando. Acho que era o jeito dele de sentir que ainda estava no controle de alguma coisa na vida dele. — Com um movimento quase negligente, ela puxou um cigarro de entre as almofadas do sofá e o acendeu. A fumaça começou a preencher o ar abafado do apartamento, misturando-se ao cheiro de cerveja velha e desespero. — Ou talvez estivesse com outra garota. Ele fazia isso, lembra?
Jocelynn manteve-se imóvel, mas algo em seu olhar endureceu com desgosto.
— Lembro, sim. — A voz dela era baixa, mas carregada de intenção. — Mas dessa vez foi diferente. Ele morreu, Bella. Algo aconteceu entre o momento que ele te mandou aquela mensagem e quando o encontramos. Preciso saber se ele mencionou algo, deu alguma pista... se você sabe com quem ele poderia estar se encontrando durante essas semanas.
Bella fez uma careta, meio desconfortável.
— Talvez com a namorada dele. — Ela deu de ombros, soprando a fumaça devagar, como se o assunto não tivesse peso algum.
Jocelynn piscou, mas não demonstrou surpresa.
— Namorada?
— Namorada. — Bella confirmou, um brilho divertido no olhar que rapidamente se apagou. — Acho que o nome dela é Liza. Filha de um banqueiro.
— Sabe o sobrenome dela?
— Não. — Bella fez uma pausa, inclinando-se para esmagar o cigarro no cinzeiro. — Mas tenho certeza de que o pai dela tem dinheiro o suficiente para mandar matar alguém. Ele trabalha no principal banco de Bludhaven a anos.
— Ele te falou isso?
— Ele me disse que só estava com ela por causa do dinheiro. — Bella cruzou as pernas, sua voz adquirindo um tom cortante de desdém. — Mike era assim, sempre buscando um atalho.
Jocelynn assentiu, processando a informação.
— E o endereço dele? Ainda mora na Avenida Skunk?
— Até onde eu sei, sim. Um prédio azul perto do estádio.
— Certo. Tem mais alguma coisa que você acha que eu deveria saber? — Sua voz era firme, mas não acusadora.
Bella balançou a cabeça lentamente, seus olhos vidrados em um ponto indefinido na parede. Ela estava absorta em pensamentos.
— Nada que eu consiga lembrar agora.
— Tudo bem — Joss estreitou os olhos — Pode me dizer onde você estava ontem, entre as 7 e as 8 horas?
— Sério mesmo? — Perguntou Bella, soando indignada.
— É apenas o procedimento padrão, Bella. Eu preciso saber.
Ainda irritada, Bella bufou e balançou a cabeça.
— Eu estava com um cliente. O nome dele é Carl, mora a duas quadras daqui. Você pode ligar para ele, se quiser. Ele vai confirmar — respondeu ela. — Vai precisar dos detalhes de tudo que fizemos também?
Joss torceu o nariz em desgosto.
— Não é necessário.
A resposta de Bella havia sido convincente e ela não desviou o olhar para responder, deixando claro que se sentiu ultrajada por ter sido meramente considerada uma suspeita. Não era culpa de Joss precisar confirmar para ter certeza, fazia parte do procedimento, era necessário perguntar para não deixar nenhuma possibilidade passar. Sem contar que Joss havia visto Mike e Bella discutindo muitas vezes no passado. Não seria uma surpresa ela ter se cansado e decidido matá-lo por simplesmente não aguentar mais aquele ciclo em que os dois estavam presos.
E Jocelynn sabia melhor do que ninguém que Bella poderia matá-lo facilmente se quisesse. Ela não era chamada de Belladonna atoa. Por mais que hoje em dia ela não fosse metade da heroína que gostava de fingir ser, Bella Garnet ainda poderia ser tão letal quanto antes.
Respirando fundo, Joss assentiu. Ela não esperava encontrar todas as respostas ali, mas achava que Bella teria mais a oferecer sobre Mike. Sabia que colocar muita expectativa era errado, parte disso vinha de uma tentativa falha de sua mente de encontrar uma solução mais rápido.
