@PallomaMota escreveu: Carlos, já vi que você é ótimo nas dicas então lá vem eu com mais uma indagação: como faço para ser menos perfeccionista? Eu escrevo meus livros mas nunca estou contente com minha escrita, não consigo ser subjetiva como gostaria e isso me deixa irritada as vezes. Considero minha escrita razoável, mas não é do jeito que eu gostaria ainda, vejo muitas pessoas com a escrita excelente e outras nem tanto, mas meu único desejo é apenas cobrar um pouco menos de mim.

Palloma, obrigado por sua pergunta! Em primeiro lugar, percebi algumas coisas legais na sua pergunta.

1) Você já reconhece essa característica em você, isso é muito bom. Autoconhecimento é sempre o primeiro passo.

2) Perfeccionismo, quando cria uma barreira tem um lado ruim, mas também, é legal reconhecer que ele tem um lado bom. O lado bom é que você possui um senso crítico aflorado. Ter o senso crítico é o caminho para poder alcançar o aperfeiçoamento, em qualquer área. É a capacidade de olhar para algo que você fez, ou outra pessoa fez e pensar: isso não está tão bom, poderia ser melhor... Isso acontece comigo mesmo no campo da ilustração, muitas vezes me falta a habilidade para fazer uma ilustração do jeito que eu queria, ou imaginava, e isso me sinaliza que eu ainda posso praticar mais, me esforçar para melhorar.

3) Considerar sua escrita razoável é uma boa coisa. Mesmo considerando que é difícil analisarmos nosso próprio trabalho, sinaliza que o nível de perfeccionismo não é extremo e não está impedindo você de concluir partes do seu trabalho.

Vou falar algumas coisas gerais sobre perfeccionismo que também podem ajudar.

Requentando duas das dicas do capítulo "Como aperfeiçoar minha escrita":

Termine. Aprenda tudo o que puder e aplique ao que estiver escrevendo com foco em terminar de escrever o que já começou. Não deixe que o perfeccionismo faça você desistir no meio do caminho. Isso pode levar a ter seis ou sete livros inacabados e engavetados, mas nenhum completo. Não dá para se tornar um melhor escritor, sem terminar suas obras. Se seu primeiro livro não parece excepcional para você, aplique esforço para reescrevê-lo e torná-lo melhor até que se sinta mais confortável com o resultado. Ou, apenas coloque-o de lado e comece o próximo. Lembre-se, algo que você consiga terminar (especialmente romances), ainda que imperfeito, é uma grande conquista. Eu já escrevi 9 romances muuito imperfeitos, mas que agradam a um certo público, algo que valorizo muito.

Livre-se de seu medo. Talvez a coisa mais importante que você consiga fazer é livrar-se do medo que possui de que o que escreve não é bom o bastante. Seu trabalho é contar a história, então conte da melhor forma que lhe for possível. Dê o melhor acabamento possível e envie-a ao mundo, e não se preocupe quanto a pessoas que não vão gostar do que escreveu, pois não importa o quão excepcional for o nível de sua escrita, é garantido que sempre haverá pessoas que não irão gostar. Os mais talentosos e bem sucedidos escritores do mundo ainda possuirão críticos que dirão que sua escrita é amadora, entediante, mal acabada, ou mesmo sem talento. Não é possível agradar a todos, então, não se preocupe em tentar. 

Para mais detalhes, vale revisitar os capítulos "Hesitação de iniciante" e "Como aperfeiçoar minha escrita".  

Agora tentando dar uma resposta objetiva à sua pergunta: como cobrar menos de si mesma?

Peso. Não coloque tanto peso no que você já escreveu até então, e nem no que está escrevendo no momento e nem no que vai estar escrevendo daqui a alguns meses ou daqui a um ano ou dois. Você estará em processo de aperfeiçoamento constante. É preciso que tenhamos a capacidade de aceitar o que o resultado produzido num dado momento, foi o melhor possível até então. Perdoe e aceite suas limitações.

Prazo. Tente estabelecer um limite de tempo. Muitas vezes não concluímos algo por que ficamos presos num ciclo de ajustes sem fim para atingir uma "perfeição inatingível". O prazo vai ajudar a pensar assim: "pronto! Isso foi o melhor que consegui fazer neste prazo."

Experiência de outros escritores. A maioria dos escritores passa por um processo natural de aperfeiçoamento. A medida em que estudam e praticam, vão se tornando melhores. Muitos escritores tradicionais (daqueles publicados por editoras, de antes do tempo da internet e mecanismos facilitados de autopublicação) não emplacavam um sucesso de vendas ou crítica em seu primeiro livro, tão pouco, no mais recente. E já li muitos relatos de livros que foram editados, impressos e vendidos e que depois de esgotar várias edições, vieram a ser rescritos em parte. Muitas vezes, anos depois, e ganharam uma edição revisada. Como aqueles DVDs/Blu-rays que saem anos depois com a versão do diretor. Então, talvez, mais adiante, você possa revisitar algum projeto antigo e aperfeiçoá-lo com facilidade usando seu aprendizado acumulado ao longo do tempo.

Permita-se errar. O processo de aprendizado depende de erros. Quem não se permite errar, não aprende. 

Subjetividade. Não existe uma única maneira certa (ou perfeita) de produzir seu texto. Qualquer um que avalie seu texto, o fará num nível subjetivo. Como disse antes, não será possível agradar a todos.

Obra prima. A maioria dos artistas produzem muitas coisas ao longo da vida, nem todas perfeitas. Todo seu processo pode ser visto como uma jornada para produzir, ou fazer surgir sua obra prima. Me desculpe o trocadilho ruim, mas ninguém vai chegar numa obra prima, sem passar pelas não primas.

Em fim, relaxe e se divirta. Escrever para mim é um prazer em si. Escrevo primeiro para me divertir, descobrir e mostrar a mim mesmo uma nova história. Busque pelo prazer intrínseco da escrita, isso também poderá ajudar.