Lado A: Campos de Morango

Silêncio.











Silêncio.











Silêncio.







Um rumor de vozes distantes se aproximam e aos poucos podem ser distinguidas. De muito muito longe vêm em seus passos burocráticos e apressados.

Eu... não... mal... dia... não que... Mas assim... rir... mim mesmo...

 Não faz sentido rir de si mesmo!

 Mas não fazendo isso, você aumenta o seu vazio.

— E que há de mal nisso? Sempre vivi junto dele.

— Sua vida será mais pesada e a mínima pedrinha no seu caminho se tornará o maior dos rochedos. E você vai bater nele. E vai doer tanto, como se ele te rasgasse por dentro.

— Não importa. Eu já sou uma carcaça. Se eu não tiver expectativas, nunca vou me machucar. Sempre pode vir o pior e, quando isso acontecer, encaro-o com os olhos vazios envoltos de olheiras.

— Eu não queria ser O Pior para ver isso. Mas diga, quantas vezes ele de fato apareceu e suas muralhas acabaram servindo de algo?

— Quer mesmo saber? Todos os dias do corrente ano. Desde o término, à transferência para outra cidade e a até a queda das ações. E cá estou ainda funcionando.

— Sim, funcionando. Mas está satisfeito com tudo isso?

As vozes se perdem no meio de imensos campos de morango, sob um céu cor de rosa banhado em laranja. As plantas, alinhadas, ostentam os frutos vermelhos, desejosas de entender o que não se vê.

Sonham com uma terra só de morangos, sem alguém que lhes arranque os ramos, escravize as vontades. Uma terra de beldades e bondades. Onde o amor é imperativo e onde acreditar em romantismo não é ridículo. Onde nada é real e viver não parece imoral. Uma vivência de paz, sonhos doces de infância.

Será que faz sentido a elas esperançar no meio de uma estufa opaca, no meio da selva de concreto da massa humana perdida? Não importa que elas sobrevivam, sua morte já foi predestinada.

E é nessa hora que o mais pessimista dos morangueiros sofrerá menos. Ele bem entende que é impossível a revolução. De si e do mundo. Ele sim entende que é só mais uma parte do progresso e depois do seu último morango, será destituído de sua condição de ser: ser apático, ser dramático, enfim, existir.

Também será esse o nosso fim, negados de nossos próprios campos de morango?

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