Tirou um cartão de visitas do bolso e colocou-o sobre a mesa de centro, próxima à garrafa de cerveja vazia.
— Se lembrar de algo, qualquer coisa, me ligue.
Bella assentiu, mas seu olhar continuava distante, como se estivesse presa em alguma memória que não ousava compartilhar. Jocelynn observou-a por mais um segundo antes de virar-se e caminhar até a porta. O clima entre elas ficou claramente estranho de uma hora para outra e Joss percebeu que não aguentava mais um minuto sequer naquele ambiente.
— Eles sabem? — A voz de Bella a fez parar com a mão já na maçaneta.
Joss virou-se lentamente, os olhos fixando-se nos de Bella.
— O quê?
— Seus colegas do departamento — Bella inclinou-se para frente, o rosto iluminado apenas pela luz amarelada do teto. — Eles sabem que você conhecia o Mike? Ou está escondendo isso deles também?
Jocelynn manteve o olhar firme, mas algo nela vacilou por dentro.
— Isso não é relevante para a investigação.
— Não é relevante para a investigação ou para você? — Bella indagou, ultrajada e recostando-se no sofá, ela tragou seu cigarro mais uma vez — Nós nunca fomos importantes para a sua vida perfeita, por isso fez questão de afastar todos nós.
— Foi uma decisão coletiva, não apenas minha. Quando o grupo decidiu se separar, todos entraram em um consenso de que não deveríamos mais nos encontrar — retrucou Joss. — Era o certo a ser feito. Se não estava satisfeita com essa decisão, deveria ter dito 2 anos atrás.
— Do que adiantaria? Você já estava decidida a sair e todos os outros queriam o mesmo que você: a emancipação. Seguir carreira solo, esquecer que algum dia estivemos juntos — rebateu Bella, seu tom de voz aumentando aos poucos.
— Você sabe muito bem o porque essa decisão foi tomada, Bella. Não aja como se nossos motivos fossem egoístas. Não se esqueça do que você fez,
— Sim, claro. Continue bancando a impecável, Jocelynn Kennedy. — A voz de Bella era um fio de veneno, cada palavra carregada de uma amargura corrosiva. O olhar enviesado que ela lançou era como uma lâmina, tentando cortar por baixo da armadura de Joss. Então, com esforço, Bella se levantou, os movimentos rígidos, mas ainda firmes o suficiente para exibir um resquício de desafio. Ela caminhou até Jocelynn, o cigarro preso entre os dedos tremendo levemente. — Você sempre foi boa em fingir. Mas sabe... você e eu não somos tão diferentes quanto gosta de acreditar.
As palavras pairaram no ar, afiadas como estilhaços de vidro quebrado. Jocelynn não respondeu de imediato. Seus braços permaneciam ao lado do corpo, imóveis, enquanto seus lábios se comprimiam em uma linha fina e inquebrável. Aquelas palavras deveriam atingi-la, perfurá-la, mas tudo o que sentiu foi... vazio. Bella Garnet não tinha mais o poder de feri-la. Não depois de tudo o que haviam sido, e do que haviam se tornado.
Ela estudou Bella, afundada no sofá encardido. O cigarro em seus dedos era tragado como se fosse a última coisa que a ancorava à realidade, o perfume amargo da fumaça misturado ao doce e enjoativo cheiro de pó. Jocelynn não sentia raiva. Nem mágoa. O que sentia era pior: pena. Não a pena piedosa que aquece o coração, mas uma compaixão gélida e distante, que fazia as veias dela se apertarem como gelo.
— Eu só vejo uma prostituta fracassada na minha frente. — As palavras escaparam de seus lábios com uma calma cruel, cada sílaba meticulosamente afiada. — Nós duas não somos iguais. Nunca fomos.
Ela girou nos calcanhares, as solas dos sapatos ressoando no chão como um ponto final na conversa. Estava decidida a não se permitir mais uma palavra, mas Bella tinha outros planos.
A mão de Bella agarrou o braço de Jocelynn com força surpreendente, obrigando-a a se virar.
— Essa conversa não acabou! — Bella rugiu, os olhos brilhando com uma intensidade sobrenatural, um verde espectral que iluminava suas íris. O cheiro inconfundível de beladona invadiu o ar, doce e tóxico, penetrando o ambiente como uma sombra viva. — Você não tem o direito de virar as costas pra mim, não depois do que você fez comigo!
No instante em que as palavras deixaram os lábios de Bella, Jocelynn sentiu o ar ao seu redor mudar. O cheiro doce e enjoativo de beladona encheu o ambiente, um perfume intenso e sufocante que fez sua visão vacilar. O tecido do blazer começou a queimar onde os dedos de Bella o tocavam, o calor ácido penetrando como pequenas lâminas.
— Bella... — Joss murmurou entre dentes, tentando manter o controle.
— V-você tem que me ajudar! — Bella arfava, a voz oscilando entre súplica e ameaça. — Se não fizer isso, se não me ajudar, eu vou contar a todos quem você realmente é, Jocelynn! Eu vou te arrastar para o fundo comigo! Você me deve, Joss! ME DEVE—
Bella engasgou, a última palavra morrendo em seus lábios. Seu corpo travou, os olhos esbugalhados olhando para baixo, onde a mão de Jocelynn, distorcida e translúcida, estava dentro de seu peito.
Joss não atravessara a carne, mas sua mão envolvia o coração de Bella, suas unhas invisíveis cravando-se no órgão. O coração lutava contra aquela força estranha, pulsando de forma errática sob o controle absoluto de Jocelynn. Ela sentiu a textura pulsante e quente sob seus dedos, o poder intoxicante de manter uma vida em suas mãos, literalmente.
Bella não conseguiu se mover. O brilho esverdeado apaga-se lentamente de seus olhos e dedos, enquanto seu corpo treme, e ela solta o braço de Jocelynn, cambaleando para trás, quase sem forças, mas sem conseguir se afastar.
— Você se esqueceu de quem eu sou, Bella. — A voz de Jocelynn era impassível e dolorosamente cortante. — Talvez seja hora de lembrar.
Ela prolongou aquele momento para satisfação própria, segurando o coração pulsante de Bella em suas mãos com mais firmeza. O desespero brilhou nos olhos da mulher, que tentou segurar o braço de Joss, mas apenas atravessou um espectro. Sua luta foi em vão e, por um momento, Bella pensou que aquele fosse seu fim. Olhando diretamente para os olhos azuis de Jocelynn Kennedy que não mostrava nenhum remorso enquanto a deixava sofrer. A visão de Bella turvou, pontos pretos surgiram e ela arfou uma última vez, quase fechando as pálpebras.
A mão de Joss se desmaterializou, e Bella caiu de joelhos, ofegante, as mãos pressionadas contra o peito como se ainda pudesse sentir o aperto invisível. Jocelynn deu um passo atrás, observando a cena com uma expressão de mármore. Sem os efeitos da beladona ao redor, tudo retornou ao normal e a visão de Joss entrou em foco mais uma vez.
— Isso não foi... isso não foi uma miragem... — Bella gaguejou as palavras, ainda abalada. — Como você...
A surpresa era nítida nas feições de Bella quando ela ergueu o olhar para Joss, ainda com uma mão sobre o peito.
— Você não precisa saber como — Joss colocou as mãos dentro do blazer enquanto falava. — Apenas precisa saber que não vai conseguir fazer joguinhos comigo. Não tenho nenhuma compaixão por você e, na próxima vez, não serei tão misericordiosa, entendeu? Abra a porra da boca para qualquer um e vai ter um fim pior que o do Mike.
Bella engoliu o seco e, sem conseguir manter contato visual, ela desviou o olhar par um canto próximo na parede. Jocelynn ergueu sua postura mais uma vez e suspirou, enquanto retirava uma mecha de cabelo do rosto. Seus olhos caem para onde o poder de Bella correu o tecido de seu blazer, enchendo Joss de desgosto ao ver o estrago feito.
— E você me deve um blazer novo.
Antes que Bella pudesse replicar, Jocelynn gira a maçaneta e sai, sem olhar para trás. A porta se fechou com um estalo, cortando qualquer tentativa de prolongar aquela conversa. Não havia mais o que discutir com Bella Garnet.
O ar do lado de fora estava fresco em comparação ao ambiente abafado e cheio de fumaça do apartamento. Jocelynn desceu os degraus do prédio sem pressa, mas com um alívio crescente a cada passo. Deixando para trás não apenas Bella, mas também o peso daquele passado em ruínas. A situação havia sido ruim, mas Joss estava tentando não se culpar. Ela dizia a si mesma que Bella a levou ao limite, que fez o que fez pois a Garnet pediu por isso, mas ainda assim não conseguia tirar sua mente de tudo que a antiga heroína havia dito. Tanto rancor que Bella deveria nutrir por ela, tanta raiva. Joss pensou que estava fazendo o certo, mas não estava. As consequências de seus atos agora eram gritantes na vida de outras pessoas. Como não se sentir culpada quando foi uma ideia sua que causou isso?
Quando entrou em seu carro, Joss retirou o blazer e o jogou no banco de trás. Em seguida, Joss ajusta o espelho retrovisor, observando brevemente seus olhos no vidro. Sem miragens, sem mentiras. Apenas o verdadeiro reflexo, e Joss não sabia se gostava do que via.
Depois de dirigir pelas ruas caóticas de Bludhaven, Joss finalmente estacionou em frente à delegacia. Ela percebeu que o relógio marcava dez minutos além do horário. Havia dirigido todo o percurso com determinação, traçando os melhores caminhos para não se atrasar, porém isso não se mostrou eficaz. As ruas de Blüdhaven estavam, como sempre, congestionadas. O tráfego lento era um lembrete constante de que a cidade nunca parava, nunca dormia. Jocelynn desviava entre faixas, tentando escapar do trânsito opressor. Avisara a Stell que se atrasaria, mas ainda assim acelerava, determinada a minimizar o atraso.Pelo menos sua chefe entenderia que o atraso foi por um bom motivo.
Ela soltou um suspiro curto, pegando sua bolsa no banco do passageiro ao lado e saiu do carro, trancando-o e entrando no prédio em seguida. O espaço aberto do departamento estava cheio de oficiais, como sempre. Alguns tomando café, outros em suas mesas trabalhando e outros saiam para atender chamados pela cidade. Ela comprimentou alguns pelo caminho, sendo amigável enquanto caminhava até sua mesa para deixar suas coisas. Jocelynn apressou os passos pelo corredor, seus saltos ecoando contra o chão encerado.
Ao lado da mesa dela, Jonah estava encostado, digitando algo freneticamente no celular. Ele ergueu os olhos quando ela se aproximou, uma sobrancelha levantada em leve provocação.
— Bom dia, bom dia. — Jonah a cumprimentou em um tom baixo, inclinando a cabeça. Ele não parecia afetado por uma ressaca, diferente de Margot que por pouco não levantou da cama. Joss quase precisou arrasta-la para fora da cama — Pensei que você fosse perder sua reunião super importante com a Stell hoje.
— Quase perdi, mas você sabe como eu sou sortuda. — Jocelynn respondeu, um meio sorriso se formando em seus lábios enquanto ela deixava sua bolsa sobre a cadeira.
— Sorte ou teimosia. Ainda não decidi.
— Um pouco dos dois — Joss piscou um olho para ele, fazendo Jonah revirar os olhos.
— Espero mesmo que ela tenha boas notícias para você. Tentei descobrir o que era com a Maria, mas ela não sabe.
— Ela não disse o que queria discutir comigo, mas disse que era importante — disse a Kennedy. — Então se nem a secretária dela sabe o que é, deve ser realmente muito importante.
Jonah assentiu, meio pensativo. Joss sabia que ele estava um pouco frustrado por não ter descoberto o que era. Deus sabia o quanto Jonah adorava uma fofoca.
Despedindo-se do amigo, Jocelynn decidiu não perder mais tempo. Ela subiu os lances de escada até o escritório de Stell e parou em frente à porta do escritório de Stell, as mãos ansiosas alisando o tecido da blusa branca que vestia. Inspirou profundamente, sentindo o peso de sua respiração no peito, e se obrigou a parecer apresentável.
Duas batidas rápidas. Firmes, mas não impacientes.
— Entre. — A voz de Stell cortou o silêncio com autoridade, familiar, mas intransigente.
Com a permissão, Joss abriu a porta, projetando uma postura de confiança que mal mascarava a inquietação que rastejava sob sua pele.
— Bom dia, chefe. Me desculpe pela demora. — Seu tom era controlado, quase indiferente. Mas, ao entrar, seu olhar caiu sobre a figura sentada de costas na cadeira em frente à mesa de Stell. Algo sobre ele — a rigidez dos ombros, a meticulosa ordem do cabelo castanho quase preto — acendeu uma fagulha de reconhecimento, incômoda e persistente. — Se estiver ocupada, podemos remarcar nossa reunião.
Havia uma hesitação em suas palavras, quase imperceptível, mas real.
— Não, não precisa sair detetive Kennedy — disse Stell. A mulher de pele morena e olhos cor de âmbar ergueu uma mão, impedindo Joss de sair. Sua chefe era filha de pais indianos e havia todos os traços em suas feições, desde seu cabelo escuro e liso até seu nariz fino. Entretanto, Indira Stell era muito intimidadora quando queria ser. — Fique, quero apresentar você a alguém.
Não havia dúvidas que era ao homem que Joss não conseguia ver o rosto, mas tinha a leve sensação de que conhecia de algum lugar. Ela só conseguia ver a nuca dele, a blusa branca de botões e o cabelo castanho, quase preto, bem arrumado com gel.
Jocelynn assentiu, fechando a porta atrás de si e entrando completamente na sala de Indira. O lugar era simplório, com alguns quadros na parede que mostravam os diplomas de Stell e matérias de jornal que envolviam o nome da mulher. Em uma cômoda próxima a parede entre duas janelas, estavam as fotos de Stell com suas duas filhas e o esposo, junto de uma foto dela com seu antigo chefe e mentor.
— Jocelynn quero apresentar a você ao seu novo colega de departamento e também seu novo parceiro — Stell disse, estendendo sua mão na direção dele — Detetive Richard Grayson.
Seu cenho se franziu em um reflexo involuntário. Havia algo naquele porte, na forma como ele se movia quando se levantou, que despertava uma memória recente e desconfortável. E então ele se virou, e a lembrança bateu com força. Jocelynn sentiu o ar faltar por um momento, seu estômago afundando como se tivesse despencado de um penhasco.
Era ele, não havia dúvida. O mesmo homem com quem havia trocado sorrisos e olhares no bar na noite anterior, aquele com quem Joss flertou descaradamente. O estranho charmoso que segurara seu interesse por tempo suficiente para parecer uma distração perigosa. O cara que Joss chamou de stripper e conseguiu o número, pensando que nunca mais o veria novamente.
Os olhos dela se arregalaram ligeiramente, um brilho de reconhecimento piscando por trás da fachada controlada. Ele pareceu perceber, porque seus lábios se curvaram em um sorriso quase imperceptível quando estendeu a mão para ela, um reconhecimento imediato, o qual serviu apenas para que Joss soubesse que, da mesma forma que ela se lembrava dele, ele também se lembrava dela.
— É um prazer conhecê-la, detetive Kennedy. — Sua voz era suave, comedida, mas o olhar que acompanhava suas palavras continha algo mais: um brilho de reconhecimento que dançava entre ironia e provocação.
— Digo o mesmo, detetive Grayson. — Jocelynn forçou um sorriso, estendendo a mão para apertar a dele, sentindo a pele quente do homem sobre a sua e escondendo com habilidade a tempestade que rugia sob a superfície.
O toque de suas mãos durou apenas um momento, mas foi suficiente para acender uma tensão tangível no ar, uma que só eles dois conseguiam identificar. Stell os observava, alheia ao que acontecia sob a superfície.
Por fora, Joss manteve-se impecável. Mas, por dentro, havia apenas uma palavra ecoando em sua mente repetidas vezes: Merda.
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